Folha de S. Paulo
Ter um vice como Alckmin ajudará a retomada
de políticas progressistas
Na
coluna de 7 de novembro, escrevi que acho uma boa ideia a chapa Lula/Alckmin
para a eleição presidencial de 2022. Na época, não tinha muita expectativa
de que a aliança de fato acontecesse. Talvez eu tenha perdido a capacidade de
reconhecer boas notícias, ou talvez tenha medo demais de um novo surto de
estupidez antipolítica.
De qualquer forma, a probabilidade de que a aliança aconteça subiu muito neste último mês. No momento, o principal obstáculo parece ser a escolha do candidato para o Governo de São Paulo. É algo perfeitamente negociável entre adultos.
A
receptividade à proposta na esquerda foi bem melhor do que eu esperava. Mas
também houve gente respeitável e inteligente que me escreveu discordando.
Os críticos da chapa no PT têm como
argumento principal a liderança folgada de Lula nas pesquisas. Faltando tão pouco
para a vitória no primeiro turno, por que fazer uma aliança difícil de vender
dentro da esquerda? Além disso, perguntam: quantos votos tem Geraldo Alckmin?
A primeira pergunta é boa, mas se baseia em
uma premissa errada. Não faltam só 5 pontos percentuais para Lula vencer no
primeiro turno, falta um ano.
A ideia de que não haverá novos movimentos dos adversários nesse período, ou
que esses movimentos serão facilmente neutralizados, é difícil de sustentar.
Talvez o establishment aceite uma trégua
com o PT após o desastre de Bolsonaro. Entretanto não o fará antes de tentar
outras coisas. Bolsonaro vai gastar muito, muito dinheiro para tentar se
reeleger. Os
candidatos da "terceira via" certamente receberão muito apoio da mídia,
do empresariado e de elites políticas locais.
Haverá manobras feias e muito jogo sujo.
Talvez nada disso seja suficiente para garantir-lhes a vitória. É inteiramente
possível, entretanto, que seja suficiente para garantir a realização de um
segundo turno.
Chegando no segundo turno, vocês acham que
a negociação de uma coalizão pró-Lula será mais fácil ou mais difícil se o vice
de Lula for alguém como Geraldo Alckmin? Eu acho que será mais fácil.
"Quantos votos tem Alckmin?" é a
pergunta errada. A questão é saber quantas pessoas que resistem em votar no PT
o fariam se o vice de Lula fosse alguém como Alckmin; não interessa se Alckmin
seria o cabeça de chapa preferido dessas pessoas.
Pensem na situação inversa. Se o
governador Flávio
Dino (PSB-MA) fosse candidato a presidente agora, teria poucos votos,
mesmo sendo um excelente quadro. Por outro lado, se fosse vice, digamos, na
chapa de Luciano
Huck, certamente diminuiria a resistência contra Huck em parte da esquerda.
A propósito, tenho amigos na esquerda que
acham que: a) a centro-direita foi sórdida e montou uma farsa com a Lava Jato
para tirar Lula da eleição em 2018; e b) em 2022 essas mesmas pessoas votarão
em Lula contra Bolsonaro sem que a esquerda lhe ofereça qualquer concessão
programática, porque são patriotas altruístas que reconhecem o desastre que foi
Bolsonaro. Pelo menos uma das duas teses é falsa.
A
vitória de Lula, sozinha, não reverterá completamente as derrotas terríveis
sofridas pelos progressistas brasileiros nos últimos anos. Acreditar
no contrário não é radicalismo de esquerda, é messianismo. O diálogo com gente
de fora da esquerda será necessário. Ter um vice como Alckmin, nessa situação,
ajuda ou atrapalha? Eu acho que ajuda.
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