quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Vera Magalhães: Velho Bolsonaro volta depois das 7 ondas

O Globo

Tão logo os brasileiros pulem as sete ondinhas e façam seus desejos para um 2022 que promete ser ainda mais duro que o último biênio, Jair Bolsonaro já terá rasgado a fantasia de moderado que Michel Temer lhe vestiu e estará de volta à velha forma conspiracionista, atirando contra tudo e todos. Desta vez com o cartão de crédito dos gastos populistas e eleitoreiros na mão e com limite alto.

Aos poucos, o presidente já vai se despindo do figurino que lhe causa desconforto, o que respeita as instituições e o contraditório.

Faz isso ao mesmo tempo que cerca sua base mais ideologizada à custa de bravatas e de promessas de benefícios financeiros ou empresariais.

A nova investida se dá junto aos policiais federais, num momento em que há muitas imbricações de interesses da sua família e dos seus sob responsabilidade da PF.

O prometido reajuste geral a servidores no ano eleitoral começou justamente pelos policiais. Veio na forma que também já se tornou usual no método bolsonarista: apenas avisando a Paulo Guedes que ele se vire para arrumar o dinheiro.

Na esteira da PF virão os demais funcionários públicos, num movimento que, além de pressionar o já fictício Orçamento da União, também gerará um efeito de pressão em cascata sobre estados e municípios. Afinal, há governadores que são candidatos e estão igualmente ávidos por um populismo que os faça decolar nas pesquisas.

Eis a fórmula que o presidente usará para tentar se reeleger. Se em 2018 contou apenas com o lavajatismo e o antipetismo para alimentar uma estrutura que vinha montando desde anos antes, cevando uma direita radicalizada diante da qual até então a política, a imprensa e a academia estavam distraídas, agora o presidente precisa de mais. E tem: a estrutura de Estado, o dinheiro conseguido à custa de calote, pedaladas e o apoio de um Centrão cooptado pelo orçamento secreto.

Essa grana ilimitada será usada para tentar compensar a perda de uma parcela do eleitorado que era formada justamente pelos insatisfeitos com a política como um todo ou com o PT, em particular, que já fugiram do barco diante da conduta criminosa do governo na pandemia, das investidas contra a democracia, do desmonte das políticas públicas em todas as áreas e todo o resto do legado destrutivo de Bolsonaro.

Quem é o eleitor-alvo da fase de populismo fiscal que já começou? Os beneficiários de programas sociais, os servidores agora adulados e quem mais puder ser atingido pelas políticas federais voltadas a desmontar estruturas de contenção a determinadas atividades — garimpeiros, madeireiros, caçadores e atiradores, o grupo é grande.

Para atrair esses nichos e manter o núcleo duro da extrema direita ainda fiel é que o Bolsonaro que bate, deixa bater, divulga fake news, demoniza o Supremo e conspira contra o voto eletrônico e a vacina precisa voltar em todo o seu esplendor.

Alguns últimos atos deste 2021 têm de acontecer antes que ele saia do casulo: a posse do amigão André Mendonça no STF nesta semana, a votação do Orçamento, a conclusão da PEC dos Precatórios, o abafa das investigações contra o filho Flávio.

Bolsonaro está riscando essas datas no calendário como presos fazem marcas na parede à espera da soltura.

Tão logo ele colha o fruto de todas essas colheres de chá que lhe foram sendo dadas pelos próprios ministros dos tribunais superiores, por deputados e senadores da oposição, pelo TCU e por uma sociedade que parece disposta a esquecer em breve até os 616 mil mortos da pandemia, aí é melhor apertar o cinto. Cenas como as covardes agressões a jornalistas sob olhar aprovatório do presidente serão constantes e incentivadas. Com dinheiro ilimitado, tende a ser ainda mais fácil.

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