Retomar território é essencial no combate ao crime
Por O Globo
Operações policiais são necessárias, mas só
políticas sociais consistentes garantirão o domínio do Estado
A megaoperação no Rio contra o Comando
Vermelho (CV) reacendeu o debate sobre os desafios do combate a organizações
criminosas que dispõem de armamento de guerra e sofisticação militar. Operações
policiais são necessárias para enfraquecê-las. Mas os resultados costumam ser
parciais e, quase sempre, efêmeros. Há décadas, diferentes governos tentam
enfrentar as quadrilhas, mas o problema persiste. É preciso políticas mais
consistentes e duradouras. Retomar e manter o território é crítico para
garantir a segurança das cidades e o bem-estar da população.
Apesar de os estados canalizarem recursos vultosos à segurança pública, é o crime que tem se expandido. Na Região Metropolitana do Rio, entre 2008 e 2023, a extensão territorial sob domínio de facções criminosas ou milícias cresceu de 8,8% para 18,2%. O avanço não ocorre só no Rio e é visível para o cidadão comum, exposto a uma rotina de tiroteios e crimes de toda sorte.
Já houve, é verdade, experiências positivas.
O projeto Favela-Bairro, implantado no Rio nos anos 1990, procurava qualificar
o espaço urbano das comunidades, mas foi interrompido. As promissoras Unidades
de Polícia Pacificadora (UPPs) num primeiro momento contribuíram para reduzir
os índices de violência,
mas foram colocadas a serviço de um projeto eleitoral que as expandiu
demasiadamente. O Alemão, um dos símbolos das UPPs, virou quartel-general do
CV.
Há caminhos a seguir com base em exemplos
bem-sucedidos, segundo análise do Insper. A cidade de Medellín, na Colômbia,
era uma das mais violentas do mundo quando vivia sob o jugo dos
narcotraficantes. Reverteu a calamidade adotando políticas voltadas não só para
policiamento, mas também para transporte, cultura, esporte, educação e
cidadania — classificadas como “urbanismo social”. Com medidas bem desenhadas e
com apoio consistente de sucessivos governos, empresas e sociedade, Medellín
reduziu os homicídios de 395 por 100 mil habitantes em 1991 para 11,7 por 100
mil em 2024 — e virou referência no combate à criminalidade. No Brasil também
há experiências exitosas. A Região Metropolitana de Belém, uma das mais
violentas do país, se transformou com ideias inspiradas em Medellín.
“Tem que existir a polícia de proximidade que
evite o crime” diz Ricardo Balestreri, coordenador do núcleo de urbanismo
social e segurança pública do Insper Cidades e ex-secretário nacional de
Segurança. “Mas hoje se faz incursão e depois evasão.” Os projetos de urbanismo
social unem policiamento permanente a políticas sociais, em especial construção
de escolas. Mas também postos de saúde, teatros, centros culturais, agência de
bancos, correio e serviços públicos que dão à população a sensação de ser dona
do território.
Ao julgar a ADPF das Favelas, em abril, o
Supremo Tribunal Federal determinou que o governo fluminense elaborasse um
plano para retomar os territórios ocupados pelo crime. É a deixa para implantar
um novo modelo. Operações policiais sempre serão necessárias para conter o
avanço de facções e milícias. A situação é insuportável, e revertê-la exigirá
alguma dose de violência. Mas é preciso ir além. Não se pode perder a
oportunidade de apresentar planos consistentes para retomada dos territórios. É
hora de pôr em prática as ideias testadas que dão certo no longo prazo, ou mais
uma vez haverá retrocesso depois da saída da polícia.
Acordo entre Trump e Xi criará desafios para
exportações brasileiras
Por O Globo
Beneficiado por mais vendas para a China
depois do tarifaço americano, agronegócio sofrerá impacto negativo
O encontro entre Donald Trump e Xi Jinping na
base área de Busan, na Coreia do Sul, desanuviou a guerra comercial entre China
e Estados Unidos, mas terá repercussão negativa para o Brasil. Os
desdobramentos da reaproximação entre Trump e Xi representam um desafio para a
estratégia de comércio exterior brasileira. Um dos acordos selados na reunião
inclui a promessa da China de voltar a importar soja americana. Como Brasil e
Estados Unidos são concorrentes no mercado global de alimentos, é previsível o
efeito negativo para o agronegócio brasileiro — que havia sido enormemente
beneficiado com o crescimento de exportações à China, como resultado da
retaliação chinesa ao tarifaço americano.
Depois da conversa entre Xi e Trump, a China
concordou em importar 25 milhões de toneladas anuais de soja dos Estados Unidos
nos próximos três anos, de acordo com declarações do secretário do Tesouro
americano, Scott Bessent. Para efeito de comparação, de janeiro a maio, o
Brasil exportou aos chineses aproximadamente 21,2 milhões de toneladas. Diante
do baque inevitável, o governo brasileiro e o setor agropecuário devem tratar
quanto antes de diversificar o destino das exportações não apenas de soja, mas
também de outros produtos primários.
Deve-se tornar um objetivo permanente reduzir
a excessiva dependência da China como cliente. Petróleo e celulose são dois
outros itens vulneráveis da pauta. Mas há ainda carnes bovina e suína, mercados
em que os Estados Unidos também atuam e em que a China é destino importante
(nos dois, as exportações americanas no ano passado foram, respectivamente, de
US$ 10,4 bilhões e US$ 8,6 bilhões, ante as brasileiras de US$ 12,8 bilhões e
US$ 3 bilhões).
Ao mesmo tempo, é melhor para o mundo que
Washington e Pequim mantenham canais de diálogo aberto. A partir de Busan, os
dois países deverão chegar a mais acordos no comércio. Os americanos se
comprometeram a reduzir as tarifas sobre produtos chineses de 57% para 47%, em
vez de aumentá-las para 100% como havia ameaçado Trump. Em troca, a China
concordou em voltar a vender aos Estados Unidos as terras-raras, minerais
estratégicos para a produção de chips e para a transição energética.
Antes do encontro, Trump também anunciou que os Estados Unidos retomarão os testes com armas nucleares, sob o argumento de que China e Rússia fazem o mesmo. Pode ter sido apenas uma carta a mais na mesa para aumentar seu poder de barganha diante de Pequim. Mas, se a Casa Branca quisesse, poderia aproveitar a oportunidade para entabular com a China negociações concretas, com o objetivo de restabelecer a moratória nos testes nucleares. É inaceitável a volta da corrida armamentista. O comércio poderia abrir a porta a negociações geopolíticas estratégicas.
Diálogo entre Trump e Xi traz alívio global
momentâneo
Por Folha de S. Paulo
Com ameaça de restringir comércio de terras
raras, China se mostra capaz de resistir a tarifaço americano
Em troca da promessa chinesa de controlar a
exportação de insumos de fentanil, EUA reduziram em 10 pontos as tarifas de
importação
China e Estados
Unidos concordaram
em renovar a trégua que parecia reafirmada por um telefonema trocado
entre Xi
Jinping e Donald Trump,
em 19 de setembro. Não houve novo acordo ou o estabelecimento de novas
diretrizes entre os líderes dos dois países na Coreia do Sul.
Apenas se tratou de cancelar retaliações recentes.
Mais uma vez, o gigante asiático se mostrou
de capaz enfrentar e conter pressões americanas. Espera-se nova rodada de
negociações, que poderiam ser a base de um acerto maior entre as duas potências
econômicas, até abril do ano que vem, quando Trump deve encontrar Xi na China.
A trégua parecia ameaçada por uma rodada de
retaliações iniciada em 29 de setembro. Na ocasião, a Casa Branca ampliou, na
prática, a lista de empresas chinesas impedidas de adquirir tecnologia de
ponta. Em 9 de outubro, Pequim contra-atacou, com regulamentação detalhada
de restrições
do comércio de terras raras, seus subprodutos e tecnologias.
Além do mais, vetava-se a venda desses
materiais que pudessem ter uso militar —a China tem quase o monopólio global
dos imãs de terras raras, essenciais para a indústria de ponta.
Trump reagiu ameaçando com aumento de 100
pontos percentuais do imposto de importação sobre produtos do rival. Colocou
também em dúvida o encontro marcado com Xi, na Coreia do Sul. Houve abalos nos
mercados financeiros e receio de que o conflito entre os dois países pudesse
voltar aos níveis de abril.
Essa tensão se dissipa com a nova perspectiva de trégua.
Os EUA se comprometem a cancelar as sanções
mais recentes. Em troca da promessa chinesa de controlar a exportação de
insumos da fabricação de fentanil, reduziram em 10 pontos percentuais as
tarifas de importação, que caem assim para perto de 47%. Os dois países
cancelam o aumento de taxas portuárias sobre o comércio recíproco.
Pequim afirma que não vai aplicar durante um
ano a nova regulação sobre terras raras; que voltará a comprar soja e outros
produtos agropecuários.
Em bom português, a ameaça chinesa de
embargar a venda de produtos de terras raras conteve outra vez a ofensiva de
Trump. A China mostra que tem poder para ser o único país a confrontar ameaças
americanas. Contudo dois motivos de atrito maior e imediato permanecem.
Xi quer que os EUA suspendam restrições à
exportação de tecnologia. Essas limitações, porém, se devem a motivos militares
e à política americana de manter a vantagem em inteligência
artificial. Washington quer diminuir o déficit comercial com a China, o que
depende de mudança na política econômica do rival, de baixo consumo e excesso
de exportações.
Nos próximos meses, os dois países devem
tentar atenuar tensões enquanto prossegue o processo de desacoplamento das duas
economias. No fundo, está a disputa pela supremacia geopolítica e econômica no
mundo.
Sem retrocessos na educação especial
Por Folha de S. Paulo
Parlamentares de direita querem derrubar
decreto que consolida avanços da legislação brasileira
É consenso entre pesquisadores que a inclusão
de pessoas com deficiência no ensino regular é benéfica para toda a comunidade
escolar
Parlamentares vinculados à direita
conservadora mais uma vez criam disputa ideológica para tratar de políticas
públicas, que deveriam ser avaliadas com base em leis e evidências. Agora, o
alvo é o ensino de crianças e jovens com deficiência.
No dia 21 deste mês, o governo Luiz
Inácio Lula da
Silva (PT)
publicou decreto que institui a Política e a Rede Nacional de Educação Especial
Inclusiva. A norma pouco faz mais do que consolidar o que já está na Constituição,
em tratado internacional do qual o Brasil é signatário, na lei de 1996 que
estabelece as diretrizes e bases da educação e no Estatuto da Pessoa com
Deficiência de 2015.
Tal legislação estabelece que a educação
desse estrato da população deve ser inclusiva em todos os níveis e se dar
preferencialmente na rede regular de ensino.
Prevê ainda, quando necessário,
"serviços de apoio especializado na escola regular para atender às
peculiaridades da clientela de educação especial", além da atuação de
instituições privadas sem fins lucrativos —capacitadas para educar crianças e
jovens com deficiência física ou intelectual— que podem receber apoio técnico e
financeiro do Estado.
Diretrizes condizentes estão no decreto ora
publicado, como assegurar acesso e aprendizagem dos alunos em classes comuns
nos estabelecimentos de ensino e o Atendimento Educacional Especializado (AEE),
atividade pedagógica de caráter complementar à escolarização —preferencialmente
na rede regular, mas também em centros especializados da rede pública ou em
instituições sem fins lucrativos conveniadas às secretarias de educação.
Mesmo assim, deputados e senadores alegam de
modo insensato que o decreto retira autonomia das famílias e dificulta o
funcionamento de instituições especializadas. Como resposta, colocaram em
pauta proposições
para sustar a norma do governo.
O movimento evoca a
iniciativa de viés segregacionista tentada por Jair
Bolsonaro (PL)
em decreto de 2020, que previa a identificação de alunos que não se beneficiam
das escolas regulares inclusivas e seu direcionamento a escolas especializadas.
É consenso antigo entre pesquisadores em todo
o mundo que a inclusão no ensino regular é medida benéfica para toda a
comunidade escolar, ao promover diversidade pedagógica e autonomia das pessoas
com deficiência.
Em vez de promover retrocessos como cavalo de batalha, deputados e senadores devem, se for o caso, propor aperfeiçoamentos no texto do governo, sem jogar por terra os avanços da legislação brasileira no setor.
Um debate crucial para o País
Por O Estado de S. Paulo
O Brasil tem de decidir se as facções
criminosas ainda são apenas caso de polícia ou se são os inimigos numa guerra –
situações muito diferentes, que demandam leis e métodos específicos
A operação policial que provocou mais de cem
mortes nos Complexos da Penha e do Alemão, na zona norte do Rio, colocou o País
diante de um debate inadiável. O Brasil precisa decidir se o avanço do poder
bélico e financeiro das grandes organizações criminosas, como o Primeiro
Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), ainda pode ser enfrentado
como uma questão ordinária de segurança pública, ou se já estaríamos numa
situação de “conflito armado não internacional” – que em alguns casos pode ser
chamado também de guerra civil –, o que demandaria uma abordagem
substancialmente diferente da atual.
Esse debate precisa ser travado sem embaraços
ideológicos ou políticos, porque o resultado afetará a todos. E, sobretudo,
seja qual for a escolha democrática que se faça, roga-se que a violência do
crime organizado não sirva de pretexto para a supressão de direitos e a adoção
de medidas de caráter excepcional, ao arrepio das leis e da Constituição. Mesmo
as guerras – se decidirmos que estamos em uma – têm regras.
A confusão conceitual que envolve o combate
ao crime organizado ficou evidente. O governador do Rio, Cláudio Castro (PL),
por exemplo, afirmou que a polícia não enfrenta mais traficantes comuns, e sim
“narcoterroristas”, e as autoridades de segurança dizem que a polícia está
lutando uma “guerra irregular”. A nomenclatura não é acidental: na prática, se
o Rio está em “guerra” e se o inimigo é “terrorista”, o uso da força para
matar, e não para prender, estaria justificado – o que tiraria a questão do
terreno da segurança pública e a transformaria num problema militar.
Considerando a percepção crescente de que o
Estado perdeu o controle sobre largas porções de seu território, nas quais
vigora a lei das facções, e que estas constituem hoje verdadeiros exércitos não
raro mais bem armados que a polícia, as leis atuais e o ferramental à
disposição das autoridades para o enfrentamento desse fenômeno são claramente
insuficientes.
Eis por que uma pergunta crucial para o
futuro do País se impõe: PCC e CV são problemas de polícia ou se tornaram um
ataque à soberania nacional? A resposta definirá tanto o tipo de técnica
operacional que o Estado deve adotar, como, sobretudo, o arcabouço jurídico
apto a legitimá-la. Se se trata de segurança pública, operações policiais como
a que houve no Rio são inúteis. É preciso mudar os métodos de ação e adequar as
leis ao avanço do crime, sempre considerando que os criminosos devem ser
prioritariamente presos, e não eliminados.
Se, ao contrário, o País reconhece que está
diante de um conflito entre forças estatais e grupos organizados com estrutura
hierárquica e capacidade militar, então a questão muda de natureza. Será
preciso aprovar um novo marco legal, instrumentos operacionais específicos e
protocolos compatíveis com a legislação internacional em vigor sobre esse tipo
de combate. Hoje, o Brasil não dispõe desse arcabouço. Do ponto de vista
operacional, o emprego das Forças Armadas em operações de Garantia da Lei e da
Ordem para prover segurança pública urbana é sabidamente ineficaz há décadas.
A premência desse debate impõe mais
responsabilidade. As discussões não podem se orientar pelas paixões ideológicas
nem serem instrumentalizadas por conveniências políticas de ocasião. A disputa
eleitoral que se avizinha é terreno fértil para o populismo de viés autoritário
nessa seara. O discurso da “guerra ao crime” seduz uma sociedade esgotada pelo
medo, mas é perigoso. No limite, pode levar a excessos e ilegalidades que
agravam a violência que se pretende combater, sem que o problema se resolva.
Por outro lado, a recusa em reconhecer as reais dimensões do CV e do PCC –
tratando as facções como mera questão de segurança pública – pode retardar a
adoção de medidas que, de fato, tenham o condão de resolver o problema de uma
vez por todas. Entre o belicismo exacerbado e a tibieza, há uma via racional e
republicana que o País precisa encontrar.
O Estado deve agir com firmeza, mas também
com legitimidade. E, para isso, precisa primeiro saber com clareza o que está
enfrentando. O combate ao crime organizado exige estratégia, coordenação e
propósito – e isso deve ser pactuado por todos, como nação.
Educação deve ir além da retórica
Por O Estado de S. Paulo
Relatório parlamentar sobre o Plano Nacional
de Educação é razoável, mas ainda pode evoluir para que o País tenha um plano
de voo educacional ambicioso e realista nos próximos dez anos
“Não existe educação de direita e de
esquerda, existe a educação do nosso país”, disse o presidente da Câmara dos
Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), durante a leitura do parecer do
relator do Plano Nacional de Educação (PNE), deputado Moses Rodrigues
(União-CE). A lembrança pode ser retórica ou não, mas não deixa de ser providencial
para demarcar o que realmente importa: transformar o que hoje é uma prioridade
resumida à retórica e às ilhas de exceção no País num plano concreto e
articulado, movimento para o qual a aprovação do PNE é condição essencial. O
novo PNE é um instrumento de planejamento e gestão da educação do novo decênio,
orientador, portanto, das políticas educacionais dos próximos dez anos.
Esperava-se que fosse aprovado ainda em 2024, quando apenas 4 das 20 metas
estabelecidas no PNE anterior haviam sido parcialmente cumpridas. É hora de
acelerar, seja na tramitação, seja no cumprimento das novas metas.
Mas não é trivial o simbolismo de que, na
comissão que analisa o plano, pareçam convergir numa só direção diferentes
colorações partidárias: além de Rodrigues, registre-se o trabalho da presidente
da comissão, a deputada Tabata Amaral (SP), do PSB, e nomes do PT, do PP e do
MDB – além de mais de 3 mil emendas discutidas desde que o Ministério da
Educação (MEC) apresentou o projeto de lei, em junho do ano passado. Foi essa
união de forças que permitiu ao relatório produzir avanços significativos em
relação à proposta originalmente enviada pelo MEC, sobretudo ao estabelecer em
lei um cronograma mais rígido para que Estados e municípios aprovem seus
planos, ao exigir a necessária prestação de contas sobre os porcentuais
cumpridos para as metas definidas pelo PNE, ao facilitar o acompanhamento das
metas e ao propor incentivos por meio de um fundo de infraestrutura, abastecido
por royalties de petróleo e gás natural.
Outro avanço é a inclusão de alguns
dispositivos para o monitoramento das metas, de modo a corrigir rotas quando
necessário e em tempo hábil. Prevê-se, por exemplo, a divulgação, pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep),
de indicadores de alcance bienal, com metas nacionais e por Estado. O texto
mantém a premissa, sugerida pelo MEC, de que ao Inep caberá elaborar projeções
das metas nacionais por ente federativo, oferecendo subsídios técnicos para a
construção dos chamados planos subnacionais, de modo que cada realidade local
seja contemplada e ajustada. Um dos grandes desafios do PNE é justamente o
cumprimento das metas estabelecidas, já que o anterior passou por três gestões
federais e está sendo concluída na quarta, todas com prioridades e entraves
distintos – sem que tenhamos visto ações corretivas durante o percurso. Esse é
um grave problema que prejudica os estudantes e desacredita o plano.
Mas não faltam poréns que precisam ser
alertados. O primeiro deles, por óbvio, é a necessidade de que o próximo ciclo
escape desse histórico de resultados alardeados, mas não cumpridos. Segundo
cálculo da organização Todos Pela Educação, dos 53 indicadores monitorados,
afinal, apenas 4 conseguiram atingir ou ultrapassar suas metas, 15 ficaram
próximos (mais de 90%), 14 alcançaram entre 50% e 80%, e outros 9 nem sequer
chegaram à metade dos valores pretendidos. O segundo alerta é que o ajuste das
metas, decorrente das falhas do PNE anterior, não pode ser sinônimo de
suavização. Como este jornal já sublinhou neste espaço, a essência do próximo
ciclo deve ser combinar ambição com realismo. Um outro alerta vem de
especialistas: é preciso metas de aprendizagem mais realistas. Previstas na
proposta do MEC e mantidas no texto substitutivo, as metas de aprendizagem
parecem pouco factíveis diante das condições atuais.
Por fim, e tão importante quanto, é preciso
ver o Plano Nacional de Educação aprovado e sancionado ainda neste ano, de modo
que o Brasil comece 2026 com um plano de voo para os dez próximos anos. Um
plano ao mesmo tempo concreto, ambicioso e realista.
Puro suco de Brasil
Por O Estado de S. Paulo
Servidores do MPF criticam penduricalho de
procuradores não por justiça, mas por despeito
Servidores do Ministério Público Federal
(MPF) parecem bastante incomodados com o pagamento de penduricalhos. Em grupos
de um aplicativo de mensagens, auxiliares dos procuradores da República
passaram a criticar abertamente essas benesses. À primeira vista, poder-se-ia
dizer que, enfim, o Brasil vê o surgimento de um levante contra essa profusão
de privilégios injustificáveis. Mas esses servidores, na verdade, estão apenas
indignados por não terem recebido seu quinhão desses benefícios. Ou seja, não
foram convidados para a festa.
Conforme revelou reportagem do Estadão, os servidores compartilharam
no WhatsApp mensagens nas quais afirmaram que houve a liberação do pagamento de
um penduricalho de até R$ 1 milhão por procurador, o que é apenas um fato. As
associações de membros do Ministério Público da União (MPU), do qual o MPF faz
parte, pediram à Procuradoria-Geral da República (PGR) o pagamento retroativo
de uma licença compensatória supostamente devida quando há um alegado excesso
de serviço. Com as folgas convertidas em dinheiro, esse bônus levou alguns
procuradores a terem o direito de receber essa bolada, bem acima do teto do
funcionalismo, de R$ 46,4 mil.
A estratégia reiterada de promotores,
procuradores e também magistrados de inflarem seus contracheques por meio de
decisões administrativas chanceladas pelos conselhos superiores resulta nos
chamados supersalários. Essa elite deliberadamente dribla a via legislativa. É
o Congresso Nacional o único Poder que legitimamente pode decidir sobre a
remuneração na administração pública federal. Nos grupos de mensagens, os
servidores revoltosos disseram que esse movimento é um “sequestro
orçamentário”. A bem da verdade, eles têm razão. O problema é que também eles
querem sequestrar o Orçamento.
A Associação Nacional dos Procuradores da
República (ANPR) se insurgiu contra a queixa dos seus auxiliares e enviou à PGR
um ofício no qual alegava que as mensagens, ora vejam, maculavam a imagem da
instituição. Segundo essa espécie de sindicato, os comentários “extrapolam a
esfera da crítica legítima, configurando possível infração ao dever funcional de
lealdade, moralidade e ética”, numa ameaça aberta à liberdade de expressão.
Mesmo assim, a PGR instaurou uma sindicância
para apurar a conduta dos servidores, o que só explicitou o seu espírito
autoritário e o distanciamento de suas funções constitucionais de defender a
ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais
indisponíveis do povo brasileiro. Isso porque o que move os procuradores da
República não é o bem comum da sociedade, mas a defesa de seus interesses
pessoais. Por sua vez, o que move os servidores é sua pauta corporativista e
seu inconformismo com a diferença salarial entre a categoria e os procuradores
da República.
Como se vê, são todas motivações nada republicanas. É o exemplo do roto falando do rasgado. Nessa briga fratricida por dinheiro público, ninguém tem razão.
Trégua com a China consolida correção
tarifária dos EUA
Por Valor Econômico
Trump empreende um rebalanceamento geral da
carga tarifária, no qual o Brasil está incluído
O déficit comercial com a China foi o
principal motivo (ou pretexto) para a guerra tarifária dos Estados Unidos
contra o mundo. Mas a agressividade do presidente Donald Trump, por maior que
fosse a retórica, sempre parou às portas da Cidade Proibida, onde fica a sede
do governo chinês. Trump reuniu-se mais uma vez com o presidente Xi Jinping, e
concordaram com uma trégua, que já se afigura permanente, de um ano, abdicando
de medidas de retaliação recíprocas, uma confissão informal dos Estados Unidos
de que não têm como impedir os danos que retaliações chinesas possam provocar
na economia americana, ao contrário do que as bravatas de Trump pareciam
indicar.
O mais recente episódio da disputa comercial
foi a iniciativa chinesa de suspender as exportações de terras raras e minerais
estratégicos, emulando o poder de abrangência dos EUA. Para evitar que os
insumos exportados fossem utilizados em armas de todos os tipos - uma cópia do
argumento de defesa da segurança nacional usado por Trump para iniciar a guerra
comercial -, Pequim avisou aos compradores dessas matérias primas estratégicas
que teriam de pedir autorização para qualquer tipo de revenda, que deveria
seguir regras estritas, cujo rompimento implicaria sanções drásticas.
O governo chinês fez mais sem avisar, em um
cálculo cujo objetivo foi o de arranhar o prestígio político de Trump junto a
suas bases republicanas: não comprou um grama da soja na nova safra americana,
depois de aplicar tarifa de 20% sobre esse e outros produtos vindos dos EUA,
como algodão, sorgo, frango, carne suína e lácteos. Além disso, em resposta à
taxa portuária imposta por Trump a navios construídos na China que chegassem
aos portos americanos, de US$ 50 por tonelada métrica, aplicaram aos navios
americanos taxa de US$ 56, em média.
Trump ameaçou colocar tarifas adicionais de
100% sobre mercadorias chinesas, que entrariam em vigor no sábado. O governo
chinês colocou como prazo inicial da contenção da venda de terras raras o
início de dezembro. Como tinham negociações marcadas quando tomaram essas
medidas, os prazos foram desenhados para concessões mútuas. Trump recuou
bastante e cedeu a importantes reivindicações chinesas, em um reconhecimento
realista de que um recrudescimento chinês na guerra comercial colocaria os EUA
em situação constrangedora, por falta de alternativas de fornecimento.
O governo americano, sem esmaecer na retórica
agressiva, está agora procurando modular a tarifação inicial em função de seus
efeitos sobre os preços pagos pelos consumidores americanos, que estão em alta.
O périplo de Trump pela Ásia alinhavou acordos com Camboja, Indonésia, Vietnã,
Camboja e Malásia, grandes exportadores de têxteis e produtos eletrônicos para
o mercado americano. Essas mercadorias, até agosto, devido ao aumento de
tarifas, subiram respectivamente 14% e 8%, e os produtos intermediários, que
compõem a maior parte das importações do país, subiram entre esses dois
percentuais. Há indicações de que os EUA estão em negociações com a Índia que
poderiam reduzir as tarifas pagas pelo país de 50% atuais (as mais punitivas,
como as do Brasil) para algo ao redor dos 15%. A China até agora não abriu mão
de nada e, ainda que afetada pelas proibições de acesso ao maior mercado
consumidor do mundo, não foi gravemente afetada. A queda de mais de 30% das
vendas para os EUA foi contrabalançada pelo aumento das exportações para o
Sudeste Asiático, conseguindo até agora aparar uma interrupção abrupta de sua
máquina exportadora, que seria perturbadora em um momento em que o consumo
interno dá sinais de fraqueza e que suas metas de crescimento estão ameaçadas
pela queda do investimento e pela longa e profunda crise do mercado
imobiliário.
A principal meta da China, ratificada na
sessão plenária do Comitê Central do Partido Comunista, é perseguir a dianteira
tecnológica em todas as frentes, que pode ser detida diante do cerco levantado
pelos EUA à exportação para o país de equipamentos e tecnologia para confecção
de chips de última geração. A trégua firmada com Trump libera as exportações
americanas de boa parte desses itens.
Trump empreende então um rebalanceamento
geral da carga tarifária, no qual o Brasil está incluído. Exportador de
produtos importantes para o consumidor americano, como carnes e café, o Brasil
dificilmente será o único país a pagar tarifas de 50%, quando a China, que tem
superávit gigantesco de US$ 295 bilhões em 2024 com os EUA, viu cortada sua taxação
de 57% para 47%. Por isso, o governo americano aceitou abrir negociações com
Brasília, antes bloqueadas por determinação expressa de Trump.
Os temores de que um acordo com a China fosse prejudicar as vendas brasileiras que concorrem com os EUA, em especial a soja, à primeira vista não se materializaram. Pequim concordou em adquirir 12 milhões de toneladas este ano e mais 25 milhões de toneladas nos próximos três anos, quantidades que não roubam espaço das exportações brasileiras aos chineses nos últimos anos.
Saúde do homem: a responsabilidade é de todos
Por Correio Braziliense
O Instituto Nacional de Câncer (INCa) projeta
para o triênio 2023-2025 cerca de 71 mil novos casos de câncer de próstata no
país por ano
Passado o Outubro Rosa, que se encerra hoje,
entramos no Novembro Azul, que tornou-se, ao longo das últimas décadas, a
principal campanha pública e privada de conscientização sobre o câncer de
próstata. O objetivo é simples e urgente: reduzir mortes por meio da
informação, do diagnóstico precoce e do aprimoramento do acesso ao tratamento.
Por trás dos laços azuis existe uma realidade complexa — epidemiológica, social
e política — que pede uma análise crítica.
No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer
(INCa) estimou, recentemente, que o câncer de próstata permanece entre os
tumores mais incidentes: na projeção para o triênio 2023-2025 são previstos
cerca de 71 mil novos casos por ano, fazendo da doença uma das principais
preocupações de saúde pública do país. Globalmente, levantamentos também
apontam para um aumento no número absoluto de diagnósticos nas próximas
décadas, motivado pelo envelhecimento populacional — com uma correspondente
elevação nas mortes se medidas não forem adotadas. 
O Sistema Único de Saúde (SUS) inclui alguns
fluxos para investigação (como exames de PSA e toque retal), além da
confirmação por biópsia. O Ministério da Saúde e o INCa orientam condutas
diagnósticas e terapêuticas, contemplando cirurgia, radioterapia,
hormonioterapia, quimioterapia em casos avançados e cuidados paliativos. No
entanto, na prática, há uma variação regional tanto no tempo de espera para
biópsia, quanto no acesso a ressonância magnética e fila para tratamento
especializado, refletindo as desigualdades estruturais. 
Entre os acertos, destacam-se a existência de
diretrizes nacionais, os programas de atenção oncológica e o caráter universal
do SUS, que garante tratamento gratuito a pacientes oncológicos. Entre as
falhas persistentes estão a subdetecção em regiões remotas, a demora no
diagnóstico, a capacidade limitada para cirurgias e radioterapia em alguns
estados e a ausência de programas dedicados ao paciente que reduzam o abandono
terapêutico. A fragmentação entre atenção primária (onde o rastreamento deveria
começar) e serviços especializados também dificulta a jornada do paciente.
No Congresso Nacional, há movimentação
legislativa para ampliar visibilidade e ações sobre o tema: propostas recentes
alteram dispositivos do Programa Nacional de Controle do Câncer de Próstata
para disciplinar a divulgação e ampliar campanhas de prevenção e projetos na
Câmara tratam de proteção laboral e de incentivos à detecção precoce, como, 
por exemplo, o PL 687/2024, que propõe medidas de divulgação e assistência.
Essas iniciativas mostram avanço institucional, mas demandam operacionalização
e orçamento. 
Políticas públicas precisam, mais do que
nunca, priorizar o fortalecimento da atenção primária para identificação e
encaminhamento. É necessária a ampliação e a regionalização de equipes de
urologia e aparelhos de imagem, assim como a adoção de protocolos de triagem
por risco, para evitar tanto subdiagnóstico quanto sobrediagnóstico e tratamentos
desnecessários. 
Programas de educação voltados a homens, para enfrentar o estigma e masculinidades que inibem a procura por cuidados também são bem-vindos. Sem isso, aumentos projetados na carga global da doença poderão se traduzir em mais mortes evitáveis entre os brasileiros.
PEC é avanço no combate ao crime organizado
Por O Povo (CE)
É hora de aprovar a PEC
da Segurança Pública e de firmar o Susp como um eficaz instrumento para o
combate ao crime organizado
Após tensões iniciais, provocadas pelo
confronto mais letal da história do Rio de Janeiro, o ministro da Justiça e
Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, e o governador Cláudio Castro (PL)
chegaram a um acordo para criar um Escritório de Combate ao Crime Organizado,
em caráter emergencial.
O objetivo será acompanhar exclusivamente a
situação do Rio, depois da megaoperação desencadeada nos complexos do Alemão e
da Penha para conter o avanço territorial do Comando Vermelho (CV) e cumprir
mandados de prisão contra os líderes da facção.
A criação do escritório, que o ministro
Lewandowski classificou como "fórum de diálogo", é um ponto positivo,
em meio à tragédia desencadeada pela ação policial, que deixou mais de 100
mortos, entre eles quatro policiais. A iniciativa mostra a disposição dos
governos estadual e federal de trabalharem conjuntamente para enfrentar o crime
organizado, que hoje se espalha por praticamente todo o País.
O propósito será organizar ações integradas
entre as forças federais e estaduais, com capacidade para agir prontamente,
reduzindo os entraves burocráticos. O escritório será comandado pelo secretário
Nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo, e pelo seu homólogo estadual,
Victor Santos.
Ainda que Cláudio Castro — e outros
governadores de oposição — discordem da PEC da Segurança Pública, o escritório
pode ser apontado como o embrião de ações conjuntas da União com os entes
federativos constantes na PEC. A proposta na emenda constitucional, que tramita
no Congresso, cria o Sistema Único de Saúde (Susp), que visa integrar as forças
de segurança — polícias militares, civis e penais, além do sistema prisional —
sob coordenação da União.
Este jornal vem defendendo que esse debate
precisa ser feito sem preconceitos e que as autoridades participem dele
pensando nos mais altos interesses do País — e não em questiúnculas políticas
ou eleitorais. O assunto é sério demais para ficar subordinado a injunções
partidárias, pois está em jogo a segurança de milhões de brasileiros.
Se existem divergências quanto à PEC, que
elas sejam discutidas para se chegar a um denominador comum, que seja aceitável
pelos envolvidos no debate, e que resulte em procedimentos eficazes. A
importância da emenda procede do fato que, inscrito na Constituição, o Susp se
tornará um organismo permanente, que terá fundos próprios para a sua ação,
independentemente de governos. Assim, suas ações não terão soluções de
continuidade, como ocorre hoje, a cada eleição.
Portanto, após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter sancionado o projeto que endurece as penas para o crime organizado, é hora de aprovar a PEC e de firmar o Susp, como um eficaz instrumento para o combate ao crime organizado.

 
 
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