Correio Braziliense
O tema voltará a ocupar as atenções de
partidos e candidaturas, mas, infelizmente, em um debate que tende a ser
marcado pela conhecida, de tão antiga, dicotomia: de um lado, a defesa do
aumento da repressão e das punições; de outro, a ideia de que não há saída sem
o enfrentamento das causas sociais
Todas as pesquisas têm revelado que segurança pública é o tema que mais aflige a sociedade brasileira. O crescimento vertiginoso do crime organizado não chega a ser uma novidade, mas sua infiltração de maneira abrangente em diversas atividades econômicas formais era algo ainda pouco conhecido da maioria da população e que veio à tona com a Operação Carbono Oculto, conduzida com extrema competência pela Receita Federal, em conjunto com Polícia Federal, GAECO do Ministério Público de São Paulo, Ministério Público Federal, Polícias Civil e Militar, Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, Agência Nacional do Petróleo e PGE/SP.
Desde a deflagração dessa operação, o governo
federal, como esperado, vem repercutindo seus resultados e utilizando como
instrumento para fortalecer sua estratégia de mostrar que atua firmemente para
enfrentar os ricos em defesa das camadas mais pobres. Em entrevista à Rede
Amazônica, em 9 de setembro, Lula falou o seguinte: "O crime organizado,
hoje, está em tudo quanto é lugar. Está no futebol, na justiça, na política,
está em todas as instituições. Fizemos uma operação, que foi a maior da
história do Brasil feita contra o narcotráfico, e nós fomos chegar aonde? Na
Faria Lima, nós fomos chegar nas fintechs, nessas empresas de jogos".
Do outro lado do espectro político, vimos
essa semana uma megaoperação das Polícias Civil e Militar do estado do Rio de
Janeiro contra o Comando Vermelho nos Complexos da Penha e do Alemão com 121
mortes, entre elas a de quatro policiais e 113 presos, sendo 33 de outros
estados. Diferentemente do que costuma ocorrer em ações dessa natureza, não se
tem notícia de moradores inocentes vítimas do confronto por balas perdidas em
razão da tática operacional adotada que encurralou os criminosos na área de
mata. Considerada pelo próprio governo como a maior operação policial da
história do estado, recebeu o apoio e a solidariedade dos governadores de São
Paulo, Goiás, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Pará e Distrito Federal.
Ressalte-se que levantamento realizado pela empresa especializada Ativaweb nas
redes sociais aponta que entre os dias 28 e 30 houve mais de 4 milhões de
citações, sendo que 63% delas apoiando a ação.
Depois de troca de acusações pela imprensa, o
governador e o ministro da Justiça se reuniram, na quarta-feira, quando
anunciaram a criação do Escritório de Combate ao Crime Organizado. Considero a
iniciativa uma boa notícia porque, segundo especialistas, não há qualquer
possibilidade de se enfrentar o crime organizado sem uma ação articulada entre
os entes federativos.
A triste realidade é que, desde a
redemocratização — e já se vão 40 anos — nenhum governo central adotou a
postura de chamar para si a liderança em torno do tema. Preferiram ficar na
zona de conforto em torno das atribuições formais de cada um dos entes
federativos previstas na Constituição. A única medida diferente foi a Lei nº
13.675, de 11 de junho de 2018, instituindo o Sistema Único de Segurança
Pública (Susp) e a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social
(PNSPDS) com a finalidade de preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, por meio de atuação conjunta, coordenada, sistêmica e
integrada dos órgãos de segurança pública e defesa social da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em articulação com a sociedade.
Porém, desde então, quase nada foi feito para
concretizar tal integração. Mesmo a chamada PEC da Segurança Pública,
apresentada pelo governo federal, propõe, basicamente, incluir o SUSP na
Constituição. É um avanço tímido.
A um ano das próximas eleições, o tema
voltará a ocupar as atenções de partidos e candidaturas, mas, infelizmente, em
um debate que tende a ser marcado pela conhecida, de tão antiga, dicotomia: de
um lado, a defesa do aumento da repressão e das punições; de outro, a ideia de
que não há saída sem o enfrentamento das causas sociais. Enquanto isso, o crime
segue sua trajetória de transnacionalização. Aumenta diariamente a porção do
território nacional ocupada pelas facções, sejam de traficantes ou milicianos.
Nem mesmo os presídios escapam, incluindo os de segurança máxima.
Só consigo enxergar uma saída: o governo
federal chamar para si a liderança política desse processo, para além das
medidas legislativas e administrativas, buscando uma articulação
suprapartidária com governadores. Resta saber se, num cenário de polarização
pré-eleitoral, os envolvidos estariam dispostos a dar esse passo fundamental a
favor do país e de sua população. A conferir.

 
 
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