sexta-feira, 31 de outubro de 2025

China e EUA concordam em evitar guerra comercial aberta e imediata; e só, por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Xi Jinping e Donald Trump apenas recolocam relações sino-americanas na situação de setembro

EUA aliviam sanções contra empresas; China alivia em terras raras, de venda ainda restrita

China e Estados Unidos concordaram em evitar guerra econômica aberta; aceitaram fingir que querem ou podem chegar a um acordo. É o que se depreende do resultado mínimo do encontro entre Xi Jinping e Donald Trump. A situação voltou apenas para onde estava em meados de setembro. A China prometeu aliviar em terras raras, comprar uma soja; os americanos prometeram sancionar menos empresas chinesas e deram uma gorjeta em tarifas.

O assunto não é blablá de política internacional. A depender do tamanho do risco de conflito, grande, taxas de juros e preços de moedas variam muito, como sentimos até aqui neste canto do mundo. Alteram-se decisões de investimento, estratégias de comércio, portas de comércio se abrem e se fecham, no curto e médio prazo.

O acordo possível é evitar a guerra. China e Estados Unidos disputam a supremacia militar, a liderança em inteligência artificial, em computação quântica etc.; agora, disputam até certos recursos naturais. Os EUA limitam faz anos e limitarão a venda de tecnologia avançada para a China, além de sancionar empresas chinesas avançadas ou com poder de mercado grande no mundo.

Trump chegou a dizer, na véspera da reunião com Xi, que discutiria a liberação da venda do chip mais avançado da Nvidia para os chineses. Causou grande rebuliço e ranger de dentes bipartidário nos EUA. Limitar acesso chinês a tecnologia de ponta agora é política de Estado e do establishment americano. Mas os chineses continuam a dizer que querem mais acesso e menos sanções contra suas empresas.

Os americanos querem que a China mude sua política econômica —ou geoeconômica. Isto é, pouco consumo, muito subsídio, muito investimento e muito excedente de produto industrial para exportação, saldo comercial enorme, investimento grande no exterior, formação de novas alianças e dependências no resto do mundo. Não vai acontecer mudança relevante a não ser em caso de convulsão na cúpula chinesa.

Os chineses controlam 90% ou mais do mercado mundial de terras raras, além de fazer dumping, manipular preços, para derrubar concorrentes possíveis no negócio. Os EUA e países ocidentais ricos correm para encontrar fornecedores de terras raras e desenvolver fábricas de processamento e de ímãs.

Os EUA acabam de fazer acordos ou entendimentos mais ou menos firmes com Austrália, Japão, Malásia, Tailândia, Camboja, Vietnã e Indonésia, por exemplo, a fim de ter acesso ao minério, coordenar investimentos em fábricas e criar um mercado paralelo ao chinês. Seria ou será um mercado com grandes subsídios e controles de preços estatais, americanos inclusive. Mesmo que dê certo ou que também sejam desenvolvidas tecnologias alternativas, vai levar anos (cinco, mais) para que se comece a se morder a China. O valor do negócio, em si, é pequeno (US$ 10 bilhões em vendas), mas a escassez provocada ameaça estrangular empresas industriais da ponta da tecnologia.

Também por isso a China terá o poder de peitar os EUA por um tempo (os chineses também são fornecedores exclusivos de muito insumo, farmacêutico inclusive). Os EUA vão aceitar esse jogo? Como vão ameaçar a China por outros meios? Por ora, há "desacoplamento" (menos comércio entre os dois países, empresas americanas saindo da China) e guerra morna —nas relações econômicas. A perspectiva é de desacordo duradouro.

 

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