CPI do Crime Organizado tem oportunidade
Por O Globo
Se condução for ‘técnica’ e não partidária, comissão poderá contribuir para enfrentar criminosos
É comum que as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) se tornem palco de embates políticos, de olho nos holofotes e na opinião pública, em vez de nas respostas e soluções às questões que despertaram sua convocação. Foi por isso encorajadora a atitude do presidente da recém-instalada CPI do Crime Organizado, senador Fabiano Contarato (PT-ES). Em entrevista ao GLOBO, ele se disse comprometido com uma condução “técnica” dos trabalhos, para evitar que a CPI sirva de palanque voltado às eleições.
O plano de trabalho da CPI, elaborado pelo
relator Alessandro
Vieira (MDB-SE), é objetivo e aborda questões essenciais no combate às
organizações criminosas que amedrontam o Brasil. Entre elas, a ocupação
territorial por tráfico e milícias, a lavagem de dinheiro, a corrupção da
máquina pública na esteira da atuação da criminalidade, fontes de financiamento
e instrumentos para o Estado enfrentá-la de forma eficaz. Contarato foi uma
escolha adequada para presidir a CPI. Ele tem experiência de delegado da
Polícia Civil capixaba e de professor de Direito Penal. É visto como nome
independente no PT, reconhece a dificuldade da esquerda para tratar de
segurança pública e será secundado na vice-presidência por Hamilton
Mourão (Republicanos-RS), general da reserva. Não são neófitos em
segurança pública.
É inevitável que a CPI suscite embates entre
governo e oposição. Há divergências na própria mesa que conduzirá os trabalhos.
Mourão e Vieira são favoráveis a classificar as facções criminosas como grupos
terroristas, enquanto Contarato é contra, embora defenda o endurecimento de
penas e outros ajustes na legislação. Diferenças de opinião fazem parte da
democracia. O importante é não deixar que elas se transformem em pretexto para alimentar
a polarização, movida pela lógica eleitoral.
O avanço do crime organizado é
responsabilidade de vários governos, cuja omissão permitiu que organizações
criminosas se espalhassem pelo país enquanto se conectavam com fornecedores de
drogas no exterior e abriam rotas para distribuí-las noutros países. O negócio
cresceu, se fortaleceu e, para enfrentá-lo, é preciso uma legislação adequada e
um Estado bem articulado em todos os níveis federativos. Tramitam no
Legislativo várias propostas com o objetivo de ampliar o poder estatal diante
do crime. Se bem conduzida, a CPI poderá oferecer contribuições relevantes para
aperfeiçoá-las.
“Não há nada mais poderoso do que uma ideia
quando seu tempo chega”, disse Contarato na entrevista. Várias iniciativas
recentes apontam caminhos para coibir as facções criminosas. Há lições a
extrair tanto da Operação Carbono Oculto, contra o PCC em São Paulo, quanto da
incursão da polícia fluminense contra o Comando Vermelho nos complexos da Penha
e do Alemão, no Rio. Será essencial um plano robusto e unificado, capaz de
asfixiar financeiramente os criminosos, mas também de retomar e reocupar o
território por eles controlado, levando serviços públicos permanentes e
retirando a população do jugo do crime.
“Passou da hora de o campo progressista
assumir essa pauta, porque ela é apartidária”, disse Contarato. “Não pode ser
exclusiva da direita ou de quem tem um perfil mais conservador.” Ele tem razão.
A CPI será um bom teste para o Congresso. Os resultados concretos dirão se os
representantes do povo estão à altura de enfrentar os desafios criados pelo
crime organizado.
Tornado que arrasou cidade no Paraná
evidencia risco de mudanças climáticas
Por O Globo
Eventos extremos serão mais intensos e
frequentes. É preciso investir em adaptação para resistir
O tornado que arrasou o município paranaense
de Rio Bonito do Iguaçu, na última sexta-feira, é um sinal eloquente da
emergência trazida pelas mudanças
climáticas. Os ventos atingiram entre 300km/h e 330km/h. Na escala
Fujita, que vai até 5, o tornado foi classificado na categoria 3. Poucas
construções permaneceram de pé na cidade de pouco mais de 14 mil habitantes.
Árvores e postes foram derrubados, veículos arrastados, prédios destelhados.
Até centros de ajuda à população ficaram destruídos. Ao menos sete moradores
morreram e mais de 700 ficaram feridos.
De acordo com meteorologistas, as condições
de calor e umidade, além de mudanças na direção e intensidade dos ventos,
favoreceram a formação do tornado. Foram registrados outros tornados também nos
municípios de Guarapuava e Turvo, onde os ventos ficaram abaixo de 300km/h.
Embora tenham chamado a atenção pela intensidade, pelas mortes e pelo nível de
destruição, esses tornados que varreram cidades do Paraná não podem ser
considerados eventos isolados.
A Região Sul registrou 411 tornados entre
1975 e 2018, ou 9,6 por ano, de acordo com estudo de pesquisadores da
Universidade Estadual de Ponta Grossa. Somente o Paraná contou 89 no período, a
maior parte com ventos de até 180km/h, menos letais que o de sexta-feira. Mas
eventos extremos dessa natureza têm ficado — e, pelas previsões dos
meteorologistas, ficarão — cada vez mais intensos e mais frequentes.
O tornado tem uma característica que o torna
diferente das demais tempestades. Não há como prevê-lo ou saber sua intensidade
de antemão, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres
Naturais (Cemaden). Ao contrário do que ocorre com uma tempestade violenta, não
há como os municípios acionarem planos de contingência para retirar moradores
de áreas alagáveis ou sujeitas a deslizamentos de terra, prestar socorro
durante inundações, traçar rotas de fuga e providenciar abrigo para as vítimas.
A tragédia paranaense, às vésperas da COP30,
que começou nesta segunda-feira em Belém, chama a atenção para o lado mais
agudo e doloroso do aquecimento global. “A mudança climática saiu dos
relatórios e entrou para a vida real”, diz Márcio Astrini, secretário executivo
do Observatório do Clima. “O que se discute hoje é com que nível de mudança
climática queremos lidar nas próximas décadas, se estabilizaremos o clima num
nível em que poderemos nos adaptar ou conviveremos com algo muito pior.”
Ninguém deve se iludir. Continua a ser indispensável reduzir os níveis de emissões de gases de efeito estufa. Mas isso não bastará. Será preciso investir em adaptação para uma realidade de eventos climáticos extremos, como tornados, tempestades arrasadoras, incêndios florestais devastadores, secas severas, enchentes diluvianas ou avalanches inclementes. No panorama atual, não há qualquer perspectiva de trégua.
COP30 busca relevância em contexto
desfavorável
Por Folha de S. Paulo
Após dezenas de conferências da ONU, avanço
na contenção das emissões e do aquecimento é insatisfatório
Apesar das dificuldades, sem o
multilateralismo das COPs, o mundo estaria ainda mais distante de atingir a
meta do Acordo de Paris
A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre
Mudanças Climáticas (COP30),
aberta nesta segunda (10) em Belém,
é mais uma oportunidade diplomática para conter o efeito estufa. Mas, levando
em conta as estatísticas e as últimas edições da reunião, nota-se que a
mobilização global está aquém do desafio e que acordos sobre pontos
controversos parecem distantes.
O Acordo de Paris (2015) instituiu a meta de
manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2ºC até o final deste
século —preferencialmente limitá-lo a 1,5°C— e reduzir emissões de carbono
provenientes da queima de combustíveis fósseis (petróleo,
carvão e gás natural).
As emissões, porém, só crescem. Segundo
relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma)
divulgado na terça (4), elas subiram 2,3% em 2024, chegando ao
recorde de 57,7 gigatoneladas de CO² .
Para conter o aquecimento em 2°C no fim do
século, as emissões em 2030 teriam de cair 25% em relação ao registrado em
2019, e 40% para atingir a marca de 1,5°C.
O Acordo de Paris estabeleceu que os 196
signatários devem apresentar contribuições nacionalmente determinadas (NDCs),
planos para reduzir emissões renovados a cada cinco anos.
Até setembro, prazo estabelecido pela ONU, só 64
países haviam entregado suas NDCs. No primeiro
dia da COP30 o número chegou a 110 —e faltam grandes poluidores
como Índia, Irã e Arábia
Saudita, sem contar a retirada dos EUA do acordo por Donald Trump em
janeiro.
A UNFCCC (braço climático da ONU) analisou 86
dessas NDCs e, segundo a entidade, elas reduziriam as emissões verificadas em
2019 em só 12% até 2035. Assim, estima-se que o mundo chegará a 2100 com
aquecimento de 2,8°C.
A pauta obrigatória da COP30 é a definição de
indicadores para medir o progresso das ações de adaptação climática, importante
para manter o pragmatismo.
Os principais entraves são a lucratividade do
setor de combustíveis fósseis e o financiamento para adaptação a mudanças
climáticas em países em desenvolvimento por nações ricas, que fica debilitado
num contexto de conflitos globais e ascensão de protecionismos econômicos.
As três COPs anteriores foram sediadas por
nações petrolíferas: Azerbaijão (2024), Emirados
Árabes Unidos (2023) e Egito (2022).
Na do ano passado, foi
estabelecido financiamento anual US$ 300 bilhões, pífio diante do
US$ 1,3 trilhão ao ano almejado.
Apesar das dificuldades, o multilateralismo é
a melhor forma de conter o aquecimento global. Sem as conferências da ONU, o
mundo estaria ainda mais distante da meta do Acordo de Paris —sem contar seu
papel indutor de articulação de setores privados e da sociedade civil.
Espera-se que a edição na maior floresta
tropical do planeta consiga superar obstáculos e o contexto adverso para ao
menos limitar a escalada da temperatura global e seus efeitos deletérios.
Cautela na Petrobras
Por Folha de S. Paulo
Estatal indica corretamente que revisará
plano de investimentos à luz da redução dos preços do petróleo
Resultados do 3º tri mostram queda da
receita, embora a dívida esteja em nível confortável; deve-se isolar gestão de
pressão política
Os resultados da Petrobras no
terceiro trimestre deste 2025 mostram um quadro de robustez e, até o momento no
mandato atual de Luiz Inácio Lula da
Silva (PT),
de manutenção de disciplina na condução dos investimentos.
A produção diária de petróleo e
gás atingiu o maior patamar histórico, de 3,14 milhões de barris de óleo equivalente
(considerando também o gás natural) por dia —alta de 3,19% ante o período
correspondente de 2024.
O lucro
líquido do trimestre foi de R$ 32,7 bilhões, crescimento modesto de
0,5% ante o ano anterior, enquanto a receita recuou 1,3% para R$ 127,9 bilhões,
impactada pela queda dos preços.
Já os investimentos saltaram 23,7%, para US$
5,5 bilhões (R$ 30 bilhões), concentrados em plataformas e equipamentos
relacionados à exploração e produção, atingindo 76% da meta anual e sinalizando
superação do orçamento de US$ 19 bilhões. A dívida bruta fechou em US$ 71
bilhões (R$ 390 bilhões), próxima do teto de US$ 75 bilhões.
Na comparação com o resultado operacional, o
endividamento permanece em nível confortável e ainda muito distante do patamar
atingido durante a ruína sob Dilma Rousseff (PT).
Mesmo assim, desde 2022 praticamente dobrou nessa base de comparação, o que
acende um sinal de alerta.
A grande dúvida diz respeito à permanência
dos investimentos em bases prudentes. Enquanto analistas e a própria direção da
estatal apontam a necessidade de cautela, o governo Lula pressiona por expansão
em áreas como refino e fertilizantes —de retorno mais demorado e risco elevado.
O plano 2026-2030, a ser divulgado neste
novembro, é o principal ponto de atenção por sinalizar se a gigante petroleira
priorizará a sustentabilidade ou cederá a imperativos políticos.
O plano 2025-2029, de US$ 111 bilhões (alta
de 4,7% sobre o anterior), destinou US$ 98 bilhões a projetos em curso. Tal
seletividade preservou dividendos, totalizando R$ 32,4 bilhões no ano.
Mas os riscos à frente são palpáveis,
especialmente com o preço do petróleo em queda. O do tipo Brent fechou outubro
a US$ 65 por barril, cerca de 13% menos que no início do ano, com certo alívio
no cenário geopolítico e produção global em crescimento.
A Petrobras indica que haverá revisões em todos os pressupostos do novo plano, para preservar a alavancagem baixa. É o correto. Os bons resultados da empresa desde seu saneamento a partir de 2016 são a prova, como se ainda fosse necessária, de que ela não pode voltar a atuar a reboque de planos do Executivo.
Mais maturidade contra o crime
Por O Estado de S. Paulo
Reação petista ao nome de Derrite como
relator do PL Antifacção, sem nem sequer avaliar seu relatório, de resto
razoável, revela que a conveniência eleitoral está acima do interesse público
O Projeto de Lei Antifacção, enviado pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Congresso e relatado pelo deputado
Guilherme Derrite (PL-SP), suscitou reações que, a persistirem, empobrecerão o
debate sobre um dos temas mais prementes da agenda nacional: o combate ao crime
organizado. Essa discussão tem de ser conduzida com maturidade e espírito
público, acima de divergências ideológicas, picuinhas partidárias e, sobretudo,
conveniências eleitorais de momento. Ao fim e ao cabo, está-se tratando da vida
de milhões de brasileiros que dormem e acordam sob o jugo das facções
criminosas.
O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh
Farias (RJ), considerou a indicação de Derrite um “desrespeito” do presidente
da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), a Lula. Por quê? Por que Derrite é
filiado ao principal partido de oposição e ocupa o cargo de secretário de
Segurança de São Paulo, sob a gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos), um
dos nomes aventados para a sucessão presidencial em 2026? Isso é uma
mesquinharia que só rebaixa a política. Onde o líder petista vê afronta há um
sinal de normalidade institucional, coisa de democracia madura.
Como afirmou Motta numa rede social, a
indicação de Derrite “é a prova de que não importa de onde a ideia vem”, ou
seja, “se ela é boa para o País, a gente leva adiante”. À luz da polarização
política que eletriza a sociedade há anos, a lógica republicana que deve
prevalecer nos debates legislativos parece ter sido esquecida: o interesse
público está acima dos protagonismos políticos. Ao abrir espaço para a
convergência de diferentes visões, a Câmara contribui para a aprovação de um
texto que possa sobreviver às circunstâncias.
Enfrentar o enorme poderio das facções
criminosas é um desafio que extrapola as fronteiras ideológicas. A infiltração
dessas organizações no Estado e na economia formal é uma ameaça à própria
integridade política do País. Vencer essa hidra não é tarefa de um governo ou
de uma legislatura – é um projeto nacional. Cuidar da segurança pública, nesse
sentido, é a política em sua melhor acepção: a concertação entre propostas e
interesses distintos que buscam, cada qual a seu modo, devolver aos cidadãos a
sensação de segurança mínima para que possam cuidar com tranquilidade de sua
própria vida.
O relatório de Derrite não resvala para o
populismo ao deixar de classificar juridicamente as facções e milícias como
grupos terroristas. Esse tratamento legal, além de equivocado, abriria um
perigoso precedente em razão da natureza extraterritorial do terrorismo, o que
poderia, em tese, permitir a atuação de forças estrangeiras em território
nacional sob o pretexto de combater o “terror”. Derrite foi prudente ao
rejeitar essa confusão conceitual. Em seu parecer, afirmou não se tratar de
“classificar as organizações criminosas, paramilitares ou milícias privadas
como organizações terroristas em sentido estrito”, mas de reconhecer que certos
atos cometidos por essas estruturas têm “efeitos sociais e políticos
equivalentes aos atos de terrorismo”, justificando penas mais severas – exatamente
como quer o presidente da República.
Mas o texto não é isento de falhas. Como
alertou ao Estadão o
promotor Lincoln Gakiya, referência nacional no enfrentamento ao Primeiro
Comando da Capital (PCC), há problemas no substitutivo de Derrite que podem
comprometer a eficácia do combate às facções. Em especial, Gakiya chamou a
atenção para o art. 11 do substitutivo, que altera a Lei Antiterrorismo de 2016
e, de forma confusa, distribui competências de investigação e julgamento entre
diferentes instituições. A Câmara deve ouvir especialistas como Gakiya e
aperfeiçoar um marco legal que precisa fortalecer a ação do Estado contra o
crime organizado.
Dito isso, o projeto também não pode ser
recebido como panaceia. Por si sós, a criação de tipos penais e a majoração de
penas nunca tiveram o condão de acabar com a criminalidade. O bom combate ao
crime é fruto da coordenação de ações dos Três Poderes. E passa,
necessariamente, por medidas tão básicas quanto eficazes, como, por exemplo, o
expurgo de policiais, promotores e juízes que se deixam corromper por aqueles
que deveriam enfrentar a serviço da lei.
O efeito Trump na balança
Por O Estado de S. Paulo
Três meses de tarifaço custaram US$ 1,5 bi em
vendas para os Estados Unidos. O Brasil deve deixar de lado os rapapés e
estabelecer de fato negociação para reequilibrar o mercado
Três meses seguidos de queda nas exportações
para os Estados Unidos são o saldo imediato do tarifaço do presidente
americano, Donald Trump, contra o Brasil, com destaque para a redução de quase
38% em outubro, ante o mesmo mês de 2024. Se para a balança comercial como um
todo isso não representou um desastre – o superávit de US$ 7 bilhões no mês foi
bem superior às previsões, entre US$ 4,3 bilhões e US$ 6,3 bilhões, segundo
as Projeções Broadcast –,
isso se deve ao incremento das vendas brasileiras para a China, que no mesmo
mês subiram 33,4%.
Nesse meio tempo, Trump e o presidente da
China, Xi Jinping, selaram um acordo que suspendeu por um ano as sobretaxas
recíprocas, o que tende a fazer a China levantar, integral ou parcialmente, o
boicote imposto a produtos norte-americanos, movimento que levou os chineses a
aumentar sobremaneira as importações brasileiras, como foi o caso da soja. Já o
Brasil corre o risco de perder o bonde da negociação, que vai ditar os
parâmetros de exportações e importações de 2026 em diante.
A importância do encontro do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva com Trump em Kuala Lumpur, na Malásia, em 26 de outubro,
será aferida de fato conforme surgirem medidas concretas para reduzir o
tarifaço de 50% imposto ao Brasil. “Química”, fotos e declarações conciliadoras
criam um ambiente favorável, mas não bastam, e os resultados estão aí para
comprovar: de janeiro a outubro, as exportações para os Estados Unidos, nosso
segundo maior parceiro comercial, caíram 4,5%, o que equivale a quase US$ 1,5
bilhão a menos. E isso porque o impacto da sobretaxa está restrito a três dos
dez meses do período.
Em entrevista a correspondentes estrangeiros
em Belém, onde participava da COP-30, Lula disse ter sugerido a Trump iniciar a
discussão com taxas zeradas para negociar no limite estabelecido pela
Organização Mundial do Comércio (OMC), que é de 35%. Disse também que, se não
for marcada a reunião de negociação até o término da conferência de Belém, no
dia 21, vai ligar para Trump. “O interesse é meu de negociar”, declarou o
presidente brasileiro.
E tem razão: nesta delicada barganha, o
interesse maior é do Brasil, que precisará de muita diplomacia para manter a
negociação – quando finalmente ocorrer – no terreno econômico, desarmando
armadilhas de Trump, que tenta usar o comércio como instrumento de pressão
política. A diversificação das exportações, uma espécie de antídoto à
dependência comercial, não é fácil, tampouco rápida.
O Brasil teve importantes avanços depois que
o tarifaço estreitou as portas do comércio para o maior mercado consumidor do
mundo. Em agosto, primeiro mês do impacto no Brasil, o México se tornou o
segundo maior comprador de carne brasileira, superando os EUA, que caíram de
segundo para sétimo, conforme dados do Ministério do Desenvolvimento,
Indústria, Comércio e Serviços. A situação já mudou: em outubro, a China
manteve a liderança isolada, seguida por União Europeia e Estados Unidos.
O peso do mercado chinês – e não apenas na
carne, ressalte-se – tem sustentado o bom desempenho da balança comercial
brasileira. Ao buscar uma trégua, ainda que temporária, com Xi Jinping, o
imprevisível Trump deu mostras de reconhecer o cacife da China em nível
equiparável ao norte-americano. O Brasil está entre os dois gigantes como um
parceiro estratégico, mas cuja importância no jogo depende tremendamente dos
lances dos outros dois.
Em recente entrevista ao Estadão/Broadcast, o ex-secretário
de Comércio Exterior Welber Barral considerou adequada a estratégia do Brasil
de tentar a retirada linear da taxa, mas observou que a negociação deve ser
longa por causa da complexidade dos temas mais importantes postos à mesa pelo
lado norte-americano, como a questão das big techs e a exploração de terras
raras – minerais que são matéria-prima para tecnologias de ponta como turbinas
eólicas, carros elétricos, microchips e telas de smartphones.
Na relação com os Estados Unidos, o governo
brasileiro tem adotado atitude de cautela e firmeza desde a desarrazoada carta
em que Trump, entre mentiras e ameaças, anunciou a sobretaxa ao Brasil. Agora,
que dá sinais de querer negociar, é hora de cobrar agilidade.
O léxico autoritário do PT
Por O Estado de S. Paulo
Gleisi Hoffmann diz que o governo foi
‘condescendente’ com Galípolo, como se o BC não fosse autônomo
O governo petista, como é de conhecimento
geral, não se conforma com a autonomia do Banco Central (BC). Trata o atual
presidente da autarquia, Gabriel Galípolo, como se fosse funcionário do governo
(ou bate-pau do partido, o que dá no mesmo), que ali estaria para cumprir uma
missão: baixar os juros na marra, mesmo que não haja condições objetivas para
isso. Como a taxa não caiu – e, a julgar pelos recentes comunicados da
autoridade monetária, não cairá tão cedo –, os petistas começam a hostilizar
Galípolo publicamente.
Em entrevista ao Estadão, a ministra da
Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, foi direta: “Quando o
Galípolo entrou, a gente teve condescendência”, disse a ministra. Traduzindo: a
manutenção dos juros na estratosfera pelo BC mesmo sob a direção de Galípolo,
colocado ali em janeiro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi de
início tolerada pelo governo porque, segundo a versão petista da época, era
resultado ainda das decisões do BC na presidência de Roberto Campos Neto – que
Lula tratou como o principal inimigo do Brasil.
Passado quase um ano da gestão de Galípolo,
porém, a “condescendência” acabou. Para a ministra Gleisi, os dirigentes do BC
têm sido “mais realistas que o rei”. E ela avisou que o governo continuará a pressionar
pela queda dos juros porque “não pode deixar só o mercado pressionar” para
“subir a taxa”.
O léxico petista é autoexplicativo. Na visão
autoritária do PT, Galípolo está no BC para fazer o que o partido julga ser
correto, sem qualquer autonomia, seja a determinada pela lei, seja a ditada
pelo bom senso. Pode contar no máximo com a “condescendência” temporária dos
caciques do partido. Sabendo que ano que vem é ano de eleição, Galípolo
certamente saberá o que é ser alvo da intolerância petista.
Nesse sentido, roga-se que o jovem presidente
do BC mantenha-se firme na sua determinação de conduzir a política monetária
conforme os melhores parâmetros econômicos, e não segundo os humores de seu
padrinho Lula.
Mas Galípolo terá trabalho. Na entrevista
ao Estadão, a
ministra Gleisi argumentou que um punhado de indicadores econômicos
momentaneamente positivos são suficientes para determinar o corte na taxa.
Falou em geração de emprego, PIB positivo e o que chamou de “inflação sob
controle” – o que não coaduna com uma taxa acumulada de 5,17%, nos 12 meses
encerrados em setembro, muito acima da meta de 3%.
O IPCA está 2,17 pontos porcentuais acima do
centro da meta, alvo da política monetária do BC. Mas para o governo petista o
centro da meta é uma abstração. A ministra Gleisi, seguindo o padrão do
governo, comentou que a “meta de 3% também é bem apertada”. Ora, essa meta é
determinada pelo próprio governo no Conselho Monetário Nacional.
Um dos principais fatores de pressão inflacionária – e que, consequentemente, provoca alta dos juros – é o descontrole fiscal do governo Lula. Se o governo fizesse sua parte, os juros já teriam caído. Mas os petistas, como sabemos, são muito condescendentes com a inflação.
Mais holofotes sobre o envelhecimento do país
Por Correio Braziliense
O acelerado processo de envelhecimento da
população brasileira merece mais holofotes. Há um atraso político e cultural
que se contrasta com uma realidade demográfica atravessada pelas desigualdades
estruturais do país
Os inscritos no Exame Nacional do Ensino
Médio (Enem) tiveram que dissertar, na prova de redação do domingo, sobre as
"perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira". Nada
mais oportuno. São esses candidatos — 75% dos inscritos têm até 20 anos — que
chegarão a cargos estratégicos do setor público e privado em um Brasil com nova
configuração etária. As estimativas indicam que o país terá mais idosos do que
crianças em cinco anos e que, em 2050, 30% da população terá mais de 60 anos.
Hoje, o percentual é praticamente a metade, 15,6%, e sobram sinais de que à
longevidade conquistada faltam qualidade e respeito.
Balanço divulgado pelo Ministério da Justiça
(MJ) às vésperas do Enem ilustra bem a complexidade desse cenário. O órgão
deflagrou, em outubro, a Operação Virtude 2025, com o intuito de combater a
violência praticada contra pessoas idosas pelo país. No período, 981 suspeitos
foram presos, 21.525 vítimas atendidas, 28.174 procedimentos policiais
instaurados e 19.209 boletins de ocorrência registrados. A junção de esforços
do poder público resultou, obviamente, em números concentrados, mas o
comparativo com o saldo de edições anteriores desperta preocupação.
A quantidade de prisões mais que dobrou em um
ano (foram 480 na operação de 2024) e aumentou 390% em relação a 2023 (com 200
detidos). O MJ avalia que um dos fatores que contribuíram para esse avanço é a
interiorização das ações realizadas, o que reflete, no mínimo, a existência de
um desprezo disseminado pelos idosos no país. Os ataques são diversos — físico,
psicológico, sexual, financeiro, institucional —, quase sempre impulsionados
por vítimas incapazes de denunciar.
Ao Correio, a delegada Ângela Santos, titular
da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial,
Religiosa ou por Orientação Sexual ou Contra a Pessoa Idosa ou com Deficiência
(Decrin), alertou que a perda de autonomia — tanto por razões fisiológicas
quanto sociais, como imposta por familiares — é a porta de entrada para os
abusos. "Outras violências se instalam a partir do momento em que a pessoa
idosa não diz o que fazer com o seu dinheiro, o que fazer com o seu corpo, o
que fazer com a sua casa".
Não cabe apenas à polícia assegurar a
independência dos mais velhos. Precisa-se também de uma sociedade preparada
para a convivência intergeracional, de cidades e sistemas de saúde acessíveis,
de opções de lazer diversificadas, do desenvolvimento de serviços e produtos
que considerem as demandas dos mais vividos, de um mercado de trabalho aberto
aos candidatos maduros. Trata-se, sem dúvidas, de uma configuração que exige
novos olhares de todas as áreas de conhecimento.
Acerta, portanto, o Ministério da Educação (MEC) ao mobilizar essa reflexão entre quem dá os primeiros passos profissionais. O acelerado processo de envelhecimento da população brasileira merece mais holofotes. Há um atraso político e cultural que se contrasta com uma realidade demográfica atravessada pelas desigualdades estruturais do país. Há velhices em curso neste Brasil continental. E todas elas precisam ser vividas com dignidade.
Sinais de acordo para pôr fim à paralisação
do governo dos EUA
Por Valor Econômico
Mas o acordo é apenas uma trégua ínfima, que vai reabrir temporariamente o governo por 80 dias. No fim de janeiro, o governo estará diante de outra paralisação
A deserção de 8 senadores democratas
moderados abriu caminho no Senado americano para encerrar a mais longa
paralisação do governo dos Estados Unidos. O grupo rompeu com os líderes
democratas e aceitou um acordo com os republicanos para reabrir o governo,
paralisado desde 1º de outubro, com a promessa vaga dos republicanos de uma
votação sobre a prorrogação dos subsídios do Obamacare em dezembro. Contudo, o
fim do “shutdown” ainda levará alguns dias: falta a votação final do acordo no
Senado, que depois precisa ser aprovado pela Câmara antes de ir à sanção do
presidente Donald Trump. Enquanto isso, os custos bilionários da paralisação e
seu impacto sobre a economia seguem se acumulando. A cada semana a paralisação
custa à economia americana entre US$ 10 bilhões e US$ 30 bilhões, segundo
estimativas de analistas. Considerando um custo médio de US$ 15 bilhões, a
conta já alcança ao menos US$ 90 bilhões. Este shutdown não apenas é o mais
longo, mas também o mais amplo. Em eventos passados, mesmo em 2018-2019, o
Congresso americano manteve o financiamento de muitas agências federais - por
meio de miniacordos pontuais - para permitir que continuassem operando,
limitando os efeitos da paralisação. Não foi o caso agora, com a Câmara dos
Deputados em recesso desde o fim de setembro e a falta de diálogo no Senado
impedindo a aprovação de brechas para manter serviços cruciais em
funcionamento.
Em outubro, primeiro mês de shutdown, mais de
4 mil funcionários públicos federais foram demitidos, 650 mil foram colocados
em licença não remunerada e outros 730 mil continuam trabalhando sem receber
salário - incluindo os cerca de 13 mil controladores de tráfego aéreo e 50 mil
funcionários da segurança dos transportes (TSA).
Entrando no segundo mês de paralisação, além
dos funcionários federais, 42 milhões de americanos deixaram de receber
benefícios do Programa de Assistência Nutricional Suplementar, enquanto outros
24 milhões começaram a receber a notificação do aumento do custo do seguro
saúde do Obamacare no próximo ano, já sem os subsídios que vencem no fim do
ano. A prorrogação desse benefício era a única exigência dos líderes democratas,
que perderam sua alavancagem com a defecção de 8 senadores moderados.
Um dos impactos mais evidentes do shutdown é
no setor aéreo, com controladores de voo deixando de comparecer ao trabalho ou
pedindo aposentadoria para assumir um segundo emprego em meio à falta de
pagamento. Na semana passada, a Administração Federal de Aviação (FAA) ordenou
que todas as companhias aéreas comerciais reduzissem os voos em 4% a partir de
sexta-feira como forma de reduzir os riscos devido à escassez de controladores.
Isso levou ao cancelamento de 7,2 mil voos no fim de semana. Ontem, mais 1,8
mil voos foram cancelados e outros 4,5 mil estavam em atraso.
No fim de semana, o conselheiro econômico da
Casa Branca, Kevin Hassett, alertou que se a paralisação se prolongar e afetar
o feriado de Ação de Graças, um dos mais movimentados do ano para a economia
americana, o crescimento econômico no quarto trimestre poderá ser negativo. A
consultoria Oxford Economics calcula uma redução de 0,9 ponto percentual nesse
trimestre se a paralisação durar mais uns poucos dias.
Ontem, Trump alertou os controladores de
tráfego aéreo que têm faltado ao trabalho a retornarem aos seus postos,
ameaçando reter o pagamento. Ele ainda prometeu um bônus aos que não tiverem um
dia de falta. O presidente atribuiu ao shutdown a ampla vitória dos democratas
nas eleições de 4 de novembro na cidade de Nova York e para os governos de
Virgínia e Nova Jersey.
Porém qualquer pagamento desse tipo
precisaria ser aprovado pelo Congresso e não faz parte do acordo em tramitação
no Senado. Além disso, esse projeto de lei garante que todos os funcionários
federais receberão o pagamento retroativo integral referente ao período da
paralisação - algo inicialmente rejeitado por Trump - e prevê a reintegração
dos funcionários públicos demitidos durante esse período.
Na primeira votação, o Senado aprovou o
acordo por 60 votos a 40, com ajuda de 8 democratas, sendo que um republicano
votou contra. A aprovação do acordo na Câmara, em que os republicanos têm uma
estreita maioria, ainda é incerto. O bloco democrata ameaça rejeitar o acordo e
o presidente da Câmara, Mike Johnson, não poderá perder nenhum voto de sua
bancada.
O acordo é uma trégua ínfima. Ele pode
reabrir temporariamente o governo por 80 dias. No fim de janeiro, o governo
estará diante de outra paralisação. Trump queria alívio até setembro de 2026. A
situação parece, ao longo do tempo, caminhar para impasses permanentes,
tendência que fez as empresas de rating retirarem a nota máxima, AAA, dos
títulos americanos.
A liderança democrata não quer o acordo, porque o golpe no Obamacare será violento e lesivo à população mais pobre. Mas também porque as recentes pesquisas de opinião mostram que a maior parte da culpa da paralisação se deve à intransigência de Trump, embora os democratas não saiam ilesos da confusão.
O mundo da COP30 e a tragédia do Paraná
Por O Povo (CE)
As imagens do que aconteceu no Paraná,
apontando um quadro de muita destruição deixada atrás de si pelo tornado que
passou pelo estado do sul brasileiro, parece ser uma mensagem contundente da
natureza àqueles que teimam em negar o que a realidade expõe aos olhos de todos
nós. Passou da hora de discutirmos a temática do meio ambiente com a seriedade
que ela está a exigir, até como forma de termos um futuro a construir.
Os números da tragédia falam por eles
próprios e sequer definitivos são, a cada momento precisando ser atualizados o
tempo todo para que se tenha a dimensão exata do que aconteceu com a passagem
de tornados por território paranaense que atingiram pelo menos 12 cidades em
intensidade maior. Rio Bonito do Sul, a mais afetada delas, teria registrado
rajadas de ventos com até 330 km por hora.
Por enquanto, são sete mortes confirmadas,
cerca de 800 pessoas feridas e, no caso de Rio Bonito do Sul, 90% de uma cidade
completamente destruída, mil famílias desalojadas, metade das casas e prédios
sem energia elétrica, enfim, um cenário geral que é desolador. Tornados,
lembremos, são fenômenos naturais com os quais o Brasil convive em registros
muito raros, parecendo natural entender que a repetição frequente de
acontecimentos do tipo representam um efeito da falta de atenção que predomina
em relação aos esforços de preservação do meio ambiente, sempre abaixo daquilo
que a necessidade impõe.
Na verdade, segundo nos adverte o
especialista Carlos Nobre, uma voz sempre ouvida quando se trata de discutir a
questão ambiental, o episódio representa o "novo normal" com o qual,
infelizmente, precisamos começar a nos acostumar no País. A explicação é que o
aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera acaba resultando em quantidade
maior de energia disponível, especialmente devido à elevada evaporação de vapor
d'água dos oceanos.
Claro que atribuir tragédias como esta no
Paraná apenas ao problema do aquecimento global parecerá um certo simplismo,
mas, a advertência está feita, teremos situações semelhantes acontecendo em
território brasileiro com maior frequência a partir de agora. E pior, com mais
intensidade a cada oportunidade em que se repetir, estimando-se que deixe atrás
de si sempre um rastro de destruição, perdas e mortes.
É a natureza mandando seu recado, infelizmente com perdas humanas e materiais, aos governos e às sociedades. Caso a marcha da insensatez siga no ritmo dos dias atuais teremos um futuro marcado por muita incerteza e por um quadro de repetição frequente de tragédias das quais, até recentemente, nos entendíamos livres, como essa de Rio Bonito e municípios próximos.

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