segunda-feira, 3 de novembro de 2025

Opinião do dia José Sarney (É a Constituição, imbecil)

“Bandido tem direito a ser julgado e receber a pena proporcional a seu crime. Quem julgou esses bandidos cumpriu ali mesmo a pena de morte vedada na Constituição. Assim são rasgadas todas as garantias que lhes assegura o Estado de Direito.”

(José Sarney, ex-presidente do Brasil)

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Queda no desemprego: os dois lados da balança

Por Correio Braziliense

O desafio real é transformar emprego em trabalho de qualidade: reduzir a subutilização, formalizar ocupações, elevar rendimentos reais e combater as desigualdades regionais e por gênero

O último dado oficial é, inegavelmente, um alento: a taxa de desemprego no Brasil tem alcançado os menores patamares históricos, um feito notável que merece ser reconhecido. De acordo com os dados divulgados, sexta-feira última, pelo IBGE, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) constatou que a taxa de desocupação ficou em 5,6% no trimestre encerrado em setembro de 2025, o menor nível desde o início da série em 2012, com a população desocupada em cerca de 6 milhões de pessoas. Esse resultado representa uma queda de 3,3% (menos 209 mil) em relação ao trimestre anterior e de 11,8% (menos 809 mil) na comparação com o mesmo período de 2024.

Cláudio Castro repete a tática do ventilador, por Miguel de Almeida

O Globo

Governador brindou os jornais internacionais com a mais horrorosa imagem brasileira das últimas décadas

Em São Paulo, o prefeito Ricardo Nunes se gaba de ter eliminado a Cracolândia. É uma meia verdade. O antigo quadrilátero hoje anda mais esvaziado. Ele conseguiu, então? Nada disso. Sua ação espalhou por uma área bem maior os usuários de drogas. O que antes era um problema circunscrito ao bairro da Luz está agora escancarado em várias regiões da cidade.

Esse estilo de gestão da direita — jogar no ventilador — jamais funcionou no Brasil. Prefeitos de cidades do interior, atendendo ao pároco e às senhoras religiosas, se viam levados a fechar as zonas de meretrício. Acabaram os problemas? Não. Como na Cracolândia, as prostitutas se espalharam por toda a cidade.

A tática do ventilador não está mais apenas nas prefeituras. No Rio, o governador Cláudio Castro, em seu gritante despreparo, brindou os jornais internacionais com a mais horrorosa imagem brasileira das últimas décadas. Uma fileira de dezenas de corpos, entre decapitados e baleados, quase todos sem camisa, estendidos numa praça carioca. Repetiu a tática do ventilador, agora com cadáveres, com os ares de quem resolveu o problema.

Instituições são fracas, crime é organizado, por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Trata-se de questão de Estado e de toda a sociedade, não problema dos partidos, da esquerda ou da direita

A Operação Overclean, da Polícia Federal, entrou na oitava fase na última sexta-feira. Em investigações ordenadas pelo Supremo Tribunal Federal, já apanhou contratos suspeitos que chegam a R$ 1,4 bilhão. Os envolvidos são políticos de expressão nacional e funcionários de governos estaduais e prefeituras. A fonte do dinheiro roubado é pública: emendas parlamentares.

O esquema da corrupção se repete pelo país: empresas-fantasmas ficam com parte dos recursos destinados por deputados e senadores a obras e serviços públicos. Trata-se, portanto, de roubar a população. O cardápio inclui, além da grossa corrupção: organização criminosa, peculato, lavagem de dinheiro e fraude em licitações. É aqui, nessas fraudes, que está a base dos “negócios”.

Na sexta-feira, a Polícia Federal apurou casos ocorridos no Tocantins, mas também foram cumpridas ordens de busca e apreensão no Distrito Federal, em Goiás e em São Paulo. Nas sete fases anteriores da Overclean, foram investigados casos em vários outros estados. O crime é nacional.

Operações em primeira pessoa, por Irapuã Santana

O Globo

O tiroteio começa, o tempo se dissolve. O coração acelera, o corpo reage antes da mente. Cada disparo é uma prece muda para voltar vivo

Ele ajusta o colete como quem veste uma armadura velha demais. O tecido não o protege há muito tempo, apenas tenta segurar os pedaços da alma que ficaram pelo caminho. Na parede, o mapa da operação: linhas, setas, nomes de comunidades.

Enquanto o comandante fala, ele pensa em casa. Na esposa, que tenta dormir fingindo que o barulho do zíper da mochila não é presságio. No filho, que ainda pergunta por que o pai trabalha em horários malucos, ao contrário dos outros pais da escola.

— Pra proteger as pessoas — ele respondeu um dia.

E até hoje tenta acreditar nisso.

BC fecha brechas com nova regra de capital, por Alex Ribeiro

Valor Econômico

Instituição vai anunciar nesta segunda-feira uma ampla revisão nos requerimentos mínimos de capital para a operação de instituições financeiras

O pêndulo da regulação vai oscilar mais uma vez para o lado da segurança, depois de ter avançado em demasia para o lado da competição. O Banco Central vai anunciar nesta segunda-feira uma ampla revisão nos requerimentos mínimos de capital para a operação de instituições financeiras.

A notícia foi antecipada na semana passada pelo diretor de Fiscalização do Banco Central, Ailton de Aquino, em evento da Fenasbac. “Faz mais de 30 anos que não fazemos uma revisão profunda de capital das instituições autorizadas”, disse. “Acho que a gente chegou a um bom momento para dialogar acerca de capital.”

Será difícil conter novas Operações Contenção, por Bruno Carazza

Valor Econômico

Aprovação popular ao uso de violência em ações da polícia abre precedente para que estratégia se prolifere pelo país

“Violência real e sensação aguda de desproteção e impunidade formam um cenário perigoso. Nos subúrbios e favelas, onde a violência está mais presente e o poder público mais ausente, direitos humanos viraram sinônimo de ‘moleza com os bandidos’, em vez de proteção ao cidadão. A lógica do medo transforma o delinquente num monstro contra o qual toda violência é tolerada.”

O parágrafo acima foi retirado do programa de governo do então candidato Fernando Henrique Cardoso, lançado nas eleições de 1994, e demonstra que desde aquele tempo a sociedade brasileira já se dividia a respeito do uso excessivo da força no combate à criminalidade.

Em 2 de outubro de 1992 a polícia militar de São Paulo invadiu a Casa de Detenção do Carandiru durante uma rebelião e o saldo foi de 111 presos mortos (“quase todos pretos, ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres”). Pesquisa Datafolha realizada com 1.080 paulistanos logo após o massacre indicou que 53% dos entrevistados consideravam que os PMs haviam agido errado, enquanto 29% concordavam com a execução dos presos. Ao serem perguntados sobre quem seria responsável pelo massacre, os entrevistados se dividiam: 38% culpavam os policiais, 36% os próprios presos e 11% atribuíam a responsabilidade a ambos.

Duterte do Rio, por Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

A política de segurança pública de Duterte fracassou em cumprir o objetivo alegado

O governador do Rio, Cláudio Castro, demonstrou satisfação com o resultado da operação policial que deixou mais de uma centena de mortos no Complexo da Penha, na semana passada. Ele afirmou estar muito tranquilo em “defender o que foi feito”. A intenção, segundo ele, não era matar, mas isso acabou sendo necessário por causa da “retaliação” por parte dos traficantes. Quatro policiais morreram no confronto.

As falas de Castro lembram as justificativas que Rodrigo Duterte, presidente das Filipinas entre 2016 e 2022, dava para a brutal guerra às drogas que ele comandou no arquipélago do Sudeste Asiático, marcada por chacinas e execuções extrajudiciais. Estima-se que 30 mil civis tenham morrido em meio à sua campanha contra as gangues.

Segurança e território, por Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

O Estado brasileiro não é internamente soberano, tendo abandonado uma fatia importante do seu território às organizações criminosas

As cenas do Rio de Janeiro apresentam um teatro de guerra. Guerra, não esqueçamos, travada entre as forças policiais do Estado, que agiram sob mandado judicial, e traficantes, que operam segundo a lógica da guerrilha. Amputaram o Estado de uma parte de seu território e passaram a dominá-lo, implantando um regime de extorsão e violência, aterrorizando os seus moradores. É a sua “lei” que passou lá a vigorar. Para se “defenderem”, utilizam inclusive drones e bombas! Nesse contexto, as forças do governo do Rio agiram segundo uma lógica militar, e não poderia ser de outra forma, visto que se trata da recuperação de um território perdido.

A dar atenção a ONGs esquerdistas, fica-se com a impressão de que as polícias tiraram a paz desses cidadãos que viveriam em harmonia, embora, na verdade, destituídos de cidadania. Não são discursos politicamente corretos que podem alterar tal situação. Os criminosos aproveitam-se de tais “aliados” para nutrir, então, a sua narrativa específica, em busca de legitimidade. A tática é a mesma do Hamas em Gaza.

Entrevista |Operação no Rio faz parte de projeto totalitário de extrema direita, diz pesquisador da violência, por André Fontenelle

Folha de S. Paulo

Para Gabriel Feltran, brasileiro que leciona no SciencesPo, elite cedeu poder a seu 'setor jagunço'

Segundo ele, igualar-se aos torturadores do CV não é saída para construção de Estado civilizado

operação policial de 28 de outubro no Rio de Janeiro tem um aspecto inédito, além da escala de mortos sem precedentes: o planejamento político. É a visão do pesquisador brasileiro Gabriel Feltran, 49, diretor de pesquisas do Centro Nacional de Pesquisa Científica da França (CNRS) e professor do SciencesPo, uma das principais instituições de ensino de ciências sociais da Europa.

Sociólogo do crime, Feltran estuda há mais de 20 anos a violência urbana no Brasil e o conflito entre Estado e crime organizado. Para ele, a narrativa que enxerga uma faxina contra o suposto narcoterrorismo, apoiada por youtubers e ex-policiais convertidos em comentaristas de TV, fomenta um projeto totalitário.

Esse projeto, segundo ele, já controla governos estaduais, legislativos e parte do Judiciário, faltando apenas controlar o STF (Supremo Tribunal Federal). "E não parece que vai demorar para que isso se realize."

Para Feltran, "igualar-se aos torturadores do Comando Vermelho, com espadas e decapitações, não parece ser uma boa saída para a construção de um Estado civilizado".

Sistema eleitoral não é escudo contra crime organizado, por Lara Mesquita

Folha de S. Paulo

Exemplo mexicano deveria ser considerado antes de se defender que sistema eleitoral misto pode oferecer blindagem contra financiamento político ilícito

Não existe sistema eleitoral capaz de impedir que os recursos do crime organizado interfiram nos resultados eleitorais

Não é a primeira vez que utilizo este espaço para abordar o tema da reforma eleitoral.

Retomo o tema porque, antes de qualquer mudança, é preciso que se tenha clareza sobre o problema que se pretende resolver. Sem isso, não podemos avaliar a adequação do remédio proposto. Isso vale também para o debate sobre a mudança do sistema de governo.

Usualmente, essas duas reformas –a adoção de um sistema parlamentarista e/ou de um sistema majoritário puro (também conhecido como distrital) ou combinado com o sistema proporcional (o sistema misto)– são apresentadas como soluções mágicas: resolveriam todos os problemas da política brasileira.

Argentina: quando o fracasso sustenta a identidade política, por Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

A trajetória do peronismo e do radicalismo revela um país onde a identidade pesa mais que o desempenho

Milei virou o jogo: conta com base ampla, quórum para veto presidencial e recursos para negociar com governadores

É lugar-comum afirmar que o Brasil não é para amadores. O que dizer, então, da Argentina? Uma das frases mais célebres sobre o país — ou sobre sua tragédia— é atribuída a Simon Kuznets, prêmio Nobel de Economia em 1971: "Existem quatro tipos de países no mundo: desenvolvidos, subdesenvolvidos, o Japão e a Argentina".

A eleição de um libertário em um país marcado pelo intervencionismo estatal e pela instabilidade fiscal não deveria surpreender. Situações de crises recorrentes tendem a produzir respostas políticas radicais. O feito, no entanto, não é apenas individual. O partido La Libertad Avanza (LLA) saltou de 14% para 41% das cadeiras na Câmara. Três fatores foram decisivos: a mais baixa taxa de comparecimento às urnas em quatro décadas (67%), apesar do voto obrigatório; o swap cambial de US$ 20 bilhões (R$ 107 bilhões) de Trump; e a promessa do presidente dos EUA de descontinuar apoio se Milei viesse a perder. O peronismo foi amplamente derrotado. Como alternativa era ainda pior.

Carta branca para o invisível, por Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

A luta de grupos minorizados pelo reconhecimento de suas vozes passa por sujeitos visíveis no espaço comum

Um eleitorado sem voz tem a mesma fajuta consistência política da escultura invisível do italiano espertalhão

Deu no jornal que o italiano Salvatore Garau produziu uma escultura invisível, já vendida pelo equivalente a R$ 80 mil. O comprador tem à disposição apenas um suporte sem nada por cima, mas leva para casa o "espírito" e a assinatura do autor. É algo bizarro, mas pouco surpreendente no rol das extravagâncias que há muito tempo fazem o espetáculo nas galerias de arte em todo o mundo. Na verdade, a arte moderna é principalmente avaliada pela subjetividade do artista, materializada em sua valiosa assinatura.

A ilusão da vitória, por Eduardo Ribeiro*

O Povo (CE)

O Brasil que naturaliza e até mesmo celebra a morte brutal de 134 pessoas em uma operação policial é o mesmo país que convive há décadas com altíssimos níveis de desigualdade e de precarização da vida de amplas parcelas de sua população. Que negligencia suas periferias e territórios populares, e criminaliza a pobreza, construindo uma narrativa onde o "inimigo" mora no morro, na favela ou na quebrada. É também um país que não resolveu as heranças de seu passado autoritário e escravocrata.

É possível entender a indiferença social diante do sofrimento e da morte como produto de um longo processo de desumanização das pessoas mais pobres, assim como das pessoas negras. Processo que transforma o sofrimento em rotina, que reduz a empatia e fortalece a ideia de que a violência e a brutalidade são não apenas justificáveis, como inevitáveis.

A Elite da Tropa e os Atos dos Apóstolos à procura da Frente Democrática, por Vagner Gomes

O pecado de Pilatos foi que, quando poderia ter salvado nosso Salvador de uma morte injusta, permitiu que a inocência caísse, com base em acusações contraditórias entre si e contrárias a estranhas revelações celestiais, e proferiu a sentença de morte, apenas para satisfazer uma multidão sedenta de sangue. Mas, de outra forma, foi o caso de meu Lorde de Strafford, pois ali o Rei não era o único juiz, aliás, era incapaz de julgar, e o delinquente fora legalmente condenado, tendo sido provadas acusações tão hediondas contra ele que seus maiores amigos se envergonharam de justificá-las, e todos os homens imparciais de três reinos inteiros as consideravam mortais; e, portanto, o Rei poderia, com a consciência limpa, ter assinado uma ordem de execução, embora discordasse da sentença. Assim, se um juiz no mesmo tribunal discordar de três, ou um jurado no tribunal discordar de onze, eles podem submeter-se à maioria, embora talvez menos hábeis do que eles próprios, sem imputação de culpa; e se assim é em matéria de Direito, com mais razão ainda é em matéria de Estado, onde a própria satisfação de uma multidão, por vezes em coisas que de outra forma não seriam convenientes, pode revelar-se não só conveniente, mas necessária para o estabelecimento da paz e o fim da discórdia. Por exemplo: Foi um pedido de todo o Reino, reunido no Parlamento, ao Rei, que confiasse as Milícias e o Depósito de Armas de Hull, etc., a pessoas que gozassem da boa estima do povo. A consciência e o entendimento nada poderiam alegar contra isso, e se pudesse ter sido afirmado (como foi).

Poesia | O analfabeto político, de Bertolt Brecht

 

Música | Mariana Aydar, Alceu Valença e Mestrinho - Coração Bobo