O Supremo Tribunal Federal (STF) realizará nesta quarta-feira (16) um julgamento que talvez fosse desnecessário se o Legislativo tivesse feito seu próprio trabalho.
Trata-se de, a pedido do PC do B, dissipar dúvidas relativas aos ritos que devem ser observados durante o processo de afastamento da presidente Dilma Rousseff (PT).
As incertezas são variadas. Editada em 1950, a lei que regula o impeachment (1.079) abriga até hoje inúmeros dispositivos procedimentais que conflitam com a Constituição de 1988. O mesmo pode ser dito em relação aos regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado, embora esses passem por frequentes atualizações.
Tome-se a comissão especial que analisará o impeachment. A lei 1.079 estatui que esse colegiado será eleito, mas não diz de que modo (art. 19). Como o regimento da Câmara prescreve escrutínio secreto (art. 188, III), o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), adotou essa forma de votação.
Entre as questões que ora compete ao Supremo decidir está essa determinação de Cunha.
Nesse ponto, contudo, não parece haver maiores dificuldades. O STF já definiu que as exceções ao princípio da publicidade nas deliberações parlamentares devem estar explícitas na Constituição, e não é esse o caso da comissão especial. Faz sentido, pois o cidadão tem todo o direito de saber como vota seu representante no Congresso.
Outros temas, no entanto, têm potencial para suscitar debates acirrados. Um deles diz respeito ao momento em que se considera instaurado o processo contra o presidente da República no Senado. A discussão é das mais relevantes porque só então o chefe do Executivo será afastado do cargo.
Em seu parecer, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defende, com razão, que se repita hoje o roteiro adotado à época de Fernando Collor, em 1992. Na ocasião, o início do processo no Senado só ocorreu após parecer de uma comissão especial da Casa ser aprovado pelo plenário.
Para a oposição, tal sugestão representa verdadeiro acinte; não caberia aos senadores rediscutir um juízo já proferido por pelo menos dois terços (342) dos deputados.
A divergência sobrevive porque o STF, nos julgamentos do caso Collor, não esgotou todas as dúvidas existentes –muitas das quais ligadas ao fato de que, quando se trata de impeachment, a Constituição de 1988 deu a cada uma das Casas do Legislativo um papel diferente daquele atribuído pela Carta de 1946.
A rigor, nem caberia ao Supremo estabelecer o procedimento em seus pormenores; essa é uma função do Congresso, a quem compete aprovar leis. Os legisladores, entretanto, falharam grosseiramente nessa missão –e é espantoso que ainda acusem o Judiciário de se imiscuir num assunto político.
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