Em
quase todos os lugares do mundo, as escolas públicas foram as últimas a fechar
e as primeiras a reabrir durante a pandemia; aqui no Brasil, é o contrário
Depois
de sete horas de disputa em plenário, na terça-feira, a Câmara dos Deputados
aprovou o projeto que regulamenta a reabertura de escolas e faculdades durante
a pandemia (PL 5.595/20), mas a polêmica continua. O texto torna a educação
básica e superior serviços essenciais, ou seja, não podem ser interrompidos
durante a crise sanitária. O texto seguirá para o Senado, onde a discussão deve
pegar fogo. A proposta inverte a equação: proíbe a suspensão de aulas
presenciais durante pandemias e calamidades públicas, exceto se houver
critérios técnicos e científicos justificados pelo Poder Executivo quanto às
condições sanitárias do estado ou município.
O fato de a relatora do projeto ser a polêmica deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), facilitou a vida dos setores de esquerda que se opõem à abertura das escolas, apesar de ter incorporado emendas que estabelecem protocolos para o retorno escolar. Autora da proposta, a deputada Paula Belmonte (Cidadania-DF) destaca que “o texto foi alterado para garantir segurança de professores e alunos”. Outros deputados de perfil conservador e liberal patrocinaram a aprovação. “Esse projeto é de suma importância para (…) aquela mãe ou para aquele pai que não tem onde deixar o seu filho, (…) que é analfabeto e que não pode colaborar com a educação domiciliar, (…) que não tem conexão,computador e, como muitos disseram aqui, não tem água nem luz, às vezes”, argumentou a deputada Aline Sleutjes (PSL-PR).
Califórnia
Um
dos argumentos contra o projeto é o de que o Brasil é muito desigual, e as
escolas das periferias e pequenos municípios não têm condições de seguir os
protocolos. Entretanto, há inúmeros exemplos de escolas em locais remotos com
alto desempenho escolar. Por isso, lembrei-me do best seller A quarta
revolução, a corrida global para reinventar o Estado, de John Micklethwait e
Adrian Wooldridge. Lós Angeles tem 687 mil alunos, ao lado de 23 outros distritos
escolares californianos com 20 alunos ou menos.
O
glamour hollywoodiano da Califórnia, por causa de Beverly Hills e do Vale do
Silício, esconde milhares de condados, cidades e distritos, nos quais se
reproduz o abismo existente entre Palo Alto, com suas empresas de alta
tecnologia, e a burocrática Sacramento, a capital do estado com a terceira
Constituição mais longa do mundo. Milhares de leis estaduais e locais de
iniciativa popular engessam três quartos do orçamento público.
Os
lobbies mais poderosos da Califórnia são: o dos agentes penitenciários
(republicano), que aumentaram os empregos nos presídios e a população
carcerária, com a duplicação das penas para criminosos reincidentes, e o dos
professores da rede pública (democrata), cujo sindicato gastou US$ 210 milhões
em campanhas políticas, entre 2000 e 2010, para conquistar uma taxa de demissão
de 0,3%, ou seja, não importa o desempenho, professores são “imexíveis”. Há 50
anos, a Califórnia tinha o melhor sistema de ensino dos Estados Unidos; hoje,
disputa com o Mississipi os maiores índices de analfabetismo e gastos per
capita. Quem manda na rede de ensino público não são seus gestores, são os
sindicatos de professores.
Em quase todos os lugares do mundo, as escolas públicas foram as últimas a fechar e as primeiras a reabrir durante a pandemia; aqui no Brasil, é o contrário. Tem alguma coisa errada. Os prejuízos para as crianças fora da escola não são tangíveis, vão muito além dos boletins esco- lares. E são justamente as mais pobres que mais precisam voltar às salas de aula.
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