LDO-2022
não trata sobre o cenário de pandemia continuar
Escaldado
pela terrível experiência do Orçamento de 2021, o governo enviou o projeto de
Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2022 (PLDO) com uma série de regras para
facilitar a execução dos gastos públicos, caso o Congresso não aprove a peça
orçamentária do ano eleitoral. Acendeu-se, assim, a luz amarela se o texto
teria um viés eleitoreiro, ao permitir, por exemplo, a execução de
investimentos, mesmo sem Orçamento aprovado.
Experientes
observadores do tema ouvidos pelo Valor apontam,
porém, que os mecanismos teriam de fato um viés de precaução da área técnica e
não qualquer outra motivação. E consideram que a repetição do vexame ocorrido
neste ano é improvável, justamente por causa das eleições.
Uma
dessas fontes, que por muito tempo esteve no governo, mostrou levantamento com
as datas de sanções dos orçamentos desde 2002. Em anos de eleição geral, apenas
em 2006 o Orçamento se arrastou por tanto tempo além do prazo normal, sendo
assinado pelo presidente em maio daquele ano.
Além disso, apontam os especialistas, a regra de impositividade das emendas parlamentares reforçaria a tendência favorável à aprovação dentro do prazo (dezembro), dado que deputados e senadores querem entrar o ano já executando suas ações. Por isso, acreditam, o Orçamento de 2022 será aprovado ainda em 2021.
Esses
interlocutores lembram ainda que não é a primeira vez que o governo tenta
emplacar regras que facilitem a execução do Orçamento na chamada
“antevigência”. Mas os parlamentares sempre cortaram essas maiores
liberalidades, que enfraqueceriam o controle do Congresso sobre o gasto
público.
Além
de liberar parcialmente as despesas de investimento antes do Orçamento
aprovado, o PLDO 2022 altera as regras de execução de restos a pagar e facilita
a antecipação de despesas que só ocorreriam após a sanção presidencial. Embora
já se possa fazer isso hoje, a leitura de especialistas é que a medida dá mais
segurança para o Tesouro autorizar esses gastos. O órgão também nega motivação
eleitoreira e salientou ao Valor que
o principal objetivo é “aprimorar a transparência para a sociedade e para os
órgãos do Executivo dos procedimentos a serem observados”.
O
Tesouro destacou que essa execução não vai comprometer o cumprimento da meta de
resultado primário e a regra do teto de gasto. “Observa-se ainda a previsão de
que os limites financeiros serão considerados como antecipação do cronograma
anual a ser editado posteriormente, após a publicação da LOA (previsão na LRF),
portanto, não tem o condão de agilizar gastos em ano eleitoral, e sim de
estabelecer fluxo transparente e regular dos pagamentos”, disse.
Sempre
rico em informações, o PLDO-2022 não trata da possibilidade de a pandemia de
covid-19 continuar. E não dá orientação para o Orçamento lidar com esse
cenário, destacou ao Valor o
consultor legislativo do Senado Vinícius Amaral.
“Não
há nenhuma previsão de políticas relacionadas à pandemia, para que o país
priorize o enfrentamento e também a recuperação nas áreas de saúde, educação,
emprego e assistência social”, disse Amaral. “Vamos precisar de políticas para
recuperação da educação. Há risco de toda uma geração ficar com déficit de
aprendizado e não se fala nada disso. Não se fala dos riscos de sequelas
geradas pela covid e de outras consequências de médio e longo prazo.”
O
consultor de orçamento da Câmara Ricardo Volpe não vê como um problema o PLDO
não tratar da pandemia, pois ainda não há como precisar quais serão as
necessidades relativas a essa questão em 2022. Porém, ele ressalta a
necessidade de o país ter uma estratégia de um a dois anos para o pós-pandemia.
“Precisa
ter um plano, como previsto na Constituição, e aí ele ser integrado no
Orçamento. O ideal seria fazer isso junto com o plano de revisão de benefícios
tributários, que em grande parte não servem para nada, e o que arrecadar mais
vai para esse programa pós-covid”, sugere.
O
alerta desses analistas sobre planejar como o país vai lidar com o futuro
pós-pandemia merece ser levado em conta pelo governo e pela sociedade, ainda
que o presente siga dramático. O excesso de improviso já custou muitas vidas.
Infelizmente, ainda vai custar mais. Se há tanta preocupação do presidente Jair
Bolsonaro em fazer a economia funcionar, que ele se atente então para a
necessidade de se preparar os próximos passos de reação ao vírus e a etapa
seguinte, quando casos e mortes despencarem. Talvez seja pedir demais dele, mas
não custa sonhar.
Reforma
sob atritos
Mudando
de tópico, a Comissão de Constituição Justiça (CCJ) da Câmara começou a dar
andamento para a reforma administrativa. O tema é tão polêmico que já houve
atrito na última sessão sobre a quantidade de audiências públicas a serem
feitas na CCJ, inicialmente prevista para sete reuniões, com início na próxima
terça-feira. A oposição, porém, quer mais sessões.
Essa
reforma é uma das apostas da agenda da equipe econômica para este ano e também
conta com apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que colocou
pressão sobre a CCJ.
Mas
há críticas de mérito ao projeto. Artigo publicado no site Brasil Debate pelos
economistas Jefferson Fraga, da PUC-MG, Helder Ferreira e José Oreiro, da UnB,
aponta que a proposta não resolve as distorções existentes no serviço público e
pode até agravá-las. Segundo eles, a PEC parece ter apenas foco na questão
fiscal e deixaria de fora as maiores fontes de distorções: militares, juízes,
Ministério Público e parlamentares.
Ao Valor Oreiro destacou que
é preciso cuidado com as mudanças na estabilidade e no estágio probatório de
dez anos, que trariam riscos de todo tipo de ingerência na autonomia de
trabalho dos servidores, o que vale não só para as carreiras típicas de Estado.
“Corremos risco de voltar para a República Velha”, disse. Ele também salientou
que o gasto com pessoal no Brasil não é alto para padrões internacionais e tem
ficado estável em proporção do PIB há muito tempo.
Que as críticas que estão surgindo sirvam para aperfeiçoar as propostas do governo, e não simplesmente para paralisar a discussão. Há muito o que se melhorar no serviço público brasileiro e isso é tarefa urgente.
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