'Boiada' de Bolsonaro e Salles deu protagonismo a governadores na política ambiental
A política antiambiental
do governo Jair Bolsonaro, liderada pelo
ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, arrastou o Brasil para
o isolamento no cenário internacional, mas acabou servindo para fortalecer as
pontes e o canal direto de diálogo dos Estados e municípios com os
financiadores internacionais. A turma lá de fora, que tem o dinheiro na mão, e
quer apostar em projetos de desenvolvimento sustentável e locais, via governos
locais e agências de fomento regionais.
Esse movimento de
articulação já estava em gestação antes de Bolsonaro, mas cresceu muito nos
últimos dois anos no Brasil, no vácuo deixado pelo governo
federal, que preferiu ignorar todos os alertas do prejuízo para a imagem do
País e a economia do desmonte da política ambiental.
Bolsonaro e Salles, ao contrário, insistiram no plano de passar a “boiada” na legislação ambiental e, agora, com a troca de presidente dos Estados Unidos tentam contornar o prejuízo ao buscar dinheiro internacional para o combate ao desmatamento.
Só que ninguém acredita na
mudança. A ponto de o presidente norte-americano, Joe Biden, ter sido bombardeado
por cartas de governadores,
ex-ministros, artistas brasileiros, americanos e britânicos que pediram o
endurecimento da posição da Casa Branca com Bolsonaro na área ambiental, como
mostrou reportagem do Estadão.
Os governadores foram ao
ponto: têm fundos e mecanismos criados especialmente para responder à
emergência climática, disponíveis para aplicação dos recursos internacionais.
Antes, era o governo federal o protagonista e principal catalisador de atração
do dinheiro internacional para o meio ambiente.
Um bom termômetro da força
desse novo ambiente de financiamento pode ser testado, ao longo da próxima
semana, no fórum internacional de desenvolvimento, organizado pela ABDE, a
associação brasileira que reúne 31 dessas agências de fomento e bancos de
desenvolvimento presentes em todo território nacional.
São bancos conhecidos como
“de última milha”, que estão mais próximos dos problemas locais e atuam em
parceria numa espécie de cascata em que o recurso vem dos financiadores
internacionais e do setor privado nacional para uma aplicação direta na ponta.
Será uma reunião de cúpula
das instituições de desenvolvimento do País e certamente o principal evento do
ano sobre desenvolvimento, tanto do ponto de vista das lideranças políticas
(alguns presidenciáveis), com participação de grandes nomes internacionais da
área. Governadores, bancos de desenvolvimento do mundo inteiro, organismos
multilaterais e economistas renomados. Mais do que nunca, a área precisa de
dinheiro, mas também de bons projetos.
A número dois da ONU e ex-ministra do Meio
Ambiente da Nigéria, Anima Mohammed, também
falará no fórum.
A criação recente da
Aliança Subnacional de Bancos de Desenvolvimento da América Latina e do Caribe
fortaleceu essa ponte. “É importante cuidar das emergências do presente, mas
também planejar e preparar o futuro”, diz Sergio Gusmão Suchodolski,
organizador do evento e presidente da ABDE.
Gusmão é hoje um dos
principais nomes brasileiros lançando mão de ferramentas inovadoras de
financiamento na área, utilizando modelos que fazem um mix de diferentes fontes
de capital de maneira a mobilizar recursos para projetos atrelados ao tema da
sustentabilidade. Ele coordenou, no ano passado, a primeira emissão de bônus
sustentável, com DNA ambiental e social, no mercado externo feita por um desses
bancos de “milha”, o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais.
Para Gusmão, o Brasil está
atrasado: “O que eu sinto falta é uma estratégia de País com consistência. De
começo meio e fim para o tema de desenvolvimento sustentável. Um caminho com
ações concretas e que tragam recursos para o financiamento”.
Os Estados estão buscando
se articular internacionalmente não só porque veem a urgência da agenda
climática e de desenvolvimento sustentável, mas também pela preocupação com o
impacto negativo do risco reputacional.
Os governadores querem se
aproveitar da agenda positiva que Biden está liderando nessa área,
catalisando contrapartidas concretas e linhas específicas para investimentos
que usam instrumentos adequados para cada região do País. Esse tipo de articulação
aconteceu em alguns Estados e capitais americanas durante o governo Trump.
Ninguém quer ficar parado e sofrendo com impacto negativo das políticas que saem de Brasília e afetam a todos. Está todo mundo “correndo atrás do prejuízo” porque ninguém acredita na capacidade de Salles, chamado pelos críticos de ministro do desmatamento, em conseguir atrair dinheiro de Biden. Os americanos sabem o que o governo brasileiro fez no verão passado e continua fazendo para prejudicar o combate pelos órgãos de fiscalização dos crimes ambientais.
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