Acordo de colaboração judicial assinado por empresa, desta vez no Peru, tem potencial devastador
Prevê-se uma longa e forte tormenta sobre o governo e o Congresso do Peru , como consequência do acordo de colaboração judicial assinado pela Odebrecht na semana passada. Na essência, é similar ao que o grupo empresarial fez há dois anos no Brasil, nos Estados Unidos e na Suíça. Prevê testemunhos e entrega de provas, sem restrições, de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Suspeitas de má administração e recebimento de propinas de empresas brasileiras, Odebrecht à frente, já induziram o cerco judicial a quatro ex-chefes de Estado peruanos.
Neste ano, houve a renúncia de um presidente, Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018). Outros dois ex-presidentes tiveram prisão decretada, Alejandro Toledo (20012006) e Ollanta Humala (20112016). E um quarto, Alan García (1985-1990 e 2006-2011), hoje peregrina por embaixadas em Lima à procura de “asilo” alegando “perseguição política” — argumento risível porque no Peru, como no Brasil, vive-se sob império da lei e da democracia. Além deles, investiga-se a líder da oposição, Keiko Fujimori, presa preventivamente. Nesse contexto, o acordo tem potencial ainda mais devastador. E sinaliza algo parecido ao México, Colômbia, Equador e países centro-americanos.
O “efeito Odebrecht” se espraia por Américas, África e Europa. Sua força deriva da ansiedade por mudanças, cristalizadas no Brasil a partir das manifestações de 2013.
Numa ironia histórica, produziu inédita união latino-americana ao colocar a corrupção no centro do debate político, alentando influências liberalizantes no ciclo eleitoral pelo qual passa a maioria dos países da região, até o final de 2019.
Revelações sobre o pluripartidarismo de propinas chocam, tumultuam e deflagram batalhas pelo poder. Mas têm efeito balsâmico para as sociedades, porque desmontam mitos e maniqueísmos de direita e de esquerda, herança de ciclos autoritários sob o manto da Guerra Fria.
Um das consequências notáveis é o respaldo público à repressão aos crimes que desequilibram a competição nos mercados nacionais.
Exageros são cometidos, sim. No Brasil, por exemplo, a polícia ainda confunde publicamente testemunhas com acusados, como ocorreu semana passada ao cumprir mandados de prisão e intimação do Supremo Tribunal Federal. Há também algum ativismo judicial. Os excessos precisam e devem ser punidos, mas, deve-se reconhecer, são pontuais.
A experiência brasileira em casos como o da Odebrecht oferece lições. Uma das mais relevantes é a necessidade de se evitar que a disputa de poder entre órgãos judiciais, de fiscalização e controle leve empresas nacionais colaboradoras ao naufrágio econômico-financeiro.
O objetivo da purgação é oxigenar as forças sociais, políticas e econômicas nacionais, para se avançar rumo a uma sociedade mais igualitária.
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