segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

O agro e o risco diplomático: Editorial | O Estado de S. Paulo

Com superávit de US$ 73,32 bilhões até outubro, o agronegócio continua garantindo um bom resultado para o comércio exterior e uma preciosa segurança nas contas externas. Graças a isso o Brasil conseguiu em dez meses um saldo positivo de US$ 47,72 bilhões nas exportações e importações de bens e poderá fechar o ano com excedente superior a US$ 55 bilhões. O bom desempenho do agro compensou com grande folga o resultado negativo de outros setores. Com a perspectiva de mais um período de grande produção, o campo e as indústrias processadoras poderão dar uma excelente contribuição ao novo governo – especialmente importante num começo de mandato.

Mas isso dependerá em boa parte do novo presidente e de sua política externa. Se a diplomacia enveredar por encrencas com grandes clientes, como a China e países muçulmanos, essa exibição de incompetência – mais que de imprudência – poderá custar ao Brasil muitos bilhões de dólares de receita cambial e um bom pedaço de seu crescimento econômico.

O contraste entre o futuro governo e a área mais dinâmica e moderna do agro é ostensivo. De um lado, pessoas próximas do presidente eleito continuam mandando mensagens assustadoras ao mundo exterior – promessas de abandono dos compromissos de defesa do clima, de mudança da embaixada em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém, de rejeição do multilateralismo e de alinhamento à política truculenta do presidente Donald Trump. Autoridades da China e de países muçulmanos já mostraram preocupação diante da nova orientação diplomática indicada pelo presidente eleito e sua equipe. Da Europa também já vieram sinais de desagrado em relação às alterações na política ambiental brasileira, um tema delicado quando se trata de comércio e de acordos econômicos internacionais.

Do lado do agro, o esforço para produzir de forma competitiva continua. Um novo recorde, de 238,41 milhões de toneladas, foi projetado para a safra de grãos de 2018-2019 pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), ligada ao Ministério da Agricultura.

No caso da soja, o produto mais volumoso, as estimativas apontam colheita de 120,7 milhões de toneladas, 0,6% maior que a do ano anterior, exportações de 75 milhões de toneladas, além das vendas de farelo e óleo. Neste ano, até outubro, os embarques do complexo soja proporcionaram receita de US$ 36,27 bilhões, 23,9% mais que em igual período de 2017, e um saldo positivo de US$ 36,18 bilhões.

A Ásia permaneceu como principal destino, com a China como maior compradora de soja e derivados. O presidente eleito parece haver esquecido esse detalhe, quando fez declarações pouco diplomáticas em relação à China e pareceu estar seguindo, também nesse ponto, o caminho do presidente Donald Trump.

Mas o agro contribui para a receita cambial com muito mais que as exportações de soja e outros vegetais e seus derivados. As vendas externas de carnes também são muito importantes para o balanço de pagamentos do Brasil. Neste ano, até outubro, os embarques de carnes garantiram receita de US$ 12,12 bilhões. Incluídas nesse conjunto, as vendas de carne de frango proporcionaram US$ 5,32 bilhões, valor 12,3% menor que o de um ano antes, mas, ainda assim, uma contribuição relevante para o faturamento em moeda forte.

O Brasil tem produzido mais de 13 milhões de toneladas de frango e exportado cerca de um terço do total. Países muçulmanos estão entre os principais compradores. De janeiro a outubro o Oriente Médio foi o terceiro destino mais importante das vendas externas do agronegócio, tendo absorvido mercadorias no valor de US$ 6,2 bilhões. Boa parte correspondeu à carne de frango.

O Brasil é um dos mais eficientes produtores e exportadores de aves, graças a muito investimento e muita melhora do processo produtivo – avanço semelhante ao de outros segmentos do agro. Ganhos de produtividade e de mercados deram muito trabalho. Mas podem ser desperdiçados facilmente, se uma política externa infantil e incompetente for acionada pelo novo governo.

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