sábado, 11 de dezembro de 2010

Vai desacelerar:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

No ano que vem, o Brasil vai crescer menos do que em 2010. Mesmo que o governo não faça qualquer aperto fiscal e monetário, o país deve crescer em torno de 4% e não acima de 7%, como será este ano. Em parte, porque o efeito estatístico que favoreceu o último ano do governo Lula - a comparação com a recessão de 2009 - ocorrerá no sentido oposto no primeiro ano de Dilma.

Mesmo assim, se der o que os analistas estão prevendo, será um bom ano, muito melhor do que o ano de estreia do período Lula. Parte grande do crescimento de 2010 é a recuperação da queda de 2009, que esta semana foi recalculada para -0,6%, o maior tombo desde 1990. Em parte, o crescimento foi turbinado por aumento de gastos públicos e expansão do consumo via crédito. No final do ano, o governo teve que conter o consumo do crédito através das medidas anunciadas há uma semana pelo Banco Central.

A RC Consultores registra que em 2010 o crescimento do crédito foi de 23% e acredita que em 2011 continuará subindo forte, mas em 14%. A consultoria prevê que no ano que vem o PIB fique em 4%.

André Loes, economista-chefe do HSBC, acha que é até desejável que o crescimento do PIB desacelere, porque o ritmo atual está aprofundando o déficit em transações correntes e pressionando a inflação:

- Todo país só tem chance de crescer acima do potencial por alguns trimestres, que é o que vai acontecer este ano.

Ele acha que a inflação é mais fácil resolver, com aperto monetário, mas que o déficit em transações correntes continuará alto, em parte porque há muito investimento em bens de capital e a Petrobras tem alugado muito equipamento, que entra na conta de serviços. Num cenário em que fique mais difícil financiar o déficit, o real se desvaloriza. As empresas precisam estar preparadas porque em 2008, quando o dólar subiu, houve riscos concretos para várias delas.

- As empresas precisam aproveitar este momento de dólar farto e barato para fazer investimentos. Mas isso não vai durar para sempre, é preciso cuidado com a alavancagem - disse Loes.

O que as consultorias e os departamentos econômicos dos bancos estão prevendo é um quarto trimestre mais forte do que o terceiro. Depois disso, um ano que vem mais fraco do que o atual, mas mesmo assim com um ritmo bom de crescimento. Na verdade, muitos analistas têm o hábito de projetar o futuro como igual ao presente, com pequenas mudanças. Há muitas incertezas na situação da Europa. Se ela se complicar, o mundo pode entrar num quadro bem mais difícil de administrar, e isso atinge o Brasil. Mas, por enquanto, os analistas olham para o ano que vem e projetam crescimento entre 4% e 4,5%, o que é um bom ritmo, apesar de menor do que o de 2010.

- O risco é saber como a demanda vai se comportar com as restrições de crédito - diz Sérgio Valle, da MB Associados.

Ele acha que no começo de 2011 a indústria poderá ter taxas negativas, pela base de comparação. A indústria, como se viu neste terceiro trimestre, encolheu, no meio do crescimento do PIB, porque a alta do consumo foi em parte atendida pelas importações. Sem nenhuma reforma que a ajude a superar o diferencial de competitividade e com o câmbio baixo, a indústria continuará sendo o mais fraco dos setores. Além disso, há problema até de medidas.

- É difícil saber como estão os estoques industriais, há muita imprecisão. As importações estão muito fortes, suprindo parte da demanda. A tendência em 2011 é não termos crescimento tão forte do consumo interno - disse Felipe Salles, do Itaú Unibanco.

O economista Marcelo Varejão, da Socopa Corretora, acha que o comércio vai continuar aquecido, puxado pelos três itens que ficarão de pé: crédito, renda e nível de emprego. Ainda que o ritmo de expansão de cada item seja mais fraco do que foi em 2010.

A mineração vai continuar indo bem porque a demanda da China permanecerá e não há projetos importantes de expansão da oferta que possa afetar os preços. Ainda que, contraditoriamente, ele ache que para o aço, feito com minério, o cenário não é animador porque continua o excedente de produção mundial. Na construção civil, apesar de admitir que há um grande aumento de preços dos terrenos nas grandes cidades, Varejão não vê riscos de bolha. Mesmo assim, considera que o cenário é mais contido para 2011.

Fábio Silveira, da RC Consultores, acha que uma das razões da redução do ritmo de crescimento do PIB é que este ano os juros reais foram de 3,2% e no ano que vem eles serão maiores:

- Projetamos juros reais de 6,9%. A inflação começará a cair no segundo semestre e a Selic será maior.

Ele acha que juros maiores e as restrições do crédito farão com que o consumo cresça menos, o que afetará a produção industrial:

- A massa salarial vai desacelerar de 7,5%, este ano, para 2,8%, ano que vem. Já o varejo, de 11% para 6,5%.

A agricultura também terá crescimento menor em 2011, segundo projeções tanto da RC Consultores quanto da MB Associados. A MB está mais pessimista. Mas as razões são quebras de safra que já aconteceram, como na soja e no milho; além de ser o ano de safra menor no café. A cana-de-açúcar também crescerá menos. Sobre a redução geral do ritmo, Silveira acha que isso reduzirá desequilíbrios:

- Já há gargalos até na iniciativa privada. Celulares tendo dificuldade para pegar em algumas áreas, falta de equipamentos para instalação de TV por assinatura, problemas com conexão para internet. Do ponto de vista logístico, fila de navios em portos, aeroportos lotados.

É cedo ainda para dizer, porque na mudança de governo há muitas incertezas e no cenário internacional, também. Mas já se pode afirmar que no primeiro ano do governo Dilma o Brasil vai crescer menos que este ano, porém mais do que no primeiro ano do governo Lula.

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