sábado, 13 de dezembro de 2025

Opinião do dia - Luiz Werneck Vianna*

“O sucesso da democracia nas urnas, importante como foi, não ocultou uma forte presença das forças antagonistas que, derrotadas, se insurgem em movimentações consertadas a fim de tentar subverter a ordem sob o pretexto de que teria havido fraude no processo eleitoral num arremedo farsesco das táticas de Trump. O verdadeiro legado de Bolsonaro foi, como se constata, deixar em sua esteira uma extrema-direita orientada a embaraçar os caminhos da restauração democrática, objetivo principal do novo governo Lula-Alckmin, que também enfrenta os desafios de animar uma sociedade desorganizada conscientemente pelas práticas do governo Bolsonaro em seus quatro anos de mandato.

Tal tarefa ainda se faz mais difícil em razão dos partidos terem subestimado sua radicação no mundo popular que ficou sob a influência dos pentecostais e de sua canhestra ideologia da prosperidade, cenário agravado pela condenação por parte da hierarquia da Igreja católica da teologia da libertação com que seus intelectuais tentavam se comunicar com os seres subalternos. Os efeitos nefastos dessas orientações produziram uma limpeza de terreno favorável a destituição da política e à difusão de valores antidemocráticos nesses setores.

Tal desertificação da política, contudo, tem remédio já conhecido, uma ida ao povo por parte de seus políticos e intelectuais, uma medicação de uso continuado a demandar tempo na sua aplicação. Em nossa desastrada experiência republicana já fizemos uso dessa recomendação, e já está passando da hora o momento de aprendermos as boas lições do nosso passado.”

*Luiz Werneck Vianna (1938-2024), Sociólogo, “Bons remédios não se esquecem”. Blog Democracia Política e novo Reformismo, 7/12/22.  

 

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Inimigos do povo

Por CartaCapital

O Parlamento se firma como o covil do golpismo

Irritado com a repercussão nas redes e fora delas da expressão “Congresso, inimigo do povo”, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, ordenou à polícia legislativa a investigação do que considera um “ataque” ao Parlamento. Pai, mãe, padastro e padrinho do orçamento secreto, Alcolumbre não consegue largar o vício do poder acumulado pelo Legislativo durante o período em que o Brasil tinha na Presidência da República um cidadão que abandonou os afazeres do cargo para se dedicar exclusivamente ao planejamento de um golpe de Estado. O amapaense recorre a um subterfúgio típico: agressor, posa de agredido e atribui aos outros o seu comportamento autoritário. Na Câmara, Hugo Motta igualmente se faz de ofendido, embora com menos brio e altivez. E vale-se da truculência e da censura contra aqueles que denunciam suas manobras.

Constranger, reagir, enfrentar. Por Flávia Oliveira

O Globo

Inconformismo, em vez de resignação; empenho, em vez de omissão; ação, em vez de passividade

Nesta semana, a polícia do Rio de Janeiro voltou ao Complexo do Salgueiro, na Região Metropolitana, em mais um capítulo da política de enfrentamento ao Comando Vermelho. Cerca de mil agentes participaram de nova etapa da Operação Contenção, a mesma que, em fins de outubro, deixou 117 civis e cinco agentes mortos nas regiões do Alemão e da Penha, Zona Norte da capital. Cinco anos atrás, uma mal explicada incursão de policiais civis e federais no mesmo conjunto de favelas de São Gonçalo tirou a vida do adolescente João Pedro Mattos Pinto, aos 14 anos. O assassinato dentro da casa de parentes, em plena pandemia da Covid-19, levou o ministro Edson Fachin, hoje presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), a proibir operações em comunidades durante a crise sanitária.

Desordem e progressão. Por Eduardo Affonso

O Globo

Os que roubaram os pensionistas do INSS logo estarão soltos (isso se um dia chegarem a ser presos). Idem para o político corrupto

A palavra do ano, para a equipe do dicionário Cambridge, foi parassocial (aquela sensação de intimidade — não recíproca — com figuras públicas). O Oxford veio de rage bait (conteúdo criado para gerar engajamento na força do ódio). No Brasil, segundo a consultoria Cause e o instituto de pesquisa Ideia, foi “incerteza”. Eu teria votado em “progressão”, com novo sentido, o de retrocesso.

Na cadeia, progressão é o regime que permite ao condenado cumprir apenas 1/6 da pena. Na escola, o que empurra o aluno adiante, mesmo que ele não tenha aprendido nada. É o Estado não educando no sistema educacional nem reeducando no sistema penitenciário. A aposta é que o aluno incapaz de entender a tabuada do 2 se recupere magicamente mais tarde, quando chegar à tabuada do 7. Que o criminoso adquira, na rua, os princípios morais que lhe faltavam antes do curto estágio de confinamento.

O dever moral do ministro Alexandre de Moraes. Por Thaís Oyama

O Globo

Situação revelada por colunistas do GLOBO, embora lícita do ponto de vista legal, abre amplo espaço para discussão

Foi com um silêncio olímpico que o ministro do STF Alexandre de Moraes reagiu a três recentes revelações da imprensa envolvendo seu nome. A primeira, feita pelo colunista do GLOBO Lauro Jardim, mostrava que, entre os documentos recolhidos pela polícia na operação que prendeu o banqueiro Daniel Vorcaro, estava um contrato firmado entre o agora liquidado e suspeito de transações fraudulentas Banco Master e o escritório comandado pela mulher do magistrado, a advogada Viviane Barci de Moraes, em sociedade com filhos do casal. A segunda revelação, esta feita pela colunista Malu Gaspar, também do GLOBO, foi que o contrato em questão atingia uma cifra astronômica, em torno de R$ 130 milhões — número nunca antes visto, nem mesmo no firmamento dos escritórios mais estrelados do país (um dos maiores valores conhecidos até hoje era o contrato estimado em R$ 60 milhões entre o falecido Márcio Thomaz Bastos e as empreiteiras Odebrecht e Camargo Corrêa na Lava-Jato). A terceira notícia, também dada por Malu Gaspar, é sobre o tipo de serviço que o escritório Barci de Moraes se dispôs a prestar ao Master.

O juiz venceu. Por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Ainda que anestesiado pelo ritmo dos despachos em Brasília, operações a cada lance mais criativas-ousadas, o cronista peleja para não se acomodar ante as notícias recentes que comunicam – como se prática natural – acordos políticos firmados entre ministro do STF e os donos do Senado; de repente admitido que uma ADPF possa ser instrumentalizada, ademais cassando um direito político, para forçar que o Congresso, submetido, reforme a lei nos termos das “orientações” do juiz-parlamentar.

Não faltaria ao rito viciado a corrupção da palavra, de modo que o juiz que legisla, na verdade, orienta. O juiz venceu. Jogou e venceu. Sem surpresas. O Judiciário brasileiro – para prazer do Direito Xandônico – é o mais forte do mundo. (Venceu a Magnitsky!)

No fundo do poço, outro poço. Por Roberto Amaral*

“Cuidemos. A República pode afundar.”
 Manuel Domingos Neto

Sinal dos tristes tempos: devemos comemorar a suspensão por seis meses do mandato do deputado Glauber Braga, decretada pelo plenário da Câmara Federal na última quarta-feira (10/12/2025). No dia anterior, por ordem do presidente da Casa, ele fôra agredido por gendarmes da polícia legislativa.

As hosanas são justificadas porque o corretivo previamente decidido pela direita era a pura e simples cassação do mandato do parlamentar fluminense, cumulada com oito anos de inelegibilidade — sua virtual expulsão da vida pública, que ele tanto dignifica. Antes disso, pelas artes e sortilégios  de Artur Lira – dublê de capo e feiticeiro –, Glauber era submetido ao Conselho de Ética. Nada ouviu ali que merecesse ser tomado como acusação séria, mas teve a perda do mandato indicada. A espada de Dâmocles pesa sobre sua cabeça desde março.

O ritual das candidaturas. Por André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

Neste final de 2025, a questão sucessória já se impõe no horizonte dos atuais líderes políticos brasileiros. Todos tentam alcançar o melhor lugar para sensibilizar o eleitor

A crise do sistema democrático acontece, normalmente, nos pródromos da eleição presidencial. É o período em que os sinais da tensão originária pela substituição no poder começam a tomar conta do cenário político. Neste final de 2025, a questão sucessória já se impõe no horizonte dos atuais líderes políticos brasileiros. O presidente Lula trabalha com um olho na administração diária e outro travado na eleição de 2026, quando ele tentará o quarto mandato. As rebeliões, os projetos, os discursos e as reviravoltas acontecem em torno da dança da sucessão. Todos tentam alcançar o melhor lugar para sensibilizar o eleitor.

A baderna da Câmara dos Deputados. Por Juliana Diniz

O Povo (CE)

Jornalistas e toda imprensa tiveram o acesso negado ao recinto, um episódio também sem precedente, e extremamente preocupante

A semana da Câmara dos Deputados proporcionou um teste difícil até para o mais otimista dos cidadãos. Como disse o deputado Arthur Lira: a Casa virou uma grande esculhambação. Entre os feitos, destaco a aprovação do PL da Dosimetria, que reduz as penas dos condenados pela tentativa de golpe de estado, e a liberação de Carla Zambelli da cassação, mesmo após ter sido condenada com trânsito em julgado e presa na Itália, à espera de extradição.

Meu estimado bandido. Por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Acordo na Câmara tem a ver com emendas e campanha presidencial

Jogados aos leões, Glauber Braga e Carla Zambelli salvaram-se

Os embalos na Câmara são um primor de organização e não acontecem ao acaso ou de surpresa, como se quer dar a entender. Deles fica de fora a plebe ignara, pobres mortais que, por não terem pulseirinha vip, jamais poderiam se misturar com a nata em ambiente tão fino e conservador.

A coisa é preparada nos mínimos detalhes para se precipitar no momento oportuno, a tradição obrigando que o clímax seja atingido na alta madrugada. A sessão que aprovou o PL da Dosimetria, que reduz a pena de Bolsonaro e outros golpistas, terminou às quatro da manhã de quarta (10), um mês após a condenação do ex-presidente no STF.

Tarcísio, o leal. Por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Bolsonaristas radicais não gostam do governador, mas ele esteve ao lado do ex-presidente nos momentos mais críticos

Jair retribuiu indicando Flávio para concorrer à Presidência; após três dias, Tarcísio quebrou o silêncio e falou em outras candidaturas

Tarcísio de Freitas não agrada bolsonaristas radicais. Não se sabe por qual motivo: se porque o governador come com garfo e faca, frequenta reuniões na Faria Lima ou visita gabinetes do Supremo Tribunal Federal (ou todas as opções).

Eles alegam que o governador de São Paulo não é leal a Jair Bolsonaro. Nos momentos mais críticos, porém, ele esteve, sim, ao lado do ex-presidente —por lealdade genuína ou cálculo político.

Código de conduta é antídoto contra fragilização do Judiciário. Por Oscar Vilhena Vieira

Folha de S. Paulo

Medida contribui para preservar a confiança dos cidadãos nos juízes e tribunais

Edson Fachin acerta ao buscar fortalecer independência, imparcialidade e integridade da Justiça

A Justiça brasileira se beneficiaria muito com a adoção de um código de conduta. A autoridade da Justiça deriva de sua capacidade de aplicar a lei com independência, imparcialidade, consistência, integridade e em prazo razoável. Quando o comportamento dos magistrados compromete a reputação dos tribunais, a autoridade da Justiça declina e cresce a disposição para desrespeitar suas decisões ou mesmo afrontá-las.

A Justiça brasileira desempenhou e desempenha um papel fundamental na defesa da democracia. Num mundo marcado por crescentes ataques às instituições constitucionais, a postura do Judiciário brasileiro tem se demonstrado um indispensável ativo democrático. Mas isso não é suficiente para garantir sua autoridade.

Precisamos falar sobre Hugo Motta. Por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Jovem presidente da Câmara dos Deputados vai acumulando erros em ritmo impressionante

Inexperiência explica apenas parte dos equívocos cometidos ao longo do mandato

A inexperiência é o único defeito que não piora com a idade. Devemos, então, concluir que há esperança para Hugo Motta, o jovem presidente da Câmara que vem metendo os pés pelas mãos num ritmo que surpreende até seus padrinhos políticos?

Só nesta semana ele cometeu dois lapsos graves. Preocupado em não reeditar a frouxidão com que lidou com o motim de parlamentares bolsonaristas em agosto, resolveu enfrentar a rebelião do deputado Glauber Braga com firmeza. Mandou suspender a transmissão ao vivo da sessão —o equivalente legislativo do policial desligando a câmara corporal—, retirou a imprensa do plenário e soltou a Polícia Legislativa em cima dos insurgentes. Os agentes da ordem não foram delicados nem urbanos.

Vacina contra o autoritarismo. Por Cláudio Couto

CartaCapital

Não é razoável imaginar que apenas 21 senadores possam afastar um ministro do STF. Gilmar Mendes tem boas razões para querer proteger a Corte do constante assédio da extrema-direita

Uma nova crise na relação entre os poderes se abriu com a recente decisão, do ministro Gilmar Mendes, de declarar inconstitucionais trechos da Lei do Impeachment de 1950 referentes à cassação de ministros do Supremo Tribunal Federal. A decisão respondeu à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) proposta pelo partido Solidariedade e pela Associação dos Magistrados Brasileiros.

A ética e o STF. Por Aldo Fornazieri

CartaCapital

Se exigem que o cidadão comum cumpra a lei, os magistrados devem ser os primeiros a fazê-lo de forma exemplar

Péricles (495–425 a.C.) foi o mais importante governante da Atenas Clássica e o maior símbolo da democracia antiga. Administrou a cidade por 30 anos, eleito anualmente. Era muito rico, mas lutava contra a aristocracia. Não se trata de listar suas reformas, sempre voltadas a ampliar a democracia. Péricles foi um líder inspirador, que governou pelo exemplo, com grandeza moral incomparável, impulsionando o povo e seus seguidores a uma vida politicamente engajada. Adquiriu, com mérito, a fama de incorruptível.

Papai Estado. Por Luiz Gonzaga Belluzzo e Nathan Caixeta

CartaCapital

Nas crises bancárias, há quem sempre queira trocar a mão invisível do mercado pelo colo seguro do Leviatã

O desfecho do episódio iniciado pela identificação de fraudes e de prejuízos bilionários nas demonstrações contábeis do Banco Master (e fora delas) permanece um mistério para os interessados no espólio dos ativos da instituição. O que nos parece certeiro e registrado nas histórias do capitalismo é a inevitável intervenção do Estado, quando o mercado, livre, leve e solto, apronta suas trapalhadas. O noticiário e as análises midiáticas em torno do tema correm para particularizar as culpas, na tentativa de salvar a reputação da mão boba e invisível do mercado.

Evolução harmônica. Por Cristovam Buarque

Veja

É preciso entender o mundo como uma coisa só

Nesta semana, a UnB comemorou trinta anos do Centro para o Desenvolvimento Sustentável (CDS). Quando concebido, em 1990, e quando criado, em 1995, mesmo ano da COP1, em Berlim, o CDS apresentava duas ousadias: do ponto de vista da estrutura universitária, adotava o estudo multidisciplinar, fora dos departamentos especializados por categoria do conhecimento; e do ponto de vista da concepção de progresso, adotava a crítica ao desenvolvimento baseado no crescimento econômico. Passados trinta anos, a própria ideia de desenvolvimento sustentável está em crise. Os conceitos de “desenvolvimento” e de “sustentabilidade” deixaram de indicar rumo desejável para o progresso. Apesar do sucesso de centenas de egressos de cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior, surgiu a ideia de o CDS se transformar em um Centro para a Evolução Harmônica da humanidade — entre os seres humanos, e deles com a natureza e seus povos.

O desafio maior: a guerra que não pode ser perdida. Por Marcus Pestana

2026, ano de eleições gerais. Momento de reavaliar a trajetórias e fazer escolhas. Os especialistas em pesquisas de opinião e marketing político já construíram um certo consenso de que o tema central será segurança pública. O crescimento do crime organizado realmente assusta e mobiliza corações e mentes. A sensação de insegurança é real e pode predominar na formação da decisão de voto dos brasileiros.  Mas a agenda de desafios brasileiros é muito mais ampla.

Poesia | O açúcar, Ferreira Gullar

 

Música | Roberta Sá - Casa Pré-Fabricada