quarta-feira, 20 de novembro de 2019

O que a mídia pensa – Editoriais

Sinistro amazônico – Editorial | Folha de S. Paulo

Impossível não associar a alta do desmatamento a atos e omissões de Bolsonaro

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, como de hábito tenta isentar o governo Jair Bolsonaro de responsabilidade pelo aumento de 29,5% na área de floresta amazônica que sofreu corte raso entre agosto de 2018 e julho de 2019. Esforço fútil e inútil.

Verdade que o desmatamento não começou a recrudescer apenas sob Bolsonaro. Desde 2013 observa-se tendência de alta, que se deve atribuir, portanto, a Dilma Rousseff (PT) e a Michel Temer (MDB).

Não resta dúvida, porém, de que a política de Bolsonaro, ou a falta dela, contribuíram e muito para “potencializar” (como disse o próprio presidente) esse processo nefasto.

No período 2018-19, sofreram derrubada 9.762 km² (cerca de seis vezes a área da cidade de São Paulo)de floresta. Nos 12 meses anteriores, haviam sido 7.536 km², diferença que corresponde à taxa de 29,5% de aumento —a maior em 11 anos.


Só sete meses desse calendário da destruição coincidem com o atual governo, de fato. Durante os três meses da campanha eleitoral, quando o futuro presidente não economizou discursos em desfavor da Amazônia, a alta do desmate foi ainda maior, ao ritmo de 49%.

Segundo dados preliminares do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), de janeiro a outubro de 2019 caíram 8.300 km² de mata amazônica, 70% mais que no mesmo período do ano anterior. Nessa toada, a taxa anual de 2019-20 poderá ultrapassar 12 mil km².

Já no Planalto, Bolsonaro não se limitou a ataques retóricos contra a proteção da Amazônia. Enquanto vociferava em defesa da soberania sobre a maior floresta tropical do mundo, aprofundava a destruição —incentivando garimpeiros, esvaziando o Ibama, intervindo no Inpe, menosprezando queimadas.

Acima de tudo está o fato de que Salles até hoje não apresentou política ou programa consequente para enfrentar a situação dramática. Sua medida mais proeminente foi inviabilizar o Fundo Amazônia, subtraindo doações internacionais que financiavam projetos de alternativa à destruição.

Os ventos que Bolsonaro e Salles semearam resultam agora na colheita de tempestade dupla. Primeiro, o país não logrará cumprir metas de redução do desmate assumidas no Acordo de Paris, deixando de dar sua contribuição para mitigar a crise do clima planetário.

Pior, surgem sinais de que o rastilho de ressecamento da Amazônia já se acendeu na sua porção sudeste, não por acaso a que abriga o chamado Arco do Desflorestamento. A prosseguir o fenômeno batizado como “savanização”, agronegócio e hidrelétricas sofrerão perdas com a redução de chuvas.

Sim, a Amazônia é nossa —mas não deveria ser para devastar como se não houvesse amanhã.

O PT mais PT do que nunca – Editorial | O Estado de S. Paulo

Lula da Silva deu a ordem: nada de “autocrítica” no PT. Ou seja, o partido nem se dará ao trabalho de fingir que tem consciência dos inúmeros desastres – e crimes – que protagonizou nos últimos anos e, desse modo, enganar os incautos a respeito de uma suposta regeneração.

Melhor assim. “Autocrítica”, no léxico da esquerda autoritária, é um processo que em nada se assemelha a um exame de consciência, na busca honesta da identificação de erros e acertos. Trata-se, na verdade, de uma farsa montada para reafirmar os objetivos centrais do partido e castigar os que se atrevem a contestá-los.

Lula da Silva está tão seguro de sua liderança despótica no PT que dispensou até mesmo a empulhação de uma “autocrítica”. Ele concentra poderes tais que pouca gente hoje no PT é capaz de sugerir qualquer mudança de rota para recuperar um pouco da imagem do partido, destroçada depois de anos de desmandos, corrupção e incompetência administrativa. Isso já era claro antes de Lula da Silva ser preso por corrupção e lavagem de dinheiro, mas a cadeia serviu para levar ao clímax a narrativa martirológica que pretende elevar o chefão petista à categoria de divindade – e palavra de “deus” é mandamento.

Munido de tais poderes, Lula da Silva, falando aos devotos em sua primeira “atividade partidária” depois de ser solto, conforme a descreveram os órgãos do PT, determinou que o partido tem que ser “mais unido” e “mais disposto a brigar”. Dizendo que “tem companheiro do PT que fala que tem que fazer autocrítica”, Lula afirmou: “Será que os petistas que dizem que o PT deve fazer autocrítica têm consciência que nós conseguimos criar o maior partido da América Latina?”. Trata-se de uma clara advertência aos que ousarem criticá-lo.

Lula da Silva não está preocupado nem mesmo em parecer democrático. Sem esperar as resoluções do congresso do partido que se realizará nos próximos dias, o demiurgo de Garanhuns já determinou que o PT lance candidaturas “em todas as cidades que for possível” nas eleições para prefeito no ano que vem, pois “o PT não nasceu para ser partido de apoio”. Nisso também não há nenhuma novidade, pois o PT nunca admitiu abrir mão do protagonismo nas alianças eleitorais que montou ao longo de sua história. De tempos em tempos, os petistas até discutem a possibilidade de serem coadjuvantes em alguns palanques, dando espaço para partidos aliados e para o surgimento de novas lideranças no “campo progressista”, mas no fundo todos sabem que se trata de fingimento: no frigir dos ovos, a decisão sobre a formação de chapas cabe exclusivamente ao dono do partido, Lula da Silva.

Assim, o líder petista interditou qualquer possibilidade de transformar o PT num partido genuinamente interessado em fazer oposição democrática ao atual governo, nem tampouco, caso volte à Presidência da República, em governar disposto a dividir o poder e a respeitar a oposição. “O PT polarizou em todas as eleições e vai continuar polarizando”, anunciou Lula da Silva, relembrando, a quem interessar possa, que essa é a natureza petista.

É lamentável que o maior partido da oposição seja movido por esse discurso raivoso, que ajuda a manter o País prisioneiro de um insuperável antagonismo, que em nada colabora para a resolução dos graves problemas nacionais. Ao contrário, drena as energias políticas necessárias para articular saídas duradouras para a crise – cuja gênese, sempre é bom lembrar, está na desastrosa passagem do PT pelo Palácio do Planalto.

Quem pagou e continua a pagar a parte mais salgada da conta por essa situação são os mais pobres, justamente aqueles que o PT diz proteger. Se estivesse honestamente interessado em ajudar essa população vulnerável, o PT reconheceria que não é possível fazer justiça social dilapidando os cofres públicos, que governantes petistas erraram ao transformar a irresponsabilidade fiscal em política de Estado e, finalmente, que o partido institucionalizou a corrupção como ferramenta para se manter no poder. Ao fazer isso, o PT se apresentaria como partido democrático de fato, disposto a aceitar como legítimos outros projetos para o País. Mas aí então esse não seria o PT de Lula da Silva, um partido que só existe para sustentar o ego de um político que se julga acima da lei.

Desmatamento confronta Bolsonaro – Editorial | O Globo

Os alertas feitos pelo Inpe, e que levaram o presidente a destituir o diretor do instituto, são confirmados

De vido ao discurso anti preserva cio ni sta da campanha, Jair Bolsonaro assumiu sob aplausos de desmatadores e garimpeiros ilegais. Estes seriam saudados mais tarde em um inédito minicomício presidencial às portas do Planalto.

Para reafirmar sua defesa da liberação do avanço sem controle de agricultores, pecuaristas e mineradores desprovidos de qualquer consciência ambiental, o presidente Bolsonaro, ao lado do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, logo atacou o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), de reputação mundial, forçando o afastamento do seu comando do cientista Ricardo Galvão.

Foi claro ao demonstrar desconfiança nos dados captados e analisados pelo Inpe,colh idos por satélites, sobre a destruição da Amazônia. Salles chegou afalar na contratação de algum serviço privado.

O governo trocou Galvão por Darcton Policarpo Damião, com passagem pelo Inpe, e os dados divulgados segunda-feira pela instituição confirmaram o cenário de destruição detectado pelo instituto e que tanto irritara a dupla Bolsonaro-Salles. Reafirma-se a verdade de que não adianta culpar o mensageiro pelas más notícias.

De acordo com o sistema Prodes, do Inpe, que vigia a Amazônia do espaço, de agosto de 2018 a 31 de julho último foram perdidos 9.762 quilômetros quadrados de floresta, um aumento de 29,5% em relação ao período anterior.

Só não superou 1998, em que o desmatamento cresceu 31%. Como são grandes as dimensões amazônicas, os 9,7 mil quilômetros devastados de meados de 2018 ao fim de julho equivalem a mais de seis vezes o tamanho da cidade do São Paulo, a maior do país.

Salles, que divulgou os dados, teve de reconhecer a expansão do desmatamento e chegou a admitir que poderá ser pedida mais uma vez a atuação das Forças Armadas na região. Isso foi feito no pico de queimadas e deu certo.
Disse estar na sua agenda a reativação do Fundo Amazônia, em que há R$ 3,4 bilhões doados pela Noruega e Alemanha, que recuaram diante da tentativa do governo de intervir no próprio fundo.

Nestes quase 11 meses de poder, o governo Bolsonaro perdeu qualquer nesga de credibilidade que pudesse ter em promessas de alguma política ambiental consequente.

A imagem criada pela pressão sobre os sistemas de controle e vigilância no Ibama e ICMBio, por exemplo, exercida por Salles, é mais forte do que qualquer declaração pré-fabricada.

É provável que o Brasil, por tudo o que tem acontecido, seja novamente atingido por críticas de outros países. O espaço para isso poderá ser a próxima Conferência do Clima, a COP-25, agendada para Madri, no mês que vem.

Sem acordo para eleições, Bolívia tende ao caos – Editorial | Valor Econômico

Forças contrárias impulsionam o governo transitório. Jeanine dá salvo conduto aos militares para reprimir partidários de Morales

Após a renúncia do presidente boliviano Evo Morales e de seu asilo no México, o número de mortos em manifestações chegou a 23 - e a conta está aumentando. O trôpego governo interino, que não pode se legitimar porque tanto a saída de Morales quanto a escolha de seu substituto teriam de ser aprovadas pelo Congresso - no qual o Movimento ao Socialismo (MAS), do ex-presidente, tem peso decisivo - emite sinais errados, que tendem a ampliar a discórdia política, e não a atenuá-la, e abrir espaço a novas eleições.

A autoproclamada presidente, a senadora conservadora Jeanine Añez, deu licença aberta para que militares usem de todos os meios disponíveis para reprimir movimentos contra o governo. O drama dos últimos dias, além da impossibilidade de reunir o Congresso e da ausência de titulares constitucionalmente legítimos para governar, gira em torno de Morales, que continua sendo um político muito popular, com amplo apoio dos indígenas e dos sindicatos de cocaleros, especialmente em Cochabamba, seu reduto. Lá, na sexta-feira, a polícia matou 9 manifestantes.


A força do MAS é declinante, assim como a de Evo Morales, mas está longe da irrelevância - mantém-se como a principal força política do país. Nas eleições de 20 de outubro, quando fraudes foram detectadas, o MAS obteve a metade das cadeiras do Senado (18) e ficou um pouco abaixo da maioria na Câmara - 64 de 130 deputados. No Congresso anterior, dominava dois terços de ambas as Casas.
Com esse peso nas decisões, o MAS terá de ser trazido à mesa de negociações, não com balas, mas com um diálogo aberto, multipartidário, sob pena de uma crise permanente. Mas Morales contribui abertamente para incendiar os ânimos. O ex-presidente disse que tinha renunciado para evitar a violência contra seu povo, deixando explícito que tinha sido vítima de um golpe e implícito que nada fizera de errado. Em entrevistas no México, tem afirmado que seu desejo é voltar à Bolívia - o quanto antes, melhor - e que o governo atual é ilegítimo, em um chamamento claro à resistência de seus partidários.

Entre os graves problemas de agora estão não só a convocação de novas eleições - um tribunal eleitoral precisa ser escolhido -, mas também a de quem poderá concorrer. Morales ignorou um referendo que rejeitou por maioria de 51% lhe dar uma nova chance de permanecer na Presidência. Ao recorrer a seus acólitos na Justiça, passou por cima da vontade popular expressa das urnas. Deixá-lo concorrer mais uma vez é voltar à situação inicial do conflito institucional, quando os partidos de oposição, como o Comunidade Cidadã, de Carlos Mesa, o segundo lugar no pleito, e líderes extremistas, como Luis Fernando Camacho, do movimento cívico de Santa Cruz de la Sierra, berço da oposição a Morales, promoveram protestos contra a manipulação de votos.

A vacância da Presidência e a renúncia de Morales acenderam a cobiça de políticos que antes sequer sonhavam em chegar ao Palácio Quemado. Jeanine Añez é uma senadora direitista inexpressiva, mas não é difícil imaginar que ao se assenhorar do poder queira obter prestígio e apoio político suficientes para disputar a nova eleição, se e quando ocorrer. Mais inquietante é a possibilidade de que Camacho, de extrema direita, queira ele também disputar o cargo.

Nenhum dos dois têm mais experiência e aprovação do que Carlos Mesa, que aguarda definições e defende que o MAS terá de fazer parte da única solução democrática para a crise, isto é, novas eleições, o mais rápido possível. Mesmo com todo o desgaste de 13 anos usufruindo do poder e apoiando Morales, o MAS ainda tem alguma chance de ganhar as eleições, se não for proscrito pelas forças conservadoras que se uniram ao governo provisório. A legenda tem, porém, a desvantagem comum aos movimentos que seguem líderes populistas. Evo não deixou sucessores com cacife suficiente para substituí-lo em uma disputa eleitoral.

Forças contrárias impulsionam o governo transitório. Jeanine prega eleições logo, mas dá salvo conduto aos militares para reprimir partidários de Morales e dá livre vazão a seus preconceitos, ao lado de ministros que veem nos bloqueios a influência diabólica da Venezuela e Cuba - senhas para no futuro banir o MAS do pleito.

Morales não aceita a derrota de seu projeto continuísta, o que impede o amplo acordo nacional, sem o qual as eleições não saem. Se o impasse persistir, a direita tentará governar com o apoio das baionetas - comum na história boliviana - garantindo novas convulsões futuras.

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