Novo marco do saneamento pode funcionar como um dos motores da expansão da economia pós-Covid-19
A sanção pelo presidente Bolsonaro do novo marco do saneamento básico não é uma ato meramente burocrático perdido no noticiário do drama de milhares de mortos pela Covid-19, milhões de desempregados e da crise política. Na verdade, trata-se de um fato que, em meio a todos os problemas, é parte de um conjunto de ações capazes de levar a melhorias substanciais em campos variados, na economia e na área social: saúde, educação, padrão de vida etc.
O chavão do “país dos contrastes” usado para qualificar o Brasil é muito verdadeiro quando se comparam os indicadores de saneamento — água de boa qualidade, coleta e tratamento de esgotos — com segmentos modernos do país. Indústrias de elevada tecnologia e instituições financeiras sofisticadas convivem com um sistema de água e esgoto em parte estacionado no século XIX, mesmo em grandes cidades. O país com uma das dez economias do mundo deixa 35 milhões de sua população (16,5% do total de 211 milhões) sem água tratada e 100 milhões (47%) sem coleta de esgoto.
Enfim, mudanças regulatórias necessárias para impulsionar a atividade foram aprovadas pelo Congresso e sancionadas, mesmo com muito atraso, devido a todo tipo de resistência política e corporativista surgida em torno das estatais que exploram mal o serviço, mas desejam manter este rentável cartório para funcionários das empresas e políticos que orbitam neste meio.
Um ponto central das novas regras é elevar a baixa participação de empresas privadas no saneamento, de apenas 6%, comprovadamente mais produtivas e eficientes que as estatais. Basta comparar a incapacidade da estatal Cedae de atender de forma aceitável a população fluminense com os índices de eficiência alcançados pela concessionária privada Águas de Niterói. A cidade vizinha ao Rio é a 18ª colocada no ranking dos cem melhores serviços de saneamento básico do país em 2020, do Instituto Trata Brasil. Já o Rio, do outro lado da Baía, quase todo atendido pela Cedae, está em 52º lugar.
O marco sancionado na quinta-feira estabelece que o poder concedente — as prefeituras, segundo interpretação da Constituição — precisa licitar as concessões. Assim, abre-se espaço para grupos privados ampliarem sua participação no setor. A possibilidade de as prefeituras poderem prorrogar por 30 anos contratos feitos com essas empresas foi vetada. Um veto acertado, pois obriga as licitações, embora possa criar dificuldades políticas à tramitação de outras mudanças necessárias, nos tributos, na organização da burocracia estatal etc. O essencial é que o novo marco do saneamento produza efeitos o mais rapidamente possível.
A nova regulação é uma forte alavanca de ativação de investimentos bilionários, a fim de que sejam atingidas as metas definidas para 2033: 99% da população terão de receber água tratada e 90% precisarão estar conectados à rede de esgoto. A empreitada necessitará de investimentos totais de meio trilhão de reais, capazes de criar milhares de empregos.
A economia recebeu o choque da epidemia da Covid-19 em baixo crescimento. O PIB deste ano deverá ter um encolhimento recorde, algo como 6%, pelas últimas projeções do mercado. A melhor forma de estimular a expansão e sustentá-la será por meio de investimentos, pois a impulsão via consumo gerado por medidas de emergência social tem um limite estabelecido pela sensatez fiscal. O novo marco do saneamento pode cumprir importante papel nesta retomada e na manutenção de um crescimento de longo prazo. Daí a pressa para que comece a ser aplicado
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