quarta-feira, 5 de março de 2025

Governo Trump volta a reclamar de tarifas altas no Brasil - Assis Moreira

Valor Econômico

‘Agenda de Política Comercial 2025’ de Trump enviada ao Congresso procura justificar seu unilateralismo

Acusa a OMC de ter sido ‘incapaz de reduzir disparidades e desequilibrios’ no comércio. Exemplifica comparando a tarifa consolidada nos EUA de 3,4% e a aplicada de 3,3% na média em 2023, enquanto no Brasil a consolidada era de 31,4% e a aplicada de 11,2%. Na India, a tarifa consolidada na OMC era de 50,6% e a aplicada de 17%. As alíquotas médias consolidadas e aplicadas da Coreia eram de 17,0% e 13,4%, respectivamente. Tarifa consolidada é o máximo que um país pode aplicar, pelos acordos na OMC.

‘Daqui para frente, os Estados Unidos tomarão medidas para criar a alavancagem necessária para reequilibrar nossas relações comerciais e transferir de volta a produção (hoje em outros países), inclusive, entre outros, por meio do uso de tarifas. Isso aumentará os salários e promoverá uma defesa nacional forte’, avisa o novo representante de Comércio dos EUA, Jamieson Greer.

Acrescenta: “Os Estados Unidos enfrentam desafios econômicos e de segurança nacional sem precedentes. O presidente Trump estabeleceu um plano para enfrentar esses desafios em seu Memorando Presidencial de Política Comercial America First. A agenda comercial de hoje apresenta o pensamento e a visão que sustentam esse plano. O momento atual exige ações para colocar os EUA em primeiro lugar no comércio, e a agenda comercial explica a importância da política comercial do presidente Trump para os trabalhadores e as empresas americanas.”

O governo Trump alega que grande parte do poder industrial do país foi transferido para o exterior e a inovação começou a partir também para o estrangeiro. Diz que os empregos no setor de manufatura nos EUA diminuíram de 17 milhões em 1993 para 12 milhões em 2016, mais de 100 mil fábricas fecharam entre 1997 e 2016, e o déficit na balança comercial de mercadorias subiu para mais de US$ 1 trilhão.

O culpado é claro, para o governo Trump: ‘‘Essas tendências são o produto de um ataque devastador de décadas das elites globalistas que adotaram políticas - inclusive políticas comerciais - com o objetivo de enriquecer às custas do povo trabalhador dos Estados Unidos. Como resultado, a classe média se atrofiou e nossa segurança nacional está à mercê de frágeis cadeias de suprimentos internacionais’.

O USTR avalia, evidentemente sem surpresa, que somente Trump reconheceu o papel que a política comercial desempenhou nessa situação e como a política comercial pode corrigi-la. E isso com o uso de tarifas contra os produtos estrangeiros como ‘ uma ferramenta legítima de política pública’.

‘Ele demonstrou a necessidade imperativa de uma fiscalização comercial rigorosa contra os países que acham que podem tirar vantagem dos EUA e sair impunes', diz o documento. 'Ele demonstrou que os EUA têm influência e podem negociar agressivamente para abrir mercados para as exportações Made in America, especialmente para as exportações agrícolas. Ele provou que uma política comercial robusta e realista pode criar empregos, promover a inovação, fortalecer a defesa nacional, aumentar os salários, apoiar os agricultores e promover o renascimento da manufatura que muitas elites há muito tempo pensavam ser impossível para os EUA’.

A ‘economia de produção’ é apresentada como um componente vital da defesa nacional dos EUA. Reclama que sua base de manufatura se atrofiou. Os EUA, que produziam menos de 14 mil aeronaves nas duas décadas anteriores à Segunda Guerra Mundial, chegaram a produzir 96 mil aviões por ano em 1944. Em comparação, hoje os EUA só conseguem produzir mensalmente cerca de um terço dos 360.000 projéteis de artilharia que os militares dizem precisar para deter os adversários. ‘A política comercial pode ajudar a fortalecer nossa base industrial de defesa’, acha o governo Trump.

O USTR diz que também identificará oportunidades para acordos plurilaterais bilaterais ou setoriais específicos que possam ser negociados para abrir novos acessos ao mercado para as exportações dos EUA e ‘reorientar o sistema comercial para promover a competitividade dos EUA’.

Foca nas relações comerciais com a China, ‘a maior fonte individual do grande e persistente déficit comercial do nosso país e um desafio econômico único’. Deixa claro que a pressão sobre os chineses será forte, sem surpresa.

‘Os Estados Unidos ainda são uma superpotência’, insiste o documento do governo Trump, acrescentando que “a partir deste momento, o declínio dos EUA acabou”.

O governo Trump analisa os efeitos dos acordo da OMC sobre os interesses dos EUA, além dos custos, benefícios e o valor da participação contínua na entidade. Reclama de ‘falhas sistêmicas persistentes’ na OMC e ‘intransigência de alguns membros’ que teriam impedido que os EUA obtivessem todos os benefícios previstos na criação da OMC.

Visando a China, diz que a OMC tem sido incapaz de lidar com políticas e práticas que não são de mercado, e também incapaz de fazer cumprir as regras acordadas, de reformar-se e ter negociações significativas – tudo isso, sem reconhecer o papel que os EUA exerceu para isso também.

O governo Trump sinaliza que sua paciencia está se esgotando, avisa que o cenário político, econômico e comercial em 2025 difere muito de antes e que continuará a buscar “novos caminhos”.

O unilateralismo e intimidação trumpista continuarão com toda a força, se é quem alguém tinha dúvidas. E os parceiros que se preparem para aceitar as exigências americanas ou sofrer retaliações.

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