quarta-feira, 5 de março de 2025

O dilema de Gleisi para desencarnar do PT - Vera Rosa

O Estado de S. Paulo

Centrão e mercado temem que ministra mantenha duelo com Haddad e endureça política do governo

O presidente Lula disse que sente saudade de Flávio Dino. Hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dino não deixava ataques sem resposta quando era titular da Justiça e fazia a disputa política com a oposição. Desde que foi alçado ao STF por decisão do próprio Lula, há um ano, o governo não tem mais quem vista tal figurino.

A escolhida para assumir esse papel, agora, é Gleisi Hoffmann. De saída da presidência do PT, a deputada tomará posse segunda-feira na Secretaria de Relações Institucionais, substituindo Alexandre Padilha, que comandará o Ministério da Saúde.

O que intriga o mundo político é como alguém com perfil de enfrentamento como Gleisi pode construir alianças para as eleições de 2026 e pontes com o Congresso.

“Preparem-se para morder a língua!”, disse o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), ao lembrar os acordos firmados por ela para a campanha de Lula, em 2022. “Gleisi sabe bem em que cadeira vai sentar.”

Mesmo assim, a dúvida do Centrão e do mercado persiste: ela vai desencarnar do papel de presidente do PT, cargo que exerceu por quase oito anos?

No comando do partido, Gleisi sempre foi a principal voz contra a política econômica do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Sob sua direção, por exemplo, o PT chamou o ajuste das contas públicas de “austericídio fiscal”.

O ex-prefeito de Araraquara Edinho Silva – cotado para presidir o PT a partir de julho – vai na direção oposta e prega uma correção de rota no partido. No diagnóstico de Edinho, o PT precisa ter uma estratégia para pôr fim à polarização no País.

A posição moderada do exprefeito, nome favorito de Lula para ocupar a vaga de Gleisi, é descrita por aliados da futura ministra como a defesa de um “PT sem dentes”. Mas, como tudo no Brasil começa depois do carnaval, há que se ver agora como Lula vai conduzir essa queda de braço nas fileiras do PT na segunda metade de seu mandato.

Além de fazer o papel de advogada da gestão Lula e negociar palanques com os partidos nos Estados para o projeto de reeleição do presidente, Gleisi também terá controle sobre a distribuição das emendas parlamentares. Não é pouca coisa.

Engana-se, porém, quem pensa que a ex-ministra da Casa Civil sob Dilma fará algo que Lula não queira. Não fez como presidente do PT, quando abriu fogo contra Haddad, e não será agora que agirá assim.

O estilo de Lula é o de estimular conflitos na equipe para dar a última palavra. Foi assim com José Dirceu e Antônio Palocci, está sendo com Rui Costa e Haddad e os próximos capítulos prometem fortes emoções. Nessa novela sem fim, Gleisi é a continuísta que tentará salvar a trama.

 

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