O Globo
Um freio de arrumação faria bem ao tribunal
Se o ministro Edson Fachin conseguir que seus
colegas aceitem se submeter a um código de conduta, terá marcado sua passagem
pela presidência do Supremo Tribunal Federal. Não será fácil.
Na semana em que o ministro Gilmar Mendes decidiu blindar os colegas, soube-se que seu colega Dias Toffoli foi ao Peru para assistir à final da Libertadores. Viajou no jatinho de um empresário, na companhia do advogado Augusto de Arruda Botelho, descendente do Barão do Pinhal, contratado por Luiz Antonio Bull, diretor de compliance do Banco Master. Quatro dias depois, o ministro baixou uma ordem de sigilo no processo e determinou que novas investigações devessem passar primeiro por seu crivo.
Daniel Vorcaro, o celebrizado dono do Master,
tinha um fraco por eventos, em especial os que patrocinava no exterior,
enfeitados por notáveis da República. O jatinho que levou Toffoli ao jogo de
futebol mostra que o banco acabou, mas seu estilo sobrevive.
Um código de conduta para ministros do Supremo
teria a virtude de servir de exemplo a outros magistrados, altos funcionários
do Executivo — e também para jornalistas.
Esse código cuidaria, por certo, de mimos
como o jatinho para Toffoli e de dois campos minados: as palestras e as farofas
no circuito Elizabeth Arden.
Ninguém pode impedir um magistrado de dar uma
palestra, até mesmo sobre a desdita do Palmeiras. Tudo ficaria mais claro se o
palestrante pusesse na internet quanto cobrou, onde falou e quem pagou.
O mesmo valeria para as farofas, incluindo a
origem do paganini do
transporte e da hospedagem. Essa regra é forte e não vigora para a Suprema
Corte americana. O genial ministro Antonin Scalia morreu em 2016 durante uma
farofa. Se o Tribunal brasileiro vier a adotá-la, livra-se de uma canga.
Registre-se que um número considerável de magistrados opera nesses limites.
Quando Toffoli faz uma das suas, destaca-se mais pela conduta e consegue uma
exposição que não é dada à qualidade de seus votos.
Acesso a ministros é coisa valiosa. Quando
ministro da Justiça, de 1937 a 1942, Francisco Campos via-se apoquentado por um
finório que insistia em convidá-lo para almoçar. Um dia aceitou, mas mandou o
ajudante de ordens.
A maioria dos ministros do Supremo fala
pouco, não embarca para farofas e seleciona suas palestras. Como selecioná-las?
Basta seguir a lição de Potter Stewart (1915-1985), da Suprema Corte dos
Estados Unidos:
— Não sei definir pornografia, mas, quando a
vejo, reconheço-a.
Seria saudável se o Supremo Tribunal
debatesse a própria blindagem com uma proposta de código de conduta. A
blindagem mostraria que só o procurador-geral pode abrir um processo de
impedimento de um ministro. Jogo ruim, mas seria jogo jogado. O código de
conduta informaria ao distinto público o que os ministros blindados se
comprometem a não fazer.
Pelo cheiro da brilhantina, a blindagem
prosperará. O código de conduta, quem sabe?

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