Tomara que a presidente Dilma Rousseff vá em frente e refaça de alto a baixo a política externa do governo Lula. Por enquanto só há um sinal de que ela poderá fazer isso – mas é um sinal forte, muito positivo. Trata-se do Irã.
Obviamente não se trata de dar lições de moral para ninguém, nem de dificultar o comércio bilateral, nem a cooperação em outras áreas de mútuo interesse. Mas a presidente brasileira precisa sinalizar claramente ao governo iraniano que manterá a devida em relação a seu programa nuclear.
Na questão dos direitos humanos, Dilma fez bem mais que sinalizar. Referindo-se à condenação de Sakineh à morte por apedrejamento, ela disse com todas as letras que não concorda com a política iraniana, que a considera medieval, e que não pretende respaldá-la em foros internacionais.
Neste assunto, está pois afastada a hipótese de continuidade com a política do governo Lula; aqui me refiro evidentemente à vergonhosa atitude assumida meses atrás pela diplomacia brasileira, abstendo-se de votar pela condenação da política de Teerã no âmbito da ONU.
Conquanto positivo, esse, no entanto, foi o único sinal emitido até agora pelo novo governo.
Não sabemos se Dilma tem intenção de rever também a decisão que Lula tomou no apagar das luzes a respeito do ex-terrorista italiano Cesare Battisti.
Levado presumivelmente por seu antigo viés esquerdóide, Lula recusou, como se sabe, a extradição solicitada pelo governo italiano. Lamentável por todos os títulos, tal decisão teve ainda o condão de deixar um ambiente incômodo para as primeiras discussões do governo Dilma sobre assuntos exteriores.
Salvo os pontos mencionados, o Brasil nada tem a ver com a política doméstica do Irã ou da Itália. Nada temos a opinar sobre os respectivos regimes e processos políticos internos. Com a óbvia ressalva do respeito à soberania, nossos deveres e interesses são maiores nos casos de Cuba e da Venezuela.
Em relação a Cuba, além da indispensável crítica ao regime por suas práticas no campo dos direitos humanos, o Brasil pode e deve exercer sua influência junto aos irmãos Castro, aconselhando-os fraternalmente a cair na real, coisa que deviam ter feito uns 20 ou 30 anos atrás, pelo menos.
É difícil crer que os dois e a nomenklatura local não tenham se dado conta de que o “socialismo realmente existente” acabou; e mais que isso, que a própria viabilidade econômica de Cuba em seu esplêndido isolamento socialista deixou de existir a partir do momento em que o país deixou de ser um client state da União Soviética.
Justo este mês, como se sabe, Cuba dá início a um ajuste fiscal de proporções verdadeiramente thatcherianas, demitindo 500 mil do total de 4 milhões de servidores públicos.
A Central dos Trabalhadores (leia-se o Partido Comunista) já assumiu seu previsível papel de enxergão, solicitando aos servidores toda a aquiescência possível para o bom andamento das medidas decretadas pelo governo.
Mas tal situação, convenhamos, resvala para o surrealismo. Soa estranha, com todo o respeito, a posição enunciada oficialmente pelo comandante Raúl Castro: a de que o mencionado ajuste é condição para os próximos passos de Cuba rumo ao socialismo.
Para concluir, duas palavras sobre a Venezuela.
No que interessa à diplomacia brasileira, poder-se-ia apontar uma semelhança de momento entre Venezuela e Cuba. Em ambos os casos, com cautela e equilíbrio, o Brasil pode desempenhar um papel indutivo, apoiando os respectivos governos e demais forças políticas na busca de um convívio verdadeiramente democrático.
Contudo, a semelhança apontada é superficial. Mais importante, neste momento, é o fosso que parece estar se aprofundando entre os dois países no que toca a suas respectivas conjunturas políticas.
Os governantes cubanos, como já se notou, estão dando início a uma dura reforma. Diga-se o que se disser, a posição deles não é de arrogância, é a de quem se vê forçado a fazer algo que de outra forma não faria.
Em Caracas, arrogância é o nome do jogo. Tão cedo, ao que tudo indica, Hugo Chávez não cairá na real. Suas medidas recentes – desde logo a imposição à Assembléia Nacional de uma lei que o habilita a governar por decreto pelos próximos 18 meses – representam um passo decidido e inequívoco no sentido da ditadura.
Por mais que anseie pela reintegração da Venezuela à comunidade latino-americana de nações democráticas, o que o Brasil tem a fazer de imediato é pois registrar esse aumento da distância política e de valores entre Caracas e Brasília.
A posição brasileira, cultural e constitucionalmente, é por uma democracia plural, na qual a separação entre os poderes e o respeito mútuo entre governo e oposição estejam inequivocamente configurados.
Obviamente não se trata de dar lições de moral para ninguém, nem de dificultar o comércio bilateral, nem a cooperação em outras áreas de mútuo interesse. Mas a presidente brasileira precisa sinalizar claramente ao governo iraniano que manterá a devida em relação a seu programa nuclear.
Na questão dos direitos humanos, Dilma fez bem mais que sinalizar. Referindo-se à condenação de Sakineh à morte por apedrejamento, ela disse com todas as letras que não concorda com a política iraniana, que a considera medieval, e que não pretende respaldá-la em foros internacionais.
Neste assunto, está pois afastada a hipótese de continuidade com a política do governo Lula; aqui me refiro evidentemente à vergonhosa atitude assumida meses atrás pela diplomacia brasileira, abstendo-se de votar pela condenação da política de Teerã no âmbito da ONU.
Conquanto positivo, esse, no entanto, foi o único sinal emitido até agora pelo novo governo.
Não sabemos se Dilma tem intenção de rever também a decisão que Lula tomou no apagar das luzes a respeito do ex-terrorista italiano Cesare Battisti.
Levado presumivelmente por seu antigo viés esquerdóide, Lula recusou, como se sabe, a extradição solicitada pelo governo italiano. Lamentável por todos os títulos, tal decisão teve ainda o condão de deixar um ambiente incômodo para as primeiras discussões do governo Dilma sobre assuntos exteriores.
Salvo os pontos mencionados, o Brasil nada tem a ver com a política doméstica do Irã ou da Itália. Nada temos a opinar sobre os respectivos regimes e processos políticos internos. Com a óbvia ressalva do respeito à soberania, nossos deveres e interesses são maiores nos casos de Cuba e da Venezuela.
Em relação a Cuba, além da indispensável crítica ao regime por suas práticas no campo dos direitos humanos, o Brasil pode e deve exercer sua influência junto aos irmãos Castro, aconselhando-os fraternalmente a cair na real, coisa que deviam ter feito uns 20 ou 30 anos atrás, pelo menos.
É difícil crer que os dois e a nomenklatura local não tenham se dado conta de que o “socialismo realmente existente” acabou; e mais que isso, que a própria viabilidade econômica de Cuba em seu esplêndido isolamento socialista deixou de existir a partir do momento em que o país deixou de ser um client state da União Soviética.
Justo este mês, como se sabe, Cuba dá início a um ajuste fiscal de proporções verdadeiramente thatcherianas, demitindo 500 mil do total de 4 milhões de servidores públicos.
A Central dos Trabalhadores (leia-se o Partido Comunista) já assumiu seu previsível papel de enxergão, solicitando aos servidores toda a aquiescência possível para o bom andamento das medidas decretadas pelo governo.
Mas tal situação, convenhamos, resvala para o surrealismo. Soa estranha, com todo o respeito, a posição enunciada oficialmente pelo comandante Raúl Castro: a de que o mencionado ajuste é condição para os próximos passos de Cuba rumo ao socialismo.
Para concluir, duas palavras sobre a Venezuela.
No que interessa à diplomacia brasileira, poder-se-ia apontar uma semelhança de momento entre Venezuela e Cuba. Em ambos os casos, com cautela e equilíbrio, o Brasil pode desempenhar um papel indutivo, apoiando os respectivos governos e demais forças políticas na busca de um convívio verdadeiramente democrático.
Contudo, a semelhança apontada é superficial. Mais importante, neste momento, é o fosso que parece estar se aprofundando entre os dois países no que toca a suas respectivas conjunturas políticas.
Os governantes cubanos, como já se notou, estão dando início a uma dura reforma. Diga-se o que se disser, a posição deles não é de arrogância, é a de quem se vê forçado a fazer algo que de outra forma não faria.
Em Caracas, arrogância é o nome do jogo. Tão cedo, ao que tudo indica, Hugo Chávez não cairá na real. Suas medidas recentes – desde logo a imposição à Assembléia Nacional de uma lei que o habilita a governar por decreto pelos próximos 18 meses – representam um passo decidido e inequívoco no sentido da ditadura.
Por mais que anseie pela reintegração da Venezuela à comunidade latino-americana de nações democráticas, o que o Brasil tem a fazer de imediato é pois registrar esse aumento da distância política e de valores entre Caracas e Brasília.
A posição brasileira, cultural e constitucionalmente, é por uma democracia plural, na qual a separação entre os poderes e o respeito mútuo entre governo e oposição estejam inequivocamente configurados.
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