terça-feira, 23 de dezembro de 2025

O Brasil de todos os escândalos. Por Fernando Gabeira

O Globo

O sigilo de cem anos é sempre o vencedor, pois está na mão do poder e é uma arma que desequilibra o jogo

No passado, creio, um escândalo esperava o outro antes de aparecer. Agora já não se respeita a fila. Eles aparecem a todo instante, se chocam, se encavalam um no outro, a gente precisa escolher o que vai acompanhar.

Quem os segue por dever profissional acaba se tornando graduado em escândalos. Um dos traços mais importantes aparece no caso do Banco Master. É um escândalo, sem dúvida. Mas, logo em seguida a sua aparição, surgem novos, típicos do Brasil: os escândalos do abafa.

No caso do Master, o escândalo foi continuado. Primeiro a explosão, depois a relação com ministros do Supremo e, finalmente, a decretação do sigilo numa tentativa de bloquear seu curso. O Supremo contribuiu com Toffoli, que nesse esporte joga em várias posições: sua mulher já foi sócia de advogados do Master, ele próprio viajou para Lima com um advogado do Master e finalmente assumiu o inquérito e decretou um pesado sigilo.

O contrato da mulher de Alexandre de Moraes com o Master é, se quiserem, outra forma de escândalo: R$3,6 milhões mensais para defender o Banco tão discretamente que ninguém consegue achar os processos em que ela atuou. E agora vem à tona que Moraes falou pelo menos quatro vezes com o presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, interessado no destino que seria dado ao banco.

Como se não bastasse, o Tribunal de Contas da União, por meio de um ministro que era deputado de Rondônia, acusa o BC de uma intervenção prematura na liquidação do Master. O ministro queria esperar que um número maior de investidores e entidades fossem lesadas.

O outro escândalo que está em cartaz, o roubo dos aposentados, tem característica distinta. É o escândalo vulcão. Passa umas semanas adormecido, de repente entra de novo em erupção. O filho do presidente é acusado de relações com a quadrilha e deve depor na CPMI.

A PF fez várias ações de busca e ficou mais ou menos claro o envolvimento do senador Weverton Rocha (PDT-MA). Ele é apontado como sócio oculto da quadrilha que roubava os velhinhos. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, decretou cem anos de sigilo nas informações sobre a visita do chefe da quadrilha ao Senado. Isso confirma de novo a lógica do escândalo à brasileira: depois da eclosão, o segundo e grande momento é o abafa.

Um dos funcionários de Weverton foi preso. Outro dia fizeram buscas na casa de uma funcionária do ex-presidente da Câmara Arthur Lira. Ele é citado 25 vezes no inquérito, mas a maneira como a investigação foi conduzida e divulgada dá a impressão de que a funcionária destinou irregularmente R$ 4 bilhões em emendas a seu bel-prazer e contemplou Alagoas só para fazer um agrado ao chefe.

A PF fez questão de afirmar, e a imprensa repete disciplinadamente: Lira não é investigado. No Brasil, a culpa é sempre do mordomo, outro importante ensinamento no curso avançado de escândalo.

Foi por denunciar Lira que o deputado Glauber Braga quase perdeu o mandato. É outro ensinamento que o curso de escândalo no Brasil reserva para o estudioso: ai de quem denunciar, certamente pagará caro pela ousadia.

Na política brasileira, ao lado das clássicas contradições, existe uma que nasce desse turbilhão de escândalos: transparência versus sigilo. O sigilo de cem anos é sempre o vencedor, pois está na mão do poder e é uma arma que desequilibra o jogo. Alguém segura a bola é diz: acabou o jogo, voltem no próximo século.

 

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