Era para ter sido uma manifestação em torno de novos hábitos de exercício da política e da gestão. O governador de Sergipe, Marcelo Déda, anfitrião da reunião do Fórum de Governadores do Nordeste, antes mesmo do encontro que ocorreu segunda-feira, estava rouco de tanto falar ao longo da semana preparatória sobre o caráter moderno dessa associação. No uso dos instrumentos de governo, na projeção do futuro, nas relações políticas, no respeito à vontade do eleitor, no melhor aproveitamento dos recursos, na transparência, nos métodos de inserção da região no desenvolvimento nacional.
O discurso anterior do anfitrião contrastou, porém, com o fato mais concreto que emergiu do fórum. Para administrar o país, concordaram os governadores - e era tudo o que a presidente Dilma queria ouvir - é preciso mais dinheiro, e a verba mais fácil continua sendo criar um novo imposto. Ou ressurreição de um imposto velho, como a CPMF, com o qual estavam todos familiarizados e cuja extinção, por obra da propaganda e do discurso eleitoral do ex-presidente Lula, acabou sendo perda e não ganho para o eleitor.
Assim, foi o apoio à recriação da CPMF, o imposto sobre o cheque que vigorou como provisório por cerca de 15 anos e, em boa hora, num momento de estrangulamento da capacidade de a classe média suportar ônus sem retorno, o Congresso extinguiu, que apareceu desse encontro, fazendo submergir as modernas intenções de uma gestão de respeito.
Exclusividade da ECT no envio de contas é anacrônica
Marcelo Déda havia exposto traços de um claro avanço das ferramentas de gestão, das propostas e políticas para a região. Dizia esperar, por exemplo, que a primeira reunião de governadores do Nordeste no governo Dilma, um fórum que funciona há mais de uma década, representasse a consolidação da efervescência recente da região e impulsionasse o futuro a partir da nova base.
Em que, segundo sua argumentação, o cenário já era outro. " Nos últimos anos, houve no Nordeste uma efervescência muito grande, muita gente do PT se elegeu, do PSB também, e os oligarcas sofreram uma profunda derrota pessoal, as gerações mais antigas da política local foram, de certa maneira, substituídas. O fórum expressa esse novo clima da política regional. Uma maioria de governadores mais jovens do ponto de vista da história política da região, e um processo de fragilização das oligarquias. Esse clima permitiu uma integração muito boa, independente dos partidos".
As divergências entre os governadores - e há muitas - transformaram-se em bandeiras individuais e não em problemas intransponíveis. Como os embates em torno da transposição do São Francisco, da duplicação da BR-101, da Transnordestina, de quem vai dirigir o Banco do Nordeste, e tantos motivos de divisão. A partir da constatação de que sumiu do cenário a visão clássica do Nordeste, como um problema, para ser parte na solução do problema nacional.
"O Nordeste, hoje, é um Nordeste renovado do ponto de vista dos seus indicadores, renovado politicamente, uma região que deu a Dilma a mais alta votação e tem colhido resultados das políticas desse projeto".
Exceções, como o Maranhão, por exemplo, cujos indicadores continuam ao rés do chão, não merecem destaque na avaliação. "Temos problemas mas a tendência é de avanço", diz o anfitrião dos dirigentes nordestinos. "Visto antes como destino da cesta básica, o Nordeste virou destino de empresas que procuram mercados para vender. Temos mil problemas, mas hoje o nordestino virou consumidor".
Déda minimiza o embate político entre os governadores - na região, disputam Eduardo Campos, de Pernambuco, com Cid Gomes, do Ceará, dentro do PSB; Eduardo Campos e Jaques Wagner (PT), da Bahia, têm divergências explícitas; ele próprio tem suas diferenças com o governador tucano de Alagoas, Teotonio Vilela.
"Não podemos ficar presos ao vício do conflito. Nós precisamos ainda de parcerias fortes com o governo central, precisamos de investimentos em infraestrutura, para dar continuidade ao que foi iniciado e para agregar novos investimentos e novas prioridades. O Teotônio tem que botar o tucano dele na gaiola e eu tenho que tirar a estrela da lapela para sentar e conversar. Temos que fazer uma ponte entre Sergipe e Alagoas, senão perderemos, por exemplo, a oportunidade de expandir a influência da Copa como evento para além dos locais onde a competição vai ficar", disse Déda nas conversas preparatórias.
O Fórum de Governadores não é uma utopia de união, é uma ferramenta pragmática de articulação dos interesses regionais, definiu o governador de Sergipe.
Uma ideia que não foi capaz de sobreviver ao lobby do governo federal. Nada mais distante desse cenário de modernidade traçado pelo governador Déda do que o resultado mais concreto que se obteve do encontro.
E a CPMF está voltando com o pretexto de antigamente, o de canalizar recursos para a saúde, embora sua extinção, determinada pelo Congresso, tenha sido coberta com vantagem por outras contribuições e impostos que resultaram em aumento incontestável da arrecadação. Nem durante o tempo que vigorou, nem com seus substitutos, o imposto resolveu o problema da saúde.
Especialistas já demonstraram à exaustão que o problema da saúde, no Brasil, não é falta de verbas. Que a CPMF, criada como provisória e transformada em permanente, não se destinava à saúde. Que o governo federal procura a revanche com o Senado, onde tem maioria folgada hoje, para fazê-lo aprovar impostos.
Tudo o que se refere a esse imposto exige disfarce tal a ojeriza que o instrumento provoca. Na campanha eleitoral a presidente disfarçou que iria reduzir a carga tributária e não criaria novos impostos. Os governadores apoiaram sua recriação de forma ainda disfarçada. E somaram-se ao Congresso que, antes mesmo de sofrer a pressão final do governo em forma de corte de verbas de emendas orçamentárias dos parlamentares, já disfarçadamente ensaiava entregar esse ouro à nova presidente. Com a força do lobby da bancada hospitalar.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
FONTE: VALOR ECONÔMICO
O discurso anterior do anfitrião contrastou, porém, com o fato mais concreto que emergiu do fórum. Para administrar o país, concordaram os governadores - e era tudo o que a presidente Dilma queria ouvir - é preciso mais dinheiro, e a verba mais fácil continua sendo criar um novo imposto. Ou ressurreição de um imposto velho, como a CPMF, com o qual estavam todos familiarizados e cuja extinção, por obra da propaganda e do discurso eleitoral do ex-presidente Lula, acabou sendo perda e não ganho para o eleitor.
Assim, foi o apoio à recriação da CPMF, o imposto sobre o cheque que vigorou como provisório por cerca de 15 anos e, em boa hora, num momento de estrangulamento da capacidade de a classe média suportar ônus sem retorno, o Congresso extinguiu, que apareceu desse encontro, fazendo submergir as modernas intenções de uma gestão de respeito.
Exclusividade da ECT no envio de contas é anacrônica
Marcelo Déda havia exposto traços de um claro avanço das ferramentas de gestão, das propostas e políticas para a região. Dizia esperar, por exemplo, que a primeira reunião de governadores do Nordeste no governo Dilma, um fórum que funciona há mais de uma década, representasse a consolidação da efervescência recente da região e impulsionasse o futuro a partir da nova base.
Em que, segundo sua argumentação, o cenário já era outro. " Nos últimos anos, houve no Nordeste uma efervescência muito grande, muita gente do PT se elegeu, do PSB também, e os oligarcas sofreram uma profunda derrota pessoal, as gerações mais antigas da política local foram, de certa maneira, substituídas. O fórum expressa esse novo clima da política regional. Uma maioria de governadores mais jovens do ponto de vista da história política da região, e um processo de fragilização das oligarquias. Esse clima permitiu uma integração muito boa, independente dos partidos".
As divergências entre os governadores - e há muitas - transformaram-se em bandeiras individuais e não em problemas intransponíveis. Como os embates em torno da transposição do São Francisco, da duplicação da BR-101, da Transnordestina, de quem vai dirigir o Banco do Nordeste, e tantos motivos de divisão. A partir da constatação de que sumiu do cenário a visão clássica do Nordeste, como um problema, para ser parte na solução do problema nacional.
"O Nordeste, hoje, é um Nordeste renovado do ponto de vista dos seus indicadores, renovado politicamente, uma região que deu a Dilma a mais alta votação e tem colhido resultados das políticas desse projeto".
Exceções, como o Maranhão, por exemplo, cujos indicadores continuam ao rés do chão, não merecem destaque na avaliação. "Temos problemas mas a tendência é de avanço", diz o anfitrião dos dirigentes nordestinos. "Visto antes como destino da cesta básica, o Nordeste virou destino de empresas que procuram mercados para vender. Temos mil problemas, mas hoje o nordestino virou consumidor".
Déda minimiza o embate político entre os governadores - na região, disputam Eduardo Campos, de Pernambuco, com Cid Gomes, do Ceará, dentro do PSB; Eduardo Campos e Jaques Wagner (PT), da Bahia, têm divergências explícitas; ele próprio tem suas diferenças com o governador tucano de Alagoas, Teotonio Vilela.
"Não podemos ficar presos ao vício do conflito. Nós precisamos ainda de parcerias fortes com o governo central, precisamos de investimentos em infraestrutura, para dar continuidade ao que foi iniciado e para agregar novos investimentos e novas prioridades. O Teotônio tem que botar o tucano dele na gaiola e eu tenho que tirar a estrela da lapela para sentar e conversar. Temos que fazer uma ponte entre Sergipe e Alagoas, senão perderemos, por exemplo, a oportunidade de expandir a influência da Copa como evento para além dos locais onde a competição vai ficar", disse Déda nas conversas preparatórias.
O Fórum de Governadores não é uma utopia de união, é uma ferramenta pragmática de articulação dos interesses regionais, definiu o governador de Sergipe.
Uma ideia que não foi capaz de sobreviver ao lobby do governo federal. Nada mais distante desse cenário de modernidade traçado pelo governador Déda do que o resultado mais concreto que se obteve do encontro.
E a CPMF está voltando com o pretexto de antigamente, o de canalizar recursos para a saúde, embora sua extinção, determinada pelo Congresso, tenha sido coberta com vantagem por outras contribuições e impostos que resultaram em aumento incontestável da arrecadação. Nem durante o tempo que vigorou, nem com seus substitutos, o imposto resolveu o problema da saúde.
Especialistas já demonstraram à exaustão que o problema da saúde, no Brasil, não é falta de verbas. Que a CPMF, criada como provisória e transformada em permanente, não se destinava à saúde. Que o governo federal procura a revanche com o Senado, onde tem maioria folgada hoje, para fazê-lo aprovar impostos.
Tudo o que se refere a esse imposto exige disfarce tal a ojeriza que o instrumento provoca. Na campanha eleitoral a presidente disfarçou que iria reduzir a carga tributária e não criaria novos impostos. Os governadores apoiaram sua recriação de forma ainda disfarçada. E somaram-se ao Congresso que, antes mesmo de sofrer a pressão final do governo em forma de corte de verbas de emendas orçamentárias dos parlamentares, já disfarçadamente ensaiava entregar esse ouro à nova presidente. Com a força do lobby da bancada hospitalar.
Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras
FONTE: VALOR ECONÔMICO
Nenhum comentário:
Postar um comentário