O presidente Michel Temer não perde uma votação importante no Congresso desde que assumiu o posto, no impeachment de Dilma Rousseff. Semana passada não foi diferente. Por 39 a 26 votos, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados recomendou ao plenário a rejeição do pedido do Ministério Público Federal para o Supremo Tribunal Federal (STF) investigar e processar o presidente pelos crimes de obstrução de justiça e formação de organização criminosa. A expectativa é que o plenário confirme a decisão da CCJ, embora com uma vantagem inferior àquela conferida pela maioria por ocasião da votação da primeira denúncia.
Na votação da CCJ, Temer perdeu dois votos em relação à votação anterior, mas venceu ainda por expressiva maioria (59% dos votantes). Se a tendência se mantiver na votação em plenário, Temer pode até não sair com a maioria absoluta dos 513 votos da Câmara, como aconteceu da vez anterior, quando teve o apoio de 263 deputados, mas ainda assim sairia com algo em torno de 250 votos, número mais que suficiente para o governo tentar arrematar o processo de aprovação de reformas a que se propôs. É difícil, mas será ainda mais complicado se o presidente vier a perder algo entre 30 e 40 votos sobre a primeira denúncia, conforme previsões mais alarmistas.
Trata-se, portanto, de uma cartada decisiva para o governo e o presidente, que a partir de agora joga todas as suas fichas na recuperação da economia, a fim de poder influir na própria sucessão e quem sabe até reverter em alguma medida a aprovação de Michel Temer, o chefe de governo mais impopular desde que o poder civil retornou ao Palácio do Planalto, nos idos de 1985. Para tanto, o governo terá de aprovar a reforma da Previdência, mesmo desidratada em relação à proposta original, e as medidas do pacote fiscal de agosto que ainda esperam por bom tempo no Congresso para serem enviadas.
A reforma previdenciária e as medidas fiscais são pilares para a sustentação da retomada do crescimento e a consequente redução do desemprego. Pesquisas feitas entre parlamentares indicam que não se trata de uma empreitada fácil, sobretudo à medida que se aproxima a eleição geral de 2018. O apoio parlamentar à idade mínima para a aposentadoria, por exemplo, já foi maior na Câmara, onde agora só 31,13% dos deputados consideram que a proposta tem alguma chances de ser aprovada até o fim do governo do presidente Temer, segundo pesquisas.
Igualmente difícil é a aprovação de nove das 11 medidas do pacote fiscal de agosto que dependem de apreciação do Congresso, caso do aumento da contribuição dos servidores à Previdência. Mas o governo Temer, como já se observou, tem se mostrado muito competente na hora de formar maiorias no Congresso, seja para salvar a pele do presidente, seja para aprovar medidas-chave para destravar a economia, como foram a aprovação da PEC do teto de gastos e as mudanças nas leis trabalhistas, para citar apenas duas de maior dificuldade e repercussão.
Passada a votação da segunda denúncia, o governo deve ao país no mínimo o mesmo empenho na aprovação de reformas cruciais para a recuperação econômica. O governo Temer sabe falar a língua do Congresso, suas relações com o parlamento são profundas. Ninguém mais adequado para reduzir resistências e reunir apoios. É fato que a aproximação das eleições deixa os deputados mais sensíveis a temas que calam fundo no eleitor, a exemplo da mudança nas aposentadorias, mas é um mito que o voto a favor da reforma da Previdência equivale a uma sentença de morte eleitoral - é exatamente o oposto, segundo estudo da Consultoria Legislativa do Senado.
Na reforma previdenciária do governo Fernando Henrique Cardoso, 345 deputados votaram favoravelmente, 152 contra e houve três abstenções. Na eleição imediatamente seguinte, 69% dos que votaram a favor da reforma se reelegeram, enquanto só 50% dos contrários conseguiram um novo mandato. É um tabu que pode ser contornado com a habilidade política em geral demonstrada pelo atual governo. É do interesse do país, mas também dos atuais inquilinos do Palácio do Planalto - a recuperação da economia é a única chance de o grupo político no poder entrar com alguma possibilidade no jogo eleitoral de 2018, calando a boca de quem não lhe atribui méritos na retomada, mas sim a um descolamento da economia em relação à política.
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