O Estado de S. Paulo
A Conferência do Clima da ONU (COP 26) que
começa neste domingo, em Glasgow, Escócia, está mais carregada de ceticismo do
que de boas expectativas.
Os comentaristas já apontaram dificuldades
que comprometem seus resultados, como a pandemia, a ausência de importantes
chefes de Estado e de governo e a falta de recursos para as iniciativas dos
países em desenvolvimento.
Mas nenhuma explicação seria completa se
não começar pelo enorme descasamento entre os macro-objetivos da agenda
ambiental atual e da COP 26.
O primeiro é o que já foi definido no
Acordo de Paris, em 2015, que é de limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C
acima dos níveis pré-industriais.
Essa meta implica drástica substituição da energia de fonte fóssil por energia de fonte renovável. É por isso que a questão climática passa pelo equacionamento da transição energética e também por que as grandes negociações se concentram sobre a maneira de administrar essa transição.
Hoje, o potencial de geração de energia
renovável (eólica, solar, hidrogênio verde) corresponde a não mais que 15% da
matriz energética mundial. Estimativas da Agência Internacional de Energia
apontam para a necessidade de se chegar a pelo menos US$ 4 trilhões em
investimentos por ano até 2030 – para garantir a neutralidade das emissões até
2050. Mas o principal obstáculo não é o financeiro. É o tempo necessário para a
maturação desses investimentos e a pressão enorme que já começa a existir sobre
materiais e matérias-primas. Essa transição exigirá o desmonte de trilionárias
instalações de petróleo, carvão, gás natural e frotas de veículos e a
substituição de mão de obra.
Paradoxalmente, para essa substituição está
sendo necessária o uso de energia fóssil. É em parte o que explica a atual
disparada dos preços do petróleo e do gás natural no mercado global. A escassez
já é tanta que Alemanha e China tiveram de reativar termoelétricas a carvão.
Outro macro-objetivo global é o combate à
exclusão social. Só a China precisa incorporar ao mercado de trabalho e de
consumo 400 milhões de pessoas. A Índia tem quase 1 bilhão nessas condições.
Uma transição energética rápida demais conspira contra esse objetivo.
O risco é o de que, também desta vez, os
maiorais do mundo assinem esmeradas declarações de intenção – que, de resto,
não serão eles, mas seus sucessores que deverão cumprir – que podem não se
traduzir em ações eficientes para o clima.
Hoje já não é preciso tanto esforço como
antes para convencer as autoridades de que é preciso agir para reverter o
excessivo aquecimento do planeta. Mas falta compatibilizar objetivos e esse é o
fator que pode emperrar tudo, inclusive o andamento desta cúpula. •
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