sábado, 23 de agosto de 2025

Trump ajuda Lula com dólar barato, por Hélio Schwartsman

Folha de S. Paulo

Relacionamento entre os dois líderes não é bom, mas ações do americano desvalorizam sua moeda, o que favorece o brasileiro

Parece seguro afirmar que Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump não morrem de amores um pelo outro.

O relacionamento diplomático entre Brasil e EUA passa pelo que pode ser o pior momento da história e é difícil crer que a falta de entrosamento entre os dois líderes não tenha contribuído para essa situação.

É ridículo, porém, como querem os bolsonaristas, responsabilizar Lula pelo tarifaço e outras sanções que os EUA impuseram ao país —um ataque inédito à economia e à política nacionais. Essa é uma realização dos Bolsonaros, obtida com base em mentiras pespegadas em âmbito internacional e não só em escala local.

É forçoso, entretanto, reconhecer que Lula, antes da crise, dera vários maus passos que agora podem estar cobrando seu preço. Na condição de chefe de Estado do Brasil, ele jamais deveria ter se posicionado em favor de Kamala Harris e contra Trump no pleito americano, para dar um único exemplo. Líderes sábios não se metem em processos eleitorais de outras nações.

Depois da crise, Lula não desperdiçou oportunidades de dar estocadas em Trump. Materialmente, tem razão em todas elas —e há muito mais que poderia ser dito. Mas, de novo, não é uma atitude inteligente.

Lula, pelo cargo que ocupa e pela possibilidade, ainda que remota, de vir a discutir diretamente com Trump tarifas, é um dos poucos brasileiros que precisa pensar duas vezes antes de falar mal do Agente Laranja.

Dadas as relações não exatamente amistosas entre os dois, é curioso constatar que venha de Trump, "malgré soi", uma relevante colaboração para a despiora da popularidade de Lula.

desvalorização do dólar, pela qual Trump dá a impressão de trabalhar duro, tem um efeito anti-inflacionário que ajuda bastante o brasileiro, talvez até mais que a bandeira da defesa da soberania nacional.

última pesquisa Quaest mostra que foi entre os pobres do Nordeste que Lula mais ganhou pontos —uma população que costuma olhar mais para a conta do supermercado do que para as intrigas da política internacional.

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