O Globo
Uma crise sem um fiapo de interesse público
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre,
criou uma crise com o Planalto sem que haja nela um só fiapo de interesse
público. Tudo por causa da escolha, por Lula, do advogado-geral da União, Jorge
Messias, para a cadeira vaga no Supremo Tribunal Federal. Alcolumbre queria
o ex-presidente do Senado Rodrigo
Pacheco.
Aos fatos:
A prerrogativa constitucional de nomear
ministros do STF é
do presidente da República, e só dele. A preferência de Alcolumbre, como o pato
ao tucupi, é uma escolha dele. A preferência de Lula por Messias é uma
prerrogativa.
Faça-se de conta que Alcolumbre se aborreceu por não ter sido avisado. Essa manha é pueril.
(Em 1967, quando o marechal Castelo Branco
telefonou a seu chefe da Casa Militar, general Ernesto
Geisel, comunicando a escolha do deputado Adauto Lúcio Cardoso para o STF,
ele ouviu e foi rápido e ríspido. Noutra versão, bateu o telefone. Meses antes,
preferia cassá-lo a fechar o Congresso; Castelo fechou o Congresso e não cassou
Adauto. Geisel detestou o deputado por toda a vida. Seja como for, o incidente
só foi conhecido décadas depois.)
Assim como cabe ao presidente nomear os
ministros da Corte, cabe ao Senado aceitá-los ou rejeitá-los. Messias precisa
de 41 votos. Se não os tiver, paciência. Esse é o caminho que a Constituição dá
aos descontentes. Se Messias não tiver os votos, restará a Lula a opção
palmeirense, chorar baixinho.
Antes de ir a voto, Messias terá de passar
por uma sabatina. Admitindo que ele não tem a qualificação necessária,
Alcolumbre e os senadores descontentes poderão demonstrar seus pontos,
expondo-o. Rosa Weber foi
cruelmente sabatinada e passou com louvor pelo tribunal. Seu desempenho no 8 de
Janeiro entrou para a História.
É falta de educação dizer que Messias tem
mais currículo e conduta do que pelo menos dois ministros da Corte. (Alcolumbre
já manteve André
Mendonça na chuva por meses. Mendonça é hoje um dos melhores ministros
do STF.)
Alcolumbre aborreceu-se com as críticas (e
falsidades) que apareceram contra ele na blogosfera. O PT bem
que podia recomendar boas maneiras a seus milicianos eletrônicos, mas isso faz
parte da vida.
O presidente do Senado resolveu romper com o
líder do governo, senador Jaques Wagner, pessoa conhecida por suas boas
maneiras e pelo apuro de suas camisas. Num movimento simultâneo, o presidente
da Câmara, deputado Hugo Motta,
ficou de mal com o líder do PT na Câmara. Instituição bicentenária, o
Parlamento brasileiro regrediu para arrufos de adolescentes.
Alcolumbre teve uma pesada divergência com
setores do governo em torno da exploração de petróleo na Margem Equatorial e,
até agora, prevaleceu cavalheirescamente. Encrencou com Jorge Messias
avacalhando um ritual estabelecido e respeitado.
A zanga de Alcolumbre levou-o a desengavetar e aprovar uma pauta-bomba. É muita crise por pouco motivo. Arrufos desse tipo servem apenas para valorizar a ação de intermediários, oferecendo o papel de pacificadores na entrada, para cobrar caro na saída.

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