domingo, 13 de julho de 2008

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)


NÃO É NA DINAMARCA, É AQUI
Alberto Dines


Agora é Eike Batista, o Midas que transforma em grandes negócios tudo o que toca. Nos últimos dias a cena esteve ocupada pela telenovela de fraudes e trambiques protagonizada por Daniel Dantas que já se arrasta há mais de uma década. Junto com ele a Polícia Federal prendeu o especulador Naji Nahas (que quebrou a Bolsa de Valores do Rio no fim dos anos 80) e levou junto o ex-prefeito Celso Pitta, filhote de Paulo Maluf, o mesmo que anda às voltas com a Justiça desde que experimentou os prazeres do poder.

O Estado brasileiro precisa de uma colonoscopia urgente para avaliar o calamitoso estado dos seus intestinos. Precisa de alguém apto a fazer a anamnese (histórico clínico) minimamente confiável. Acontece que o governo – administrador e defensor do Estado – é uma entidade inconfiável porque além de paciente é também agente. Enfermo e enfermidade: sente dores, sintomas, mas não tem condições de tratá-los.

A sucessão de conflitos e contenciosos que estouram a cada doze horas originam-se na própria incapacidade do Executivo de sobrepor-se aos litigantes simplesmente porque ele também litiga nos desvãos. É parte, portanto suspeito.

A pressa da Polícia Federal em colocar o "gênio" Daniel Dantas no xilindró tem a ver com a consumação dos acordos destinados a criar a super-tele, a operadora de telefonia resultante da fusão OI-Brt (Brasil Telecom), incentivada e empurrada pelo governo. Ou um segmento dele.

Diante de um Congresso esvaziado, uma oposição convertida em federação de candidaturas, um ministro da Justiça atropelado pelos fatos e um chefe de Estado empoleirado nos palanques, a crise ganha dimensões preocupantes porque ultrapassa a questão da "espetacularização das ações policiais".

Estamos diante de uma grave crise institucional e, como se não bastasse, com características surpreendentes, pois não se trata de poderes que colidem, mas de confrontos corporativos intestinos que extravasam, se contagiam e contaminam todo o ambiente.

Há pelo menos duas alas na Polícia Federal, uma delas muito aguerrida, acelerando o bulldozer e aliada ao Ministério Público. Um juiz de primeira instância próximo deste segmento se rebela abertamente contra decisão do presidente da suprema corte e, além disso, autoriza o "monitoramento" do seu gabinete.

Neste dramático pandemônio, lobistas e advogados agem nos corredores palacianos cuidando nas altas esferas dos interesses de clientes nem sempre coincidentes com os interesses do governo e do Estado. Chocante e doloroso, o caso do advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, campeão na luta dos direitos humanos, ex-deputado do PT e membro do seu Diretório Nacional que procura o chefe-de-gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, para livrar Daniel Dantas das pressões de um delegado "meio descontrolado" (Protógenes Queiroz, o encarregado da Operação Satiagraha que provocou o furacão jurídico-policial).

E como chegam à sociedade tais aberrações? Por vazamentos, dicas, meias informações e contra-informações sopradas para a imprensa pelas diferentes facções. O vazio de poder é físico e metafísico. Faltam referências, contestações, murros na mesa e, principalmente presenças. Autoridades evaporaram e a autoridade desapareceu.

O narrador viajou para os antípodas e como os fatos são confusos, sobraram delirantes versões. E os cheiros.

» Alberto Dines é jornalista.

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