"O Brasil cor-de-rosa não é real", diz tucano
Aécio critica PT e conclama oposição a cobrar e fiscalizar
Gerson Camarotti
Com um cuidadoso e planejado discurso de estreia no Senado, o ex-governador Aécio Neves (PSDB-MG) fez um chamamento à oposição, alertando seus colegas que, se não fizerem isso, continuarão colecionando sonhos irrealizados, e criticou duramente o PT, especialmente a gastança, o aparelhamento e as interferências dos governos petistas. Aécio cobrou promessas de campanha da presidente Dilma Rousseff e apresentou propostas na área tributária, para melhorar a situação financeira de estados e municípios e também para resolver gargalos de infraestrutura:
- O Brasil cor-de-rosa vendido competentemente pela propaganda política, apoiada por farta e difusa propaganda oficial, não se confirma na realidade. E nós vivemos no Brasil real. Por isso, cessadas as paixões da disputa eleitoral, o Brasil precisa, neste momento, de um choque de realidade.
O discurso de Aécio mobilizou o Senado, com dezenas de apartes de senadores da oposição e governistas e contou com a presença surpresa do ex-governador José Serra (PSDB-SP), que estava em Brasília desde a véspera para um aniversário. Apesar das cobranças e das contestações dos dois lados, o clima era até de cordialidade.
Ao subir à tribuna, Aécio defendeu um redirecionamento do comportamento do PSDB e dos demais partidos de oposição para os quatro anos de governo Dilma Rousseff, ao pregar uma postura firme e lúcida, mas sem ódio. Se firmou como o principal nome da oposição no Congresso e cresceu também na disputa interna do PSDB para a eleição presidencial de 2014.
- Convoca-nos, neste momento, a responsabilidade para fazer o que precisa ser feito. Ou o faremos ou continuaremos colecionando sonhos irrealizados. Não temos esse direito. Precisamos estar, todos, à altura dos sonhos de cada um dos brasileiros.
Contestações em meio aos elogios
Numa postura crítica, levantou problemas atuais da administração Dilma Rousseff, ao citar o excesso de gastos do governo Lula no ano eleitoral e suas consequências atuais, como a necessidade de um ajuste fiscal. Alertou ainda para o risco de desindustrialização de setores da economia e para a volta da inflação:
- Escondido sob o biombo eleitoral montado, o desarranjo fiscal, tantas vezes por nós denunciado, exige agora um ajuste de grande monta que penalizará investimentos anunciados com pompa e circunstância. E não é bom para um partido inaugurar nova fase de governo sob a égide do não cumprimento de compromissos assumidos com a população - discursou.
Num dos momentos mais fortes do discurso, Aécio criticou a postura PT em momentos históricos como a redemocratização nos governos Tancredo Neves e José Sarney, quando foi preciso fazer um pacto de governabilidade no governo Itamar Franco e quando foi criado o Plano Real para a estabilização da moeda. Lembrou ainda que o PT não apoiou e foi até à Justiça contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. E também defendeu o legado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso:
- Sempre que precisou escolher entre os interesses do Brasil e a conveniência do partido, o PT escolheu o PT.
Atacou duramente posições dos governos petistas, como a subordinação das agências reguladoras e aparelhamento e inchaço do Estado brasileiro:
- Não é interesse do país, por exemplo, a subordinação das agências reguladoras ao governo central (...). Não é interesse do país que o Poder Federal patrocine o grave aparelhamento e o inchaço do Estado brasileiro, como nunca antes se viu na nossa História. Da mesma forma, não posso crer que seja interesse do país que o governismo avance sobre empresas privadas, com o objetivo de atrelá-las às suas conveniências. Como se faz, agora, sem nenhum constrangimento, com a maior empresa privada do Brasil, a Vale, criando perigoso precedente.
Aécio reconheceu avanços no governo Lula e citou a ampliação das políticas sociais, mas concluiu, neste ponto, que os historiadores serão independentes para considerar os governos Itamar Franco, FH e Lula "como um só período da História do Brasil, de estabilidade com crescimento".
Lembrou que Serra teve 44 milhões de votos e que os partidos de oposição governam nos estados a metade da população brasileira:
- Em relação ao governo, temos como obrigações básicas: fiscalizar com rigor; apontar o descumprimento de compromissos assumidos com a população; denunciar desvios, erros e omissões; e cobrar ações que sejam realmente importantes para o país - disse. - Acredito que devemos organizar o exercício da oposição em torno de três valores. São eles: coragem, responsabilidade e ética.
Durante quase quatro horas de apartes, Aécio ouviu elogios da oposição e de governistas ao seu estilo sereno, mas também foi questionado. A saia justa ocorreu na intervenção da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), que lembrou que os tucanos, inclusive Serra, não defenderam o legado de Fernando Henrique Cardoso.
- Em 2010 novamente, o nosso então candidato, o ex-governador José Serra, colocava-se como continuador das políticas do governo do presidente Lula. Então, devo registrar que eu não vi essa contundência na defesa nesses momentos críticos, nos momentos de disputa perante a opinião pública - disse Gleisi.
- Gostaria de cumprimentá-lo e reconhecer, sem nenhum medo de errar, que o senhor é o melhor quadro da oposição neste país - disse o líder do PT, Humberto Costa (PE), cobrando também humildade para reconhecer avanços dos governos Lula e Dilma.
Para integrantes de PSDB, DEM e PPS, o discurso de Aécio sinalizou uma nova forma de agir da oposição.
- É um discurso equilibrado, moderno, civilizado, que é a cara de um homem que sabe conviver com civilidade - disse o presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN).
FONTE: O GLOBO
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