O Ministério do Meio Ambiente (MMA) prometeu entregar por escrito para a Alemanha e Noruega suas propostas de reformulação do Fundo da Amazônia, nesta semana. Está em jogo o futuro do fundo, maior mecanismo existente de proteção às florestas tropicais, com cerca de R$ 3,4 bilhões, financiados pelos dois países europeus e administrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Mais recentemente surgiram indicações de que o desenrolar da discussão sobre o Fundo da Amazônia pode ter implicações mais amplas, influenciando o desfecho do acordo anunciado há pouco entre o Mercosul e a União Europeia (EU).
Será uma surpresa, porém, se o Brasil amenizar as posições recentemente adotadas em relação ao Fundo da Amazônia, que puseram os parceiros europeus de sobreaviso. Apesar de Jair Bolsonaro ter externalizado desde a campanha presidencial uma visão conservadora em relação ao meio ambiente, defendendo deixar o Acordo de Paris e atacando o "ativismo ambiental xiita" e a "indústria de demarcação de terras indígenas", foi neste ano que voltou as baterias contra o Fundo da Amazônia.
O primeiro movimento foi a redução dos conselhos em organismos da administração pública federal, que atingiu também o Fundo da Amazônia. Apresentado como medida de ajuste fiscal, o corte dos conselhos tem como uma das consequências a diminuição da participação da sociedade civil. Responsável por estabelecer as diretrizes e critérios para aplicação dos recursos, o conselho do Fundo é formado por 23 membros, entre representantes do governo federal, dos Estados da Amazônia e de entidades da sociedade civil. A intenção do Planalto é reduzir o quadro para sete a dez membros, dando mais poder para a representação federal. A mudança contraria as convicções políticas da Alemanha e Noruega, que prezam a atuação da sociedade como mecanismo de governança e transparência.
Mas o problema mais sério é a intenção do governo brasileiro de usar os recursos doados para o Fundo para financiar compra de terrenos e propriedades localizadas em áreas protegidas, inclusive fora da Amazônia, realizando indenizações que deveriam ter sido feitas desde a criação das unidades e eliminando passivos. Segundo o governo, famílias que viviam em áreas transformadas em zonas de preservação precisam ser indenizadas e transferidas. Acredita-se, porém, que existam muitos grileiros entre eles. Além disso, quando o fundo foi criado, em 2008, inclusive sob inspiração do Brasil, seu objetivo era bem específico: apoiar o combate ao desmatamento na região amazônica.
O Brasil tem, a rigor, independência para escolher os programas que serão apoiados pelo Fundo da Amazônia, mas dentro de algumas regras. A principal exigência é comprovar um desmatamento inferior à taxa de 8.143 km2 por ano na região. Se superar essa marca, fica impedido de utilizar os fundos.
Não é a primeira vez que o Brasil tem problemas com os doadores do Fundo da Amazônia. O aumento do desmatamento nos governos de Dilma Rousseff e de Michel Temer causaram a interrupção de alguns desembolsos. O programa vence no fim do ano que vem e, até agora, os europeus tinham a intenção de renová-lo. O mecanismo os ajuda a atingir suas metas climáticas. Mas as dificuldades atuais parecem de difícil superação.
O problema com o Fundo da Amazônia pode ainda alimentar a oposição em parlamentos europeus ao acordo com o Mercosul, uma vez que reforça a suspeita de que vai beneficiar os produtores agrícolas e pecuaristas às custas do meio ambiente. O próprio presidente Jair Bolsonaro ajudou a estimular esse receio quando viajou para a última reunião do G-20. Em resposta às preocupações que a chanceler alemã, Angela Merkel, havia manifestado em relação à atuação do governo com o meio ambiente, rebateu que era diferente dos antecessores e não estava indo à reunião de cúpula para ser advertido por outros países. Alguns dias depois, o deputado Eduardo Bolsonaro replicou postagem em que o presidente disse que "o Brasil é exemplo para o mundo na preservação ambiental" e que "ONGs, artistas, Raonis não mais influenciarão" a política externa brasileira.
O deputado criticou ainda o Fundo da Amazônia, dizendo que é um "truque", que "a maioria esmagadora do fundo vai para ONGs", uma posição nada conciliadora da parte de quem pode se tornar futuro embaixador do Brasil nos Estados Unidos.
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