Pressionado por mais despesas, Guedes recebe apoio de Bolsonaro.É necessário ir além das palavras
Soam como música aos ouvidos de político em busca da reeleição, caso do presidente Jair Bolsonaro, as promessas ilusórias de que basta aumentar os gastos públicos que a recuperação da economia estará logo à frente. É nesse contexto que a pressão por mais despesas — e contra o teto constitucional dos gastos — aumenta sobre o ministro da Economia, Paulo Guedes, enquanto a pauta de reformas vai sendo deixada de lado. Foi o motivo que levou, na última terça-feira, dois secretários da pasta a deixarem seus cargos: Salim Mattar, encarregado do programa de privatizações, e Paulo Uebel, da reforma administrativa.
Guedes reconheceu a “debandada” na equipe, que até agora perdeu oito dos nomes originais. Aproveitou para alertar Bolsonaro: “Os conselheiros que o estão aconselhando a pular a cerca e a furar o teto vão levar o presidente para uma zona sombria, uma zona de impeachment, de irresponsabilidade fiscal”. Bolsonaro sabe do que se trata, porque acompanhou, quando deputado federal, o impeachment da então presidente Dilma Rousseff, condenada por crimes fiscais. Votou a favor.
Com Dilma, foi executado um programa econômico voluntarista, como sempre com dinheiro do Tesouro. A deterioração das contas públicas afastou os investidores, o déficit público disparou, os juros subiram, e a economia entrou em grave recessão em 2015/16. Desde então continua atolada. A ideia de reativá-la por meio de gastos do Estado em obras públicas renasceu no governo Bolsonaro com a pandemia. O enredo é o mesmo. A tese é defendida pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, com apoio de Braga Netto (Casa Civil), Tarcísio de Freitas (Infraestrutura) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). Até o filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro, pede um “dinheirinho”.
Prepara-se o relançamento do Pró-Brasil, uma lista de projetos sustentados pelo Erário. Também como no governo Dilma, ressurge a criatividade na busca pelos recursos para as despesas: o dinheiro do Pró-Brasil, fornecido pelo Tesouro, teria de ser empenhado ainda neste ano nos estados, para ser gasto em 2021.
A reação à “debandada” trouxe ontem de volta um mínimo de bom senso. Depois de reafirmar nas redes sociais o compromisso do governo com a saúde das contas públicas, Bolsonaro convocou reunião para simbolizar uma espécie de pacto entre Executivo e Legislativo na defesa do teto de gastos e da responsabilidade fiscal. Falaram Bolsonaro, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, presidentes da Câmara e do Senado. O vice-presidente, Hamilton Mourão, pela manhã, alertara que o teto é a “âncora fiscal” do país.
Mourão tem razão. Sem o teto, a percepção de risco do Brasil se degradaria rapidamente, com os efeitos conhecidos na inflação, nos juros e no câmbio. Seria mais do mesmo. A resposta correta, para além das palavras, é a defendida por Guedes: acelerar as reformas. A administrativa e a tributária são as prioritárias. Se nada fizer por elas, Bolsonaro estará conspirando contra o próprio projeto político.
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