domingo, 11 de setembro de 2022

Míriam Leitão - Cenário externo mais complexo

O Globo

Crescem as sombras sobre 2023 no Brasil e no mundo. A Europa está sem gás, os EUA, com juros altos, e a China, desacelerando

O Brasil vive um momento de trégua na economia que seria bom se não fossem os muitos temores em relação ao ano que vem e sobre a economia internacional. Com os anabolizantes, o PIB está subindo mais do que o esperado e com redutores artificiais a inflação caiu a um dígito pela primeira vez em 12 meses. O mundo vive uma nova onda de incertezas, apesar de momentos de alta das bolsas como a de sexta-feira. A Europa se aproxima do inverno sem poder contar com o gás da Rússia para aquecer as suas residências e movimentar a sua economia. Na China, o governo hesitou ao aplicar vacinas importadas em sua população e permanece às voltas com o lockdown que paralisa grandes centros econômicos. Nos Estados Unidos, o Fed avisa que os juros vão subir até que a inflação dê sinais claros de que está convergindo para a meta. É nesse ambiente que o Brasil se aproxima das eleições presidenciais.

Tudo indica que 2023 será um ano difícil para a economia internacional. Além da guerra, em si, os europeus podem literalmente congelar de frio no próximo inverno, caso Vladimir Putin mantenha a decisão de cortar o envio de gás à região. O gás russo representa 40% do suprimento da União Europeia e chega a 60% na Alemanha, a maior economia do bloco. Os líderes europeus trabalham para atenuar o risco de racionamento. A estratégia é religar usinas térmicas mais poluentes, aumentar a importação de gás natural liquefeito e adotar políticas de redução voluntária de consumo. Não há certeza de que o plano dará certo. A inflação na área do euro chegou a 9,1% em agosto e deve continuar subindo pela escalada da energia. A recessão é dada como certa.

Em entrevista ao canal Al Jazeera, o especialista em política energética da Rússia Stanislav Mitrovic disse que a Europa deixou claro que não deseja continuar sendo parceira do país. Portanto, para Putin, cortar o fornecimento é apenas antecipar uma decisão tomada pelos próprios europeus. Se para a Europa o risco é de colapso no curto prazo, para os russos, as perdas podem chegar a US$ 240 bilhões em receitas até 2029, pelas contas da consultoria inglesa Oxford Economics. Toda a malha de gasodutos ligando as duas regiões ficará obsoleta, e uma nova rede ligando a Rússia à China pode levar anos até ser concluída. Nada é simples, nesta crise em que há dependência mútua.

O Reino Unido continua vivendo os efeitos da saída conturbada da União Europeia. A nova primeira-ministra, Liz Truss, assume o cargo com a inflação em 10% e às vésperas da recessão, segundo o próprio Banco Central inglês. As promessas de Truss para vencer a disputa no partido conservador foram recebidas como a receita para o colapso pelo mercado financeiro. Ela quer cortar impostos — sob pretexto de estimular a economia — ao mesmo tempo em que fixa preço máximo de energia. Os subsídios e os cortes de impostos vão aumentar o déficit público e por isso muitos analistas apostam que a libra pode se desvalorizar até a paridade com o dólar.

Na China, o país tem falhado por excesso no combate à pandemia. Primeiro, não importou vacinas mais sofisticadas tecnologicamente, alegando questões de segurança nacional. Depois, continuou com a política de tolerância zero com o coronavírus, o que tem obrigado várias cidades importantes do país a entrarem em lockdown. Para se ter uma ideia, em 2022 o país já contabiliza mais dias de cidades fechadas do que todo o ano de 2021. Ao mesmo tempo, setores importantes da economia estão com problemas, o pior deles é o da construção civil. As projeções do PIB chinês estão em queda, mesmo com os estímulos dados pelo governo às vésperas do Congresso do Partido Comunista, no mês que vem.

Dos EUA, vem um dos maiores temores. Quem acompanhou a economia internacional nos anos 80 conhece os efeitos de um choque de juros promovido pelo mais importante banco central do planeta. Por ora, a maior parte dos analistas aposta que o Fed irá subir a taxa para a casa dos 3%. Mas o presidente do banco, Jérome Powell, tem sido cada vez mais duro em suas falas e o receio é de que tenha que elevar a taxa para patamares ainda mais elevados. O efeito sobre o mundo seria em cascata, com um aperto brutal das condições financeiras.

No Brasil, a conta das medidas eleitoreiras tem data para chegar. Os economistas estão prevendo crescimento perto de zero e sérios problemas fiscais no ano que vem.

2 comentários:

Paulo dos Santos Andion disse...

Quero ver a choradeira quando for aprovada a "TAXA DE PENDURICALHOS" salariais.

ADEMAR AMANCIO disse...

Sempre esclarecedor os artigos da colunista.