Maduro expõe fracasso da estratégia de Lula
O Globo
Ordem de prisão contra oposicionista vencedor
da eleição comprova que ditador não quer saber de diálogo
A decisão do ditador Nicolás Maduro de mandar a Justiça prender, sob acusações absurdas, Edmundo González, o oposicionista vencedor das eleições de 28 de julho, expõe de modo eloquente o fracasso da estratégia adotada até aqui pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva diante da crise venezuelana. Depois da fraude escancarada nas eleições de julho, o Brasil se aliou à Colômbia e apostou no diálogo para encontrar uma saída. Só que, apoiado pelas Forças Armadas, Maduro nunca quis saber de conversa.
Pouco mais de um mês depois da fraude
eleitoral, a crise venezuelana entra em nova fase. Sem pretensão de parecer
legítimo, o regime investe na perseguição à oposição. A reação exige uma
resposta à altura do Brasil. Infelizmente, não é o que se vê até o momento. Em
mais uma nota anódina, os governos brasileiro e colombiano manifestaram
“profunda preocupação” com a ordem de prisão de González, mas ficaram longe da
condenação veemente que a situação exige. Curto, o texto faz uma descrição
pródiga em platitudes: “Esta medida judicial afeta gravemente os compromissos
assumidos pelo governo venezuelano no âmbito dos Acordos de Barbados,
em que governo e oposição reafirmaram seu compromisso com o fortalecimento da
democracia e a promoção de uma cultura de tolerância e convivência. Dificulta,
ademais, a busca por solução pacífica, com base no diálogo entre as principais
forças políticas venezuelanas”.
Manifestações estapafúrdias de Maduro, como a
decisão de antecipar o Natal para 1º de outubro, podem dar a entender que o
regime chavista é uma piada. Não é. É uma tragédia seriíssima. Para se manter
no poder, as forças de segurança não tiveram pudor em atentar contra o próprio
povo. A Human Rights Watch denunciou ao menos 24 assassinatos nos protestos
depois das eleições. Pobreza e desigualdade não param de aumentar. A população
subnutrida está perto da média africana. Em termos de percepção de corrupção, a Venezuela está
à frente apenas da Somália. Um quarto da população já emigrou. Com o aumento do
autoritarismo, mais venezuelanos deverão sair do país, criando mais um desafio
para o Brasil na fronteira.
Além da crise humanitária, a situação na
Venezuela tem uma dimensão geopolítica. Como escreveu o general da reserva
Otávio Santana do Rêgo Barros no GLOBO, uma das consequências da instabilidade
é a atenção de potências globais à região amazônica e à caribenha. Interessadas
em erodir o poder americano, China e Rússia apoiam Maduro.
Na opinião de Rêgo Barros, o desafio do Brasil é “evitar que outras potências
mais poderosas transformem o subcontinente sul-americano em campo de batalha
para suas disputas pelo controle do mundo”. Um conflito armado perto da
fronteira norte seria o pior cenário possível.
Em Brasília,
autoridades costumam dizer que Hugo Chávez ouvia demandas brasileiras, mas
Maduro não. Como lidar com a escalada autoritária quando quem está no poder se
faz de surdo? Com pragmatismo, marca da diplomacia brasileira, mas sem
abandonar princípios democráticos. Há muitos países interessados na solução
pacífica da crise. O Brasil teve a oportunidade de liderá-la exigindo,
negociando e monitorando a transferência de poder ao vencedor legítimo da
eleição. Quando apenas manifesta “profunda preocupação” com o arbítrio de
Maduro, fica claro que a jogou fora.
Rodovia BH-Governador Valadares testará novo
modelo de concessão
O Globo
Para atrair interessados na estrada, governo
excluiu do edital os trechos mais problemáticos
É boa notícia a concessão à iniciativa
privada da BR-381, rodovia que liga Belo Horizonte a Governador Valadares,
depois de três tentativas frustradas feitas pela Agência Nacional de
Transportes Terrestres (ANTT)
desde 2021. Considerada uma das mais perigosas do país, a estrada, fundamental
para a ligação São Paulo-Minas-Espírito
Santo, será administrada pela empresa paranaense 4UM, que venceu o
leilão oferecendo desconto de 0,94% na tarifa básica de pedágio.
O edital prevê que a concessionária terá de
aplicar R$ 9,2 bilhões ao longo dos 30 anos de contrato, R$ 5,5 bilhões dos
quais em investimentos para recuperar a estrada. Entre os compromissos estão a
duplicação de 106 quilômetros, a construção de 83 quilômetros de faixas
adicionais, 51 correções de traçado (o trajeto sinuoso, cheio de subidas e
descidas, contribui para o grande número de acidentes), a implantação de áreas
de escape, pontos de descanso para caminhoneiros, 23 passarelas, além de
melhorias na sinalização. O trecho concedido (cerca de 300 quilômetros) terá
cinco praças de pedágio. Estima-se que as obras deverão gerar 80 mil empregos.
A mudança no modelo de concessão contribuiu
para o sucesso do leilão. Dois lotes na saída de Minas e outros trechos que
representam maior risco para o concessionário, devido a problemas geológicos e
à ocupação das margens da estrada, foram retirados do edital e ficarão sob
responsabilidade do governo federal. Segundo o ministro dos Transportes, Renan Filho,
a União investirá entre R$ 800 milhões e R$ 900 milhões nos trechos
problemáticos.
Pela situação deplorável de boa parte das
estradas brasileiras, esburacadas, mal sinalizadas e com traçado obsoleto, está
claro que o governo federal não tem condição de administrá-las. Por isso a
saída é a concessão. Pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) no
ano passado mostrou que 67,5% das rodovias são classificadas como regulares,
ruins ou péssimas. Apenas 32,5% podem ser consideradas ótimas ou boas. As
administradas pelo poder público estão entre as piores: 77,1% recebem avaliação
negativa, ante 35,9% entre as privadas.
O novo modelo adotado na concessão da BR-381
terá de ser testado. Espera-se que governo federal e concessionária cumpram
seus compromissos nos trechos sob sua responsabilidade, para que os usuários
não enfrentem realidades diferentes numa mesma estrada. O presidente da 4UM,
Leonardo Boguszewski, afirmou que um dos objetivos da gestora é mudar para
“rodovia da vida” o apelido de “rodovia da morte” dado à estrada em razão do
alto índice de acidentes. É louvável. Mas ela só passará a ser segura se as
obras e serviços previstos no edital forem executados. Não se trata de questão
de nomenclatura.
BC progride em agenda sustentável no crédito
rural
Valor Econômico
BC impediu 30 mil operações com CAR irregular
A agenda ecológica do Banco Central (BC)
ganhou tração e impediu que 30 mil operações com Cadastro Ambiental Rural (CAR)
irregular no valor de R$ 726 milhões fossem concluídas em 2024, e R$ 6,3
bilhões desde 2020. A magnitude dos recursos que geram a grilagem de terras, as
operações de extração ilegal de madeira, a destruição da floresta para ocupação
com pastagens e outras ações predatórias do meio ambiente passam em algum
momento pelo sistema financeiro. Evitar que isso ocorra é um dos objetivos do
BC em ação conjunta com as instituições financeiras. Os primeiros exemplos são
encorajadores e se espera que tenham continuidade e ganhem amplitude.
A autoridade monetária, em seu Relatório de
Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticas, divulgado nesta
semana, consolida os passos dados até agora da obra em progresso de regulação,
vigilância e estímulo nas ações climáticas, alinhada ao Acordo de Paris e às
metas nacionalmente determinadas pelo Brasil. Um dos aspectos imediatos e
prementes é o da concessão de crédito para atividades agrícolas potencialmente
predatórias ou de alta emissão de dióxido de carbono. A resolução 5081 (2023),
do Conselho Monetário Nacional, por exemplo, vedou a concessão de
financiamentos bancários, com e sem subsídios federais, a propriedades que não
se inscreveram no CAR, ou cuja inscrição foi suspensa ou cancelada.
No Bureau de Crédito Rural, criado em 2022, o
BC e o Ibama fizeram acordo para o intercâmbio de informações sobre crédito
rural e Proagro. Com maior supervisão da autoridade monetária, as operações
passaram a ser analisadas em conjunto com informações sobre trabalho escravo,
localização de terras indígenas e quilombolas, por meio do cruzamento de dados
informados pelas instituições financeiras com bases de acesso público.
O BC tem estimulado os bancos a incluírem em
seu relatórios de riscos das atividades as ameaças climáticas, que se
intensificaram a olhos vistos nos últimos anos, culminando com a tragédia das
chuvas no Rio Grande do Sul e dos incêndios na Amazônia, no Cerrado e no
Pantanal. Um de seus efeitos óbvios é sobre a estabilidade financeira,
decorrente da ruína econômica dos atingidos e seus efeitos diretos sobre
empréstimos bancários. Além disso, as seguradoras estão na linha de frente da
cobertura de danos crescentes, que até há pouco eram negligenciados.
Uma linha de classificação foi identificar os
setores que emitem mais e os que emitem menos carbono e averiguar os
empréstimos concedidos. O BC indicou que houve aumento proporcional de crédito
para setores de baixa emissão entre 2012 e 2020. Em junho, passou a receber a
cada semestre de todas instituições financeiras, inclusive as de pequeno porte,
o Documento de Risco Social, Ambiental e Climático.
Os bancos apontam como risco climático mais
relevante as secas, em especial no Nordeste, em levantamento feito antes da
tragédia do Rio Grande do Sul. Já os riscos crônicos mais importantes relatados
foram a escassez de recursos naturais e a desertificação. No entanto, segundo o
BC, “só 42% das instituições gerenciam o risco de transição de alguma forma,
com apenas 19% possuindo metodologias de análise para o longo prazo. A
percepção do impacto dos riscos de transição é muito baixa no curto prazo e
média no longo prazo”.
Afetam a política monetária os danos sobre as
safras, destruição física da oferta de bens agrícolas e industriais e outros
fatores que tendem a elevar a inflação. Esses são efeitos imediatos. Mas há a
noção generalizada que, no médio prazo, a transição energética dos combustíveis
fósseis para matrizes limpas traria aumentos de preços relevantes. No
relatório, o BC não vê dessa forma a passagem de um sistema a outro. “Os
aumentos nos investimentos em energia verde têm um impacto positivo sobre a
atividade econômica, ultrapassando o efeito negativo da taxação das emissões”,
registra.
No cenário de emissão zero de carbono em
2050, que se baseia em aumento do custo da emissão e incentivos à economia
limpa, o BC conclui que “o efeito líquido dos dois tipos de choques sobre a
atividade econômica é moderadamente positivo, com o nível do PIB alcançando,
após 15 anos de transição, +1,7% acima da tendência de crescimento do modelo”.
Para esse resultado colaboram os investimentos para elevar em 45% a oferta de
energia verde.
Mesmo com a redução de 18% na oferta de
energia fóssil ao fim da transição, o BC estima que a oferta total aumentará em
10% e será 18% mais barata. “O efeito desse aumento da oferta de energia barata
é expansionista, mais que compensando o efeito negativo do aumento do custo de
emissão sobre as firmas”. Os efeitos sobre a inflação serão modestos e não
devem ultrapassar 0,40 ponto percentual, com aumento de juros básicos de 0,9
ponto percentual.
O BC está seguindo a trilha das melhores experiências internacionais. Ao normatizar e identificar recursos a setores de atividade de alta emissão de carbono, cria uma rotina salutar que favorece o crescimento sustentável.
Municípios têm muito a ganhar em eficiência
na gestão
Folha de S. Paulo
Ranking da Folha mostra que somente 3% das
prefeituras obtêm resultados satisfatórios com os recursos de que dispõem
O Brasil cometeu uma enorme extravagância a
partir da Constituição de
1988 ao criar quase 1.200 novos municípios, muitos sem condições de operar com
receitas próprias. O resultado é que o país tem hoje nada menos que 5.568
cidades, além de Brasília e do distrito estadual de Fernando de Noronha.
Mais de 80% do dinheiro gasto por três
quartos dessas prefeituras vêm de transferências da União ou dos estados. É
natural, em muitos casos, que elas recebam os recursos, pois a maioria dos
impostos arrecadados no país são gerados nos municípios.
No caso de muitas cidades pequenas, contudo,
elas acabam obtendo proporcionalmente bem mais do que contribuem.
Como é praticamente impossível voltar atrás
no disparate que foi criar cidades que não se sustentam, resta avaliar as
prefeituras para saber se gastam de forma eficiente o que recebem ou geram com
a taxação dos habitantes.
Milhares de municípios no Brasil, porém, nem
sequer mantêm páginas na internet atualizadas com prestações de contas,
contratos de obras e demais informações contábeis, como prevê a Lei de
Responsabilidade Fiscal.
A fiscalização é difusa e, em algumas cidades
grandes, tribunais de Contas politicamente aparelhados fazem vista grossa ao
não cumprimento das regras.
Com o objetivo de proporcionar um mínimo de
avaliação objetiva das cidades brasileiras, este jornal e
o Datafolha criaram o Ranking de Eficiência dos Municípios - Folha (REM-F),
que leva em conta o atendimento nas áreas de saúde, educação e saneamento,
tendo como determinante no cálculo de eficiência a receita per capita das
prefeituras.
A ferramenta permite a qualquer cidadão
consultar no endereço folha.com/remf quem
entrega mais gastando menos.
O levantamento cobre 5.276 municípios, ou 95%
do total, e se utiliza dos dados públicos mais recentes. Para 292 cidades, não
havia informações consistentes, e elas ficaram de fora.
O trabalho revela que apenas 163 municípios
brasileiros (3% do total) podem ser considerados "eficientes". Outros
3.591 (68%) apresentam "alguma eficiência", enquanto 1.450 (27,5%)
têm "pouca eficiência"; e outros 72 (1,3%) são
"ineficientes".
Existe, portanto, muito espaço para melhora
da gestão, considerando que centenas das cidades com "alguma
eficiência" são ricas e populosas —e que há, entre as com "pouca
eficiência", três capitais: Manaus, Belém e Maceió.
Outro resultado que chama a atenção é o fato
de que, quanto maior o aumento do
funcionalismo nos últimos anos, menor tende a ser a eficiência. Uma
das explicações é que, com custos fixos maiores, há menos dinheiro para
investimentos.
A um mês do primeiro turno das eleições municipais,
cumpre averiguar como os prefeitos têm empregado os recursos públicos e
comparar resultados obtidos em diferentes administrações. Só assim o debate não
cai no vazio.
Regime arcaico de Cuba não se recupera da
pandemia
Folha de S. Paulo
Crise sanitária piorou indicadores da
atividade, precária há décadas com o controle autoritário da produção pelo
governo
Como outras ditaduras surgidas ao longo do
século 20, a cubana reforça uma afirmação célebre do economista Milton
Friedman. Para o vendedor do Prêmio Nobel em 1976, a ideia de que seria
possível haver liberdade política sem liberdade econômica é puro delírio.
Isso porque indivíduos que realizam livres
trocas comerciais dependem menos do governo, o que lhes permite exercer a
cidadania de forma autônoma, limitando o risco de autoritarismo.
Além disso, incentiva-se o pluralismo e a
diversidade por meio da competição, seja de serviços e produtos ou de ideias
—base da liberdade de expressão.
Com o fim da União Soviética, Cuba passou
por severa crise econômica nos anos 1990 e, desde lá, investe no turismo para
mitigá-la. Após a renúncia de Fidel Castro,
ensaiou-se uma distensão do controle econômico nem de longe suficiente para
eliminar os problemas estruturais.
Ao minar o turismo, a pandemia de Covid-19
piorou ainda mais a situação. Reportagem da Folha esteve na
ilha e constatou um cenário de penúria.
Há escassez geral de produtos básicos, de
alimentos a remédios. A inflação está nas alturas e a cesta básica inclui só
250g de chícharo (similar ao grão de bico), 250 ml de óleo, um pacote de café e
cerca de 2,5 kg de arroz.
Cubanos pedem comida e remédios aos turistas
pelas ruas de Havana.
A agropecuária carece de sementes, fertilizantes e equipamentos. Ate a produção
de açúcar, pela qual o país é conhecido, desmorona. Em abril, foram geradas 300
mil toneladas do artigo, ante projeção de 412 mil. Na década de 1980, eram
quase 8 milhões de toneladas por ano.
O PIB per
capita despencou durante a crise sanitária e, até 2022, ainda não havia
retornado a patamares anteriores a 2019.
Há racionamento de combustíveis e energia
elétrica. Em março, uma série de blecautes levou
centenas de cubanos às ruas.
Foram os maiores protestos desde 2021, quando
uma onda deles varreu o país e acabou reprimida
violentamente pelo regime, com a prisão de cerca de 300 pessoas.
Naquele mesmo ano, estima-se que cerca de 2% dos 11 milhões de habitantes
tenham emigrado para os Estados
Unidos.
O embargo mantido pela Casa Branca é
contraproducente, já que não moveu Cuba rumo à democracia e fornece um pretexto
à ditadura.
Mas ele não é a causa da crise material e humanitária.
É o autoritarismo brutal de um regime arcaico
que oprime o país há mais de seis décadas e, não obstante, ainda conta com
defensores na esquerda continental.
O Brasil pode crescer mais
O Estado de S. Paulo
A receita para a economia se expandir mais sem gerar riscos inflacionários é conhecida, e nos últimos anos País tem colhido frutos dessa agenda. Mas o governo Lula precisa acreditar nela
A economia brasileira surpreendeu todos ao
crescer 1,4% no segundo trimestre em relação aos três primeiros meses do ano,
ante uma expectativa de 0,9%. De um lado, o resultado foi tão positivo que
levou bancos e consultorias a rever para cima suas projeções para o Produto
Interno Bruto (PIB) para um nível mais próximo dos 3%. De outro, o desempenho
voltou a despertar temores que a economia esteja rodando acima de sua
capacidade, prestes a registrar repiques inflacionários e a repetir os chamados
voos de galinha.
É um receio sempre pertinente em se tratando
do histórico brasileiro nos últimos 50 anos, sobretudo quando a maioria dos
setores contribui para o crescimento do PIB. A indústria cresceu 1,8%, puxada
pelo setor de construção, que aumentou 4,4%, mas até mesmo a indústria da
transformação, que em geral anda de lado, teve desempenho positivo, com alta de
3,6%. Serviços subiram 1%, e a agropecuária só caiu 2,30% em razão da
concentração da produção no trimestre anterior.
Dois indicadores se destacaram: os
investimentos e o consumo das famílias. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF)
cresceu 2,1% no segundo trimestre ante os três primeiros meses do ano e 5,7% na
comparação com o mesmo período do ano passado. Foi o melhor resultado desde o
primeiro trimestre de 2015, mas os investimentos ainda estão 13,1% abaixo do
pico, alcançado no segundo trimestre de 2013.
Já o consumo das famílias subiu 1,30% no
segundo trimestre em relação ao primeiro e 4,9% na comparação interanual. Como
esperado, o aumento do emprego e da massa salarial, o avanço do crédito, os
programas de transferência de renda, o pagamento de precatórios, o reajuste do
salário mínimo e a antecipação do 13.º salário dos aposentados impulsionaram os
gastos familiares.
Para o ministro Fernando Haddad, o resultado
mostra que o governo tem conseguido fazer a atividade crescer sem pressionar a
inflação. Ainda há dúvidas sobre o quanto as reformas aprovadas desde 2016 nas
áreas trabalhista e previdenciária podem ter contribuído para elevar a
capacidade produtiva da economia, mas o certo é que o PIB recorrentemente tem
superado as projeções calculadas pelo mercado e dado razão às previsões dos
governos nos últimos cinco anos.
Setores como o agronegócio e a indústria
extrativa têm registrado recordes atrás de recordes, um desempenho que embute
um ganho de produtividade que pode ter modificado o patamar da economia. O
avanço das exportações e das importações na proporção do PIB mostra que, ao
menos nesses dois setores, o País tem conseguido elevar sua ainda pequena
inserção nos mercados internacionais.
Espera-se que a aprovação da reforma
tributária sobre o consumo possa dar um impulso adicional a outros segmentos
econômicos ao simplificar, modernizar e desburocratizar o sistema, favorecendo
o desenvolvimento de atividades nas quais o País tem vocação e competitividade.
Mas essa certamente não pode ser a única iniciativa do governo na direção das
reformas.
É preciso priorizar os investimentos em uma
educação de qualidade para capacitar trabalhadores para empregos melhores.
Falta ao País uma infraestrutura robusta e capaz de reduzir os custos do setor
produtivo ante competidores internacionais.
É preciso fortalecer marcos regulatórios para
atrair investidores privados. É necessário garantir a autonomia das agências
reguladoras para fiscalizar empresas e o cumprimento dos contratos. Nem o
Estado nem as empresas estatais têm capacidade de investir à altura das
necessidades do País, e isso tampouco é essencial.
Prova disso é o avanço da participação de
empresas privadas no saneamento básico. Em menos de cinco anos, um setor até
pouco tempo dominado por companhias estaduais com baixa capacidade de
investimento mudou completamente após a aprovação do novo marco pela Câmara e
pelo Senado.
A receita para a economia crescer mais sem
gerar riscos inflacionários é conhecida, e o País tem colhido os frutos dessa
agenda. Mas o governo Lula da Silva precisa acreditar nela e abandonar velhas
convicções para que ela possa avançar sem percalços.
O desafio doméstico do saneamento
O Estado de S. Paulo
Além dos desafios regulatórios e financeiros
para universalizar a rede de saneamento básico, é preciso pensar em políticas
públicas para garantir as adequações nas residências
A carência de saneamento básico é uma das
maiores dívidas sociais do País, se não a maior. O Brasil é um dos países mais
desiguais do mundo e nada expõe com tanta crueldade essa desigualdade como a
falta de saneamento. Mais de 30 milhões de brasileiros não têm acesso à água
potável e quase 100 milhões não têm coleta de esgoto.
Essa tragédia humanitária não é uma
consequência natural da realidade socioeconômica do País. O saneamento aqui
está bem abaixo da média de outros países de renda média-alta e mesmo de renda
média. Segundo o Banco Mundial, em relação ao esgoto, por exemplo, o Brasil
ocupa o 81.º lugar entre 135 países, atrás de vizinhos como Peru, Paraguai ou
Bolívia, e de outros países em desenvolvimento, como Butão ou Senegal.
Parte maior do problema foi a incúria do
poder público. Diferentemente de outros setores – como energia e
telecomunicações – que foram modernizados por reformas que abriram os mercados
nos anos 90, o saneamento permaneceu por mais duas décadas engessado pelo
monopólio estatal, à mercê da voracidade clientelista e corporativista.
O Marco do Saneamento de 2020 foi um ponto de
inflexão. Ao estabelecer metas de universalização até 2033, obrigar a licitação
para todas as empresas, estimular a prestação regionalizada dos serviços e
consolidar o papel regulador da Agência Nacional de Águas, o Marco abriu o
mercado a investimentos privados e garantiu segurança jurídica aos
investidores.
Os resultados se fazem sentir. Segundo a
consultoria Inter.B, os investimentos, que em 2022 somaram R$ 21,1 bilhões,
devem chegar em 2024 a R$ 30,4 bilhões. Ainda assim, para universalizar os
serviços no prazo, será preciso atingir uma média anual de R$ 50 bilhões. Há
muito a fazer, desde a regulamentação das concessões de blocos regionais,
casando municípios mais e menos rentáveis, até regimes de exceção na reforma
tributária e a confecção de modelos bem estruturados de concessões, PPPs ou
venda de participação acionária.
Como se não bastasse tudo isso, há um outro
desafio que tem ficado abaixo do radar do debate público: a adequação das
moradias. De nada adianta universalizar as redes de infraestrutura se as
residências não tiverem estrutura (de tubulação a caixas d’água e pias) para se
conectar a elas.
Um estudo do Instituto Trata Brasil focado justamente
nesse problema estimou investimentos adicionais de R$ 24,3 bilhões por ano para
essas readequações. É quase o dobro dos R$ 13 bilhões gastos em 2018. Cerca de
90% das famílias que hoje não dispõem de serviços de saneamento e precisarão instalar
ou adequar os equipamentos domésticos pertencem às classes de renda baixa, com
ganho de até R$ 5,7 mil por mês. Elas terão de arcar com 75% destes
investimentos intramuros. Já hoje, 16% da população na faixa de menor renda
poderia estar conectada às redes disponíveis, mas não está por falta de
canalização em suas casas.
Assim como na estrutura extramuros, na
intramuros há uma considerável desigualdade regional: quase 50% dos
investimentos residenciais precisarão ser feitos nas Regiões Norte e Nordeste,
em especial no Pará e no Maranhão.
Diante disso, o Trata Brasil alerta para a
necessidade de se criar políticas públicas para auxiliar as populações pobres.
Na situação de aperto fiscal do País, a mais factível são linhas de crédito
para diluir o peso desses gastos na renda mensal. Mas a premência do saneamento
é uma razão a mais para que o poder público proceda a uma ampla revisão de
gastos e subsídios ineficientes e regressivos, que poderia abrir espaço fiscal
para oferecer subsídios a quem realmente precisa.
Os ganhos com saúde são evidentes: segundo a
OMS, a cada R$ 1 investido em saneamento, deixa-se de gastar R$ 4,2 em saúde.
Isso sem falar nos ganhos ambientais e socioeconômicos: mais produtividade,
desempenho educacional, valorização imobiliária e geração de empregos e
arrecadação com construção ou turismo. Segundo o Trata Brasil, a
universalização traria um retorno de mais de R$ 1 trilhão em duas décadas. Mas,
antes de tudo, é uma questão de dignidade e direitos humanos.
A mágica do Auxílio Gás
O Estado de S. Paulo
Nova proposta para programa cheira a
contabilidade criativa e gera constrangimento à equipe econômica
São velhos e manjados os truques dos governos
petistas com as contas públicas, mas eles seguem tentando iludir a plateia. O
novo Auxílio Gás, rebatizado de Gás para Todos, é o mais recente número da
trupe de Lula da Silva. Com uma mão, os mágicos do governo anunciaram que vão
quadruplicar os gastos com o programa e ampliar o número de famílias atendidas.
Com a outra, reduziram em 84% a projeção de despesas com a proposta no Projeto
de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2025. Esse bicho estranho que saiu da cartola
lulopetista é apenas uma manobra para retirar o programa do Orçamento e
repassar sua gestão e operacionalização à Caixa Econômica Federal.
Os recursos para bancar a política pública,
oriundos da venda do óleo do pré-sal, passarão longe da conta do Tesouro. A
Caixa receberá o dinheiro e fará o pagamento dos botijões de gás oferecidos às
famílias carentes diretamente aos fornecedores. Assim, o Executivo abrirá mão
de receitas ao mesmo tempo que ampliará o espaço para despesas na peça
orçamentária. Pegou mal, pois cheira a contabilidade criativa.
Questionada, a equipe econômica atribuiu a
autoria do programa ao Ministério de Minas e Energia e argumentou que o projeto
ainda sofreria ajustes durante a tramitação no Legislativo, de forma a
assegurar que sua versão final respeitasse o arcabouço fiscal.
O secretário executivo do Ministério da
Fazenda, Dario Durigan, até admitiu “alguma preocupação” com o formato do
programa, mas esse receio não impediu o governo de reduzir a projeção de
receitas e despesas com o Auxílio Gás ao elaborar o Orçamento.
Ontem, o ministro Fernando Haddad disse ter
recebido autorização do presidente Lula da Silva para ajustar o projeto e
garantir que o gasto com o programa não fique fora do Orçamento. Horas depois,
Silveira afirmou que mudanças, se ocorrerem, serão pontuais, pois “não podemos
ficar reféns da Faria Lima”.
Ora, não se trata de ceder ou não ao mercado,
mas apenas de seguir a legislação e a própria Constituição. Da forma como foi
elaborada, a proposta desrespeita o princípio da unidade orçamentária, segundo
o qual todas as receitas e despesas devem estar na LOA para garantir
estabilidade, consistência, transparência e controle no uso dos recursos
públicos.
O pesquisador do Insper Marcos Mendes disse
ao Estadão tratar-se de uma repetição de métodos criativos utilizados
por governos anteriores – leia-se Dilma Rousseff – para gastar mais sem que a
despesa apareça na peça orçamentária.
Existe um limite de gastos que precisa ser
respeitado. Além disso, embora a medida represente uma renúncia de receitas, o
governo não disse expressamente de que forma pretende compensá-las, algo
obrigatório segundo os termos da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Esse mesmo governo tão descuidado com algumas
exigências básicas no trato do dinheiro público é aquele que outro dia foi ao
Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir do Congresso que cumprisse as regras
fiscais e apresentasse maneiras de repor as perdas com a desoneração da folha
de pagamento dos setores que mais empregam e dos municípios. Não há mágica que
mude a natureza da demagogia.
Brasil destoa em crise venezuelana
Correio Braziliense
O governo brasileiro perdeu o tempo de reação
e a figura de mediador na crise que acomete a Venezuela. O risco agora é de que
qualquer medida mais robusta que venha a ser tomada não tenha relevância
política
Em nota conjunta que critica a ordem de
prisão de Edmundo González Urrutia, opositor do presidente venezuelano, Brasil
e Colômbia sobem o tom contra os exageros praticados por Nicolás Maduro desde
que ele se proclamou vencedor de uma eleição contestada dentro e fora do país.
A reação é bem-vinda, mas segue desafinada. Destoa com o que de fato acontece
na nação vizinha, que está à beira de uma ruptura democrática.
Enquanto o texto fala em "profunda
preocupação" com a ordem de apreensão emitida pela Justiça venezuelana,
parlamentares, de maioria governista, estão prestes a aprovar um pacote
"contra o fascismo" que prevê, entre outras medidas autoritárias, a
punição a manifestações populares e divulgações de notícias contrárias a
Maduro. Em outra frente, a onda de repressão pelo país segue em alta, somando,
desde o fim de julho, quase 30 mortos e 2,5 mil detidos — incluindo
adolescentes.
O assessor especial da Presidência da
República para assuntos internacionais, Celso Amorim, afirmou que não se pode
negar a ocorrência "de uma escalada autoritária na Venezuela" e que o
governo brasileiro não aceita prisões políticas, em referência a um possível
encarceramento de González Urrutia. Organizações de direitos humanos e
opositores, porém, vêm ressaltando que as detenções ocorridas desde as eleições
presidenciais de 28 de julho têm caráter político. Presos foram levados,
inclusive, a centros de tortura, como o Helicoide, na capital Caracas, sem
direito a contato com advogados e familiares.
A reação de outros países ao mais novo
desdobramento das eleições venezuelanas também sinaliza um descompasso
brasileiro e colombiano com o momento atual. Estados Unidos, União Europeia
(UE), nove países da América Latina — Argentina, Costa Rica, Equador,
Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai — e a
Organização dos Estados Americanos (OEA) consideram a decisão de prender o
opositor de Maduro, procurado por cometer crimes como "conspiração" e
"sabotagem", uma perseguição política.
Washington, que não mantém relações com
Caracas há cinco anos, estuda implementar novas sanções "para mostrar a
Maduro e a seus representantes que suas ações ilegítimas e repressivas na
Venezuela têm consequências", segundo o porta-voz do Departamento de
Estado norte-americano, Matthew Miller. Na semana passada, ministros europeus
discutiram a adoção de medidas mais robustas contra o país latino, mas não
chegaram a um acordo. Há ainda a possibilidade de uma ação do Tribunal Penal
Internacional (TPI) contra o regime de Maduro.
O diálogo é condição pressuposta na
diplomacia. Em se tratando de países que dividem fronteiras, ainda mais. Mas
espera-se do governo brasileiro estratégias mais eficazes na política
externa diante da falta de abertura para conversas ponderadas. Empurrar a
solução com a barriga para não se indispor com o país vizinho não é uma delas.
O Planalto perdeu o tempo de
reação e a figura de mediador na crise que acomete a Venezuela. O risco agora é
de que, à essa altura, qualquer medida mais robusta que venha a ser tomada pelo
governo brasileiro não tenha relevância política e efeitos práticos. O papel de
líder regional e de país conciliador da América Latina está em xeque.
Um comentário:
Lula está dando tempo pra Maduro se fortalecer... Ou apodrecer de vez. O PT ainda segue parabenizando Maduro pela brilhante e democrática vitória... Baita política externa! Quanta visão de futuro!! Parabéns, petistas!
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