domingo, 20 de dezembro de 2015

Opinião do dia: Dora Kramer

Tem gente referida no auto engano. Gente crente que a situação do País se resolve com uma conversa entre Lula e FH. Não é assim. Talvez não esteja em Michel Temer a solução. É possível que tudo seja mais simples, mas é provável que seja mais complicado e irremediável.

Entre outros motivos porque Nelson Barbosa no comando formal do Ministério da Fazenda significa a retomada de uma política que comprovadamente não deu certo, embora seja da preferência da presidente, cujas escolhas erradas deram no que deu.
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Dora Kramer, jornalista, ‘E o vento pode levar...’, O Estado de S. Paulo, 20.12.2015

STF quebra sigilos de Renan

Aliado estratégico do governo contra o processo de impeachment, o presidente do Senado, Renan Calheiros, teve seus sigilos bancário e fiscal quebrados pelo Supremo Tribunal Federal, numa investigação de cobrança de propinas em contratos da Transpetro.

Fiador de Dilma na mira

• Vital para o futuro do processo de impeachment, presidente do Senado tem sigilo quebrado pelo STF

Merval Pereira, Jailton de Carvalho - O Globo

O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e de outros suspeitos de envolvimento em supostas fraudes na contratação do consórcio Estaleiro Rio Tietê pela Transpetro em 2010. Renan, aliado fundamental do governo para o futuro do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, indicou o então presidente da Transpetro, Sérgio Machado, e exercia grande influência nas atividades da subsidiária da Petrobras, de acordo com o Ministério Público.

Teori, relator das ações da Lava-Jato no STF, autorizou a devassa nas contas de Renan e Machado a partir de pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, num dos inquéritos que tramitam na Corte. A quebra do sigilo compreende o período de 1º de janeiro de 2010 a 1º de abril de 2014.

O ministro rejeitou, no entanto, pedido do procurador-geral para a realização de busca e apreensão na residência oficial de Renan, em Brasília, por considerar que não havia indícios suficientes para medida tão extrema.

Renan transformou-se nesta semana na peça chave da crise política do país, após o STF dar mais poder ao Senado ao definir o rito do impeachment. O STF decidiu que, assim como no processo do ex-presidente Fernando Collor de Mello, o Senado tem poder de rejeitar eventual afastamento da presidente pela Câmara. Nos últimos meses, Renan, alvo de mais de uma investigação na Lava-Jato, aproximou-se do Planalto e tem atacado publicamente o vice Michel Temer e outros colegas que trabalham pelo impeachment.

Na última terça, policiais federais e procuradores vasculharam 53 endereços de investigados na Lava-Jato, entre eles a residência oficial do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB). Teori rejeitou o pedido de busca na casa de Renan, mas autorizou a devassa nas contas do senador e buscas em endereços relativos às investigações contra ele. A partir dos laudos e das quebras de sigilo, Janot deverá decidir se apresenta ou não denúncia contra Renan. O senador responderia ainda a outros quatro inquéritos no STF no âmbito da Lava-Jato. Ele não quis comentar a quebra de sigilo.

Segundo documentos obtidos pelo GLOBO e também citados pela revista “Época”, a PGR suspeita que Renan, Machado e outros agentes públicos receberam propina para facilitar a vitória do consórcio Estaleiro Rio Tietê em licitação para renovar a frota de barcaças e empurradores utilizados pela Transpetro no transporte de etanol entre Mato Grosso e São Paulo. O consórcio é formado pelas empresas Rio Maguari Serviços e Transportes Rodoviários, SS Administração e Serviços e Estre Rio Petróleo e Gás.

Pelas investigações do grupo de trabalho da Lava-Jato em Brasília, as empresas teriam repassado propina a Renan camuflada de doações eleitorais ao diretório do PMDB de Alagoas e à própria campanha do senador em 2010. As doações ao diretório seriam da ordem de R$ 650 mil. A campanha de Renan teria sido contemplada com duas doações no valor total de R$ 400 mil. O diretório do PMDB de Alagoas, controlado pelo presidente do Senado, chegou a ser alvo de buscas na última terça-feira. As empresas fizeram as doações no mesmo período em que estava em andamento a licitação na Transpetro.

Depoimentos de Costa e Youssef
As investigações sobre as supostas fraudes começaram a partir de depoimentos do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef, dois dos principais delatores da Lava-Jato. A partir das declarações dos dois e de indícios numa 2ª fase da apuração, o procurador-geral sustenta que “a contratação do Estaleiro Rio Tietê possui elementos a confirmar que teria sido fraudulenta”. Segundo ele, “sabe-se agora que recursos relacionados a essa contratação foram carreados a favor de José Renan Vasconcelos Calheiros”.

• Empresa já sabia que a licitação era um jogo de cartas marcadas. O vencedor já estava definido antes da disputa

Um dos primeiros a apontar o dedo contra Renan, Costa confessou ter recebido R$ 500 mil em propina de Machado para facilitar a contratação de navios no sistema “bareboat” pela Transpetro. O ex-diretor diz que recebeu o dinheiro no apartamento de Machado, em São Conrado, no Rio. Afilhado político de Renan, Machado foi presidente da Transpetro de 2003 até o ano passado. Ele só foi afastado do cargo depois que as denúncias de Costa vieram a público. Ainda assim, a demissão do ex-presidente quase levou Renan a romper com o governo.

No mesmo depoimento em que falou sobre a propina paga por Machado, o ex-diretor da Petrobras fez acusações a Renan. Ele disse ter conhecimento de que “um percentual dos valores envolvidos nos contratos da Transpetro são canalizados para o senador Renan Calheiros, com quem José Sérgio de Oliveira Machado se reúne periodicamente em Brasília”. Ele não especificou os valores das propinas, mas disse que as somas movimentadas são expressivas. Alguns navios contratados pela Transpetro custariam em torno de R$ 180 milhões. Janot argumenta ainda que as fraudes na contratação do consórcio Estaleiro Rio Tietê são demonstradas também numa ação por improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal em Araçatuba (SP), contra Sérgio Machado e Wilson Quintela Filho, um dos dirigentes do consórcio, e outros empresários e servidores.

Na ação por improbidade, o MP informa que, duas semanas antes do início da licitação, em 23 de fevereiro de 2010, a SS Administração e Serviços, uma das empresas do consórcio, arrendou um terreno em Araçatuba “com vista a construir os comboios da Transpetro”. Ou seja, a empresa já saberia que a licitação era um jogo de cartas marcadas, segundo o Ministério Público. Na ação, o Ministério Público responsabiliza 16 pessoas, entre elas o prefeito de Araçatuba, Cido Sério (PT), e nove empresas.

A assessoria de Sérgio Machado sustentou, por nota, que a licitação citada no pedido do MPF foi regular. “O processo licitatório foi transparente e competitivo. Foram 31 concorrentes das regiões Sul, Sudeste e Norte do Brasil e de países como EUA, Holanda, Turquia e Argentina. Destes, 16 formaram seis consórcios. O vencedor do certame apresentou proposta com preço, à época, US$ 36 milhões menor que a do segundo colocado”, afirma a nota.

Num dos depoimentos da delação premiada, Paulo Roberto Costa diz ter recebido oferta de propina de Wilson Quintela, um dos executivos do consórcio Rio Tietê. “Que Wilson Quintela disse ao declarante em reuniões pessoais que daria uma parte do estaleiro ao declarante caso o mesmo ganhasse a licitação; que esclarece que a situação do estaleiro estava vinculada à aquisição pela Petrobras de vinte empurradores e oitenta barcaças”, disse. A negociata só não foi adiante porque, antes de ser concluída, Paulo Roberto foi demitido. Ele diz presumir, no entanto, que o suborno foi repassado a uma outra pessoa.

Paulo Roberto Costa lembrou ainda que a ingerência dele sobre a Transpetro era indireta. Cabia apenas ao então diretor de Abastecimento da Petrobras incluir nomes nas listas de empresas habilitadas a participar de licitações na Transpetro. A Procuradoria-Geral pediu, e o ministro Teori também autorizou, a quebra dos sigilos bancários e fiscal das empresas vencedoras da licitação, do diretório do PMDB de Alagoas e de Wilson Quintela, entre outros envolvidos no negócio.

O ex-diretor da Petrobras também acusou o lobista Fernando Baiano de atuar na Petrobras como operador do PMDB. Ele disse que recebeu R$ 1,5 milhão a título de agrado de Baiano, réu confesso e também um dos delatores da Petrobras. “O grupo criminoso, como se percebe, seria composto por parlamentares, diretores da Petrobras, e empresários. É sabido, também, que haveria um conjunto de operadores executando medidas para permitir que o esquema ilícito funcionasse adequadamente”, sustenta o Ministério Público.

A PGR também apura suposto pagamento de propina do Sindicato dos Práticos do Rio de Janeiro ao deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE), apontado por Costa como representante de Renan em negociações na Petrobras. Depois de firmar um acordo de mais de R$ 40 milhões com a Diretoria de Abastecimento, os práticos repassaram R$ 5,7 milhões aos advogados Paulo Baeta Neves e Paulo Ornelas, ligados a Aníbal Gomes. Quando o caso veio a público, o deputado disse que levou os advogados ao encontro de Paulo Roberto, mas negou que tenha recebido qualquer vantagem no negócio.

O GLOBO tentou falar com o advogado Eugênio Pacelli, responsável pela defesa de Renan, sobre as investigações do Ministério Público, mas não obteve resposta. Na última semana, Renan rebateu publicamente as acusações de que está envolvido em corrupção na Petrobras.

— Não tenho nenhuma informação (sobre o pedido do MPF). Já prestei todas as informações que me foram pedidas, coloquei qualquer coisa à disposição. E nunca consenti, e nem consentiria, e nem permiti, nem permitiria, que alguém, em qualquer circunstância, em qualquer lugar, falasse por mim — disse Renan, após a operação da PF.

Instabilidade política desse ano não dará folga à Dilma em 2016

• 2015 foi marcado por choque do Estado contra interesses oligárquicos

José Casado - O Globo

Dilma Rousseff vai atravessar o primeiro trimestre de 2016 em busca de algo que não conseguiu durante todo o ano de 2015: estabilidade. Ela termina o primeiro ano da reeleição como a governante mais rejeitada pelo eleitorado nos últimos 29 anos, ou seja desde a redemocratização do país há 29 anos. Sua taxa de desaprovação é recorde (83%), confirmou o Ibope na primeira quinzena de dezembro (veja o gráfico ao lado). Muito além, por exemplo, das avaliações mais negativas registradas pelo governo José Sarney (1986-1990), que deixou o poder com uma inflação mensal de 83%.

Dilma já foi alvo de 39 pedidos de impeachment em 245 dias úteis, entre a posse em janeiro e a última sexta-feira. Significa que, nesse período, a Câmara dos Deputados recebeu um pedido para retirar a presidente do poder a cada seis dias de funcionamento. Três foram aceitos, anexados e transformados num único processo, que está em andamento.

O que faz de 2015 um ano singular é o império das instituições no choque do Estado com interesses de oligarquias expostos nos últimos dois anos a partir de investigações sobre corrupção na Petrobras — os velhos vícios nas relações público-privadas já levaram 23 conglomerados empresariais a significativas perdas patrimoniais, 116 prisões e 75 condenações que somam mais de 626 anos, inclusive para alguns dos principais acionistas e executivos.

A consequência institucional foi uma posição de supremacia consolidada pelo Judiciário em relação ao Executivo e ao Legislativo num cenário político que faz o calendário de 2015 parecer interminável: a presidente e o vice encontram-se ameaçados de impeachment e cassação; os presidentes da Câmara e do Senado ameaçados de perda de mandato e prisão; quase um terço Congresso está sob investigação no Supremo Tribunal Federal, e um ex-presidente, Lula, cumpre inédita rotina de visitas à polícia para depor em inquéritos sobre corrupção durante seus oito anos de governo.

A névoa de incertezas sobre o ano que vem tem origem na soma do impasse político aos efeitos depressivos da crise econômica dos últimos 24 meses, quando se acumulou queda de 30% nos investimentos, declínio de 14% na produção industrial e de 14,5% nas vendas no comércio. Na origem desses desequilíbrios estão atrapalhadas decisões de quem realmente comanda a economia no governo Dilma Rousseff, ou seja, ela mesma.

No governo e na oposição percebe-se consenso sobre a perspectiva de agravamento da situação no próximo trimestre, a partir de informações coletadas no setor privado.
Prevê-se acréscimo de quase um milhão de pessoas no grupo de 8 milhões de desempregados; inflação estável em dois dígitos; aumento da taxa básica de juros, e, dificuldades crescentes para refinanciamento da dívida pública, restringindo a solvência dos governos federal, estaduais e municipais.

A isso soma-se um processo decisório confuso que estimula a inoperância.
Exemplar foi o caso do Ministério da Saúde em meados do ano, quando se reduziu em 40% os repasses às prefeituras para serviços de controle do vetor de doenças como dengue e zika.

Resultado: na sexta-feira, a 40 quilômetros do Palácio do Planalto confirmava-se o primeiro caso de zika, com outras19 suspeitas.

Dilma vai atravessar 2016 batalhando pelo mandato. Se e quando conseguir, talvez já não tenha tempo para construir um legado. Corre o risco de sobreviver na indiferença de um rodapé da História

STF quebra sigilos bancário e fiscal de Renan Calheiros

• Reportagem da revista mostra que duas investigações da Lava Jato tentam descobrir possível envolvimento do presidente do Senado

Carla Araújo, Ricardo Brito e Fernanda Nunes - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Poupado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de ver seu nome na lista de buscas e apreensões da Operação Catilinárias, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) teve seus sigilos fiscal e telefônico quebrados a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). A ação cautelar, que corre em segredo de Justiça, determina a abertura dos dados do senador entre 2010 e 2014. A informação foi divulgada pela revista Época.

Os pedidos de afastamento de sigilo teriam como base a suspeita de que Transpetro firmou contrato superfaturado, no valor de R$ 240 milhões, para a construção de 20 comboios de barcaças em agosto de 2010 para abastecer o diretório do PMDB de Alagoas, presidido por Renan. Na ocasião, a empresa, uma subsidiária da Petrobrás, era comandada por Sérgio Machado, apadrinhado do presidente do Senado e alvo da operação de busca e apreensão da última terça-feira (15).

Conforme dados de prestação de contas no Tribunal Superior Eleitoral, ao menos duas empresas que faziam parte do consórcio sob suspeita fizeram doações de R$ 400 mil ao diretório do PMDB de Alagoas que, por sua vez, abasteceu a campanha de Renan ao Senado em 2010. Na ocasião, Renan arrecadou R$ 5,4 milhões.

O advogado Eugênio Pacelli, que defende o presidente do Senado nas investigações da Lava Jato, disse que não foi oficialmente informado sobre a decisão da quebra de sigilo e que ela causa "indignação". "Gostaria de registrar a perplexidade da defesa", afirmou. O advogado, que está de férias em Pipa (RN), disse que estava sendo comunicado da decisão pela imprensa. "Como vocês estão noticiando, desconfio que essa informação seja verdadeira. E se for causa indignação", afirmou.

Em meados de maio, quando o Estado revelou que a Polícia Federal havia encaminhado pedido para quebrar os sigilos bancário e fiscal de Renan, o próprio presidente do Senado havia autorizado sua defesa a entregar ao ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, esses dois sigilos e ainda o telefônico.

"Estou entregando ao ministro Teori (os meus sigilos), ele não precisa sequer despachar, todos os meus sigilos sem exceção", anunciou o peemedebista, na ocasião. A reportagem tentou contato com ele neste sábado por telefone, sem sucesso.

Para o advogado de Renan, o pedido da PGR surpreende porque passa a impressão de que houvesse alguma resistência por parte do parlamentar de obstruir as investigações. "É por isso que causa surpresa. A PGR fazer um pedido desses como se houvesse alguma resistência", disse.

Quando ofereceu a abertura de seu sigilo, Renan afirmou que era preciso deixar "as coisas claras". Ele repetiu sua fala de que o homem público tem que prestar contas de tudo o que faz e destacou que tem se colocado à disposição. Disse ainda já ter dado seus esclarecimentos. "Sou responsável pelos meus atos", disse.

Machado. Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, citado no despacho do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, que autorizou a quebra do sigilo do presidente do Senado, Renan Calheiro (PMDB), nega que tenha cometido irregularidades no período em que esteve à frente da subsidiária da Petrobrás. Em comunicado, Machado afirma que a licitação questionada pelo STF foi "competitiva e transparente".

Ao justificar a quebra do sigilo bancário, o ministro destacou a doação de dinheiro à campanha de Renan feita por sócios do consórcio Rio Maguari, vencedor da concorrência lançada em agosto de 2010 pela Transpetro para a construção de 20 comboios de barcaças. Na nota, Machado afirma que "a equipe técnica do Tribunal de Contas da União (TCU), a pedido do Ministério Público Federal, atestou a lisura do procedimento licitatório", citado por Zavascki.

‘Cacife político’ é arma de Renan Calheiros para 2016

• Alvo da Lava Jato, presidente do Senado agora aposta em novo status adquirido após decisão do Supremo para se defender à frente do cargo

Adriano Ceolin - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Ao encerrar a última sessão deliberativa do Senado deste ano, o presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) deixou o plenário com um livro dos autos do impeachment do ex-presidente Fernando Collor nas mãos. Passava das 19h da quinta-feira passada e fazia apenas alguns minutos que o Supremo Tribunal Federal decidira que o Senado – e não a Câmara dos Deputados – será a esfera que determinará a suspensão da presidente Dilma Rousseff do cargo em caso de aprovação de um pedido de afastamento. Segundo pessoas próximas a Renan, ele está convicto de que seu cacife político “triplicou” para 2016, ano em que deve ser concluída a investigação sobre seu envolvimento na Operação Lava Jato.

Na saída do plenário, Renan sorria e era ladeado pelos colegas Romero Jucá (RR) e Eunício Oliveira (CE). Os dois são aliados do presidente do Senado, mas nas últimas semanas atuaram em frentes opostas dentro do PMDB. Enquanto Jucá tentou ajudar a consolidar o nome do vice-presidente Michel Temer como sucessor de Dilma, Eunício trabalhou em favor do atual governo.

Essa dicotomia indica como deve ser a postura de Renan no próximo ano. “Ele será independente. Em princípio, se portará como aliado de Dilma. Porém, se o governo perder o rumo, ele pode apoiar o impeachment dela”, resume um auxiliar do presidente do Senado.

Com a decisão do STF em favor do Senado, Jucá concorda que a tese do impeachment de Dilma refluiu e o possível rompimento do PMDB com o governo também. No entanto, ele avalia que “tudo pode mudar” no ano que vem. “Toda a questão é econômica. A política é consequência. Se economia estiver se resolvendo, a política se ajusta”, disse Jucá. Já para o senador Eunício Oliveira será “natural” um rearranjo de forças na próxima convenção do PMDB, prevista para março. Atual presidente nacional da sigla, Temer aposta que o grupo do Senado tentará tomar o comando partidário.

Até agora, a estratégia dúbia de Renan tem dado certo. No começo do ano, ele esteve a ponto de romper com Dilma quando a presidente decidiu demitir o ministro Vinícius Lages da pasta do Turismo para dar lugar ao ex-deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que fora apoiado pelo vice-presidente em dobradinha com a bancada da Câmara. A partir do segundo semestre, porém, Renan viu uma janela de oportunidade para se cacifar com Dilma quando o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), resolveu partir para o confronto direto com o Palácio do Planalto. Na sequência, ele ajudou Dilma a reconduzir o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao cargo por mais dois anos.

Recompensa. Renan também ampliou suas incursões no STF, sempre com a cerimônia devida. Jamais foi à Corte sem interlocutores acertarem a visita com a antecedência. Também evitou dar declarações sobre os inquéritos contra ele. Na semana passada, teve a sua maior recompensa. O ministro Teori Zavascki negou pedido de busca e apreensão na sua residência. Foram autorizadas apenas buscas no diretório estadual do PMDB de Alagoas, que é presidido por Renan. O episódio foi comemorado no gabinete da presidência do Senado.

Os desdobramentos da Operação Lava Jato, que revelou um esquema de corrupção na Petrobrás, terão influência sobre o humor de Renan. O presidente do Senado afirma que até agora “não há nada de concreto contra ele”. Pessoas próximas ao senador ressaltam que o primeiro inquérito contra ele já foi prorrogado por quatro oportunidades “sem avanço nas investigações”. O nome de Renan surgiu pela primeira vez depois que o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa declarou que ele recebia propina por intermédio do deputado Aníbal Gomez (PMDB-CE). O presidente do Senado negou essa versão.

Dilma aposta em virada à esquerda para manter o poder

Planalto enxerga ‘salvação’ de Dilma na economia e na base histórica do PT

• Após Executivo obter vitória no Supremo sobre o rito do impeachment, presidente indica a sindicalistas e representantes de movimentos sociais uma inflexão à esquerda no governo

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Ameaçada de impeachment, a presidente Dilma Rousseff promete fazer a partir de agora um novo movimento de inflexão à esquerda nos rumos da gestão, em uma tentativa de se manter no Palácio do Planalto. Embora o Executivo tenha obtido uma vitória no Supremo Tribunal Federal, que deu ao Senado a palavra final sobre o rito de impedimento, a cúpula do PT acredita que a salvação de Dilma depende da economia e de sua aproximação com os movimentos sociais.
Foi com esse diagnóstico que a presidente, antes mesmo de trocar Joaquim Levy por Nelson Barbosa no Ministério da Fazenda, deu sinais de mudança na política econômica. Desenvolvimentista, Barbosa sempre defendeu uma prescrição que coincide com a receita de Dilma para sair da crise.

“Precisamos de uma nova equação econômica para o Brasil”, afirmou a presidente, na terça-feira, em reunião com sindicalistas e representantes de entidades empresariais. “Levamos uns trancos. Mas o que faremos após superar a crise?”, perguntou ela na quinta-feira, ao se encontrar com integrantes da Frente Brasil Popular, que no dia anterior organizara atos em defesa do seu mandato.

‘Ilusão’. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse a Dilma, a ministros e também a dirigentes do PT que é uma “ilusão” ver o Congresso como o campo de batalha mais importante na guerra contra o impeachment. Em jantar com sua sucessora há quatro dias, no Palácio da Alvorada, Lula lembrou que só a sua ligação com o povo o livrou de ser apeado do poder, em 2005, quando eclodiu o escândalo do mensalão.

“Você precisa liberar o crédito, fazer a roda da economia girar e dar notícia boa”, aconselhou o ex-presidente, na última conversa com Dilma, segundo relatos de seus interlocutores. “A agenda do País não pode ser só ajuste fiscal e Lava Jato”, emendou ele, numa referência à operação da Polícia Federal que prendeu empresários, pesos pesados do PT e ameaça o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Na avaliação do ex-presidente, se nada for feito rapidamente haverá uma “tempestade perfeita” que pode levar à pressão das ruas pelo impeachment, com inflação em alta, salário em baixa e desemprego na casa de dois dígitos antes de março de 2016.

Vale tudo. Nas conversas com sindicalistas e empresários, nessa semana, Dilma disse que fará de tudo para que a economia cresça de forma consistente nos próximos anos, mas pediu ajuda para superar a instabilidade política. Para a presidente, a briga de uma ala do PMDB e da oposição para tirá-la do cargo é uma tentativa de “encurtar o caminho” para o poder.

“Vamos manter o marco legal da democracia contra a política do vale tudo”, declarou Dilma, quando agradeceu aos movimentos sociais pela defesa do seu governo nas ruas.

A percepção do núcleo político do Planalto é a de que o vice Michel Temer (PMDB) conspira ao lado de Cunha para tirar Dilma do cargo e, embora tenha sofrido um revés nos últimos dias, precisa ter os passos monitorados.

O governo confia em Renan, mas se mantém em estado de alerta. Auxiliares de Dilma afirmam que, se a economia estiver conturbada em 2016 e o processo de impeachment for aprovado na Câmara, o aliado pode virar algoz, porque não vai “matar no peito” uma causa impopular num ano eleitoral.

“Superada essa crise política, as condições estarão dadas para a retomada do crescimento com distribuição de renda”, comentou o ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias. “É certo que existem discordâncias (com os movimentos sociais) em relação ao caminho a ser tomado, mas não quanto aos objetivos estratégicos.”

Dilma pediu apoio para a criação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Aos empresários e dirigentes sindicais, a presidente disse que se trata de um imposto com menos impacto na inflação e prometeu a divisão dos recursos arrecadados com Estados e municípios. “Não vamos fixar (a duração) em um ano, dois anos ou três anos. Isso a gente debate no Congresso”, observou.

O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, mandou ao mercado o recado de que a mudança no comando da Fazenda não significa o fim do ajuste fiscal. “Pelo contrário: nós vamos insistir em concluir a votação das medidas que estão no Congresso”, comentou Wagner. “Além disso, daremos continuidade às reformas necessárias para a melhoria do ambiente econômico.”

Freire diz que decisão do Supremo é clara interferência do Judiciário no Legislativo

 - Assessoria do PPS

O presidente do PPS, deputado Roberto Freire (SP), disse que a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que muda as regras de tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso Nacional é “uma clara interferência” do Judiciário no Legislativo”.

Segundo ele, a decisão “causou surpresa” porque o voto do ministro Edson Fachin na ação do PCdoB que questionava o andamento do processo de afastamento de Dilma na Câmara dos Deputados considerava válido todas as etapas cumpridas até então pela Casa. “Se optou pela interferência clara nas questões internas do Legislativo”, afirmou.

Freire citou como exemplo da interferência o posicionamento do ministro Luís Roberto Barroso, que em seu voto no julgamento da ação considerou inaceitável a candidatura avulsa para a eleição da comissão especial do impeachment da Câmara.

“Isso demonstra um total desconhecimento dele de como se realiza as eleições no Poder Legislativo, porque fica difícil imaginar eleição da Mesa [Diretora] da Câmara e do Senado sem a candidatura avulsa, que sempre existiu, inclusive para as comissões permanentes do Parlamento”, disse, ao acrescentar que a “história é pródiga” em exemplo de candidaturas avulsas que derrotam candidatos a presidente de comissões indicados pelas lideranças partidárias.

Para o parlamentar, Barroso mostrou “total desconhecimento do que é a vida do Poder Legislativo no tocante as suas eleições. A mesma coisa foi feita com essa comissão especial [do impeachment] em que o Supremo, interferindo indevidamente, anulou [o processo de escolha dos membros do colegiado que vai decidir sobre o afastamento da presidente]. Não foi aplicando a lei, foi quase como legislando, ao arrepio da Constituição e do regimento [interno da Câmara]”, afirmou.

Segundo Freire, a decisão “criou aquilo” que a oposição mais temia, a fixação do rito de impeachment ao “bel prazer” do Supremo. “Como sentença judicial não se questiona, vamos ter de cumprir”, disse.

Crítica
Roberto Freire, no entanto, critica a solução dada pelo STF quanto à composição da comissão especial a partir da indicação dos líderes partidários, que precisa ser votada pelo plenário. “Se a maioria da Câmara rejeitar a lista indicada pelos líderes, como é que vamos ficar se não pode ter chapa alternativa ou candidatura avulsa? O Supremo vai querer indicar os seus membros?”, ironizou.

Crise
O presidente do PPS disse que essa “decisão atrapalha o processo de impeachment, mas não impede o seu desenvolvimento. A presidente que cometeu crime de responsabilidade continua aí [no cargo]. Basta ver a crise econômica e o desespero de final de ano das famílias com a inflação e o desemprego batendo à porta provocado por esse governo incompetente e desastrado. Tudo isso continua e tende a se agravar, porque já vivemos a recessão e tudo indica que continuará, havendo inclusive o risco de depressão econômica”, disse.

Para ele, a crise durante o processo de impeachment vai se aprofundar com a perda do grau de investimento do Brasil por duas agências de risco – Fitch e Standart & Poor’s –, a alta do juro nos EUA, que dificulta a entrada de recursos externos no País, e a praticamente certa saída do ministro da Fazenda Joaquim Levy. “Tudo o que de ruim se pode anunciar está acontecendo, e o governo é incapaz de dar repostas para enfrentar a crise”, afirmou.

Corrupção
Freire diz que para “completar o conjunto da obra”, o governo tem ainda contra si o maior escândalo de corrupção da história, com os efeitos das operações Lava Jato e Zelotes. “O conjunto da obra é que vai determinar o desenlace [do governo] na questão do impeachment”, ressaltou.

Para o presidente do PPS, o partido, a oposição e a “amplíssima maioria da opinião pública brasileira” favorável ao impeachment de Dilma terão de enfrentar os “pequenos obstáculos” impostos pela decisão do STF. “O impeachment deve ser votado para o bem do País”, defendeu.

Senado
Na avaliação de Roberto Freire, a decisão do Supremo criou a ideia de que o Senado tem de confirmar o afastamento pelo mesmo quórum de dois terços exigidos na Câmara. “Para aprovar a abertura do processo de impeachment precisa de dois terços dos votos dos deputados. Se o Senado não quiser aceitar não pode ser por maioria simples, tem de ser por maioria qualificada como vai ser na Câmara, que aprovou a abertura do processo”.

Ele entende que “se tiver maioria absoluta para arquivar, é sinal que não teria maioria para aprovar o impeachment. Agora, se não arquivar, ela [Dilma] não só se afasta como ficará sabendo que vai se afastar ao final [do processo], porque a maioria existe para aplicar o impeachment”, diz, ao salientar que “sociedade brasileira exige uma correção de rumos” e que essa mudança poder se dar com o impeachment previsto no regime presidencialista.

Judicialização
Para Freire, o “processo de judicialização” das regras do impeachment pelo Supremo apresenta um aspecto positivo. “Isso desmascara de vez a estultice de chamar o impeachment de golpe. Não foi antes, com [Fernando Collor], em 1992, quando as mesmas forças que hoje estão para sofrer o processo de impeachment estavam conosco lá atrás. Não sofre impeachment quem não é presidente eleito, tal como foi com Collor. Está na Constituição e o Congresso vai se pronunciar”, finalizou.

Planalto cometeu três tipos de infrações; pedalar foi só uma delas

Vinicius Torres Freire – Folha de S. Paulo

Apesar das reviravoltas da semana passada, a presidente Dilma ainda pode ser processada no Congresso e perder o mandato. Ela é acusada de crime de responsabilidade, ato ilegal de uma autoridade, por ter violado leis que regulam como o governo deve gastar dinheiro público.

No dia a dia das conversas políticas, diz-se que a presidente está sendo julgada pelas "pedaladas". Esse é, no entanto, apenas um dos três tipos de infrações da acusação contra Dilma Rousseff.

Primeiro, a presidente autorizou o governo a fazer despesas extras sem ter a devida e específica autorização legal do Congresso para tanto. O dinheiro dos impostos não chegava na quantidade que o governo imaginara. A despesa extra não estava prevista na lei do Orçamento do governo para aquele ano.

A fim de continuar a gastar, foi preciso buscar dinheiro em outras fontes que não os impostos que são arrecadados no dia a dia. Foi preciso "abrir crédito suplementar", como se diz no jargão.

O governo teria assim violado artigos específicos que tratam literalmente de crédito suplementar, da Constituição, da Lei Orçamentária do ano, da Lei de Responsabilidade Fiscal e, assim, da lei 1.079, que trata de crimes de responsabilidade também do presidente, em seu artigo 10, item 4 ("Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária") e item 6 ("Ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal").

Pedalada
Segundo, o governo é acusado de tomar dinheiro emprestado dos bancos públicos. Na verdade, o governo teria tomado empréstimos de maneira disfarçada, pois a lei o proíbe de obter crédito em banco de que seja "dono".

É como se o governo tivesse uma conta de cheque especial com um limite bem pequeno, mas estourou esse limite, ficando no vermelho muito além do que seria razoável no Banco do Brasil (BB), na Caixa Econômica Federal (CEF) e no BNDES.

Considere-se o caso mais simples. O governo não paga diretamente aos cidadãos benefícios sociais como o seguro-desemprego ou o Bolsa Família. Nesse caso, o responsável pelo pagamento é a Caixa.

Normalmente, em certo dia ou dias do mês, o governo deposita uma quantidade de dinheiro que, imagina, será suficiente para fazer os pagamentos. A quantidade não é precisa, pois o número de pessoas que recebem o benefício pode variar ou porque nem todo mundo saca todo o dinheiro no dia do pagamento.

Se faltar um pouco de dinheiro para o pagamento, o banco cobre a diferença, e o governo paga juros no "cheque especial". Se sobrar dinheiro por alguns dias na conta, o governo recebe juros.

Dentro de certos limites, valores pequenos, essas operações são razoáveis e apenas servem para facilitar a vida da administração pública. Quando chegam ao valor de bilhões, pode-se dizer que o governo está empurrando o pagamento com a barriga, "fica devendo, paga quando puder". Na prática, torna-se uma operação de empréstimo.

Assim, é possível esconder o fato de que o governo está no vermelho e, certos meses, pode parecer que o governo tem superávit (gastou menos do que arrecadou).

Se empurra o pagamento para o futuro, "pedala para a bicicleta não cair", pode seguir adiante, passeando e gastando, deixando o débito para mais tarde, gastando mais, sem fundos, em um período eleitoral. Como em 2014.

O Tribunal de Contas da União acusou o governo de pelo menos outros dez tipos diferentes de "pedaladas".

Por exemplo: o dinheiro do FGTS é usado para baratear a compra dos imóveis do Minha Casa, Minha Vida para dar subsídio, redução do preço da casa paga com dinheiro público. Esses fundos são apenas um adiantamento que o governo deve devolver, mas ficou devendo por anos.

Dívida maquiada
O governo dá outros subsídios. Por exemplo, por meio do BNDES ou do BB, empresta centenas de bilhões de reais para empresas industriais ou agrícolas. Como empresta a taxas de juros menores que as de mercado, os bancos perdem dinheiro.

O governo precisa cobrir esse "prejuízo" dos bancos, cobertura que se chama "equalização de taxas de juros". Em especial no governo Dilma 1, essa conta foi empurrada com a barriga, se tornou na prática pagamento devido e atrasado, uma espécie de crédito dos bancos com o governo. O artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe operação de crédito entre um banco estatal e o governo.

A terceira acusação contra o governo é justamente essa: não registrou esse passivo na dívida pública, outra maquiagem da contabilidade oficial. O governo violou vários itens dos artigos 9 e 10 da lei 1.079, que definem respectivamente os crimes de responsabilidade contra a probidade na administração e contra a lei orçamentária.

Pré-candidatos são pressionados a se definirem sobre impeachment

Reynaldo Turollo Jr., Catia Seabra – Folha de S. Paulo

Com o desfecho do processo de impeachment deixado para 2016, ano de eleições municipais, deputados que deverão ser candidatos a prefeito admitem sofrer pressão dos eleitores para votar pelo afastamento da presidente Dilma Rousseff na Câmara. Enquanto uns afirmam que não vão ceder, outros evitam se posicionar.

Pré-candidato do PMDB à sucessão de Eduardo Paes na Prefeitura do Rio, o ex-secretário municipal Pedro Paulo acaba de reassumir seu mandato na Câmara, em um movimento visto como uma forma de engrossar a bancada pró-Dilma na Casa.

Ele rechaça a hipótese de ser penalizado na eleição por causa do apoio ao PT.

"O Brasil precisa sair da crise, recuperar a economia, e não acredito que a equipe que assumiria [em caso de impeachment] seja capaz de melhorar o país", afirma, em referência ao vice de Dilma, Michel Temer, que também preside o PMDB.

Já Dagoberto Nogueira (PDT-MS), que deve disputar a Prefeitura de Campo Grande, admite que há em seu Estado um "clamor" pelo impeachment, mas garante que seguirá a posição de seu partido, que é da base do governo e "contra o golpe". Para o deputado, as pedaladas fiscais não são argumento jurídico para o afastamento.

"Isso pode me trazer prejuízo, sim, mas não posso deixar de defender o que eu penso e a tese do meu partido", afirma, acrescentando que seus eleitores saberão reconhecer sua "coerência".

Deputado pelo PSOL, partido de oposição ao governo, mas contrário ao impeachment, Edmilson Rodrigues (PA) é cotado para concorrer à Prefeitura de Belém.

"Na avaliação do PSOL, não é legítimo [o impeachment] porque o argumento das pedaladas fiscais não é base para isso", diz. "Vamos votar no que acreditamos. Não estamos preocupados com as consequências eleitorais."

Oposição na base
No sentido contrário, há deputados de partidos da base a favor do impeachment.

Marcelo Belinati (PP), pré-candidato a prefeito de Londrina (PR), defende o afastamento da presidente porque "grande parte de seu governo e de seu partido têm envolvimento [na Lava Jato]".

"Não sou da base coisa nenhuma. Capaz de eu ser mais oposição que o PSOL", diz.

Postulante ao cargo de prefeito do Rio, Indio da Costa (PSD) já avisou ao ministro Gilberto Kassab (Cidades), fundador de seu partido, que votará pelo impeachment. "Quem ficar ao lado do PT terá dificuldade."

Pressionar os deputados em seus redutos é uma das apostas dos grupos pró-impeachment, como MBL (Movimento Brasil Livre) e Vem Pra Rua, para angariar votos contra Dilma na Câmara.

No último domingo (13), em São Paulo, o MBL levou para a avenida Paulista um balão com a foto do deputado federal e pré-candidato a prefeito Celso Russomanno (PRB-SP), cujo partido é da base do governo.

"Vocês vão deixar um aliado da Dilma ser prefeito?", gritavam integrantes do MBL.

Procurado pela Folha, Russomanno não quis responder.

Possível candidato a prefeito de Belo Horizonte, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG) minimizou a pressão eleitoral sobre seu voto na Câmara. Disse que sua posição observará critérios técnicos e jurídicos, e não quis adiantá-la.

Valadares Filho (PSB-SE), que deve concorrer a prefeito de Aracaju, prefere esperar seu partido fechar uma posição sobre o impeachment antes de se manifestar.

Obstáculos em série

• Para analistas, Nelson Barbosa terá de lutar por sobrevivência política com melhoras na economia

Cássia Almeida - O Globo

Economistas e cientistas políticos avaliam que o dilema do novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, é lutar pela sobrevivência política, com melhorias na economia. Recuperar a confiança do mercado, evitar outro rebaixamento do país e elevar impostos estão entre os desafios, conta Um mar turbulento espera o novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. As crises gêmeas, da política e da economia, paralisaram o país. A turbulência política talvez dê uma trégua para o novo condutor da Fazenda. A decisão do Supremo derrubando o rito de impeachment da Câmara tornou a saída da presidente Dilma Rousseff uma possibilidade mais distante no radar.

Economistas e cientistas políticos acreditam que o maior desafio de Barbosa e do próprio governo é lutar pela sobrevivência política, mostrando alguma melhoria na economia, após o país fechar 2015 com a pior recessão desde o governo de Fernando Collor, que renunciou para evitar o impeachment.

— No mínimo, o governo terá de mostrar resultados econômicos que não sejam piores que os de 2015 — diz o economista Luiz Roberto Cunha, professor da PUC-RJ.

A política acabou ditando os rumos da economia este ano e deve ser protagonista também em 2016.

— A política é a mãe da crise nesse momento. A economia vem a reboque — afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

A saída de Levy desagradou ao mercado, mas “Fora Levy” foi um dos gritos de ordem dos movimentos sociais e sindicatos na última quartafeira, durante a manifestação a favor da presidente. A iniciativa pode indicar maior sustentação política, com o PT mais unido em torno das demandas da presidente Dilma. Se este cenário se confirmar, o ministro teria menos dificuldade para aprovar novos impostos. A medida ajudaria a arrecadação e as contas públicas.

Também mudou o horizonte de atuação. O alvo agora é 2016 apenas. Não há muita crença que reformas estruturais para reduzir gastos a médio e longo prazo vão avançar.

Mesmo depois das primeiras afirmações de Barbosa como novo ministro, de que o superávit fiscal de 0,5% é o alvo a ser perseguido, alcançar esse objetivo ainda é considerada a missão mais árdua, na opinião de Vale.

— Acho muito difícil, especialmente porque a arrecadação frustará o governo e porque dois anos seguidos de corte de gastos em governo de esquerda seriam uma jabuticaba impossível. Nem aqui conseguiríamos ter isso.

Outra das tarefas do ministro citadas por analistas é a tentativa de recuperar a confiança dos agentes econômicos — de empresários a consumidores — para que o país volte a caminhar para frente.

A composição da equipe é tarefa que o novo ministro já iniciou. Parte dos técnicos que estavam com ele no Ministério do Planejamento seguirão para a Fazenda. Dyogo Oliveira continuará sendo o secretário-executivo do ministro, mas agora na nova pasta no lugar de Tarcísio Godoy, que integrava a equipe de Joaquim Levy. O atual chefe de Assessoria Econômica do Planejamento, Manoel Pires, deve ser o novo secretário de Política Econômica. A Secretaria do Tesouro Nacional, que é comandada por Marcelo Saintive, também terá um novo titular. Mas Saintive se comprometeu a ficar no cargo até o final do ano. Na Receita Federal, Jorge Rachid deve permanecer.

Os 7 trabalhos do novo ministro

1 Recuperar a confiança e as expectativas

Durante 2015, as expectativas sobre os resultados da economia foram se deteriorando semana a semana. Para o historiador Francisco Carlos Teixeira, professor da UFRJ e da Fundação Dom Cabral, a mudança das expectativas já no começo do ano será fundamental para dar sustentação ao governo e ao próprio ministro.

— Ele precisa mostrar que a economia parou de desabar, mostrar algum resultado nos próximos 40, 60 dias para ter impacto político. Tem que fazer que os empresários brasileiros acreditem, senão não vai ter investimento.

A mudança da meta de superávit fiscal primário (economia do governo antes do pagamento de juros da dívida pública), na visão do cientista político da UFF Eurico Figueiredo, pode dissipar um pouco o pessimismo generalizado com 2016, o que ele considera fundamental.

2 Evitar nova rodada de rebaixamento do país

Evitar a perda de grau de investimento por mais uma agência de classificação de risco, a Moody’s, será praticamente impossível, de acordo com analistas. Duas agências, a Standard & Poors e a Fitch, já rebaixaram os títulos brasileiros para grau especulativo. O desafio agora é evitar que o país perca mais uma vez o selo de qualidade, que é referência dos investidores.

— Levy era o fiel da balança de que o Brasil poderia impedir o rebaixamento. E sofreu downgrade por duas agências. O problema agora é evitar nova rodada no segundo semestre — afirma Luiz Roberto Cunha, da PUC.

Para Sergio Vale, da MB Associados, a piora ainda maior das notas brasileiras é praticamente certa:

— Os rebaixamentos estão garantidos. Além da Moody’s, veremos as outras duas agências diminuírem ainda mais as notas.

3 Resultados econômicos melhores que os de 2015

O horizonte do governo se encurtou. Para Luiz Roberto Cunha, da PUC-RJ, os olhos estão voltados para o Natal de 2016. Por isso, é importante que os resultados econômicos sejam menos ruins do que os deste ano. Entre os indicadores, ele ressalta que a recessão, que deve ficar entre 3,5% e 4% este ano, poderia ficar em 2,9% em 2016. Já o desemprego, que deve encerrar 2015 em 11%, recuaria para algo entre 8%a 9%. Ele pondera que a inflação será menor, pois o tarifaço de energia ficou em 2015.

— Será um ano de pressão política, com processo de impeachment, portanto é preciso melhorar o quadro pelo menos um pouco, evitando deteriorar ainda mais emprego, produção e renda, flexibilizando um pouco a política fiscal. Mas não há espaço para dar de novo um cavalo de pau na economia.

4 Conseguir alcançar a meta de 0,5% de superávit fiscal

O ministro Nelson Barbosa tocou várias vezes na mesma tecla na primeira entrevista como condutor da política econômica: perseguir a meta de 0,5% de superávit primário. Mas, para analistas, esse será um dos principais desafios de Barbosa.

— O teste fundamental vai ser mostrar que essa meta é para valer, que ela vai ser cumprida e o Brasil vai começar a recuperar o equilíbrio fiscal. Não podemos entrar num terceiro ano de déficit primário. O sinal para os mercados é que a economia começaria a entrar numa dinâmica perversa — diz Langoni.

Vale considera praticamente impossível economizar 0,5% :

— O maior desafio de todos é fazer o ajuste fiscal, que deveria ser maior que 0,5%. O governo não entendeu que aceitar política fiscal frouxa só vai piorar a situação.

5 Fechar acordos para abertura comercial

Indicadores externos melhoraram com a crise. A alta do dólar e a recessão fizeram as importações desabarem e os gastos externos de turistas estrangeiros também. O momento é de investir em acordos de comércio, diz Langoni:

— O Brasil tem que alavancar as exportações. Mas para isso precisa ter acesso a mercados. Vi muito pouca coisa em relação a novos acordos comerciais, começando pela União Europeia (UE). Vamos aproveitar agora que a Argentina está dando essa guinada liberal. Acesso ao mercado é fundamental.

Teixeira, da UFRJ, também cita a falta de empenho em fechar acordos:

— O ministro precisa viajar muito, a imagem do Brasil está ruim lá fora. Tem que acelerar o acordo com a UE.

6 Aprovar aumento de impostos

A chegada de Barbosa na Fazenda pode unir o PT — que nunca aprovou a escolha de Levy —e recompor a base do governo no Congresso. Eurico Figueiredo, cientista político da UFF, diz que movimentos sociais, micro e pequenos empresários e funcionalismo público podem voltar a dar apoio, o que influenciaria na queda de braço no Congresso. A ajuda de governadores que ganham com a aprovação da CPMF conta a favor, diz Luiz Roberto Cunha, da PUC-RJ:

— Governadores terão mais espaço para gastar, deputados terão benefícios. Vai ter apoio para aprovar CPMF.

Sergio Vale já avalia ser mais difícil aprovar CPMF em ano eleitoral. Aposta mais na Cide, a contribuição embutida no preço da gasolina, mas somente quando terminar a entressafra da canade-açúcar, para não aumentar muito o preço do combustível.

7 Não ceder a medidas heterodoxas

O ministro que é apontado como um dos formuladores da “nova matriz econômica”, política adotada no primeiro mandato da presidente Dilma, terá como desafio também não ceder à tentação de adotar medidas heterodoxas, destaca Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central:

— Temos a experiência da Argentina e a tragédia na Venezuela como exemplos do que não seguir.

Colaboraram Martha Beck e Marcello Corrêa

Luiz Sérgio Henriques: Impasses hegemônicos

- O Estado de S. Paulo

Na virada do século, um pensador italiano, de sólidas raízes no marxismo historicista de seu país, fez um repto a todos os que, do ponto de vista da esquerda, se obstinavam em continuar a pensar a transformação social. Segundo Giuseppe Vacca, o antagonismo direto entre blocos – uma realidade, se não simples, ao menos facilmente redutível a esquemas simplistas – ficara para trás. Dicotomias como capitalismo e socialismo, comunismo e anticomunismo já seriam chaves imprestáveis para decifrar o “mundo grande, terrível e complicado” que decorria da unificação da economia levada a cabo pela revolução neoconservadora então em curso.

De fato, se a força dos fatos abre caminho na vida real, mais lento é o processo de reconstrução das categorias com que são pensados. Vacca sugeria a necessidade premente de conceitos novos – e quem não se visse sequer tentado a abandonar trilhas já batidas estaria intelectualmente morto, condenado a repetir a mesma história que, em tese, também dava como morta. O sentido mais preciso desse tipo de análise consiste em advogar modos de pensar o conflito político que contemplem a unidade (na pluralidade) do gênero humano e o princípio da interdependência.
Comecemos por um lado do espectro, num esforço – de nossa parte – evidentemente autocrítico. Não raro, no universo comunista – fruto de gigantesca e disforme modernização de um país atrasado, a partir de 1917 –, afirmou-se a lógica bruta do confronto de vida e morte entre classes inconciliáveis, entre “amigos” e “inimigos do povo”, entre esquerda e direita. Nenhuma mediação, nenhuma busca de terreno comum com a matriz democrática, de que o marxismo é poderosa e desafiadora heresia, salvo, felizmente, em momentos especialmente dramáticos, como por ocasião das frentes antifascistas.

Esvaziou-se assim a possibilidade de ação hegemônica consistente, entendida como compreensão e assimilação das razões dos adversários e consequente proposição de padrões mais altos de civilização. Muito cedo – e talvez mais cedo do que habitualmente pensamos –, fixou-se a inferioridade cultural do socialismo, incapaz de se impor num século que seria “americano” ou, ainda, social-democrata. E já nos anos 1930 a social-democracia patrocinaria significativas experiências reformistas, antes ainda do compromisso keynesiano do pós-guerra a que em geral é associada.

Façamos um corte para os nossos dias. Nas condições da globalização neoliberal, que estabelece a interconexão das economias nacionais, unificando contraditoriamente toda a humanidade, desafios mais modestos – extraordinariamente mais modestos – surgiram “à esquerda” (as aspas não são recurso retórico). A ideia é que não se poderia mais contar com a social-democracia clássica, já rendida ao mercado. E o antagonismo à ordem liberal se transferiria para a América Latina, onde os governos nacional-populares, a partir de Hugo Chávez, materializariam uma ruptura radical ou pelo menos a perspectiva dessa ruptura, sugerindo uma globalização alternativa.

Este ciclo nacional-popular parece ter esgotado sua fase expansiva, como o demonstram as derrotas eleitorais do chavismo e do kirchnerismo, embora a saída de situações autoritárias não seja nunca fácil. Entre as razões de tal esgotamento se conta, não em último lugar, a reiteração da lógica amigo/inimigo, a deslegitimação das oposições, vistas como agentes do imperialismo ou encarnações da “direita”.

Manifestaram-se, em suma, as taras antipluralistas que arruinaram o socialismo real, ainda por cima agravadas por uma linguagem de “refundação” das sociedades a cargo de caudilhos de vocação “épica”. A elaboração de uma “contra-hegemonia”, a partir do Sul, tropeçou nas próprias pernas: o demônio imperialista, em geral, só compareceu para garantir a renda do Estado “revolucionário”, comprando barris de petróleo a preço de mercado. Muito pouco para o que se espera de um demônio, mais frágil ainda a elaboração da “contra-hegemonia”.

As complicações do mundo grande e terrível não param nos governantes da América Latina – e aqui se deve ir para pontos mais nevrálgicos do que o nosso continente relativamente esquecido. A lógica bipolar também frequenta o lado dominante da globalização, acirrando dramas que reconfiguram para pior, ao menos temporariamente, a “estrutura do mundo”. A demagogia populista arrasta ou pode arrastar velhas e provadas democracias – a extrema direita americana, estabelecida num dos dois tradicionais partidos, ou sua equivalente europeia, ambas à margem da vocação universalista do Ocidente, não têm instrumentos para dirigir a globalização ou responder aos males de modernizações interrompidas ou malsucedidas do antigo “Terceiro Mundo”. Um déficit hegemônico evidente.

Uma franja da esquerda busca pretexto no passado colonial para justificar o injustificável, da derrubada das torres de Nova York às chacinas de Paris. Mas a questão central são grupos dirigentes, como os que se afirmaram com George W. Bush, que não conseguem operar sem a presença real ou fantasmagórica do “inimigo total”. Em sua busca da “segurança absoluta”, própria, aliás, das tiranias do século 20, não só deflagram guerras preventivas de desfecho imprevisível, como a que, no Iraque, reacendeu tensões sectárias que ora deságuam em desconcertante califado, como também danificam a malha de direitos e liberdades que, só elas, dão sentido e força de atração às sociedades abertas.

Uma lição do século 20 é que os totalitarismos usaram como nunca a linguagem para incendiar a disputa política. Por essa trilha caminham agora os promotores da mercantilização da vida e os de uma reação fundamentalista de teor ideológico ou pseudorreligioso. Cabe aos democratas de todos os matizes afinar e definir as condições razoáveis do discurso público, em benefício geral.
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*Luiz Sérgio Henriques é tradutor, ensaísta e um dos organizadores das 'Obras' de Gramsci no Brasil. Site: www.gramsci.org

Fernando Gabeira: Feliz Natal, apesar de tudo

- O Globo

Papai Noel ou o Japonês da Federal? Sapatos de cromo ou tornozeleira eletrônica? É um dilema para os estão no topo da política brasileira. Na planície, foi um ano terrível, aqui e lá fora. Milhares de refugiados de guerra, atentados, mar de lama, epidemias, corrupção. Ainda assim, há o que celebrar. A solidariedade, por exemplo. Esteve presente na onda de refugiados que invadiu a Europa. Nos distritos arrasados de Mariana, felizmente, também não faltou.

Há que celebrar a competência dos médicos e cientistas brasileiros que estabeleceram rápido a conexão entre o vírus zika e a microcefalia. E comunicaram ao mundo. As perspectivas são aterradoras, mas seriam mais ainda se não tivéssemos dados para, pelo menos, buscar uma vacina. Os cientistas americanos que passaram pelo Recife ficaram admirados como se fez tanto com equipamentos tão modestos.

Mesmo não sendo um defensor da pobreza dos meios, valorizo esta qualidade, a tentativa de superar criativamente a limitação dos instrumentos. Já é uma qualidade de muitos brasileiros. Com o dólar nas alturas, talvez seja, por um tempo, uma espécie de segunda natureza.

O imperador Adriano, da escritora Marguerite Yourcenar, disse algo interessante sobre pessoas, mas que bem poderia ser adaptado ao Brasil: “Ele havia chegado a um certo momento da vida, variável para cada homem, em que o ser humano se abandona ao seu demônio ou ao seu gênio e segue uma lei misteriosa que lhe ordena destruir-se a si mesmo ou a superar-se”.

Creio que vivemos sob essa lei misteriosa e, ao contrário de Adriano, não a vejo comandar apenas uma coisa ou outra: os dois movimentos, autodestruição e superação, se entrelaçam, como se a própria lei hesitasse. O processo político brasileiro é autodestrutivo. Se apenas implodisse mansamente... Mas é um espetáculo longo de sirenes, buscas, batidas policiais.

De 2013 para cá, surgiu um movimento de protesto, tentando despertar mudanças e reverter a decadência. O movimento ainda está vivo hoje, sabendo agora que não se trata apenas de cobrar os serviços, mas condenar a corrupção, pedir o impeachment.

Enquanto a solidariedade marcava o ano aqui embaixo, lá em cima o ano terminava com duas notícias assombrosas: corrupção na Hemobrás e nas obras de transposição do São Francisco. Roubam a água e o sangue de populações vulneráveis. Naturalmente numa escala muito menor que os assaltos à Petrobras. Não avalio os números nem artigos do Código Penal. Não é preciso trabalhar com palavras para saber que sangue, água e óleo são substâncias diferentes.

Por essas razões, o Natal no Brasil é uma festa no front. Um ano de governo e o único resultado político é o processo de impeachment. Ele nos espera no ano que vem. Assim como a crise econômica, pois recuamos quase 4% do PIB. O Brasil talvez esteja precisando de um presente. A disposição de cada um em seguir o próprio gênio e afastar o perigo da autodestruição. Seguir o gênio, no texto, significa apenas usar as próprias qualidades, superar-se como se superaram os médicos e cientistas nordestinos.

Vamos ouvir o som das sirenes como se fosse o trenó de Papai Noel. Vamos tirar mais algumas tornozeleiras do saco de brinquedos, e ao dobrar dos sinos das igrejas de Mariana, lembrar que acaba um ano difícil. Os mais velhos, como eu, sempre dão um balanço dos seus mortos. Senti a perda de Carlos Lemos e fiquei sabendo, através da família, que ele guardou um cheque que entreguei a ele no fim dos anos 1960. Está intacto. Independentemente da cifra, é o cheque mais valioso que assinei na vida. Querido Lelé.

Na noite seguinte, fui ao aniversário de um amigo: 90 anos. Nadamos na mesma piscina. Estranhei sua ausência pela manhã. Ele disse: preciso me poupar para a festa. Ao vê-lo pulando de mesa em mesa, movendo os mesmos braços longos que desloca na água, pensei: quantas vezes falamos do Brasil, quantas vezes lamentamos o curso das coisas no país. Mas Armando Salgado, esse é seu nome, erguendo uma taça de vinho alegremente, despertou-me um sentimento essencial: sobrevivemos e é bom estar aqui.

Não creio que o Brasil se coloca um problema que não possa resolver. Há clamor nas ruas, mesmo sob o sol de dezembro, às vésperas do Natal. As forças autodestrutivas chegaram ao seu destino. Estão dentro de um amplo cerco policial contra a corrupção: o que deveria ser uma experiência histórica tornou-se um processo penal.

No ano que acaba, o difícil foi não ver a luz no fim do túnel. Se aparecer em 2016, será uma grande conquista. Esperar que as dificuldades desapareçam é ilusão. Uma luz, uma simples luz, atenua as asperezas do caminho. O planeta achou sua luz na conferência de Paris e decidiu conter o processo de autodestruição. Celebro pelas novas gerações, embora também aí a luz não não baste: o caminho é áspero. Mas se 189 países conseguem achar um horizonte comum na luta contra as mudanças climáticas, porque um só país não encontrará o seu na luta por melhores governantes?

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Fernando Gabeira, jornalista

Celso Lafer*: Um olhar sobre o mundo atual

- O Estado de S. Paulo

Yeats, com a intuição de grande poeta – e dos poetas esperamos a verdade, como dizia Hannah Arendt no seu Diário de Pensamento -, indicou num conhecido poema: “Things fall apart; the center does not hold/ Mere anarchy is loosed upon the world” (“as coisas se desmancham, o centro não se sustenta/ uma mera anarquia está solta no mundo”). Instigado pela percepção de Yeats, atrevo-me a tentar, inspirado pelo que fez Valéry na primeira metade do século 20, um olhar reflexivo sobre o mundo em que estamos inseridos.

O grande desafio que permeia o mundo atual não é o da tradicional lida com as asserções e os confrontos de hegemonias. É o de, preliminarmente, compreender, para poder enfrentar o ímpeto da desordem que torna a vida internacional crescentemente perigosa e instável. Como destacou Pierre Hassner, importante analista francês, mesmo para os estudiosos da matéria é complicado entender o que se passa. A realidade internacional apresenta-se de maneira ambígua e contraditória e está muito difícil organizar o conhecimento, diferenciando o estrutural do conjuntural, avaliando o peso das “forças profundas” e apontando em que medida esclarecem os grandes eventos que vêm sacudindo o mundo.

Para essa nebulosa contribui a dificuldade de identificar a tensão predominante, iluminadora da dinâmica dos movimentos como foi a guerra fria, inclusive no plano ideológico, em cujas brechas despontaram a polaridade Norte-Sul e o processo de descolonização.

O sistema internacional atual tem inter alia como pano de fundo os desdobramentos da queda do Muro de Berlim, que favoreceu a globalização econômica, financeira e jurídica; os ataques terroristas aos EUA em 2001, que puseram em novos termos os problemas da segurança internacional; o unilateralismo da intervenção militar norte-americana no Iraque em 2003, que vem tendo um impacto desestabilizador no Oriente Médio irradiado para fora da região; o deslocamento do dinamismo econômico para a Ásia, a emergência da China e as tensões políticas de equilíbrio na área; os regionalismos na vida do comércio internacional, que vêm minando o espaço de cooperação multilateral da OMC; o agravamento dos problemas ambientais, que comprometem a sustentabilidade do planeta, e os desafios, nesse contexto, da transição para uma economia de baixo carbono.

Tudo isso alimenta exponencialmente o aflorar de uma multiplicidade de tensões, tanto complementares quanto contraditórias. Isso se vê agravado porque a clássica lógica do sistema internacional como sistema interestatal com suas regras formais e informais se vê comprometida pela existência de “Estados falidos” (como Iraque e Líbia) ou em condição pré-falimentar (como alguns países da África). A isso se adiciona a precarização do clássico princípio da integridade territorial dos Estados, de que é exemplo a anexação da Crimeia pela Rússia.

O sistema interestatal vê-se igualmente minado pela porosidade das fronteiras, que enseja na era digital o ciberespaço da instantaneidade e da multiplicação das interações, que internalizam o “externo” na vida cotidiana dos países. Nesse contexto, recordo a dicotomia processo-drama proposta por Raymond Aron.

O processo do avanço do conhecimento, do potencial da técnica, da expansão econômica em suas diferentes formas, da agregação em escala planetária do campo estratégico-diplomático, que, em conjunto, a partir do século 20 propiciaram a efetiva unificação histórica da humanidade, não assegura a contenção ou o deslinde do drama do confronto das vontades.

O ímpeto contemporâneo dessas interações do interno com o externo, dada a heterogeneidade das sociedades e dos valores, não é explicável apenas pela lógica dos interesses dos Estados e dos mercados. É necessário inserir no mapa das relações internacionais, para o apropriado entendimento das múltiplas tensões, a globalizada propagação das emoções – entre elas, o medo e a vaidade, a humilhação e a cólera, o ressentimento e a vingança. Estas, com seu elã fragmentário, vêm corroendo a política internacional de direitos humanos, inaugurada com a Declaração Universal de 1948, tornando precária e esquiva a tarefa da política como instância de mediação apta a administrar as tensões, para ensejar a coexistência.

O zelotismo antiocidentalista, a islamofobia, o antissemitismo, a xenofobia, os fundamentalismos de toda natureza, a sublevação dos particularismos, o recrudescimento identitário são disso uma expressão. Também o é a destrutividade erga omnes do terrorismo contemporâneo.

No que tange à guerra contra o terrorismo, intensificado pelos atentados de Paris e que se irradia tendo no “Estado Islâmico” uma das suas bases, recorro a outra lição de Aron sobre a dinâmica persuasão-subversão. Para a coligação de Estados que travam esta guerra assimétrica contra um ator não governamental, ganhar exige não perder. Para o terrorismo o ganhar se cinge a não perder e poder sobreviver para continuar promovendo a ubiquidade do medo.

Disso tudo provém, como avalia Pierre Hassner, uma profunda alteração na clássica divisão da humanidade entre nômades e sedentários. Os nômades hoje são de dois tipos: os integrados e os excluídos do mundo comum. Dos integrados participam, para o bem ou para o mal, tanto os ostensivos ligados às finanças, à economia, ao direito, às profissões, à pesquisa, às universidades quanto os ocultos das redes da criminalidade organizada, da lavagem de dinheiro, do terrorismo, do tráfico de drogas. Os excluídos são a crescente massa de refugiados que fogem sem encontrar destino e acolhida, das perseguições, das guerras civis, dos conflitos religiosos, da falta de oportunidades. Compõem a trágica categoria dos deslocados no mundo que padecem da globalização da indiferença de que fala o papa Francisco. Os sedentários reagem aos nômades no âmbito interno dos Estados pelos populismos excludentes.

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*Celso Lafer é professor emérito do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo

Ferreira Gullar: A carta de Michel Temer

- Folha de S. Paulo

Vou tentar dizer, a meu modo, como vejo a carta que Michel Temer enviou à presidente Dilma Rousseff e que tanta celeuma causa no ambiente político, particularmente nas relações do PMDB com o governo federal.

Na opinião da maioria dos comentaristas, aquela carta foi um meio de que o vice-presidente da República lançou mão para se queixar de Dilma Rousseff. Na verdade, a carta tem um tom de queixa, mas no meu entender esse foi o modo que ele encontrou para justificar seu perturbador silêncio em face do processo de impeachment a que está sujeita a chefe do governo e de quem ele é o vice.

O silêncio de Temer levou os assessores de Dilma a atribuir-lhe opinião contrária ao processo de impedimento, que não teria fundamento jurídico. Temer desmentiu essa informação, que deve ter contribuído para ele escrever a referida carta.

Mas o certo é que essa história não começa aí, vem de longe, desde o começo do primeiro governo de Lula. Eleito, surgiram entendimentos para que o PMDB aderisse a Lula e passasse a apoiá-lo. Ele rejeitou essa ideia e preferiu aliar-se a pequenos partidos, aos quais não necessitaria entregar ministérios e empresas estatais, como teria que fazer, se se juntasse ao PMDB. Àqueles partidos, em vez de altos cargos, lhes deu dinheiro (dinheiro público), de que resultou o escândalo do mensalão.

Embora Lula, no primeiro momento, ao ser interpelado sobre aquele escândalo, alegara que havia sido traído, depois que seus "traidores" foram processados e condenados, passou a dizer que se tratou de um golpe político. A verdade, porém, é que, para se reeleger e governar, recorreu ao apoio do PMDB, que rejeitara antes. E teve que fazer o que jamais quis, ou seja, dividir os ministérios com o novo aliado. Terminado o segundo mandato, inventou a candidatura de Dilma, tendo como vice Michel Temer. Que Lula nunca quis dividir o poder com ninguém, viu-se desde o começo, e só aliou-se ao PMDB para se manter nele.

Essa não é, porém, uma atitude somente do Lula mas também de seu partido e, particularmente, de Dilma Rousseff. As denúncias da Operação Lava Jato vieram piorar a situação de todos eles e, especialmente, a da presidente da República, em cujo governo o país naufragou de vez. Isso era inevitável acontecer já que, para se manter no poder, os petistas optaram por investir pesado nos programas assistencialistas e não no crescimento da economia. Em vez disso, como parte de seus programas populistas, para evitar o aumento dos preços, subvencionava grandes empresas produtoras de bens de consumo.

Ocorreu que, para ganhar as eleições de 2014, Dilma traçou um retrato falso da realidade econômica do país, mas assim que tomou posse, teve que fazer o contrário do que prometera na campanha eleitoral. Desse modo, entrou num beco sem saída, porque as medidas a serem tomadas contrariam o populismo que Lula e ela impuseram ao país. O resultado disso é que a crise econômica se agrava e a crise política também, uma acionando a outra.

Não é por acaso que, em menos de um ano do novo mandato, o índice de aprovação de seu governo oscila entre 7% e 10%. A hegemonia política dos petistas parece chegar ao fim. A popularidade do ex-presidente Lula caiu –47% do eleitorado não votaria nele em 2018. A todos esses fatores negativos, veio juntar-se o pedido do impeachment que, quer ocorra ou não, terá consequências desastrosas para o petismo.

Em face de todos esses fatores, ninguém se atreveria a apostar num bom futuro para os petistas e particularmente para o governo de Dilma. Falando claro, a hegemonia petista chega ao seu fim, sem perspectiva de recuperação. Cabe, então, perguntar: que interesse tem o PMDB em continuar apoiando o PT e, sobretudo, depois dessa história que contamos aqui? Desconheço exemplo em que algum partido tenha naufragado com o outro, por mera solidariedade. O que costuma acontecer é abandonar o barco quando começa a afundar. Essa é a minha leitura da carta de Michel Temer, que, aliás, já parece tomar providências para assumir o governo.
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Ferreira Gullar, ensaísta, crítico de arte e poeta.

Merval Pereira: Renan na linha de tiro

- O Globo

A revelação de que o ministro Teori Zavascki autorizou a quebra do sigilo fiscal e bancário do presidente do Senado, Renan Calheiros, dá a dimensão da crise política em que estamos metidos. Transformado pela decisão do Supremo no homem forte da política brasileira, já que o Senado foi ratificado como a última palavra no processo de impeachment, com poderes para rejeitá-lo liminarmente mesmo antes de um julgamento, Renan encheu-se de brios e partiu para a ofensiva dentro do PMDB, numa clara tentativa de comandar a derrota do vice Michel Temer na convenção do partido em março.

Ele, ou alguém do PMDB do Rio, a maior representação regional do partido, seria o candidato que isolaria Temer e protegeria Dilma, embora a alta direção do PMDB do Rio também esteja às voltas com a Operação Lava-Jato.

Os detalhes da decisão do STF sobre o pedido de autorização da Procuradoria-Geral da República para investigá-lo e a seus apaniguados, especialmente o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, mostram que a suposta proteção que o senador estaria recebendo do Planalto não passa de lorota.

Não se sabe quem está querendo enganar quem, se a presidente Dilma fingindo que tem algum tipo de ingerência nas investigações, se Renan se autoenganando na estratégia de se aproximar do governo e manter uma postura mansa em relação ao procurador-geral e ao Ministério Público.

Alvo de nada menos que quatro inquéritos, o maior deles o que envolve sua influência nos últimos 12 anos na Transpetro, onde seu indicado Sérgio Machado reinou intocado até a chegada da Lava-Jato, Renan Calheiros finge estar a salvo da tempestade que atinge outros políticos, mas na verdade nunca esteve tão perto de se juntar a Eduardo Cunha nas acusações de malversação do dinheiro público.

Dilma, que comemorou a vitória no Supremo reforçada pelo pedido de afastamento de Cunha, corre o risco de ver seu aliado Renan ser indiciado por diversos crimes, embora corra menos risco que Cunha de ser afastado imediatamente de seu posto.

Vulnerabilizado pela quebra de sigilos, porém, Renan não tem condições de se impor no PMDB nem segurança de que estará na presidência do Senado quando o impeachment começar.

O comentário que fez ao celular, revelado pela repórter Maria Lima, do GLOBO, de que Cunha corria o risco de ser preso se continuasse a agir para tentar bloquear seu julgamento na Câmara, mostra bem a postura cuidadosa de Renan, que já esteve no front oposto no início do ano, adversário implacável da presidente Dilma e dos mais críticos em encontros no Jaburu, quando ainda frequentava o vice.

Certa ocasião, tentando trazê-lo para a oposição formal a Dilma, Cunha advertiu-o: o próximo será você. Como a política brasileira hoje se faz na dependência da Lava-Jato, com essa revelação de agora, de que as investigações estão mais próximas de Renan como nunca estiveram, não será surpresa se ele voltar-se novamente contra o Planalto, já que a única razão para estar ao lado de Dilma é a impressão de que de alguma maneira essa proximidade o protege do MP e da PF.

Para Dilma, mais uma vez o apoio de um político contaminado pela corrupção endêmica da vida brasileira só fará aumentar as suspeitas de que não está tão isenta quanto apregoa desses escândalos na sua área de atuação, que domina com mão de ferro desde o 1º governo Lula.

Nesse folhetim em que se transformou a política brasileira, ainda veremos muitos capítulos antes do fim. Dentre as histórias de corrupção dos poderosos, as de Renan não ficam atrás das de Cunha, como se pode ler no detalhamento da de maior potencial escandaloso, a história de como um político poderoso tomou de assalto uma das principais subsidiárias da Petrobras.

Na coluna de ontem, onde está escrito artigo 56 da Constituição, leia-se artigo 86.

Dora Kramer: E o vento pode levar...

- O Estado de S. Paulo

Visto assim do alto, o cenário melhorou consideravelmente para a presidente Dilma Rousseff do início para o fim da semana passada. O governo fez valer quase todas as suas teses no Supremo Tribunal Federal, viu a Procuradoria-Geral pedir o afastamento de Eduardo Cunha e conseguiu firmar acordo de proteção com o presidente do Senado, Renan Calheiros.

Olhadas no detalhe, contudo, as vitórias podem não ser tão vantajosas quanto parecem à primeira vista. Em primeiríssimo lugar está a perda do discurso de que o impeachment equivale a um golpe de Estado. Não bastasse o escrito na Constituição para convencer os renitentes, a palavra do Supremo serviu para desmascarar os petulantes engenheiros da obra falsa.

Todo o País pôde acompanhar, voto a voto, ministro a ministro, em minúcias a exposição dos argumentos legais que estabeleceram o rito do processo do impeachment. Portanto, com o STF, o governo não poderá contar em caso de aprovação do afastamento pelo Congresso. A Corte examina a constitucionalidade das questões e esta, no caso, não esteve em questão. Logo, constitucional é.
Desdobrando as decisões tomadas naquela sessão de quinta-feira última, tomemos o voto em aberto e a necessidade de o Senado corroborar decisão da Câmara por maioria simples.

É fato que a escolha secreta favorece traições, porque serve de biombo aos infiéis temerosos.

Com pureza d’alma, é de se perguntar: nesta e na altura em que for apreciado o impeachment, quantos têm razão para temer um governo que não tem condições para reagir contra ninguém? Precisa, antes, agir a favor de si. E se vier uma nova derrota, ainda que por margem mais apertada que a anterior, desta vez aberta ao escrutínio público. Prejuízo bem maior a ser contabilizado.

Sobre a maioria simples exigida no Senado, os números falam por si. Para aprovar, a Câmara precisa de 342 (dois terços) dos 513 deputados e, para não arquivar, basta a maioria simples dos presentes no plenário. Em tese, 21 senadores, caso estejam presentes apenas os 41 necessários para abrir a sessão.

Há a suposição de que o ânimo governista dos senadores possa garantir um número bastante expressivo de presença para elevar o quórum e que a posição do presidente da Casa baste para que a presidente garanta o arquivamento. Pode acontecer, de fato. Mas é preciso lembrar que a fidelidade de Renan Calheiros guarda semelhança com uma mercadoria, cujo preço pode ser alterado ao sabor dos acontecimentos.

Outra vitória atribuída ao governo seria a volta do deputado Leonardo Picciani à liderança do PMDB. Picciani, por óbvio, não unifica a bancada e, além disso, seu mandato acaba em fevereiro. Na volta do recesso, o partido terá de escolher um novo líder. E o fará sob a égide da circunstâncias em que estiver envolvido o PMDB. Circunstâncias estas que podem ou não ser favoráveis ao Planalto.

Por fim, e não menos importante, o pedido da Procuradoria-Geral da República pelo afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Na superfície, parece que quanto Cunha for mais fraco, mais forte Dilma será.

Volver. Tem gente referida no auto engano. Gente crente que a situação do País se resolve com uma conversa entre Lula e FH. Não é assim. Talvez não esteja em Michel Temer a solução. É possível que tudo seja mais simples, mas é provável que seja mais complicado e irremediável.

Entre outros motivos porque Nelson Barbosa no comando formal do Ministério da Fazenda significa a retomada de uma política que comprovadamente não deu certo, embora seja da preferência da presidente, cujas escolhas erradas deram no que deu.