GATILHOS EM LIBERDADE
Ruy Castro
Ruy Castro
RIO DE JANEIRO - Há duas semanas, na França, durante uma exibição militar pública num regimento de pára-quedistas da Infantaria em Carcasson, no sudoeste do país, um soldado carregou sua metralhadora com balas de verdade, em vez de munição apropriada. Disparou como era exigido e feriu 17 espectadores, entre os quais crianças, colegas de farda e seus parentes, alguns com gravidade.
O soldado foi preso no ato. O presidente Nicolas Sarkozy nem piscou: no mesmo dia, tomou um avião e voou para o local, para mostrar por que foi eleito. E, no dia seguinte, o chefe do Estado-Maior do Exército -um cargo quase de ministro, com pelo menos dez figurões na cadeia de comando entre ele e o soldado- demitiu-se. Se um soldado era capaz de tamanha negligência, a culpa era de todos que tinham permitido sua presença ali.
No Rio, domingo passado, um menino de três anos foi fuzilado dentro de um carro na Tijuca por dois policiais militares, na presença da mãe e do irmão menor, sob a suspeita de que o carro contivesse criminosos. O menino morreu. Os policiais serão presos, demitidos e talvez condenados por homicídio doloso, para servir de exemplo. Nenhuma autoridade superior se demitiu.
O carro estava parado e ninguém dentro dele reagiu quando o tiroteio começou. Mesmo assim, este continuou e houve tempo para impor 17 perfurações no carro. Há uma cultura entre nossos policiais de que o negócio é atirar primeiro e perguntar depois. Se esses gatilhos em liberdade forem a regra, alguém de cima precisa assumir a responsabilidade.
E, se não forem, é porque o comando não existe e qualquer soldado dispara contra quem e quanto quiser. Também neste caso, antes de exemplar os pés-de-chinelo, seus comandantes deveriam aparecer e assumir, no caso, sua irresponsabilidade.
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