Wilson Figueiredo
DEU NO JORNAL DO BRASIL
A dois passos dos 80 anos e com meio século de vida pública nas costas, o senador José Sarney ocupa semanalmente na Folha de S. Paulo um espaço raramente visitado por suas opiniões políticas. O cronista se poupa. Mas, fora da sua coluna, trata de questões que movem o universo brasileiro.
Quando cuida de política, Sarney se dirige ao mesmo tempo a dois tipos de ouvinte (no caso, leitor), quais sejam, os políticos e os cidadãos comuns. Sabe com quem está lidando.
Para não patinar no lugar comum, Sarney não sacou em entrevista dada à Folha que o presidente Lula fará o seu sucessor. O ex-presidente trocou a certeza pela dúvida de que "o futuro presidente possa ser escolhido sem o apoio de Luiz Inácio Lula da Silva". É a mesma coisa pelo avesso, mas sem presunção. A sucessão já está definida no inconsciente coletivo brasileiro.
E não apenas por merecimento de Lula, mas também por demérito da oposição. O próprio Lula não iria perder a oportunidade de posar para a História no episódio do terceiro mandato. Com ou sem o terceiro, o PMDB não tem estoque de voto direto para bancar candidaturas. O avô de todos os partidos não se dá bem em eleição presidencial. Contenta-se com a indicação do vice.
Considerando que Sarney se dirigia com prioridade ao PT, conclui-se que adiantou, como quem não quer muito, opinião favorável à aliança com o PMDB em torno de uma parelha para 2010. Ao contrário do atual, o cuidado com o uso das palavras é inseparável do ex-presidente. Foi taxativo sem ênfase: "se depender de mim, o MDB vai para uma aliança com o presidente Lula".
Claro que não dependerá dele, que já adiantou nas entrelinhas o recado subliminar a leitores especiais. E Lula, como fica? Cada um para um lado, PMDB e PT ilustram o ditado ornitológico segundo o qual dois bicudos não se beijam. Dois anos são suficientes para Sarney chegar aos 80 anos e o petismo semear brigas e fazer um estrago na confusão de candidaturas a governador e a presidente. O ex-presidente Sarney aprendeu política com a primeira geração da UDN, de forte presença liberal na Constituinte de 1946 e participação nas crises que levaram à final de 1964.
Coube à segunda geração udenista, da qual faziam parte, entre outros, José Sarney e Aureliano Chaves, abrir a cisão no partido do governo e patrocinar a solução de menor risco político depois de enterrada as Diretas já. A alternativa estratégica empenhou José Sarney, Aureliano Chaves e Marco Maciel na cisão do PDS, batizada de Frente Liberal, e juntá-la ao PMDB na Aliança Democrática. Tancredo Neves presidente e José Sarney vice. Criou-se o acesso à democracia e se desatou o nó cego. O PT, vesgo do olho esquerdo, se manteve à margem como menino birrento e recusou a eleição indireta porque só admitia a direta. O vice-presidente Sarney chegou à presidência por uma porta estreita, Tancredo Neves sairia morto pela porta da frente.
Também não se cruzaram na passagem de governo o último presidente militar que saia e o primeiro civil que entrava. O último presidente militar e o primeiro civil não colidiram protocolarmente porque o general João Batista Figueiredo recusou-se a entregar pessoalmente os poderes do cargo ao primeiro civil da nova série, que repetiu a solução de Floriano Peixoto, que se recusou a passar o poder a Prudente de Moraes, o primeiro presidente civil.
Não é metáfora, mas a História do Brasil, no tortuoso curso a caminho da democracia. Não há candidatura (Lula não vale) capaz de unir dois partidos separados por meios e fins, como o PMDB e o PT demonstram. O primeiro quer distância das reformas de que se fala para não serem feitas.
O segundo concorda com a democracia apenas como atalho que, pela esquerda, leve mais longe do que a vista alcança numa eleição. Entre os dois, Lula balança. Com dois anos de antecedência, dificilmente a aliança do PT com o PMDB pode ser viável, e muito menos duradoura.
A não ser que se juntassem para obrigar o PSDB a honrar a responsabilidade oposicionista. Ninguém sabe como andará o Brasil em 2010 e as pesquisas não querem competir com os cegos que na Antiguidade tinham o dom de ver o que espera os governantes além do presente.
DEU NO JORNAL DO BRASIL
A dois passos dos 80 anos e com meio século de vida pública nas costas, o senador José Sarney ocupa semanalmente na Folha de S. Paulo um espaço raramente visitado por suas opiniões políticas. O cronista se poupa. Mas, fora da sua coluna, trata de questões que movem o universo brasileiro.
Quando cuida de política, Sarney se dirige ao mesmo tempo a dois tipos de ouvinte (no caso, leitor), quais sejam, os políticos e os cidadãos comuns. Sabe com quem está lidando.
Para não patinar no lugar comum, Sarney não sacou em entrevista dada à Folha que o presidente Lula fará o seu sucessor. O ex-presidente trocou a certeza pela dúvida de que "o futuro presidente possa ser escolhido sem o apoio de Luiz Inácio Lula da Silva". É a mesma coisa pelo avesso, mas sem presunção. A sucessão já está definida no inconsciente coletivo brasileiro.
E não apenas por merecimento de Lula, mas também por demérito da oposição. O próprio Lula não iria perder a oportunidade de posar para a História no episódio do terceiro mandato. Com ou sem o terceiro, o PMDB não tem estoque de voto direto para bancar candidaturas. O avô de todos os partidos não se dá bem em eleição presidencial. Contenta-se com a indicação do vice.
Considerando que Sarney se dirigia com prioridade ao PT, conclui-se que adiantou, como quem não quer muito, opinião favorável à aliança com o PMDB em torno de uma parelha para 2010. Ao contrário do atual, o cuidado com o uso das palavras é inseparável do ex-presidente. Foi taxativo sem ênfase: "se depender de mim, o MDB vai para uma aliança com o presidente Lula".
Claro que não dependerá dele, que já adiantou nas entrelinhas o recado subliminar a leitores especiais. E Lula, como fica? Cada um para um lado, PMDB e PT ilustram o ditado ornitológico segundo o qual dois bicudos não se beijam. Dois anos são suficientes para Sarney chegar aos 80 anos e o petismo semear brigas e fazer um estrago na confusão de candidaturas a governador e a presidente. O ex-presidente Sarney aprendeu política com a primeira geração da UDN, de forte presença liberal na Constituinte de 1946 e participação nas crises que levaram à final de 1964.
Coube à segunda geração udenista, da qual faziam parte, entre outros, José Sarney e Aureliano Chaves, abrir a cisão no partido do governo e patrocinar a solução de menor risco político depois de enterrada as Diretas já. A alternativa estratégica empenhou José Sarney, Aureliano Chaves e Marco Maciel na cisão do PDS, batizada de Frente Liberal, e juntá-la ao PMDB na Aliança Democrática. Tancredo Neves presidente e José Sarney vice. Criou-se o acesso à democracia e se desatou o nó cego. O PT, vesgo do olho esquerdo, se manteve à margem como menino birrento e recusou a eleição indireta porque só admitia a direta. O vice-presidente Sarney chegou à presidência por uma porta estreita, Tancredo Neves sairia morto pela porta da frente.
Também não se cruzaram na passagem de governo o último presidente militar que saia e o primeiro civil que entrava. O último presidente militar e o primeiro civil não colidiram protocolarmente porque o general João Batista Figueiredo recusou-se a entregar pessoalmente os poderes do cargo ao primeiro civil da nova série, que repetiu a solução de Floriano Peixoto, que se recusou a passar o poder a Prudente de Moraes, o primeiro presidente civil.
Não é metáfora, mas a História do Brasil, no tortuoso curso a caminho da democracia. Não há candidatura (Lula não vale) capaz de unir dois partidos separados por meios e fins, como o PMDB e o PT demonstram. O primeiro quer distância das reformas de que se fala para não serem feitas.
O segundo concorda com a democracia apenas como atalho que, pela esquerda, leve mais longe do que a vista alcança numa eleição. Entre os dois, Lula balança. Com dois anos de antecedência, dificilmente a aliança do PT com o PMDB pode ser viável, e muito menos duradoura.
A não ser que se juntassem para obrigar o PSDB a honrar a responsabilidade oposicionista. Ninguém sabe como andará o Brasil em 2010 e as pesquisas não querem competir com os cegos que na Antiguidade tinham o dom de ver o que espera os governantes além do presente.
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