sábado, 8 de agosto de 2009

Senador engaveta denúncias contra Sarney sem discussão

Maria Lima, Brasília
DEU EM O GLOBO

‘Não temo a opinião pública. Adoro decidir sozinho’, diz presidente do Conselho de Ética

O presidente do Conselho de Ética do Senado, Paulo Duque (PMDB-RJ), Arquivou os últimos sete pedidos de investigação sobre o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). Os casos engavetados apontavam suspeitas de envolvimento de Sarney em nepotismo, tráfico de influência, desvio de recursos e fraudes fiscal. Duque decidiu pelo arquivamento sozinho, sem convocar uma sessão do Conselho para deliberar sobre o caso. “Não temo a opinião pública. Adoro decidir sozinho”, disse Duque, que ontem nem foi ao Senado. DEM, PSOL e PSDB vão recorrer ao Conselho para tentar reabrir as investigações. Na sociedade civil, a reação ao baixo nível no Senado é de indignação.

Tudo para a gaveta, sem debate

Presidente do Conselho de Ética, Duque manda arquivar todas as denúncias contra Sarney

Sem convocar uma sessão do Conselho de Ética para o debate e nem mesmo aparecer em público, o presidente do colegiado, Paulo Duque (PMDB-RJ), mandou seu chefe de gabinete, Zaqueu Teles, protocolar ontem na Secretaria Geral da Mesa o despacho determinando que sejam engavetados os últimos sete pedidos de investigação sobre nepotismo, mentira, tráfico de influência, desvio de recursos e fraude fiscal supostamente praticados pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Falta agora Duque decidir, até quinta-feira, se arquiva ou aceita a representação do PMDB contra o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

Anteontem à noite, Duque disse, em relação a este último caso, que não teria como tomar outra decisão, para não ser incoerente. E afirmou não temer a reação da opinião pública: — Não temo. Já até marquei com minha família onde vou almoçar no Dia dos Pais. Não temo nada.

E negou estar a serviço da tropa de choque de Sarney: — Eu decidi tudo sozinho. Adoro decidir sozinho.

Ontem, porém, o senador não apareceu para entregar seus despachos.

— O senador Paulo Duque amanheceu hoje meio rouco — disse Zaqueu, apesar de seu chefe ser permanentemente rouco.

O alívio de Sarney pode ser passageiro.

Na segunda-feira, DEM, PSOL e PSDB vão protocolar recursos para tentar derrubar a decisão de Duque sobre cinco representações e seis denúncias contra o presidente da Casa.

Para a oposição, se o PT cumprir a promessa de não aceitar o arquivamento sumário, serão alcançados os oito votos necessários para a abertura do processo por quebra de decoro

Demóstenes: ‘O caso ainda não morreu

Caso contrário, a estratégia é levar a batalha ao plenário do Senado, onde as chances da oposição são maiores.

Ontem, Eduardo Suplicy (PT-SP) anunciou que assinará o manifesto pedindo o afastamento de Sarney até o fim das investigações. Se o fizer, serão 40 os senadores pedindo o afastamento de Sarney. São três os integrantes do PT no Conselho: Ideli Salvatti (SC), Delcídio Amaral (MS) e João Pedro (AM), todos afinados com o Planalto.

— Vamos para a luta! Agora nós vamos ver se o PT vai cumprir a palavra de votar conosco contra o arquivamento sumário. O caso ainda não morreu — disse Demóstenes Torres (DEM-GO), que redigirá os recursos.

Em nota ontem, o líder do PT e do bloco governista, Aloizio Mercadante (SP), reafirmou a posição da bancada pela licença de Sarney, e criticou o manifesto da oposição lido na véspera no plenário pedindo o afastamento. Mas não se refere ao recurso. A nota diz que Mercadante lamenta que setores da oposição utilizem a crise do Senado para atacar o presidente Lula: — Nós não nos prestamos a esse papel. A oposição poderia reconhecer publicamente que hoje reforça a posição que o PT sempre manteve (a de pedir licença).

Para arquivar a representação do PSDB que pede apuração do envolvimento de Sarney na nomeação do namorado da neta Maria Beatriz, Henrique Dias Bernardes, Duque repetiu argumento usado pelo presidente do Senado: “O pedido apresenta uma nulidade, uma vez que se baseia, integralmente, em gravações de conversas telefônicas que constam de processo que tramita em segredo de justiça e cuja divulgação é absolutamente ilícita”.

Duque diz que, no caso dos atos secretos, “praticamente todos os demais senadores foram objeto de atos administrativos não publicados” — mesma linha de defesa de Sarney

‘Recurso é certo’, diz Agripino Maia

Já no caso da denúncia apresentada por Arthur Virgílio, juntamente com Cristovam Buarque (PDT-DF), sobre fraude fiscal na venda de terras do Sítio São José do Pericumã, o presidente do Conselho usa um argumento curioso para arquivar: fraude fiscal não é matéria de competência do Conselho de Ética do Senado. Na representação que questiona a não declaração à Justiça Eleitoral da mansão que Sarney mora em Brasília, Duque diz que não foram anexados documentos e que o Conselho não pode servir de instrumento de política partidária.

— Esse argumento de luta partidária não tem nada a ver. Agora, não vejo erro no arquivamento sumário se o presidente Paulo Duque encontrou fundamento para não receber o despacho inicial. Se encontrou, está cumprindo o regimento. Se são 11 ou 12 arquivamentos, não vem ao caso. Fundamental é o fundamento — tentou justificar Almeida Lima (PMDB-SE), um dos integrantes da tropa de choque de Sarney no Conselho.

— Sarney não precisa comemorar.

O recurso é tão certo como dois e dois são quatro — disse o líder do DEM, José Agripino Maia (RN) — O Conselho foi constituído para blindar Sarney. Mas, se o Conselho não investigar, é uma pena, porque nem que quiséssemos poderíamos ajudá-lo a ter legitimidade para continuar presidindo o Senado — avaliou Renato Casagrande (PSB-ES).

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