O Poder Legislativo anda tão fragilizado e desmoralizado que determinadas propostas com teor de subtração flagrante de suas prerrogativas são feitas com naturalidade e até aceitas como perfeitamente lógicas.
Exemplo disso é a sugestão que o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso, pretende fazer à presidente Dilma Rousseff: o envio dos projetos aprovados no Congresso ao STF antes de sancionados pela Presidência da República, a fim de evitar o exame posterior da constitucionalidade da legislação.
Peluso se manifestou em função da polêmica suscitada pelo exame da Lei da Ficha Limpa e das consequências decorrentes do fato de a decisão ter ocorrido só após as eleições.
"Se houvesse consulta prévia ao STF a Lei da Ficha Limpa não teria gerado tanta discussão sobre sua constitucionalidade", argumentou Peluso ao anunciar, na sexta-feira, que iria apresentar a proposta de controle constitucional prévio à presidente.
Se não é de espantar - dado o papel de irrelevância que o próprio Congresso se impõe -, é de se lamentar a sem-cerimônia com que o presidente do Supremo aborda uma questão cujo conteúdo subtrai poderes do Legislativo e permite que o Judiciário exerça interferência prévia em decisões do Congresso.
Principalmente porque, a despeito de qualquer alteração dessa natureza necessitar de aprovação de três quintos dos parlamentares da Câmara e do Senado (quórum para emenda constitucional), Cezar Peluso achou por bem excluir o Parlamento da discussão, estabelecendo linha direta com o Executivo.
Pode ser um método mais prático, mas não é uma prática condizente com a repartição de Poderes ora em vigor na República. A menos que a proposta do presidente do STF inclua também a revisão desses preceitos, o que requereria uma ampla revisão da Constituição.
Há no Legislativo e no Executivo, instrumentos de controle de constitucionalidade que dispensam a criação do atalho proposto. As Comissões de Constituição e Justiça, no Congresso, e as assessorias da Advocacia-Geral da União, da Casa Civil e do Ministério da Justiça, no Executivo.
Se funcionam precariamente é uma questão que não se resolve fazendo do Supremo um órgão de consultoria permanente.
Vale lembrar, a propósito, que nem o STF está livre de cometer inconstitucionalidades em suas decisões administrativas.
A proposta enviada pelo próprio Peluso tempos atrás ao Congresso sobre a instituição de reajustes automáticos para os salários dos ministros é considerada por integrantes do tribunal como passível de contestação judicial.
Além disso, como pondera o senador Demóstenes Torres, as contestações constitucionais resultantes de leis aprovadas não são significativas a ponto de constituírem um problema institucional, até porque 80% da produção legislativa tem origem em projetos do Executivo. "Que não iria submetê-los ao crivo prévio do STF."
Na opinião do senador, o presidente do Supremo cria uma polêmica desnecessária. "Na questão da Ficha Limpa não podemos esquecer que o impasse só se prolongou porque o ministro Peluso se recusou a dar o voto de Minerva no empate. Não estaria, como argumentou, conferindo-se poder absoluto, mas cumprindo uma prerrogativa que lhe dá o regimento."
Cartório. Marina Silva sabia, evidentemente, com quem estava lidando ao entrar para o PV, presidido há dez anos por José Luiz Penna. Isso naquela ocasião. Agora que ele acaba de renovar o mandato mediante o controle da máquina, são 12 anos de presidência.
De ninguém com essa longevidade no poder pode-se dizer que tenha apreço pela democracia interna, que pressupõe alternância.
O grupo da ex-senadora, no entanto, pareceu apostar que o significativo cacife de 20 milhões de votos obtidos na eleição presidencial lhe daria força para renovar o partido.
De fato, seria uma consequência natural, caso não prevalecesse na política brasileira a mais absoluta desconexão entre a vida cotidiana dos partidos e os momentos eleitorais.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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