Eloísa Machado de Almeida | Folha de S. Paulo
Há quase três meses, o plenário da Câmara dos Deputados votava para impedir o andamento da primeira denúncia contra o presidente Michel Temer.
Naquela oportunidade, as acusações envolviam principalmente o crime de corrupção passiva, referente ao episódio da mala de dinheiro de Rocha Loures e os encontros gravados entre Michel Temer e Joesley Batista.
Naquela primeira vez, a CCJ precisou produzir dois relatórios. O primeiro, de Sérgio Zveiter (PMDB), recomendou o prosseguimento da acusação, com ênfase nos aspectos jurídicos necessários de uma denúncia: a existência de indícios de materialidade e autoria dos crimes, mas saiu perdedor.
O segundo, de Paulo Abi-Ackel (PSDB), foi contra a denúncia, mas também pautado em questões jurídicas, como a nulidade de delações. As dúvidas envolvendo a colaboração premiada dos irmãos Batista foram a principal arma da defesa de Temer, que deu bastante ênfase ao fato de o delator estar livre e sem acusações.
Já a segunda denúncia apresentada contra o presidente Michel Temer o acusa da prática de organização criminosa, formada com atuais ministros e ex-aliados.
A principal diferença entre as duas denúncias reside na amplitude da acusação: se a primeira tratava de um episódio, uma conversa, uma mala de dinheiro, uma delação; a segunda traz mais de uma década de informações sobre eventuais desvios, venda de projetos de leis e corrupção em nomeações que teriam sido promovidas pela organização criminosa da qual Michel Temer figuraria "ao mesmo tempo como cúpula e alicerce". Além da acusação de obstrução de Justiça, consistente em pagamentos para silenciar possíveis delatores.
A narrativa desse macro esquema vem acompanhada de uma multiplicidade de indícios, como sentenças em outros casos, testemunhos, delações, recibos e transferências bancárias. Se, por um lado, essa abrangência das acusações é um desafio à defesa, por outro, em razão de sua abstração, facilita o deslinde político.
Tanto que, nessa segunda denúncia, não houve dificuldade de sua rejeição pela CCJ. O relator, Bonifácio de Andrada (PSDB), aprovou sem maiores empecilhos o seu voto, recomendando o não prosseguimento da denúncia. É interessante notar, entretanto, que o tom é outro. Se na primeira denúncia a ênfase no relatório foi jurídica, agora é eminentemente política.
O relatório que será votado no plenário da Câmara é uma defesa indistinta da classe política, uma rejeição à pecha de que a política é um ambiente de corrupção sistêmica. Andrada não mede palavras: "O Poder Legislativo muito perdeu na sua eficiência institucional com a falta das imunidades parlamentares que existiam no passado brasileiro. É curioso que essa perda de garantias do Parlamento submete o Legislativo às pressões judiciais e à descaracterização das funções parlamentares dentro da sociedade.
Essa situação cresceu de tal maneira que o Ministério Público, hoje órgão poderoso no nosso sistema que, aliás, se utiliza e domina a Polícia Federal, mancomunado com o Judiciário, trouxe para o país um desiquilíbrio nas relações entre os Poderes da República".
O problema não está na corrupção, mas em quem a descobriu?
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