O presidente argentino Mauricio Macri venceu bem as eleições do meio de mandato e tem um futuro promissor para enfrentar novamente as urnas e conseguir se reeleger em 2019. O partido de Macri, Mudemos, cresceu na Câmara e no Senado, mas terá de continuar a explorar as dissidências peronistas para obter maioria aos projetos do governo - uma arte que o presidente vem sabendo exercer desde que assumiu o poder. A principal força de oposição, comandada pela ex-presidente Cristina Kirchner, que conquistou uma vaga no Senado, tem a esperança de reunir de novo o partido em torno de si. O desempenho da economia vai determinar a oscilação do pêndulo político, cujo movimento é agora bem mais favorável a Macri.
A Argentina fez progressos ante a péssima situação econômica legada por mais de uma década dos Kirchner na Casa Rosada. As heranças nefastas não foram vencidas ainda, entretanto. A inflação, que chegou a mais de 40% antes de Macri assumir caiu a quase a metade. A meta de inflação do BC, de 17% este ano, não será cumprida, mas o governo acredita que chegará às próximas eleições com a alta dos preços na casa de um dígito.
A queda dos preços não foi abrupta porque uma das principais medidas de arrumação da política econômica foi a eliminação dos enormes subsídios nos preços públicos, que chegaram a consumir 5% do PIB, com vários tarifaços. A correção dos preços prossegue. Ontem, após a vitória nas urnas, foi anunciada correção de 10% no preço dos combustíveis. Além disso, alimentaram a inflação o grave déficit fiscal e o fim do artificialismo cambial, que resultou em uma maxidesvalorização do peso argentino.
O déficit público matou todas as tentativas anteriores de estabilização econômica na Argentina. A meta para 2017 é de 4,2% do PIB, quase o dobro do preocupante déficit primário brasileiro. Nessa frente, Macri também vem obtendo algum progresso. De janeiro a setembro, o rombo fiscal foi de 2,2% do PIB, embora o resultado final do ano deva ser maior. O objetivo para 2018 é 3,2% do PIB, ainda assim muito elevado para a plena normalização econômica, ainda que as emissões de moeda para financiar os déficits do Tesouro sejam hoje bem menores. O governo anunciou ontem os números de setembro e apontou que, no ano, pela primeira vez desde 2004, as receitas superaram as despesas.
O déficit político de Macri obrigou-o a negociar com as majoritárias forças peronistas. Tendo a seu lado Sergio Massa, peronista adversário de Cristina Kirchner, da legenda 1pais, o presidente soube explorar as dissensões para fazer passar parte de seu programa reformista. Sua moderação e prudência deram frutos até agora. A economia voltará a crescer este ano e, com a melhora de vários indicadores vulneráveis, tudo indica que Macri buscará a reeleição em melhores condições do que as que enfrentou até agora.
Cristina Kirchner não foi bem na eleição para o Senado em Buenos Aires, onde foi derrotada pelo governista Esteban Bullrich, que manteve a dianteira por 407 mil votos em Buenos Aires, maior colégio eleitoral argentino. A derrota diminui no curto prazo as esperanças de Cristina de servir de polo aglutinador do estilhaçado Partido Justicialista. O PJ, por sua vez, perdeu poucas cadeiras no Senado e ganhou algumas na Câmara, indicando que a dissidência pró-Macri, de Sergio Massa, foi a maior perdedora nas urnas: não tem mais cadeiras no Senado (tinha 3) e perdeu 17 na Câmara (de 39 para 22).
Se o desempenho da economia continuar melhorando, como as previsões apontam e a recuperação brasileira favorece, Mauricio Macri tem a chance não só de ser o primeiro presidente não peronista a terminar um mandato desde 1928 como também de repetir a dose e se reeleger. O mapa da votação nacional já o coloca praticamente em pé de igualdade com todos as facções peronistas somadas. O Mudemos obteve 41,76% dos votantes, ante 42,2% - 21,8% dos kirchneristas, 14,6% do PJ e 5,83% de Massa (que apoia Macri).
Apesar de consolidar a nova força de centro-direita no país, há grandes obstáculos à frente. Macri quer fazer uma reforma trabalhista diante de sindicatos ainda poderosos e vencer uma inflação ainda alta à custa da desindexação de salários, concomitante ao fim de subsídios às tarifas públicas. O presidente já percorreu a parte mais difícil do trajeto, como mostraram as urnas, mas nada indica, pela história argentina, que o futuro será um passeio.
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