- O Estado de S.Paulo
STF confirma uma tendência: 'à esquerda' em costumes, 'à direita' na economia
Apesar de relações instáveis e oscilantes com o Legislativo, o presidente Jair Bolsonaromarcou um gol no Judiciário: a licença dada pelo Supremo para que as empresas e bancos estatais vendam ativos sem licitação e sem consultar o Congresso. E, como disse o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, não foi uma vitória só do governo, mas do Brasil.
As privatizações e concessões à iniciativa privada são um dos pilares da política econômica do ministro Paulo Guedes, que, de um lado, joga todas as fichas na reforma da Previdência para detonar o déficit público e, de outro, articula uma abertura crescente ao capital privado para retomar investimentos, aquecer a economia, gerar empregos e renda. Só por ideologia, e não por inteligência e pragmatismo, pode-se insistir no Estado como propulsor da economia.
Aliás, essa tendência começou no governo Collor, avançou com FHC e, com ressalvas, foi mantida por Lula. A fase mais intervencionista e filosoficamente estatizante foi a de Dilma, com suas canetadas gerando desconfiança sobre o cumprimento de contratos e a independência das empresas.
Pela decisão do STF, as “empresas mães”, como Petrobrás, Eletrobrás e Banco do Brasil, só podem ser vendidas com licitação e aprovação de leis específicas na Câmara e no Senado. Mas essas empresas têm poder e independência para traçar suas políticas, executar suas estratégias e manter ou não suas subsidiárias, algo natural em países desenvolvidos e liberais.
Desde a campanha, o agora presidente já anunciava a intenção de abrir a economia e chegou a admitir a privatização até da Petrobrás, se não tivesse outro jeito. É muito difícil um governo, mesmo à direita, mesmo ultraliberal, chegar a tanto, mas o País já está maduro o suficiente para separar o joio do trigo. Manter a exploração e o refino com a Petrobrás faz todo sentido. Mas por que a distribuição? E para que manter mais de 30 subsidiárias?
Depois dos votos do relator Ricardo Lewandowski e do ministro Edson Fachin, contra as vendas sem aval do Congresso, quem mais chamou a atenção foi Luiz Roberto Barroso, que resume um personagem em ascensão da cena brasileira: “à esquerda” nas questões de costume e “à direita” na economia. Ou seja, liberal em ambas, enquanto a tal esquerda enferrujada mantém ojeriza à abertura que gera investimentos e empregos e a tal direita insiste numa visão retrógrada e desgarrada da realidade em costumes.
Dá um frio na barriga quando os 11 ministros do STF são chamados a julgar, às vezes a toque de caixa, assuntos altamente complexos, com imenso impacto sobre o País e a sociedade e sobre os quais eles não têm a mínima intimidade. A previsão de votos vai pela ideologia de cada um. Fulano é mais à esquerda? Então vota assim. Sicrano é à direita? Então, vota assado.
Guedes, porém, entrou em campo, deu aulas sobre o que estava em julgamento e, afinal, os ministros, mesmo não sendo economistas, conhecem as leis e estão antenados com a dinâmica do mundo e do Brasil. Não há mais como ignorar o inchaço do Estado e que a máquina, a burocracia, a folha e as aposentadorias devoram os recursos.
Essa é também a percepção do Congresso, onde mais de 70% dos parlamentares vêm acompanhando o voto da liderança do governo. Bolsonaro, porém, abriu um canal direto com o presidente do STF, Dias Toffoli, que ele nunca conseguiu – ou quis – com os da Câmara e do Senado, Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. Se fosse para apostar, daria para dizer que nenhum dos 11 ministros é bolsonarista ou simpatiza com o regime. Mas as relações com a Corte andam bem mais fáceis do que com o Legislativo. Aliás, em que pé ficou mesmo o tal pacto?
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