- O Estado de S.Paulo
Governo apresentou no primeiro ano do ministro da Economia, Paulo Guedes, um déficit de R$ 95 bilhões; em qual lugar do mundo um rombo desse tamanho do governo central pode ser apontado como um sinal de contas ajustadas?
A noção de contas equilibrada foi atualizada pelo governo Jair Bolsonaro. Na publicidade de 400 dias da atual gestão, divulgada nas redes sociais, a mensagem transmitida foi a seguinte: “contas equilibradas, inflação controlada e mais poder de compra para os trabalhadores impactam positivamente na economia”.
Nada mais fake news. O governo apresentou no primeiro ano do ministro da Economia, Paulo Guedes, um déficit de R$ 95 bilhões. São “bilhões” e não “milhões”.
Em qual lugar do mundo um rombo desse tamanho do governo central pode ser apontado como um sinal de contas ajustadas?
O ano de 2019 marcou o sexto ano de déficit consecutivo de contas do governo federal. Não são rombos pequenos. Ele caiu, é verdade. Mas é alto e tem impedido o governo de avançar em investimentos – que estão em patamares ridículos há anos.
Na melhor das hipóteses, somente no final de 2022, as contas voltam para o azul. As projeções mais fresquinhas da própria equipe econômica apontam que, no último ano do mandato do presidente, o déficit será de R$ 31,4 bilhões. O mais provável – até o momento – é que o cenário de superávit só venha em 2023.
Esse quadro só muda se a economia crescer muito e muito rápido. O que não é o caso, por enquanto. O Brasil patina no baixo crescimento há anos por razões diversas e estruturais.
Por ora, a redução do déficit – comemorada pela equipe de Guedes – se deve muito à receita extraordinária com leilões de petróleo e dividendos pagos por estatais e bancos públicos. Do lado das despesas, o arrocho foi grande nos gastos discricionários (não obrigatórios), que afetou os programas sociais.
A zeragem do déficit – prometida pelo ministro para 2019 – não ocorreu. E todos sabiam que não iria acontecer no ano passado. Guedes se justifica dizendo que quis subir o sarrafo (da meta) para alcançar o melhor resultado.
Mas o corte nos incentivos setoriais, nos “privilégios” do sistema S, benefícios tributários de todos os tipos... esse ficou a ver navios. A força das criaturas do pântano, citada no discurso de posse como uma frente a ser destruída, continua solta por aí.
O governo não atacou esses privilégios. Pelo contrário, enviou ao Congresso um anexo secreto (sem publicidades) com medidas que “podem ser acionadas”. Cumpriu tabela e escondeu o caminho.
O déficit não começou nesse governo. É verdade. Acabar com ele é obrigação.
Com a mensagem dos 400 dias, a sensação que o governo passa à sociedade e ao Parlamento é que está tudo ok. Os sinais de pressão aumentam nesse ambiente. Um presidente fiscalmente responsável jamais faria um desafio aos governadores de zerar impostos sobre combustíveis.
Impossível não comemorar um déficit menor, conta de juros mais baixa e redução da dívida pública. Avanços ocorreram, sem dúvida. Mas o ajuste só estará completo quando as prioridades orçamentárias estiverem direcionadas para a população que mais precisa. Muito a fazer.
O governo reclama de fake news, mas, com todo respeito, desta vez, ele mesmo espalhou.
* É jornalista
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