- O Globo
O presidente Bolsonaro, ao que tudo indica,
conseguiu convencer os militares de que a política vive de aparências e de
promessas vãs, que não precisam ser cumpridas. Seria uma espécie de
prestidigitação para enganar o cidadão eleitor. Militar que saiu dos quartéis
diretamente para a arena política defendendo seus companheiros em
reivindicações salariais e corporativas que os fardados não podem fazer,
Bolsonaro ficou quase 30 anos praticando a baixa política, que deu a ele e aos
filhos uma vida confortável através de artifícios como a “rachadinha” dos
salários dos funcionários dos seus gabinetes, e a manipulação de outras verbas
de representação, fundos partidários e eleitorais.
Pequenos assassinatos morais cotidianos, que
não são exclusivos dos Bolsonaros mas, levados ao centro de decisão do país,
distorcem permanentemente a prática política. Deve-se a essa distorção moral o
grave fato de o General de Divisão da ativa Eduardo Pazuello ter a audácia de
dizer, em uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que a frase emblemática que
proferiu - “A questão é simples, um manda, e o outro obedece”- era “coisa da
internet”, apenas para impressionar o público das redes sociais, que estava
cobrando de Bolsonaro uma posição depois que ele, como ministro da Saúde, havia
anunciado a compra da vacina Coronavac, “a vacina chinesa do Dória”.
Essa encenação revelada candidamente por Pazuello demonstra a que ponto
Bolsonaro conseguiu condicionar os militares que o rodeiam e apoiam para
assumirem situações de envergonhar uma pessoa de bem. É sabido que Bolsonaro,
eleito por 57,7 milhões de votos no segundo turno, sempre disse a seus
assessores que quem entende de política é ele, cortando-lhes qualquer
possibilidade de argumentação contrária.
O General Braga Neto, que já exerceu a chefia do Gabinete Civil, continua, na visão de muitos militares, fazendo política no ministério da Defesa, embora ele mesmo tenha garantido que as Forças Armadas jamais aceitariam politizar os quartéis. O General Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ficou marcado durante a campanha eleitoral por uma declaração forte contra o Centrão, agrupamento político de centro-direita.
“Se gritar pega ladrão, não fica um, meu irmão”, sucesso dos “Originais do Samba”, onde pontuava o grande Mussun, cantou, surpreendentemente, o circunspecto general, para mostrar sua rejeição ao Centrão. Era o tempo em que a candidatura de Bolsonaro representava, vê-se agora que não no sentido de “simbolizar”, mas no de “encenar”, a tolerância zero com a corrupção, se contrapondo às gestões petistas marcadas pelos mensalões e petrolões da vida recente do país.
O que esperar de um austero General quando o presidente Bolsonaro se aproximou do Centrão, fechando uma parceria política no Congresso para se proteger de um impeachment? Ainda mais depois que o ex-ministro Sérgio Moro fora pressionado a sair do governo pelo empenho do presidente em “controlar” os órgãos de controle para proteger seus filhos de acusações de corrupção?
Deveria pedir o boné metafórico e ir para casa, não? Pois não apenas ficou no cargo como, dias atrás, deu uma explicação inacreditável: “Mudei de opinião. Vi que o Centrão faz parte do show político”. É uma confissão de capitulação, a mesma que o General da ativa Eduardo Pazuello fez ao afirmar que o que o presidente diz nas redes sociais, não se escreve. Serve apenas para distrair seus milhares de seguidores, base ativista de sua força política. Ou que a aliança com o Centrão, que antes via como um antro de ladrões, agora é aceita como parte necessária da luta político-partidária.
Longe vão os dias em que essa turma prometia chegar ao poder central para mudar essa prática. Mas eram apenas promessas para enganar os otários dos eleitores, coisas de internet.
Nenhum comentário:
Postar um comentário