-Folha de S. Paulo
O precário sistema de fiscalização foi
destruído na Amazônia e no Pantanal
A primeira
função da CPI está realizada, embora ainda em andamento: já ficou bem
demonstrado a que classe de gente o Brasil está entregue. Entre (ex)
ministro das Relações Exteriores, (ex) dirigente da comunicação
governamental com as altas verbas, e (ex) ministro-general da Saúde, o
governo só teve para apresentar, e representá-lo, impostores. Falsários das
atribuições dos respectivos cargos, falsários no cinismo mentiroso com que
tentam evadir-se dos próprios atos e palavras no entanto gravados, impressos,
criminosos.
A função subsequente da CPI não contará com a contribuição da corja proveniente do governo. Dependerá de como e quanto o relator Renan Calheiros (MDB-AL), até aqui com desempenho competente, e o preciso presidente Omar Aziz (PSD-AM) conduzam a formação das conclusões submetidas à comissão. De conhecimento público antes mesmo da CPI, os fatos em questão não suscitam dúvida, mas a altivez e a coragem política para relacioná-los com o Código Penal e gravíssimas consequências será de ordem pessoal.
O problema não acaba aí. Renan Calheiros
faz supor a disposição de uma atitude à altura do episódio, com um relatório
rigoroso. Mas aprová-lo, alterá-lo ou recusá-lo caberá ao corpo da comissão. E,
em qualquer dos casos, essa etapa será de luta sem freio e sem compostura, a
exigir muito de Omar Aziz. Posta tal perspectiva, pode-se ouvir que Bolsonaro,
à vista de derrota na comissão de maioria opositora, tentaria algo para impedir
a CPI de consumá-la. Algo?
Será, então, a hora do inestimável
Ministério Público. Para dividi-lo mais, não falta muito à percepção de ações e
omissões do governo articuladas no gênero próprio de quadrilha. Amazonense e
conhecedor indignado do que se passou na crise do oxigênio em Manaus, o
senador Omar Aziz está convicto de que o povo ali foi “feito de
cobaia”, para indução da cloroquina, como para a imunização coletiva pelo vírus
mesmo.
Em paralelo ao que houve, e não terminou,
na Saúde e morte de quase 450 mil pessoas, está comprovada a ação de (outra)
quadrilha no governo e no círculo de Bolsonaro. Da derrubada à entrega da
madeira amazônica no exterior ou aqui mesmo, o número de operações combinadas é
bem grande. Todas criminosas. Não pode ser coisa de poucos e amadores. A maior
apreensão de madeira ilegal, que custou ao delegado Alexandre Saraiva sua
transferência na Polícia Federal, e a denúncia americana de madeira
contrabandeada e apreendida nos Estados Unidos puseram, enfim, algemas por ora
morais nos pulsos do ministro (sic) Ricardo Salles.
Já na campanha Bolsonaro anunciava a
desmontagem do Ibama, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(acompanhamento ambiental por satélite), Funai, das reservas indígenas e de
toda a defesa ambiental. O já precário sistema de fiscalização florestal foi,
de fato, destruído na Amazônia e no Pantanal. Por Salles e seus prepostos. Por
ordem de Bolsonaro.
A proibição, sem sequer hipótese de
justificativa, de destruição do maquinário de garimpo ilegal e de tratores e
serrarias do desmatamento clandestino foi óbvia proteção de Bolsonaro aos
criminosos e seu enriquecimento compartilhado. A dispensa ilegal, mas
acobertada, de licenciamento para exploração da terra amazônica é objeto de
iniciativa do governo para legalizá-lo. E por aí segue a sequência de ações
contra a riqueza do solo e do povo amazonense.
Ou a ação de cima e a operação direta são
coordenadas, ou a madeira, o ouro e minerais valiosos nem sairiam do chão,
quanto mais chegar a portos dos Estados Unidos, da Europa e da Ásia. E essa
coordenação numerosa, profissional, de cima a baixo, tem nome no Código Penal:
quadrilha. No caso, como disseram os americanos, quadrilha internacional.
Nada surpreendente. Relações várias, próximas e financeiras com milícias. Apropriação de dinheiro público por extorsão dos vencimentos de funcionários reais e fantasmas. Controle da Abin e da Polícia Federal com direções subservientes. Entrega do Meio Ambiente a um condenado por improbidade quando secretário do Meio Ambiente de Geraldo Alckmin. O desmantelamento anunciado e realizado. Ah, sim, e milhares de militares da ativa e da reserva do Exército compondo um exército de guarda-costas políticos e judiciais, em proteção ao grande assalto. O que poderia sair desse conjunto não é mais nem menos do que saiu.
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