O Estado de S. Paulo
Instituições americanas
podem não resistir a uma nova tentativa de golpe
O pior do 6 de Janeiro foi ver o voto de 139 republicanos contra a certificação da eleição
Conforme a eleição se
aproxima e as pessoas consideram os prós e os contras dos dois candidatos,
tenho de confessar: para mim, um evento se destaca em luzes brilhantes, um
acontecimento que não consigo esquecer: o dia 6 de janeiro de 2021. Não estou
pensando muito na violência que eclodiu naquele dia, por mais terrível que
tenha sido. Essas ações foram rapidamente condenadas por pessoas de todo o
espectro político. Pelos democratas, é claro, mas também pelos republicanos,
como o então líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, o senador Ted Cruz, a
ex-governadora da Carolina do Sul Nikki Haley e o senador Lindsey Graham.
Para mim, o aspecto mais assustador do que aconteceu no 6 de Janeiro não foi o evento fora do Capitólio, mas o que aconteceu dentro dele – depois que a ordem foi restaurada. A Câmara se reuniu novamente naquela noite para certificar os resultados das eleições enviados pelos Estados. Lembre-se, isso foi depois que dezenas de objeções em muitos Estados foram consideradas e rejeitadas e dezenas de processos judiciais foram arquivados e rejeitados. Depois que todos esses procedimentos legais foram seguidos, após um ataque violento ao Capitólio, Donald Trump e seus aliados ainda instaram seus apoiadores a rejeitar os resultados, rejeitar o colégio eleitoral e, na prática, anular a eleição. E a maioria dos republicanos da Câmara – 139 deles – prontamente consentiu e votou contra a certificação da eleição. Se tivessem votos suficientes, bem, não sabemos o que teria acontecido.
VICE. Não vamos esquecer
também que Trump pressionou seu vice-presidente, Mike Pence, a abusar do seu
papel como aquele que presidia a contagem dos votos do colégio eleitoral. Esse
trabalho, explicitamente estabelecido na Constituição, é cerimonial. Trump
queria que Pence alegasse, pela primeira vez na história americana, que tinha
autoridade para rejeitar votos do colégio eleitoral, destacando o papel dele a
tal ponto que a multidão do lado de fora do Capitólio gritou: “Enforquem Mike
Pence!”
Trump atacou repetidamente
seu vice nas redes sociais. Se Pence tivesse feito o que Trump pediu, os EUA
teriam enfrentado uma crise constitucional, e não está claro se Joe Biden teria
assumido o cargo duas semanas depois. Como George W. Bush disse a respeito
daquele dia: “É assim que os resultados das eleições são contestados em uma
república de bananas”.
Vale a pena repetir essa
história porque, às vezes, na vida, uma única escolha em um momento crucial
revela caráter. Líderes nacionais frequentemente enfrentam esses testes em
maior ou menor magnitude – Mikhail Gorbachev decidiu não usar a força para manter
unido o império soviético, Lyndon B. Johnson apoiou projetos de lei de direitos
civis, embora soubesse que isso destruiria a base democrata no Sul, Al Gore
aceitou educadamente a controvertida decisão da Suprema Corte concedendo a
eleição de 2000 a Bush.
Trump enfrentou tal teste e
foi reprovado – enquanto Pence, vale a pena notar, foi aprovado com louvor. Não
só isso: Trump nunca demonstrou um momento de dúvida ou remorso quanto a pedir
ao Congresso e ao seu vice a anulação da eleição. Na verdade, ele continuou
desejando que eles tivessem encontrado alguma maneira de deixá-lo no poder.
FAVORES. Conforme a base de
Trump rapidamente retornou a ele e seu apoio cresceu, muitos dos que
denunciaram a violência reverteram o curso e voltaram para seu movimento.
Bilionários que se manifestaram por uma questão de consciência ficaram em
silêncio por um tempo, e então encontraram o caminho de volta para Mar-aLago,
esperando obter favores de um homem que era cada vez mais o favorito
republicano. Alguns ainda condenam a violência, e até desejam que Trump tivesse
feito mais para impedi-la, mas não dizem nada a respeito da ação no centro
daquele dia: uma tentativa de anular uma eleição livre e justa.
O pai da Constituição dos
EUA, James Madison, construiu um sistema no qual havia muitos freios e
contrapesos para evitar o acúmulo de poder ou a ascensão de um ditador. “Se os
homens fossem anjos, nenhum governo seria necessário”, dizia. Mas Madison entendeu
que não era suficiente criar instituições. Ele explicou que esperava “que o
povo tivesse virtude e inteligência para selecionar homens de virtude e
sabedoria”. “Nenhum freio teórico, nenhuma forma de governo pode nos deixar
seguros.”
Talvez estejamos prestes a embarcar em um experimento para ver se nossas instituições, freios e contrapesos, podem se sustentar, mesmo quando os líderes se esforçam ao máximo para subvertê-los.
2 comentários:
Quanta narrativa falsa, o choro é livre !!
o Trump vai ganhar por mais que vocês Relutem em aceitar
O colunista está correto: Trump é a maior ameaça à democracia dos EUA em toda a história dela! Trump tentou o golpe de Estado que Bolsonaro sonhou dar posteriormente. 3 estadunidenses foram assassinados durante a invasão ao Capitólio.
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