domingo, 7 de dezembro de 2025

Quem substituirá Tarcísio? Por Merval Pereira

O Globo

Assim como Bolsonaro, o senador Flávio não tem experiência de gestão de coisa nenhuma, e, diferente do pai, não tem votação própria, depende do apoio dele para se eleger qualquer coisa.

A partir da decisão do ex-presidente Bolsonaro de indicar seu filho Flávio para candidato à presidência da República, abre-se um caminho para aqueles que conseguirem substituir o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas na preferência da classe média e do mercado financeiro, que já mostrou sua preocupação com a fragilidade de Flávio e a vantagem que o presidente Lula ganha com uma escolha tão desastrada para disputar com ele.

Só o fato de que a família Bolsonaro pretende fechar entre os seus as decisões da campanha eleitoral retira da candidatura a possibilidade de ampliar sua penetração em outros setores da sociedade. Os candidatos alternativos à polarização entre lulistas e bolsonaristas terão um espaço ampliado à direita e ao centro, pois a preferência por Tarcísio de Freitas indica que o que esse nicho eleitoral buscava era um candidato competitivo que tivesse o apoio de Bolsonaro, mas que fosse distante o suficiente dele para ter autonomia de voo quando governasse.

Um candidato de direita que não fosse extremista, que tivesse uma visão administrativa moderna, que não fosse populista a ponto de esquecer a necessidade de um equilíbrio financeiro, mas com a proximidade popular que a chancela de Bolsonaro garantiria. Lula foi o preferido depois do governo temerário de Bolsonaro, mas por margem apertada. Agora procuravam um candidato distante de Lula, mas também do golpismo de Bolsonaro.

A subserviência de Tarcísio a Bolsonaro já incomodava parte desse eleitorado, que via na busca de apoio excessivo comprometimento do governador de São Paulo com temas caros ao ex-presidente como escolas cívico militares. Mas Tarcísio só ganhou o destaque na corrida presidencial por ter tido uma administração exitosa do maior estado brasileiro. Assim como Bolsonaro, o senador Flávio não tem experiência de gestão de coisa nenhuma, e, diferente do pai, não tem votação própria, depende do apoio dele para se eleger qualquer coisa.

Seria facilmente um dos dois senadores eleitos em qualquer Estado brasileiro, assim como sua madrasta Michele, que tem mais brilho pessoal que ele. Os irmãos, nem se fale. Vivem como os herdeiros de milionários que não encontraram o que fazer da vida e só gastam o patrimônio familiar, sem acrescentar nada deles ao legado da família. A prisão de Bolsonaro e a derrota anunciada de Flavio devem colocar um fim à saga extraordinária da família Bolsonaro na história política brasileira, ainda mais se um candidato de direita conseguir ir para o segundo turno.

A experiência desastrosa de Bolsonaro na presidência conseguiu ofuscar o temor de que, com Lula, iríamos acabar como a Venezuela. No mínimo, com a tentativa golpista da extrema direita, mais real do que qualquer conspiração esquerdista que Lula teima em revigorar com seus acenos a ditadores e autocratas, os que não são militantes nem da direita nem da esquerda podem ficar tentados a alternativas mais conservadoras à centro-direita, já que a esquerda não ofertará ao eleitorado um candidato alternativo a Lula.

Esse grupo terá diversos candidatos, como os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado, o do Paraná, Ratinho Junior, o do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e outros. Não é à toa que os políticos do Centrão ficaram reticentes diante do anúncio de que Flávio Bolsonaro foi o escolhido. Não são de extrema-direita, mas têm o cheiro da vitória e sabem para que lado o vento sopra. Não é na direção de Flávio, poderia ser na de Michele. Terão que ter muito tato para aderir a uma candidatura que não estava nos planos, e Flávio não parece daqueles políticos que arrebatam as multidões, tornando irreversível a escolha do pai.

O Centrão aderiu a Bolsonaro depois de ter recebido o Orçamento da República, e dificilmente aderirão a Flavio em troca do que já controlam. Se têm condições de enfrentar Lula na presidência, terão mais facilidade para encarar o filho, cujo pai já capitulou a eles. A fraqueza eleitoral de Flavio sugere que ainda teremos novos capítulos nessa saga brasileira.

 

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