O Globo
Às vésperas do início do tarifaço, EUA
manifestam desejo por riquezas do subsolo
Donald Trump mandou avisar: está de olho nos
minerais estratégicos do Brasil. O recado foi dado pelo encarregado de negócios
da embaixada americana, Gabriel Escobar. Ele expôs a cobiça a nove dias do 1º
de agosto, data marcada para o início do tarifaço contra produtos brasileiros.
O presidente dos Estados Unidos não é dado a
sutilezas. Em fevereiro, ameaçou suspender o apoio militar à Ucrânia e submeteu
Volodymyr Zelensky a uma humilhação pública na Casa Branca. Tudo para arrancar
um acordo de exploração de terras-raras, descritas como o petróleo do século
21. O solo ucraniano é rico em minerais críticos como urânio, titânio, lítio,
ferro e manganês. Para não serem abandonados à própria sorte, os donos da terra
se viram forçados a entregá-la ao Tio Sam.
Em outro lance que lembrou o colonialismo do século 19, Trump ameaçou tomar a Groenlândia, território autônomo da Dinamarca. O republicano alegou fins de segurança nacional, mas um de seus conselheiros econômicos admitiu que a cobiça se deve à presença de “muitos metais valiosos”. A União Europeia protestou, e o assunto foi deixado de lado até segunda ordem.
Trump quer reduzir a dependência americana de
minerais estratégicos exportados pela China. O desejo de encontrar novos
fornecedores é legítimo. O problema é querer obtê-los mediante chantagem e
extorsão, levando a faca ao pescoço alheio.
O Brasil detém 23% das reservas mundiais de
terras-raras, além de 92% das reservas de nióbio, matéria-prima para a
indústria aeroespacial. O país também é rico em recursos como lítio e silício,
usados na produção de baterias e semicondutores.
Na quarta-feira, Escobar expôs o apetite
americano em reunião a portas fechadas com a cúpula do Ibram. A entidade tem
nome de órgão público, mas representa os interesses das mineradoras
brasileiras. É chefiada por Raul Jungmann, ministro dos governos FH e Temer, e
pelo general Fernando Azevedo e Silva, ministro de Bolsonaro.
Jungmann também preside o Lide Mineração,
braço do grupo de lobby de João Doria. Depois que a conversa veio à tona, o
ex-ministro disse ter informado o representante de Trump que a discussão
precisaria envolver o governo — uma obviedade, já que as riquezas do subsolo só
podem ser extraídas com permissão da União. Ele acrescentou que os minerais
poderiam se tornar uma “carta na manga” para o Brasil na negociação das
tarifas.
Se a ideia era entregar o mapa da mina,
parece não ter funcionado. Na quinta, Lula aproveitou uma solenidade para
reforçar o discurso da soberania nacional e rechaçar a cobiça americana. “Temos
todos os minerais ricos que vocês querem”, disse. “Aqui ninguém põe a mão”,
completou.
Nem sempre foi assim. Em janeiro de 2019, um
recém-empossado Jair Bolsonaro cruzou com Al Gore no Fórum Econômico Mundial,
em Davos. O ex-vice-presidente americano, vencedor do Nobel da Paz, manifestou
preocupação com a Amazônia. Deu-se um diálogo espantoso, filmado pelo
documentarista alemão Marcus Vetter. “Temos muitas riquezas e gostaria muito de
explorá-las junto com os Estados Unidos”, ofertou o capitão. “Não entendi bem o
que isso quer dizer”, respondeu um constrangido Gore.
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