Folha de S. Paulo
Sucesso da resistência a Bolsonaro gera
debates sobre combate à extrema direita
Donald Trump conseguirá destruir a democracia
norte-americana?
Não se sabe ainda como terminará a guerra de
Trump contra a democracia americana. Conseguirá destruí-la ou será derrotado em
sua intentona autoritária?
De toda forma, o que já fez bastou para abalar as explicações que os cientistas políticos têm por verdadeiras. Uma delas reza que o sistema democrático seria inabalável em países com renda per capita acima de certo nível. Outro consenso estabelece que o tempo jogaria a favor da estabilidade do regime ao permitir que se enraizassem as instituições políticas que as garantem ou que se disseminassem os valores e atitudes com elas compatíveis. Outro consenso ainda sustenta que modelos democráticos com suficientes regras contramajoritárias facilitariam a oposição a investidas autoritárias, ao bloquear a concentração do poder decisório na Presidência.
Já a bem-sucedida experiência brasileira de
resistir a Bolsonaro, contrastando com o que ocorre nos Estados Unidos, começa
a alimentar polêmicas sobre o que de fato funciona para conter populistas de
extrema-direita. Desse fértil debate é exemplo a coluna do colega cientista
político Marcus André Melo, publicada neste espaço na última segunda-feira,
22/09. Aproveito a deixa para opinar.
É fato que, no Brasil, as instituições
políticas, a imprensa e a sociedade organizada travaram a trama golpista
encabeçada pelo ex-presidente. É impossível, porém, desconsiderar que o roteiro
aqui seguido é diferente daqueles trilhados no passado por bem-sucedidos
populistas autoritários e agora cumprido à risca por Donald Trump.
Na Venezuela, na Rússia, e na Hungria, por
exemplo, aspirantes a tiranos trataram de corroer as instituições da democracia
pelo controle do Judiciário; pela mudança das regras eleitorais a fim de lhes
garantir o controle do Executivo e obter maioria no Legislativo; pelo
progressivo cerceamento dos meios de comunicação e das organizações autônomas
da sociedade civil –tudo o que está em curso hoje nos Estados Unidos.
Outra foi a estratégia de Bolsonaro: apostou
suas fichas em um golpe respaldado pelas Armas. Vociferou ameaças ao STF; lixou-se
pelo que se passava no Congresso, salvo para impedir que ali prosperasse um
processo de impeachment; insultou a imprensa, os defensores de direitos
humanos, os democratas em geral. Mas não foi muito além do palavrório ofensivo.
Talvez porque estivesse certo do apoio das Forças Armadas —que chamou de
"meu Exército"— e para as quais multiplicou benefícios e esbanjou
adulação.
A estratégia do golpe fracassou, e o
julgamento que puniu os conspiradores foi mais uma demonstração de saúde
institucional da democracia brasileira. Se até alguém de rasa capacidade
intelectual como Bolsonaro é capaz de aprender com seus erros, convém que lhe
seja vedada a oportunidade de experimentar a estratégia de corrosão adotada
pelos populistas de extrema-direita para destruir o sistema democrático.
P.S.: A fala de Lula na ONU seria perfeita se tivesse mencionado, além dos
palestinos desalojados, famintos ou assassinados pelo Exército de Israel,
os mais de 100 reféns do Hamas que,
vivos ou mortos, seguem em Gaza.
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