Pesquisa nos Estados Unidos: você acha que as pessoas de Wall Street são tão honestas e éticas quanto as demais? "Sim", foi a resposta de 41% - mas isso em 2006, um ano muito bom.
Refeita a pergunta nesta semana, para o jornal "USA Today", apenas 26% responderam "sim". Três anos atrás, a opinião da maioria refletia a bronca universal contra bancos e banqueiros. Do ponto de vista do senso comum, os bancos não fazem nada e ficam com a melhor parte do lucro.
Assim: pegam dinheiro de um sujeito esforçado e econômico, que consegue guardar algum à custa de muito sacrifício, e emprestam a outro que "precisa" comprar algo ou para o empreendedor que teve uma boa ideia para tocar um negócio e que põe ali toda sua energia. O banco paga pouco para aquele de quem toma emprestado, cobra caro do devedor e salva o seu mesmo quando o negócio fracassa.
Eis por que, em circunstâncias normais, toda vez que os governos precisam arrecadar uns trocados a mais, os bancos são sempre os primeiros candidatos chamados ao caixa.
Acrescente a isso o maior fracasso da história do sistema financeiro, com reflexos diretos na vida das pessoas, que perderam nas suas ações, nos seus fundos de pensão, nas suas casas, nos seus empregos. Acrescente ainda que os governos estão pegando o dinheiro dos contribuintes e devolvendo aos bancos o que perderam em maus negócios e especulações.
Nem era preciso que os executivos financeiros distribuíssem entre si os bônus milionários, para que se formasse uma enorme rejeição do público. Raiva, dizem os jornais americanos.
Isso cria um enorme problema político, um abismo entre a visão racional, digamos assim, e o entendimento da maioria do povo. Pelas últimas pesquisas, cerca de 60% dos americanos se opõem a dar mais dinheiro para os bancos que estão à beira do colapso. (Opõem-se também ao resgate das montadoras, mas deixemos isso de lado.)
Ocorre que a visão racional, baseada na história e em milhares de estudos, sustenta que os bancos e o sistema financeiro em geral precisam ser resgatados e que isso só pode ser feito com caminhões de dinheiro público.
O lance principal a ser feito está nas mãos de Barack Obama, já que colocar de pé o sistema financeiro americano é a condição para arrumar o resto do mundo.
Obama tem suporte político. Assim como 60% dos americanos acham que o governo não deve resgatar bancos, também 60% aprovam o presidente.
Obama precisa, portanto, usar os seus 60% para convencer ao menos boa parte dos outros 60% que, sim, ele precisa solicitar ao Congresso mais US$750 bilhões para tirar os ativos podres dos bancos.
O jornalista Thomas Friedman escreveu no "N. Y. Times" de ontem que esse será "o primeiro grande teste de liderança" de Obama. Uma coisa é eleger-se na onda - e o candidato democrata soube converter o desapontamento com a era Bush, aí incluído o colapso financeiro, em apoio à sua mensagem de esperança.
Agora, trata-se de apresentar uma conta aos eleitores: mais US$750 bilhões para os bancos. Precisa ir contra a onda. Precisa convencer que os 60% estão errados e que o bem da nação exige o resgate do sistema financeiro, para impedir uma longa depressão econômica.
Obama estaria atrasado? Esta é a inquietação de muita gente. As alternativas técnicas já foram todas examinadas - comprar os ativos podres, nacionalizar, separar banco bom do ruim - de maneira que agora é escolher e agir.
Estaria Obama com receio da reação popular e, assim, procurando uma, improvável, saída que resolva o problema dos bancos, sem ofender a opinião pública?
Estaria procurando parceria no Congresso, na mídia?
Ocorre, completa Friedman, que Obama é o único capaz de "persuadir o povo de que esta (resgatar os bancos) é a menos injusta e a mais efetiva solução".
E por falar nisso, olhando para o Brasil, é impressionante a sequência de políticas impopulares, contra o senso comum, aplicadas por FHC - reformas da Previdência, privatizações e resgate do sistema financeiro (o Proer). Hoje, garantem a estabilidade; na época...
Carlos Alberto Sardenberg é jornalista.
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