quinta-feira, 31 de março de 2011

Reflexão do dia – Roberto Freire

Essas semelhanças com trabalho escravo, são inaceitáveis, ainda mais em obras do governo. É um “escárnio” que tal situação ocorra em pleno século XXI, em uma obra de um governo federal, cujo partido se diz dos trabalhadores e que surgiu no movimento sindical. Pergunta-se: para que ter Ministério do Trabalho, Delegacia do Trabalho e centrais sindicais, se a espoliação da mão-de-obra da classe operária no Brasil tem episódios como esses como exemplo; a que ponto chegamos!.

Roberto Freire, Deputado Federal e Presidente do PPS, no Portal do PPS

Mário Covas: democrata e republicano::Roberto Freire


Neste mês de março, relembramos, com justo orgulho e muita emoção, uma das mais fascinantes e exemplares figuras públicas da vida política brasileira da segunda metade do século XX – o santista Mário Covas , que nos deixou para sempre, há dez anos, vítima de câncer.

Sua militância começou, ainda jovem acadêmico de Engenharia na USP, onde se construiu como combativo e dedicado líder estudantil, a ponto de ser eleito vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (em 1955).

Nos turbulentos tempos do início dos anos 60, ao tentar dar início à sua vida pública, disputou e perdeu a Prefeitura de Santos (1961), mas, já no ano seguinte, elegeu-se para seu primeiro cargo, o de deputado federal, pelo PST. Com a dissolução dos partidos políticos em 1965, pela ditadura militar, ele foi um entusiasta fundador do MDB, único partido político de oposição existente. Em 1968, como corajoso líder da bancada oposicionista na Câmara dos Deputados, teve sua voz silenciada via cassação, pelo AI-5.

Em 1979, ao reconquistar seus direitos políticos, retomou abertamente a luta que travava silenciosamente contra o regime atrabiliário, conquistando mandatos de deputado federal (1982), prefeito nomeado pelo governador Franco Montoro da capital paulista (1984-1986) e, em 1986, elegeu-se o senador mais votado do país, até então (7,7 milhões de sufrágios), oportunidade em que foi líder da bancada do PMDB no Senado durante a Assembleia Nacional Constituinte, que elaborou a Carta Magna de 1988. Nesse período, pudemos compartilhar mais diretamente com ele das grandes batalhas para fazer o país avançar no rumo da democracia e das reformas.

Homem irrequieto, participou, como um dos seus expoentes, da fundação do PSDB, de tal forma reconhecido que o escolheram seu primeiro presidente nacional. Nas eleições presidenciais de 1989, as primeiras desde 1960, era um dos melhores candidatos, mas não obteve a vitória, o mesmo acontecendo, no ano seguinte, na disputa para governador de São Paulo.

Em 1994, Covas foi novamente candidato a governador e venceu o pleito por oito milhões de votos, sendo depois reeleito em 1998 para mais quatro anos. Sua gestão à frente do governo paulista se constituiu num marco não apenas de grandes realizações de real interesse da sociedade, mas também de seriedade no trato da coisa pública.

Em nome do Partido Popular Socialista, e em meu nome pessoal, não poderia jamais deixar de resgatar a figura deste exemplar político, cuja trajetória em favor das liberdades e de ações em favor do povo de São Paulo e da gente brasileira se constitui exemplo permanente para as atuais e futuras gerações.

Brasília, março de 2011

Deputado federal Roberto Freire, Presidente nacional do PPS

Percepções:: Merval Pereira

A criação do novo Partido da Social Democracia (PSD) está provocando não apenas uma razoável alteração na estrutura partidária - a legenda pode começar já maior do que o Democratas, de cuja dissidência se originou - como reabriu uma discussão, que parecia ultrapassada, sobre o que significa hoje ser "de direita" e "de esquerda".

Há no entendimento do que se pode chamar de núcleo central que pensa o novo partido (Kassab, Afif, Claudio Lembo, Kátia Abreu) a sensação de que se colocar como "de direita" reduz o alcance da nova legenda, que se tornaria, na percepção do eleitorado, a representante de uma classe política insensível às questões sociais, ligada ao mercado financeiro e a grandes lucros e, por consequência, grandes falcatruas.

O próprio Lembo, quando governou São Paulo por um período, deu uma célebre entrevista em que denunciou a existência no país de "uma burguesia muito má, uma minoria branca muito perversa".

Segundo ele, "todos são bonzinhos publicamente. E depois exploram a sociedade, seus serviçais, exploram todos os serviços públicos. Se nós não mudarmos a mentalidade brasileira, o cerne da minoria branca brasileira, não iremos a lugar algum".

Daí a tentativa do prefeito Gilberto Kassab de identificar o novo partido como sendo de centro-esquerda, o que não poderia ser levado a sério.

Ele então tentou negar qualquer tendência, dizendo que o PSD não seria "nem de esquerda nem de direita nem de centro". Pior a emenda que o soneto, e também não deu certo.

Agora parece que há um consenso de que o programa partidário a ser elaborado refletirá um partido "de centro".

Kassab chega a argumentar que investiu muito mais do que a ex-prefeita Marta Suplicy em programas sociais, o que indicaria que seu governo pode ser definido como de centro-esquerda.

Mas admite que toda essa dificuldade de se posicionar leva em consideração distorções históricas da política brasileira, que identifica "direita" com o período militar, e a "esquerda" com liberdade e luta contra a desigualdade.

A corrupção, que também era historicamente ligada à direita no Brasil, tornou-se um fardo também para a esquerda quando o PT chegou ao poder, nivelando por baixo o debate político nesse quesito. Mas o DEM sofreu mais com o escândalo do governador José Roberto Arruda no Distrito Federal do que o PT com o do mensalão.

E o novo partido pode sofrer um baque talvez insuperável se progredirem as negociações para que o filho de Jader Barbalho seja um dos seus fundadores no Pará.

Em outro momento dessa mesma discussão sobre tendências políticas no mundo moderno, registrei aqui na coluna que o filósofo italiano Norberto Bobbio escolheu a igualdade como parâmetro neste momento em que as fronteiras não são muito claras ou parecem ter desaparecido por completo.

A direita estaria mais preocupada com a liberdade, enquanto a esquerda enfatizaria sua pregação na redução ou eliminação da desigualdade.

O prefeito Gilberto Kassab rejeita a ideia de que não se preocupe com a desigualdade, ou de que o novo partido não tenha esse como um dos seus principais objetivos.

Acha, no entanto, que o mundo globalizado introduziu nas relações econômicas uma complexidade que exige maior eficácia nas ações governamentais e menos simplificações de definições.

Exemplifica com a interferência do Estado, afirmando que não é possível simplificar a discussão entre "Estado forte" e "Estado mínimo", e que a ação governamental depende da área que se discute: "Duvido que alguém tenha investido mais em saúde do que eu na prefeitura de São Paulo. Ali sem dúvida o Estado atua fortemente", diz ele.

O prefeito paulistano diz que tudo depende do bom senso e que a eficiência administrativa se impõe como uma necessidade dos governos modernos, sejam de que tendência forem.

Um dos alvos do novo partido é a nova classe média urbana que surgiu nos últimos anos e que, segundo diversos estudos, tende a ser conservadora para manter os avanços alcançados com a mobilidade social.

Conectada por modernos meios de comunicação, tem acesso a informações que vão moldando seu comportamento e aspirações sociais, mas também a incluindo no sistema democrático.

O prefeito Gilberto Kassab relaciona o que considera "de direita" no Brasil com atitudes como as de Jair Bolsonaro, que mais uma vez está envolvido com manifestações racistas e preconceituosas, lamentando que não exista por parte da média do eleitorado uma separação entre políticos radicais como Bolsonaro, que representam o atraso de certos setores da sociedade, não apenas quanto à desigualdade social, mas também em questões de raça e gênero, e outros, também tachados pejorativamente de "direitistas".

O fato é que o novo partido parece estar se formando com bastante força política em diversos estados, atraindo governadores, como Raimundo Colombo, de Santa Catarina, ou vice-governadores como Otto Alencar, na Bahia, e uma forte bancada de deputados federais e prefeitos, e a ideia inicial de se fundir com o PSB parece cada vez mais distante.

Ainda mais porque existe a possibilidade, cada vez mais real, de que o Democratas não resista a essa debandada e apresse sua fusão com o PSDB, talvez até mesmo antes das eleições municipais do ano que vem.

O futuro PSD herdaria assim esse nicho eleitoral que nunca foi ocupado integralmente pelo antigo PFL, atual DEM, e teria a oportunidade de demonstrar, através de atos, que ser "de direita" no Brasil de hoje não deve ser confundido com atraso político ou insensibilidade social. A conferir.

FONTE: O GLOBO

Na corda bamba:: Dora Kramer

No dia seguinte à decisão do Supremo Tribunal Federal a favor da aplicação da Lei da Ficha Limpa só para as eleições de 2012, o ministro Ricardo Lewandowski invocou a condição de presidente do Tribunal Superior Eleitoral para iniciar uma pregação sobre a necessidade de a sociedade não se deixar tomar pela frustração e seguir mobilizada em defesa da lei.

Alertou que a legislação será "fatiada como salame" em função das inevitáveis contestações judiciais dos que se sentirem prejudicados e sugeriu que a OAB, um partido ou a Procuradoria-Geral da República entrem no STF com uma ação declaratória de constitucionalidade a fim de salvaguardar a barreira legal a candidaturas de pessoas condenadas por órgãos colegiados em segunda instância.

Sem essa providência, que no entender do ministro deve ser tomada o mais rápido possível, a lei corre sério risco de virar uma "morta-viva". Ou seja, "pode vigorar, mas não ter eficácia alguma", diz ele.

A ação declaratória, que a OAB inclusive já manifestou intenção de apresentar, provoca o Supremo a se manifestar sobre a constitucionalidade ou não de todos os pontos da lei - hoje constituídos em brechas por onde os candidatos ditos fichas-sujas podem escapar - e deixar as coisas claras de uma vez por todas.

O ministro Lewandowski chama atenção para dois pontos-chave da lei que, se forem derrubados antes que o STF se pronuncie sobre a constitucionalidade geral, podem transformar a Ficha Limpa em letra morta.

"Se valer para o âmbito eleitoral a presunção de inocência até que os processos tenham transitado em julgado e se for decidido que a lei não pode alcançar atos cometidos antes de sua promulgação, terá sido perdida a oportunidade de se considerar a vida pregressa um fator determinante para o exercício de mandatos eletivos."

Lewandowski não critica seus pares, apenas constata que o Supremo se dividiu entre dois valores ao decidir pela aplicação só em 2012 - a moralidade e a anterioridade - e decidiu por um deles.

Mas ele justifica sua cruzada alegando que a Lei da Ficha Limpa pode ser comparada a outras iniciativas saneadoras, como a Lei de Responsabilidade Fiscal e a da Probidade Administrativa. Nessa condição, na concepção dele, deve ter sua eficácia assegurada.

Oxigênio. Se arrependimento matasse, não sobraria ninguém vivo no DEM para contar a história do desmoronamento do partido. O plano de "refundação" deu errado, nada saiu conforme o roteiro original que, agora, parece retomado na ideia de criação do PSD.

Segundo avaliação interna, o pecado mortal foi a mudança do nome para Democratas. Que, aliás, não pegou.

Essa autocrítica, porém, não considera um fator essencial: PFL ou DEM, o partido sempre atuou referido nos instrumentos de poder. Como não tinha diálogo social, quando lhe faltou o "pudê", faltou-lhe o chão.

Inanição. O que o menosprezo do governo à aplicação da lei impediu que fosse feito contra as ilegalidades do MST, a perda de credibilidade do movimento fez: de 2003 a 2009 os acampamentos de sem-terra s caíram de 285 para 36, com previsão de mais redução na estatística de 2010 a ser divulgada em breve.

Alguém dirá: isso prova que o governo estava certo em não reprimir as ações.

Ocorre que ao Estado é dada a prerrogativa de fazer cumprir a legislação, o que não pode ser ignorado em nome do objetivo estratégico. Se não, o que se tem é a aceitação do preceito dos fins que justificam os meios.

Bolsonaro. Vários leitores escreveram para defender o direito de o deputado Jair Bolsonaro se expressar, embora discordassem de suas declarações.

Ninguém está querendo cassar a palavra do deputado. Diga o que quiser, quando e como bem entender. Por uma questão de decoro e respeito à Constituição, só não deve fazê-lo da Câmara na posse de um mandato representativo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Ficha suja no cassino:: Clóvis Rossi

Como você reagiria se um desses parlamentares "fichas-sujas" presidisse a Comissão de Ética do Congresso, com plenos poderes para emitir juízos de valor sobre a confiabilidade de seus pares, de empresas e até de países?

Ficaria enfurecido, apoplético, certo? Pois é, meu caro, é exatamente isso que acontece todo santo dia no mundo real da economia global -e ninguém fala absolutamente nada, nadica de nada.

Estou me referindo às agências de "rating" ou avaliação de risco, que, todo santo dia, emitem "diktats" sobre a capacidade de pagamento de empresas e países, como está acontecendo neste exato momento com Portugal.

Qual é a ficha dessas agências? Eis o que diz relatório do Congresso norte-americano sobre a atuação delas na caminhada que levou à crise global de 2008:

"Concluímos que as falhas das agências de classificação creditícia foram engrenagens essenciais na maquinaria de destruição financeira". Anotou direitinho o termo? "Destruição financeira" não é uma ficha suja trivial, certo?

Mas tem mais: "As três agências [Moody"s, Standard & Poor"s, Fitch] foram ferramentas-chave do caos financeiro. Os valores relacionados com hipotecas, que estiveram no coração da crise, não teriam sido comercializados sem seu selo de aprovação".

Ou seja, essa turma deixou passar o fato de que as hipotecas ditas subprime eram um lixo, o que significa que são absolutamente incompetentes para julgar quem merece crédito e quem não, certo?

Por fim, o relatório conclui que, não fossem as agências, a crise não teria ocorrido. Não obstante, ficaram impunes e continuam com a prática de "destruição financeira".

Pior: os jornalistas somos cúmplices. Engolimos mansamente suas avaliações de risco sem avisar o leitor qual é cor (suja) da ficha de quem faz a avaliação.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Os bons obstáculos para o Brasil:: Cristian Klein

Em sua viagem aos Estados Unidos, nos idos de 1830, que renderia o clássico "A democracia na América", uma das características que mais chamavam a atenção do francês Alexis de Tocqueville (1805-1859), no regime que florescia no Novo Mundo, era a tábula rasa institucional de um modelo igualitário. O defeito da democracia, para Tocqueville, era reduzir todos a uma perigosa situação de equidade. Sem figuras notáveis e instituições proeminentes, a sociedade democrática seria um terreno livre para o despotismo do poder central. O que não acontecia na Europa, onde mesmo no Antigo Regime, a nobreza e o clero se erguiam como obstáculos na paisagem. Na América - pelo menos na fase em que Tocqueville a conheceu - a igualdade de condições entre os cidadãos e a falta de fortes poderes autônomos eram uma ameaça à própria existência do regime.

Tocqueville não falava de paradoxo. Mas tal argumento antecipou, de modo precursor, as contradições da democracia. Ela carrega o ovo da serpente do totalitarismo - como o mundo veria um século mais tarde com a ascensão do nazismo.

As lições de Tocqueville resistiram ao tempo e se mostraram pertinentes, mesmo em ambientes diversos ou contextos menos extremos. É a lógica que funciona. A lei de ferro da oligarquia - talvez a mais célebre formulada pela ciência política - segue o mesmo princípio. Quando Robert Michels, ao estudar as estruturas do primeiro partido de massas, o social-democrata alemão, chegou à conclusão de que quem fala em organização fala, necessariamente, de uma oligarquia, ele estava, mesmo sem querer, na trilha de Tocqueville.

É esse mesmo argumento que está por trás de um estudo que procura explicar as razões do sucesso da democracia brasileira, feito pelo professor da Universidade Federal de Pernambuco, Marcus Melo. Autor do artigo "Strong presidents, robust democracies?", Melo mostra como o Brasil, contrariando todas as previsões produzidas nas últimas décadas, deixou de ser o país "atrasadão", o retardatário, o "reform laggard", no linguajar de organismos como Banco Mundial, BID, PNUD e "think tanks" de Washington, e passou a ser um exemplo de instituições bem sucedidas.

Em seu trabalho, o professor lembra que o Brasil, comparado a outras nações latino-americanas, era visto como um sistema político extremamente disfuncional. Várias características institucionais apontavam para um futuro sombrio. O Brasil representava a receita do fracasso e estava atrás de todos os vizinhos. Atrasou-se a embarcar na onda das privatizações (como México e Bolívia), a realizar uma reforma da Previdência (como Chile e Argentina) e promulgava, em 1988, uma Constituição que era motivo de chacota. A ironia do economista e ex-ministro Delfim Netto servia de inspiração. O teto de 12% previsto para a taxa de juros era o equivalente de uma tentativa de se suspender a lei da gravidade.

O Brasil estaria irremediavelmente preso ao chão. Não só por isso. Mas principalmente por suas instituições. O presidencialismo forte, combinado com um quadro partidário fragmentado e um federalismo robusto, indicava um cenário desfavorável, propenso à instabilidade, à ingovernabilidade e, com uma dose de azar, a mais uma quebra de regime, e um novo período autoritário.

A lógica seria simples: com um presidente forte, dotado de prerrogativas legislativas, e eventualmente sem base partidária, o Brasil corre o risco de cair em duas situações, caso o mandatário perca apoio. Ou o presidente recua e se finge de morto para sobreviver até o fim do mandato, ou decide enfrentar o Congresso, com os poderes à sua disposição - alternativa mais provável e passível de crises militares e intervenção das forças armadas.

Marcos Melo lembra que, há 20 anos, países como Venezuela, Equador, México, Argentina eram tidos como os mais promissores na região por terem um presidencialismo fraco, próximo do modelo americano, no qual a separação de poderes é clara e o presidente não pode apresentar projetos de lei, nem tem iniciativa exclusiva em matérias fiscal, tributária e administrativa, como o Brasil.

O perigo estava no presidencialismo forte brasileiro e no chileno. Se o governante máximo tem grandes prerrogativas, vai querer utilizá-las para permanecer no poder, mesmo à custa de instabilidade e conflitos institucionais.

No entanto, nenhuma das previsões pessimistas se confirmaram. Pelo contrário. Enquanto Brasil e Chile figuram como modelos, os antes promissores Venezuela, Bolívia, Equador e Argentina é que entraram em descompasso, com distúrbios sociais e ameaças de golpe de Estado. Como explicar os erros dos prognósticos?

Para Marcos Melo, um presidente forte pode ser vantajoso ou até fundamental, como o foi, no caso do Brasil, para enfrentar a hiperinflação e a crise do endividamento dos Estados, nos anos 90. Mas, intuitivamente, é um complicador, pela possibilidade de abuso do poder. O que só não ocorreu porque os presidentes no Brasil e no Chile são constrangidos por instituições e atores fortes, como o Judiciário, o Legislativo, a mídia e uma burguesia industrial de peso. É um argumento para lá de tocqueviliano.

Melo classifica o Judiciário brasileiro como um dos mais independentes da região, atrás apenas do chileno e do uruguaio. No caso extremo, estão Argentina, Equador, Bolívia e Venezuela. Até o Legislativo, tido como um apêndice do Executivo, seria forte, institucionalizado, dotado de assessoria especializada e comissões que garantem um espaço de independência.

"São obstáculos que restringem a ação do presidente. A aprovação de um terceiro mandato de Lula não ocorreu não em razão de uma virtude individual dele, mas porque a sociedade não aceitaria", afirma o cientista político.

Melo lembra que uma questão ainda precisa ser respondida: o que favorece e dá sustentação a estas instituições fortes? Para ele, o mecanismo principal é a grande competição política nas eleições presidenciais, com dois campos bem definidos. "José Serra perdeu por uma margem relativamente pequena, mesmo contra o governo de um presidente extremamente popular", diz Marcus Melo.

Cristian Klein é repórter de Política.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Metas do BC:: Míriam Leitão

O Banco Central desistiu de buscar o centro da meta de inflação este ano e vai tentar se equilibrar na busca de dois objetivos: aceitar um pouco mais de inflação em 2011, com uma trajetória declinante em 2012, para preservar uma alta de 4% do PIB este ano. Isso é que está implícito no Relatório de Inflação, documento no qual, segundo Luiz Roberto Cunha, o BC reconhece todos os riscos inflacionários, mas os minimiza.

O BC reviu para baixo a projeção de alta do PIB deste ano, de 4,5%, no último relatório, para 4%, agora. Para o Orçamento, prevê 5%. E cada ponto a mais de crescimento do PIB significa uma previsão maior de arrecadação. Só aí já há um problema fiscal: o governo gastará como se fosse crescer 5% e o BC está avisando que vai crescer 4% e, mesmo assim, com ele aceitando terminar o ano com uma inflação de 5,6%.

A questão é se ficará neste 5,6%. Há vários riscos - e até boas notícias - que têm impacto sobre a inflação. Na parte ruim está o risco de indexação. O Banco Central diz com todas as letras: "os riscos associados aos mecanismos de indexação tornam-se importantes em 2011." De fato. No ano passado, havia a vantagem dos IGPs, que corrigem aluguéis e têm impactos em alguns preços administrados, terem ficado negativo em 2009. Assim, ajudaram em 2010. Mas o ano passado terminou com IGP em 10%. Os aluguéis subirão nesta faixa ou acima. Algumas empresas elétricas estão recebendo autorização para reajuste alto, como a Ampla, no Rio, que elevou seus preços em 11%. Como, neste cenário e com estes riscos, o BC pode concluir que os preços administrados ajudarão a conter as pressões inflacionárias?

O Banco Central diz que as medidas de contenção da oferta de crédito e redução da liquidez - que os economistas chamam de macroprudenciais - já estão surtindo efeito de diminuir o financiamento ao consumo e a pressão da demanda. As primeiras medidas foram tomadas em dezembro, mas o BC registra que em janeiro o financiamento imobiliário cresceu 50% sobre janeiro do ano passado. O crédito à pessoa física cresceu 19%. "A moderação da expansão do mercado de crédito é elemento importante para que se concretize o cenário" de convergência da inflação. Ele inclui aí nesta moderação do crédito a diminuição dos subsídios. Só que o BNDES vai receber mais R$55 bilhões de empréstimos para somar ao que tem de funding natural, do FAT e do retorno de créditos concedidos, e assim continuar financiando com subsídios as empresas.

Uma boa notícia registrada no Relatório de Inflação é que a recuperação econômica global vai acontecer mais rapidamente do que se imaginava e tem menor possibilidade de reversão. Será assimétrica, ou seja, terá ritmos diferentes dependendo do país, mas está acontecendo mais cedo. Nos Estados Unidos, a grande locomotiva mundial, é mais forte. Essa é também a avaliação do economista José Roberto Mendonça de Barros. A aposta que ele faz é que a economia americana pode crescer 4% este ano. Acha que já há sinais fortes de que através dos investimentos na energia verde, na inovação, tecnologia da informação, os Estados Unidos estão fortalecendo sua economia. Houve uma recuperação da bolsa, o que restaurou parte do patrimônio perdido das famílias. Mendonça de Barros acha que quando a economia americana crescer mais forte, os juros americanos vão subir. Isso pode produzir um efeito que é ao mesmo tempo desejado e temido na economia brasileira: o dólar se valorizar.

- Os Estados Unidos crescendo e com juros mais altos vão aspirar dinheiro do mundo inteiro. Ao mesmo tempo, apesar de estar havendo entrada forte de capital no Brasil, os investidores estão meio preocupados com a América Latina num ano em que há eleições importantes como na Argentina e Peru - disse Mendonça de Barros.

Se houver menos entrada de dólar por estes motivos e pelas medidas tomadas pelo BC, como a de aumentar o IOF sobre empréstimos externos, os preços dos produtos importados deixarão de ter o efeito de redução da taxa de inflação.

Um dos fatores de alta da inflação é a aceleração dos preços das commodities que, pelo índice do BC, aumentou 60% de agosto a fevereiro. Ao contrário de outros momentos, não é apenas uma alta sazonal, mas uma aceleração que tem permanecido. Nos últimos meses, caiu um pouco, mas Luiz Roberto Cunha acha que há um equívoco na frase do relatório: "mais recentemente a dinâmica de preços das commodities oferece sinais de moderação, apesar de desenvolvimentos desfavoráveis no campo geopolítico, como a crise no Norte da África e no Oriente Médio."

- Não é "apesar". Na verdade, os preços cederam porque houve o problema no Norte da África e no Oriente Médio, mas a tendência tem sido de alta. É um erro de avaliação. As commodities caíram porque aconteceram esses problemas, mas eles em si aumentam a incerteza do cenário - disse Luiz Roberto Cunha.

Isso parece um detalhe, mas é um ponto fundamental. Se as commodities caíram "apesar" da turbulência, é porque a tendência é de queda mesmo. Se elas caíram por causa dos problemas, voltarão a subir.

O Banco Central admite no documento que a inflação no terceiro trimestre ficará acima de 7%, ou seja, vai furar o teto da meta. Acredita que a maior probabilidade é que volte a cair no quarto trimestre, ainda que considere que há 20% de risco de que continue acima do teto. O BC não omite os riscos. Mas os subestima. Ou então, escolheu correr esse risco de inflação mais alta, porque os custos de se buscar mais o centro da meta "seriam demasiado altos" na taxa de crescimento do PIB.

FONTE: O GLOBO

Valores e interesses :: Demétrio Magnoli

O Brasil absteve-se de apoiar a intervenção ocidental na Líbia por temer uma "mudança de narrativa" da revolução árabe, explicou o ministro do Exterior, Antônio Patriota. Os bombardeios aéreos da coalizão começaram na undécima hora, quando as forças de Muamar Kadafi atingiam as entradas de Benghazi, cidade de 1 milhão de habitantes. Tudo indicava que sem a intervenção a capital rebelde seria palco de uma tragédia humana. Os espectros recentes do genocídio de Ruanda, em 1994, e do massacre de Srebrenica, na antiga Iugoslávia, em 1995, cometidos sob o olhar aterrorizado, mas passivo, da comunidade internacional, desestimularam o veto da Rússia e da China à intervenção. A confortável (devo dizer hipócrita?) abstenção brasileira não encontra justificativa legítima na preocupação de Patriota. Mas há, de fato, uma "mudança de narrativa" - e ela se iniciou antes da reunião decisiva do Conselho de Segurança da ONU.

Kadafi mudou a narrativa. Na Tunísia e no Egito, os levantes populares provocaram cisões no núcleo do poder. Os exércitos separaram-se dos ditadores e, então, os regimes caíram. A Líbia, porém, é um Estado singular, que combina estruturas de poder clânico com instituições típicas do totalitarismo socialista, como os comitês revolucionários. Seu exército regular passou para o lado dos insurgentes, mas o poder armado efetivo encontra-se nas brigadas especiais, fiéis ao tirano. A contraofensiva de Kadafi provou que a insurreição popular poderia ser esmagada em sangue. A mensagem chegou à Arábia Saudita, que aproveitou o precedente líbio para, desafiando a posição de Barack Obama, enviar suas tropas ao Bahrein. A Síria de Bashar Assad também entendeu a "mudança de narrativa" como uma licença para matar manifestantes em praça pública. O ciclo da revolução árabe não se encerrou, mas ingressou numa nova etapa, amarga e perigosa.

A metáfora do "Muro de Berlim árabe" evidencia o sentido democrático da revolução que varre a África do Norte e o Oriente Médio. Bem ao contrário do que, imunes aos fatos, asseguram os arautos do "choque de civilizações", as sociedades árabes erguem-se pela liberdade, não em nome da promessa salvacionista do fundamentalismo islâmico. Mas o paralelo tem limites, pois a topografia política do mundo árabe não se parece em nada com a do antigo bloco soviético na Europa Oriental. Os países satélites da URSS apresentavam notável uniformidade de sistema político e obedeciam a um único centro de poder externo. Os países árabes exibem uma diversidade de sistemas políticos, que se estendem desde Repúblicas pró-ocidentais baseadas nos exércitos (Egito, Tunísia, Iêmen) até monarquias sunitas conservadoras (Arábia Saudita, Bahrein), passando por Repúblicas autoritárias de partido único (Síria) e por um "Estado de massas" (Líbia). Não estamos na Europa de 1989: a revolução em curso divide-se em cascatas singulares, cujas configurações refletem as particularidades nacionais.

As diferenças não param aí. A União Europeia serviu como bacia de captação para as sociedades da Europa Oriental que emergiam das ditaduras totalitárias. O espectro do nacionalismo autoritário rondou os países do antigo bloco soviético, mas foi conjurado pelo magnetismo do bloco de democracias ocidentais. A revolução fragmentária no mundo árabe, ao contrário, não conta com nenhuma sinalização na estrada. As sociedades que hoje se libertam dos tiranos carecem de tradições democráticas ou experiências pluralistas. Nas margens dos levantes populares, espreitam as correntes fundamentalistas e, em certos casos, as organizações jihadistas. Os árabes não estão condenados à tirania, como assegura o mantra dos entusiastas da Doutrina Bush. Contudo também não iniciaram uma marcha triunfal em direção à liberdade.

O sentido da revolução árabe será profundamente influenciado pelos atos do Ocidente. A França não sustentou o ditador tunisiano Ben Ali, seu antigo cliente, e os EUA, depois de alguma hesitação, explodiram a ponte que os ligava ao egípcio Mubarak. A resolução da ONU sobre a Líbia representa mais que uma iniciativa humanitária providencial: o massacre dos insurgentes de Benghazi ofereceria uma inigualável narrativa de martírio ao radicalismo islâmico e ao terror jihadista. Entretanto, cada gesto ocidental deixa entrever um conflito dilacerante entre valores e interesses.

"Para todos aqueles que se perguntam se o farol dos EUA ainda brilha com a mesma intensidade, (...) nós provamos (...) que a verdadeira força de nossa nação não emana da capacidade de nossas armas ou do tamanho de nossa riqueza, mas do poder persistente de nossos ideais: democracia, liberdade, oportunidade e inflexível esperança." A passagem do discurso da vitória de Obama, em novembro de 2008, inscreve-se na tradição wilsoniana que busca estabelecer uma identidade entre os valores e os interesses americanos. A Realpolitik, contudo, subsiste no Bahrein, porta de entrada da revolução árabe no cenário estratégico do "golfo do petróleo", onde tropas sauditas se encarregam do trabalho sujo de repressão sob o silêncio cúmplice do Ocidente.

No Iraque, em 2003, George Bush revestiu no celofane da defesa da liberdade uma ocupação militar definida por sua peculiar interpretação dos interesses geopolíticos americanos. Na Líbia, Obama sacrifica o interesse concreto da cooperação com Kadafi na "guerra ao terror" no altar dos valores pregados pelo Ocidente. Há uma lógica estratégica na aposta de risco na revolução árabe. O fracasso da Doutrina Bush revelou que o fundamentalismo e o jihadismo prosperam na estufa opressiva das tiranias. Por isso, na Tunísia, no Egito e na Líbia, os EUA e seus aliados escolheram um lado. Mas a opção ousada terá de se estender além da Síria, até o Bahrein e a Arábia Saudita, sob pena de se esfarelar na incoerência.

Sociólogo e Doutor em Geografia Humana pela USP.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Fracasso sindical :: Cássio Casagrande

Em tempos de euforia econômica, pleno emprego e aumento da massa salarial, certamente ninguém esperava a eclosão de revoltas operárias no Brasil. Os graves episódios de Jirau, bem como as tumultuárias paralisações em Pecém e Abreu Lima, surpreenderam a todos, inclusive os respectivos sindicatos de base, que prontamente arvoraram-se em declarar que os movimentos ocorreram à sua revelia.

Mais surpreendente do que o movimento trabalhista em si e a anomia sindical que se lhe seguiu, só mesmo a bizarra declaração dos responsáveis pelo consórcio construtor da Usina de Jirau, de que a revolta foi provocada por "um grupo de vândalos", retórica bastante usual na República Velha em que a questão social era nada mais do que "uma questão de polícia". Não é crível que uma centena de ônibus e dezenas de alojamentos pudessem ser destruídos por um mero espírito de vandalismo inconsequente, sem que um caldo de cultura de opressão e exploração estivesse fervilhando entre trabalhadores sujeitos a péssimas condições laborais.

A revolta de Jirau em boa hora vem nos lembrar que "a felicidade geral da nação" ainda é uma realidade distante para milhares de trabalhadores migrantes do Norte-Nordeste, que em decorrência da escassez de mão-de-obra no Sul-Sudeste são recrutados por mercadores de peões (conhecidos no jargão proletário como "gatos") para trabalhar em condições degradantes, seja nas obras do PAC, seja nos canaviais do "moderno" setor sucroalcooleiro, onde não raro morrem de fadiga.

Os acontecimentos de Jirau, Pecém e Abreu Lima não despertaram maior atenção do público porque coincidiram com a visita de Barack Obama ao Brasil. Em seu celebrado discurso no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, o líder americano destacou o grau de evolução da democracia brasileira, enquanto as chamas ainda ardiam em Rondônia, como a advertir que o regime democrático não se resume ao direito de voto: só há democracia onde os direitos da cidadania são respeitados, inclusive no local de trabalho.

Apenas uma central sindical pediu que as condições de trabalho dos empregados sejam investigadas. O governo federal mandou a Rondônia as tropas da Força Nacional e parece preocupado que o cronograma das obras do PAC siga adiante. Seria importante ter enviado também uma força-tarefa para verificar as condições de trabalho no local. Se há algo de notável a ser celebrado nestas revoltas é o fato de que o Estado não conseguiu amalgamar em seu aparato burocrático toda a espontaneidade e vivacidade dos movimentos sociais e do sentimento de justiça dos trabalhadores.

No entanto, a revolta de Jirau, em sua força bruta e chocante, também nos faz pensar como ainda estamos longe do Primeiro Mundo, não apenas em razão da persistência do trabalho degradante, como pela dificuldade que os trabalhadores encontram em canalizar suas reivindicações através de um sindicalismo de base efetivamente representativo e independente.

Cássio Casagrande é procurador do trabalho no Rio.

FONTE O GLOBO

O que pensa a mídia

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Na Vale, Dilma dá continuidade ao intervencionismo estatal na economia:: Jarbas de Holanda

A conclusão do editorial do Estado de S. Paulo, de ontem– “Dilma, a Vale e a sombra de Lula” – aponta o limite básico, na esfera da economia, dos passos inovadores da nova chefe do Executivo federal: “A presidente Dilma Rousseff já mostrou, em mais de uma ocasião, diferenças importantes em relação a seu antecessor e grande eleitor. Neste caso, no entanto (a intervenção na Vale), quando se trata da fome de poder e de ambição centralizadora, a continuidade da política anterior parece garantida”. Outros trechos da matéria: “O governo venceu, depois de quase dois anos e meio de campanha contra o presidente da Vale, maior empresa privada do Brasil, segunda maior mineradora do mundo e líder mundial na extração de minérios de ferro. Roger Agnelli deixará o posto, afinal, porque o Bradesco desistiu de enfrentar a pressão do Palácio do Planalto”. “Se houve algo surpreendente não foi a rendição do Bradesco, mas sua longa resistência. Há uma enorme desproporção de forças entre o governo federal e uma instituição financeira privada. A pressão exercida a partir do Palácio do Planalto foi “massacrante”, segundo uma fonte citada pelo jornal o Globo”. “Ao insistir no afastamento de Roger Agnelli, a presidente Dilma Rousseff seguiu no caminho aberto por seu antecessor. Derrubar o presidente da Vale foi um dos grandes objetivos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva”.

“Reestatização da empresa aumenta riscos de negócios no Brasil” – Com este ‘olho’ no editorial intitulado “Interferência política e indevida na Vale”, o Globo, também de ontem, lembra “as enormes resistências à privatização da então Companhia Vale do Rio Doce” e as dificuldades antepostas ao trabalho empresarial que se seguiu, passando depois à avaliação dos resultados obtidos: “Mesmo com todos os obstáculos iniciais, a Vale se superou, sob o comando de uma diretoria formada por profissionais capacitados. A empresa fez ousadas aquisições, multiplicou os investimentos e soube aproveitar as oportunidades que apareceram, o que provavelmente não teria ocorrido se tivesse permanecendo como estatal, pelas condições que restringem esse tipo de companhia. O resultado da mudança se traduziu em considerável aumento do valor de mercado da Vale, que, em dez anos, saltou de US$ 9,2 bilhões para US$ 176,3 bilhões”.

Compulsão intervencionista – Do editorial da Folha de sábado último, com o título “Vale tudo”: “Não será por certo o único aspecto do governo Dilma Rousseff em perfeita continuidade com o de seu padrinho e antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, mas já basta: a compulsão de interferir politicamente na gestão das maiores empresas do país. O caso mais gritante, no presente, é o da Vale. O Planalto fez de tudo para derrubar Roger Agneli, presidente da empresa, escolhido por acordo de acionistas”. “A direção da empresa responde apenas a seus acionistas, e eles têm motivos de sobra para satisfação. A Vale teve lucro líquido recorde de R$ 30,1 bilhões em 2010”. “Trocando em miúdos, a administração Dilma reincide em um dos piores vícios da era Lula – subordinar os interesses do público e dos investidores a maquinações
palacianas”.

E a imagem de boa gestora da presidente? – Construída com empenho, e favorecida pelo contraponto com o despreparo e o palanquismo de Lula, essa imagem é bem arranhada pela intervenção na Vale. Cujo comando por Roger Agnelli é amplamente avaliado como modelo de gestão empresarial.

O PSDB, Serra e Kassab

O jornalista Raymundo Costa, em sua coluna de ontem no Valor, intitulada “O dilema do PSDB aos 90 dias de Dilma”, detém-se na resistência de José Serra à afirmação da liderança, de Aécio Neves no partido. E torna públicas especulações sobre mais uma candidatura presidencial dele em 2014 pela nova legenda que está sendo criada, o PSD, se não for indicado pelos tucanos para a disputa. Trechos da coluna: “Para os tucanos, o ideal seria que Serra fosse candidato a prefeito de São Paulo e, 2012, principalmente se o

candidato do PT for escolhido entre a senadora Marta Suplicy e o ministro Aloizio Mercadante. Serra não gosta nem de ouvir falar no assunto. Sabe que é o fim de carreira, e em seus cálculos ainda está a presidência da República. No momento, ele precisa avançar uma posição, e é neste movimento que está integralmente empenhado. O PSDB e Aécio Neves não devem subestimar o colega tucano. Sua capacidade para intervir no jogo partidário ainda é efetiva, apesar do isolamento. Já se especula com certa naturalidade, em setores do PSDB, a hipótese sobre a qual o ex-governador paulista evita cogitações – que ele venha a se candidatar ao Planalto pelo PSD, o partido que está sendo criado por Gilberto Kassab. Sabe-se que Kassab já falou sobre isso com Serra, trata-se de uma porta aberta que o tucano não fechou. É o que, no PSDB, passou a ser chamado de “bomba atômica”, uma espécie de aviso a Aécio sobre o que ele, Serra, pode fazer caso não seja presidente do PSDB”.

Jarbas de Holanda é jornalista
(30/3/2011)

Trabalhadores param obra em porto de Eike

REBELIÃO NOS CANTEIROS: Operários querem adicional de periculosidade, plano de saúde e aumento salarial

Funcionários da construção do terminal marítimo do Açu, no Norte Fluminense, bloqueiam estrada para reivindicar direitos

Danielle Nogueira e Aloysio Balbi

RIO e CAMPOS. Cerca de 300 homens que trabalham na construção do terminal marítimo de minério de ferro do Porto do Açu, em São João da Barra, no Norte Fluminense, bloquearam na manhã de ontem, queimando pneus e usando galhos de árvores, a estrada que dá acesso ao porto. Eles reivindicam o pagamento do adicional de 30% de periculosidade e aumento salarial, além de plano de saúde, participação nos lucros, equiparação salarial e outros direitos, que não estariam sendo cumpridos pela empresa há mais de três anos.

Com investimentos de R$3,4 bilhões, o Porto do Açu deve se tornar o terceiro maior do mundo quando entrar em operação, no segundo semestre de 2012. O empreendimento pertence à LLX - braço logístico do grupo de Eike Batista - e compreende vários projetos, entre eles um terminal de minério de ferro. Este está sob gestão da LLX Minas-Rio, empresa formada da união entre a LLX (51%) e a anglo-sul-africana Anglo American (49%).

Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil da região, José Eulálio, a empresa já acenou com um termo de compromisso que ainda não atingiu os objetivos dos trabalhadores. Ele informou que a empresa se nega a pagar o reajuste de periculosidade dos anos anteriores a 2011.

- A empresa quer pagar a periculosidade a partir deste ano, mas os trabalhadores querem receber os anos anteriores, o que é direito deles. As outras cláusulas estão sendo negociadas, mas, enquanto não chegarmos a um acordo que seja satisfatório para todos, não vamos arredar pé daqui - afirmou Eulálio.

A estrada bloqueada foi a RJ-240, que tem 20 quilômetros e liga a BR 356 ao Porto do Açu. Segundo a LLX, o bloqueio ocorreu por volta das 7h30m, hora que os trabalhadores costumam chegar ao canteiro de obras. Ainda segundo a empresa, trabalham no terminal de minério 350 operários, dos quais 250 no turno matinal e 100 no vespertino. Alguns trabalhadores do turno da tarde nem chegaram a ir trabalhar ontem, devido à manifestação. Ao todo, trabalham no porto 1.943 funcionários.

LLX diz que cumpre todas as normas da lei trabalhista

Os trabalhadores que fizeram o protesto são da empresa ARG, construtora responsável pelo terminal de minério de ferro. Até o fim do dia de ontem, representantes da LLX e da ARG tentavam negociar com o sindicato local para resolver o problema.

Em nota, a LLX Minas-Rio informou que "cumpre rigorosamente todas as normas e determinações da legislação trabalhista, além de exigir em contrato o mesmo rigor de seus parceiros" e que "está atenta às reclamações e acompanha de perto o cumprimento dos contratos firmados com essas empresas".

Já os operários do Complexo Petroquímico de Suape, em Pernambuco, decidiram ontem voltar ao trabalho após 14 dias de greve. Faz parte dos empreendimentos, que reúnem mais de 30 mil trabalhadores, a Refinaria Abreu e Lima, da Petrobras, uma das estrelas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A decisão foi tomada em assembleia pela manhã após o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) considerar a paralisação ilegal na véspera.

De acordo com informações do Ministério Público do Trabalho (MPT), o tribunal considerou o movimento abusivo, mas os operários obtiveram vitória em relação a boa parte da pauta de reivindicações, com aumento de vale-alimentação e horas extras. A paralisação havia começado no último dia 17.

Outra obra problemática é a da Usina Hidrelétrica de São Domingos, em Mato Grosso do Sul, onde, na semana passada, houve quebra-quebra e incêndio. Segundo o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), a situação no local é mais difícil do que em outras obras porque "cinco trabalhadores apanharam muito".

FONTE: O GLOBO

'Ambiente explosivo', diz sociólogo

Estudioso do movimento sindical brasileiro, o sociólogo do Iuperj Adalberto Cardoso afirma que as características das obras, "altamente perigosas", em comunidade e em locais parcialmente isolados, são "ambientes muito explosivos", no mundo inteiro. O caminho é criar canais institucionais para receber queixas desses trabalhadores, diz.

Por que essas rebeliões estão acontecendo?

ADALBERTO CARDOSO: São áreas de fronteira, em condições especiais, como o trabalho em minas, em refinarias e em plataformas de petróleo. É um trabalho altamente perigoso, em comunidade, relativamente isolados. É um ambiente muito explosivo, no mundo inteiro.

Por que não foi possível perceber essa insatisfação?

CARDOSO: Não houve canais institucionais adequados que chamassem a atenção para as queixas dos trabalhadores. Os sindicatos não se mostraram preparados para esse aumento na demanda de trabalhadores.

Na sua opinião, o que houve para o movimento se espalhar pelo Brasil?

CARDOSO: Foi efeito demonstração, na sequência do que aconteceu em Jirau.

Qual é a solução?

CARDOSO: É uma situação explosiva, para qual não há saída a curto prazo. Essas obras trouxeram de volta pessoas que não trabalhavam há tempos. Sem qualificação, é treinado no trabalho. Nesses locais, é preciso ter a presença do sindicato nos canteiros e canais abertos na empresas. Eles têm reivindicações justas ou que percebem justas. Não importa, porque a consequência é a mesma: motim.

E as empresas?

CARDOSO: São grandes empresas que têm know-how com canteiros deste tipo. Não dá para tirar a responsabilidade delas. Há uma culpa grande de não ter instituído canais para os trabalhadores reclamarem e não terem buscado parcerias com os sindicatos. (Cássia Almeida)

FONTE: O GLOBO

Falta de canais para queixas gerou os motins

Especialistas listam fragilidade sindical, ação errada das empresas e falta de fiscalização

Karina Lignelli e Cássia Almeida

SÃO PAULO e RIO. Uma conjunção de fatores explica a sucessão de rebeliões em grandes canteiros de obras no país: falta de canais de reclamação para os trabalhadores dentro das empresas, atividade muito arriscada, isolamento, falta de estrutura dos sindicatos locais diante do aumento da base de operários e uma ação coordenada do governo para monitorar essas obras no país, afirmam especialistas. O coordenador de Relações Sindicais do Dieese, José Silvestre Prado de Oliveira, acredita que todos têm sua parcela de culpa pela onda de quebra-quebra nos canteiros de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

As construtoras, por contratarem "gatos" para arregimentar operários por todo o país, oferecendo "condições precárias para os trabalhadores, na tentativa de apressar o término das obras"; as centrais sindicais, que demoraram "a acordar" para o problema, revelando falta de informações sobre a situação dos trabalhadores fora das grandes capitais do país; e o governo, por não fiscalizar as obras.

Para Oliveira, foi um movimento espontâneo, já que as reivindicações são muito semelhantes em todas as obras, alimentado pela falta de líderes para negociação.

- Não há uma liderança clara. O positivo disso tudo é que esse problema confirma as condições de trabalho no setor de maneira geral, provocando a necessidade de governo, grandes construtoras e centrais discutirem um pacto que garanta minimamente as condições de trabalho nessas obras - diz o coordenador do Dieese.

Novas lideranças sindicais devem surgir

Segundo o sociólogo do Iuperj Adalberto Cardoso, o saldo desse movimento será positivo. Agora, todos os atores institucionais estão com os olhos voltados para a questão.

- É de se esperar que as condições nessas obras melhorem a partir desses movimentos - afirma.

Para ele, a tendência é que surjam novas lideranças nas bases sindicais, se os atuais dirigentes não conseguirem dar conta das demandas desses trabalhadores:

- A base desses sindicatos mudou. Aumentou muito, e é natural que as lideranças desses movimentos ganhem espaço nos sindicatos.

Mas são os trabalhadores que mais sofrem com essas rebeliões, diz Cardoso. Muitos devem perder seus empregos:

- A empresa tem capacidade de identificar esses líderes. Mas, como o país está crescendo, eles não devem ter problemas em se reempregar.

O consultor sindical João Guilherme Vargas Neto, que acompanha o movimento sindical há décadas e atualmente está ligado à Força Sindical, diz que a pauta trabalhista ficou em segundo plano quando se discutiu o PAC:

- Falou-se da pauta econômica, com a geração de empregos, investimento, e da pauta ambiental. Esquecemos da trabalhista. Essas rebeliões demonstraram a necessidade de equilibrar as três pautas.

Para ele, também faltou estrutura nos sindicatos das bases para lidar com o gigantismo das obras. Havia locais, como Pecém, em que a base representativa do sindicato subiu de 600 para 20 mil da noite para o dia.

FONTE: O GLOBO

Justiça avalia pedido de embargo das obras da hidrelétrica de Jirau

REBELIÃO NOS CANTEIROS: Centrais sindicais travam disputa, dizem empresários

Para Procuradoria do Trabalho, é preciso reconstruir alojamentos e áreas de lazer

Cássia Almeida, Flávia Barbosa e Karina Lignelli

RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA. O Ministério Público do Trabalho (MPT) de Rondônia impetrou ontem uma ação civil pública na qual pede o embargo das obras da Usina Hidrelétrica de Jirau. Segundo a ação, "o ambiente de trabalho em que se ativavam os trabalhadores não oferece condições para o reinício das atividades". Segundo o MPT, as áreas de vivência, principalmente os alojamentos e os espaços de lazer, estão destruídos.

- Até reconstruir as instalações, não será possível voltar à obra - disse o procurador-chefe do MPT, Francisco Cruz.

A empreiteira Camargo Corrêa, responsável pela obra, informou que "as condições de trabalho na obra são as melhores disponíveis no país. Todos os alojamentos, separados em alas femininas e masculinas, são equipados com ar-condicionado e banheiro privativo, e dispõem de áreas de lazer com quadras poliesportivas cobertas, iluminação noturna, academia de ginástica e salas de jogos, de televisão e de acesso gratuito à internet, além de serviços de lavanderia, salão de beleza, barbearia, agência bancária, caixas eletrônicos, lanchonete e farmácia".

A disputa entre correntes e a busca por ampliação do espaço político dos sindicatos no governo Dilma Rousseff são apontadas por gestores de grandes empreendimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) como combustíveis dos conflitos que vêm explodindo nos canteiros de obras de diversos pontos do país. A avaliação é que a dimensão dos projetos elevou significativamente a categoria dos trabalhadores da construção civil, estimulando a briga pelo controle das bases entre entidades como a CUT, a Força Sindical e a Conlutas.

Um exemplo citado com frequência pelos empresários afetados pelos recentes distúrbios é o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Rondônia, que passou a ter grande importância com o início das obras das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira. De base muito pequena, condizente com o peso e o desenvolvimento econômico do estado, o sindicato passou a ter 35 mil trabalhadores sob sua jurisdição.

A entidade de Rondônia é ligada à CUT e, depois da data-base do ano passado, em maio, a Força Sindical teria desembarcado no estado para questionar em junho o processo eleitoral do sindicato local. A Conlutas também estaria tentando aproveitar as novas fronteiras de expansão da força de trabalho para conquistar espaço.

Empresários citam que têm percebido a presença de emissários das centrais sindicais, às vezes de São Paulo, em locais das assembleias de operários. Outra percepção de empreendedores de obras do PAC é que as centrais sindicais estariam tentando, a partir da visibilidade do programa e de sua importância para o governo federal, estabelecer uma agenda política mais cara ao Palácio do Planalto, em uma estratégia para reconquistar espaço no governo do PT.

Desta forma, estimular paralisações e reivindicações em relação ao PAC seria também uma forma de "testar os limites" de Dilma - que, ao contrário do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não foi forjada no movimento sindical e tampouco tem sensibilidade natural à agenda das entidades.

Do ponto de vista empresarial, existe também o temor dos gestores e concessionários de obras do PAC de que a mobilização das centrais pressione por reajustes e concessão de benefícios muito elevados, implicando em custos adicionais aos empreendimentos e criando um novo padrão nacional de remuneração.

Sindicatos afirmam que faltam condições de trabalho

Sindicalistas, por outro lado, dizem que a insatisfação dos trabalhadores, "sufocados pela pressão", seria o estopim dos problemas nas obras do PAC ao longo do Brasil. Segundo Vagner Freitas, secretário de organização da CUT, as obras do PAC, em geral, não oferecem condições ideais de trabalho.

- São obras grandes, com muito dinheiro envolvido, mas nas quais trabalhadores são tratados como gado. É uma manifestação espontânea de insatisfação - diz ele, que responsabiliza empresas e governo pelos problemas nas obras do PAC. - Não há capacidade gerencial nem critério, os canteiros são terceirizados. O Ministério do Trabalho deveria ter fiscalizado desde o início.

O presidente da Força Sindical Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, disse que os sindicatos pequenos não estariam acostumados a lidar com a grande quantidade de trabalhadores atraídos para esses canteiros:

- De repente, em uma base de 2 mil, 3 mil trabalhadores, chegam 40 mil. Pega o sindicato desprevenido. Com as más condições de trabalho, uma hora vira revolta, porque esses trabalhadores percebem que, com alguma pressão, podem conseguir seus direitos. E isso contamina todas as outras obras - afirma, que admite que as centrais "chegaram depois", e que a Força passou a enviar dirigentes especializados em negociação para "evitar problemas".

FONTE: O GLOBO

BC vê pressão gigantesca sobre os preços em 2011

O Banco Central jogou a toalha e admitiu ontem que não tem como atingir o centro da meta de inflação de 4,5% este ano. A previsão é que o custo de vida chegue a 5,6% em 2011. Pela regra atual, a inflação pode oscilar até dois pontos para cima ou para baixo, de 2,5% a 6.5%. O alerta foi feito na divulgação do primeiro Relatório de Inflação deste ano em que o BC adverte para um choque "gigantesco" de preços das commodities (matérias-primas). O diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton, disse que o objetivo agora é impedir que o custo de vida ultrapasse 6%. Apenas em junho de 2012 poderia convergir para 4,4%. O Banco Central também enfatizou que a cultura da indexação ainda é forte no Brasil: "O Copom entende que há resistências importantes à queda da inflação no Brasil. Existem mecanismos quase automáticos de reajustes."

Inflação ganha o 1º round

BC admite que não cumprirá centro da meta este ano e cita "gigantesco" choque de preços

Vivian Oswald

No primeiro Relatório de Inflação do governo da presidente Dilma Rousseff, o Banco Central (BC) sinalizou que já não há como atingir o centro da meta de inflação este ano, que deve fechar em 5,6% pelo IPCA, mais de um ponto percentual acima do alvo central de 4,5%, porém ainda dentro da margem de tolerância que vai até 6,5%. Como a economia ainda estaria digerindo o choque que o diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton de Araújo, chamou de "gigantesco", por efeito da explosão dos preços das commodities desde agosto de 2010, a instituição deve trabalhar para evitar a contaminação de outros setores da economia de modo que o IPCA - que ultrapassará o teto de 6% da meta no terceiro trimestre deste ano - arrefeça e possa convergir para o centro da meta. Mas isso só aconteceria em 2012. A previsão é que o índice chegue a 4,4% em junho do ano que vem.

- No segundo semestre de 2010, o mundo e nós fomos apanhados de surpresa por um gigantesco choque de commodities. Em nove meses, os preços subiram 70% e isso tem mais impacto no Brasil do que em outros países - admitiu o diretor ao apresentar o documento.

O choque "gigantesco" terá um impacto de 2,5 pontos percentuais na composição da inflação assim que for totalmente absorvido, segundo o BC. Dois terços deste valor já teriam sido computados no ano passado, mas ainda resta um impacto importante de cerca de 0,8 ponto para 2011. Na prática, é como se o país já partisse de uma inflação de 5,3% a 5,4% para o ano.

- Pode ser menos? Pode. Vamos ver. O nosso trabalho é para que o gap (em relação ao centro da meta de 4,5%) seja o menor possível - explicou Hamilton.

Diante da forte indexação da economia brasileira e do fato de os índices de preços no país ainda serem altos, o que cria expectativas mais elevadas para a inflação na sociedade, o BC avalia que o custo de aumentar demais as taxas de juros seja muito alto para trazer o indicador para a meta no curto prazo.

- Não abandonamos o centro da meta para 2011. Nós trabalhamos para conter a propagação dos choques. O foco é 4,5%, mas um desvio por conta de choque de oferta é aceitável e é acomodado na banda de tolerância. Isso tudo para garantir a convergência para 2012 - explicou Hamilton.

Indexação é apontada como risco este ano

O relatório de março reduziu de 4,5% para 4% a estimativa para o crescimento da economia em comparação com o último relatório. Mas nem a redução do ritmo foi capaz de aliviar a projeção para a inflação, que subiu de 5% para 5,6% desde dezembro. O BC ainda entende que o crédito deva crescer e que as pressões inflacionárias devem se manter este ano. Referências à indexação e às expectativas negativas para a inflação permeiam o documento e são tratadas como fatores de risco.

"O Copom entende que há resistências importantes à queda da inflação no Brasil. Existem mecanismos regulares e quase automáticos de reajustes, de jure e/ou de facto, que contribuem para prolongar, no tempo, pressões inflacionárias observadas no passado. Como se sabe, mecanismos de indexação de preços, mesmo que informais, reduzem a sensibilidade da inflação às flutuações da demanda", afirma o relatório. Mais adiante, alerta: "Os riscos associados aos mecanismos de indexação tornam-se particularmente importantes em 2011".

Nas entrelinhas do relatório, o BC indica que pretende esperar os efeitos das medidas macroprudenciais adotadas nos últimos meses e sinais mais concretos do cenário externo para calibrar os juros. No documento do BC não estão computados, por exemplo, os efeitos da tragédia no Japão. O preço do petróleo também é considerado uma fonte de incertezas.

"Considerando as perspectivas de desaceleração da atividade doméstica, bem como a complexidade que ora envolve o ambiente internacional, entre outros fatores, a estratégia da política monetária pode eventualmente ser reavaliada, em termos de sua intensidade, de sua distribuição temporal ou de ambos", diz o relatório.

Segundo o ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas, as ações macroprudenciais têm efeito sobre a demanda, mas não sobre as expectativas. Isso, segundo ele, só confirma o fato de o BC querer ganhar tempo para agir.

- O BC mostrou que tem plano de voo bem definido. Vai esperar o efeito das medidas macroprudenciais e ganhou tempo ao aceitar a convergência para 2012. Agora, deixou claro que, se nada disso funcionar, vai aumentar a dose do remédio amargo dos juros. Mas o risco de aguardar é que as expectativas podem contaminar a inflação e gerar a indexação na economia. O BC não está deixando a inflação subir despreocupadamente, mas está tomando riscos excessivos. Essa é uma estratégia de muito risco - disse o estrategista-chefe do banco WestLB do Brasil, Roberto Padovani.

Para o coordenador de Análises Econômicas da Fundação Getulio Vargas (FGV), Salomão Quadros, o maior problema da inflação neste momento é justamente a expectativa, no que o plano de voo do BC não ajuda:

- Ela não está ancorada. Isso acontece porque o BC está mudando de estratégia, no que pode ser bem sucedido. Mas essa troca de instrumentos ainda deixa dúvidas. É claro que, quanto mais alternativas, melhor. Mas a mudança está acontecendo no meio da batalha. Dá impressão de que o BC tem mais confiança do que o mercado.

A despeito do que vem afirmando a presidente Dilma, o relatório do BC reconhece a pressão da demanda na economia. "Esses aumentos ocorrem ainda em contexto de descompasso entre o crescimento da absorção doméstica e a capacidade de expansão da oferta, apesar dos sinais de que esse descompasso tende a recuar", diz.

- A inflação no Brasil ainda é alta. A meta ainda é alta. Quando o país evoluir para metas menores, as taxas vão cair, assim como os repasses para os (preços dos) serviços - ponderou Hamilton, do BC.

FONTE: O GLOBO

Pesquisa mostra que renda do trabalhador caiu 1,7% em janeiro

A inflação voltou a mostrar forte efeito sobre o poder de compra do trabalhador. Em janeiro, o valor médio da renda da população ocupada caiu 1,7%, para R$ 1.382. Os dados foram divulgados ontem pela Fundação Seade e pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).

Os números, calculados com base em sete regiões metropolitanas, mostram que entre os assalariados a perda foi menor, de 0,1%, com média em R$ 1.440.

Na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) a maior redução do poder de compra foi dos autônomos, de 3,7%, com os ganhos ficando em R$ 1.176. A remuneração dos assalariados caiu 0,7%, para R$ 1.535. No total, a população ocupada teve uma perda de 2,8% na renda, para R$ 1.505.

O índice de desemprego médio nas regiões ficou praticamente estável em 10,5%, ante 10,4% registrados em janeiro.

Alexandre Loloian, do Seade, indica que -além da inflação- a queda dos salários no setor de serviços, que responde por mais 50% da atividade na região, pesou na redução.

Na RMSP, o comércio perdeu 23 mil vagas no mês, e o setor de serviços, 16 mil.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Carinhoso - Marisa Monte e Paulinho da Viola

Apito final - Graziela Melo

Silêncio

Na alma
Medo
No coração


É o ponto
Final
A ultima
Estação


Dos que
Nascemos
Juntos


Dos que
Vivemos
Juntos


Da nossa
Geração


O tenpo
Acabou
O juiz
Apitou


Sem
Prorrogação...


Se foram
Os amores
Tardios


Ficaram
Os
Recantos
Vazios


E...


A
solidão!!!

Crônicas, contos e poemas, pág. 109. Fundação Astrojildo Pereira, 2008

quarta-feira, 30 de março de 2011

Reflexão do dia – Roberto Freire

É um escândalo que obras tão importantes para o país tenham condições de trabalho como as desses acampamentos. Só poderia partir de um governo que desrespeita completamente todos os direitos, com a complacência e a omissão das centrais sindicais brasileiras, todas elas mais preocupadas em apoiar governo do que em defender trabalhadores.
Roberto Freire, no Portal do PPS, 29/3/2011

O político humano :: Merval Pereira

O ex-vice-presidente José Alencar humanizou a imagem do político com sua simpatia natural e, sobretudo, pela luta que travou em público contra a doença que acabou matando-o já fora do poder. O destino foi injusto com ele, não permitindo que descesse a rampa ao lado de Lula ao fim dos oito anos de governo em que foi uma figura política relevante, tanto nas negociações de bastidores quanto na pregação permanente contra a alta taxa de juros.
Mesmo sendo a antítese da figura do vice ideal, que seria aquele que não aparece, Alencar conseguiu ajudar Lula desde o início da candidatura, quando surgiu como o empresário que avalizava aquele líder operário que colocava medo nos seus companheiros capitalistas.

O PL, que terminou na oposição a Fernando Henrique, surgiu como solução para a composição de uma chapa que indicasse a mudança ideológica da candidatura de Lula à Presidência.

Foi uma sinalização fundamental para garantir segurança a uma parte do eleitorado. Coube a Alencar compor uma chapa inédita unindo trabalho e capital que viabilizou a vitória de Lula na sua quarta tentativa de chegar à Presidência da República.

E fez isso com habilidade de político mineiro, fechando na undécima hora, em 2002, um acordo polêmico do PT com o PL, partido a que estava filiado então.

Trancados no quarto de um apartamento, José Dirceu e Valdemar da Costa Neto negociaram tenebrosas transações, enquanto na sala, oficialmente alheios aos acertos finais, Alencar e Lula conversavam.

Esse acerto teria consequências desastrosas mais adiante, quando surgiu o escândalo do mensalão, mas nem Lula nem Alencar foram atingidos por seus estilhaços.

O PL do bispo Macedo acabou tornando-se uma sigla manchada pelo escândalo, e Alencar mudou-se em outubro de 2005 para o Partido Municipalista Renovador (PMR), hoje Partido Republicano, também ligado à Igreja Universal, uma manobra do católico Alencar para continuar garantindo o apoio dos evangélicos ao governo Lula.

Indemissível, pois tinha mandato, Alencar seria uma pedra no sapato da equipe econômica até o fim do primeiro governo de Lula com suas reclamações sobre a política de juros, que atribuía ao então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e chegou a ser cogitado como candidato à Presidência em oposição a Lula, o que jamais foi possível devido à amizade crescente que surgiu entre os dois.

A escolha do vice-presidente José de Alencar para acumular o cargo de ministro da Defesa foi considerada pelos especialistas em segurança na ocasião um agrado do governo Lula aos militares, diante da evidente resistência dos militares a um comando civil.

Os militares, com isso, se considerariam tratados como se tivessem uma situação acima das demais áreas do governo.

O vice-presidente, um empresário nacionalista, também era visto como o ideal para negociar com o governo investimentos para reequipamento das Forças Armadas, mas teve uma passagem apagada pelo ministério e acabou sendo substituído por Waldir Pires.

Alencar tinha orgulho de ser um empresário nacionalista e dizia que sua pregação contra os juros era um trabalho de "catequese, de formação, uma cruzada".

Às suas pregações contra os juros altos, uma bandeira altamente popular, José Alencar adicionou críticas mais amplas à política econômica do governo e chegou a se aproximar de economistas de esquerda, ligados ao Conselho Federal de Economia.

Houve um momento em que, devido à doença de José Alencar e também às suas críticas, foi aventada a troca do vice na chapa da reeleição de Lula, para incorporar o PMDB à base do governo com mais força.

Mas a ligação pessoal entre ele e o presidente Lula, que àquela altura já ultrapassava os interesses partidários, impediu que se desfizesse a dupla, que continuou pelo segundo mandato.

A dimensão humana do político foi ganhando pouco a pouco maior relevância, enquanto ele lutava estoicamente contra o câncer, numa sucessão espantosa de cirurgias.

Sua obstinada luta pela vida passou a ser acompanhada por todo o país, e seu exemplo de superação emocionou tantos quantos viam e ouviam suas declarações, a cada dia mais filosóficas à medida que o fim ficava mais próximo.

Dizia, por exemplo, que mais do que temer a morte devia-se temer a desonra. Ou que Deus dispunha de seu destino e que, se o quisesse levar, "nem precisava do câncer".

Aos que se espantavam com seu bom humor depois de uma das tantas cirurgias a que se submeteu, comentou: "Eu sou assim mesmo, mas a coisa está preta."

Recebeu de todo o país um mar de correspondências, com mensagens de apoio e até receitas para livrá-lo do câncer.

Atribuía a essa mobilização dos brasileiros eventuais melhoras de seu ânimo, e houve momentos em que se entusiasmou com os efeitos de um medicamento experimental que parecia estar reduzindo o tamanho dos tumores em seu abdômen.

Sua empatia com o brasileiro comum resistiu até mesmo a uma atitude polêmica, a de rejeitar de público fazer exame de DNA para verificar se era mesmo sua uma filha que reclamava sua paternidade.

FONTE: O GLOBO